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Consórcio: as regras de devolução de valores e a posição dos tribunais

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22/09/2015 às 16:21
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4 – O MOMENTO DA RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS PAGAS PELOS CONSORCIADOS DESISTENTES/EXCLUÍDOS

 Aquele que desiste do negócio ou simplesmente deixa de pagar as parcelas mensais (o chamado excluído), invariavelmente pretende a imediata restituição dos valores desembolsados. No entanto, necessário lembrar que a estrutura básica do sistema de consórcios envolve pessoas com as mesmas necessidades de consumo, que se reúnem em grupos fechados, em que solidariamente se autofinanciam para, em prazo determinado, utilizarem seus créditos para a aquisição de bens ou serviços com menor esforço financeiro.

Aqui é preciso uma rápida distinção entre os grupos constituídos antes e após a lei nº 11.795/2008. Anteriormente, a regulamentação editada pelo Banco Central do Brasil[13], previa que, dentro de 60 (sessenta) dias da contemplação de todos os consorciados, cabia à administradora, na seguinte ordem, comunicar: a) aos consorciados que não tivessem utilizado o respectivo crédito, que o mesmo estaria à disposição para recebimento em espécie e, b) aos excluídos, que os valores relativos à devolução das quantias por eles pagas estavam à disposição. É o que se observa do artigo 21 da mencionada circular.

Dúvida não há, portanto, que a prioridade sempre foi a de aquisição de bens ou serviços pelos consorciados ativos, - os denominados adimplentes e, somente após, no prazo de 60 dias da contemplação de todos os consorciados, teriam os consorciados desistentes/excluídos o direito ao recebimento dos valores desembolsados.  

E esse momento de restituição, previsto no regramento consorcial, foi confirmado pela jurisprudência, matéria inclusive que foi pacificada no Superior Tribunal de Justiça, conforme acórdão proferido no Recurso Especial nº 1.119.300-RS em 14 de abril de 2010, da lavra do Ministro Luis Felipe Salomão, cuja ementa é a seguinte:

 “RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. JULGAMENTO NOS MOLDES DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS PELO CONSORCIADO. PRAZO. TRINTA DIAS APÓS O ENCERRAMENTO DO GRUPO.

Para efeitos do art. 543-C DO Código de Processo Civil: é devida a restituição de valores vertidos por consorciado desistente ao grupo de consócio, mas não de imediato, e sim em até trinta dias a contar do prazo previsto contratualmente para o encerramento do plano.

Recurso Especial conhecido e parcialmente provido.”

Ainda da mesma Corte, colacionam-se diversos precedentes que bem demonstram a solidez do entendimento acerca do tema: RESP 1033193/DF, REL. Massami Uyeda; RESP 442.107-RS, Rel. Aldir Passarinho Júnior; AgRg no Ag 1098145/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi; AgRg no RESP 1066855/RS, Rel. Min. Sidnei Beneti; RESP 702.976/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão.

De maneira que, para os grupos constituídos antes da vigência da lei 11.795/08, tanto o regramento aplicável quanto a jurisprudência fixaram o momento da restituição ao desistente ou excluído, -  somente após o encerramento do grupo. E assim o fizeram, acertadamente, em respeito à estrutura básica do sistema de consórcio, que privilegiava a aquisição de bens/serviços pelos consorciados ativos (adimplentes).

Mas aí veio a Lei nº 11.795, de 09 de outubro de 2008 e o legislador, claramente, optou por não mais fazer distinção entre consorciado ativo e  excluído. E é possível perceber esse tratamento igualitário, no artigo 22  [14] da lei, que conceitua a contemplação como “a atribuição ao consorciado do crédito para a aquisição do bem ou serviço, bem como para a restituição das parcelas pagas, no caso dos consorciados excluídos”. E o § 3º do art. 24 da mencionada lei define a restituição do consorciado excluído como sendo “crédito parcial”.

Logo, por crédito deve se entender tanto o destinado à aquisição de bem ou serviço, como também o destinado à restituição das parcelas pagas aos excluídos.

E dúvida não resta, portanto, que para a utilização do crédito, seja para a aquisição de bem ou serviço, seja para a restituição ao excluído, necessário haver contemplação, no primeiro caso através de sorteio ou lance e no segundo apenas por sorteio.

Vejam então que a lei trouxe significativos benefícios aos excluídos, pois, se antes os mesmos somente poderiam receber os valores após o encerramento do grupo (60 dias após a última contemplação), doravante poderão receber os valores já no decorrer do grupo, eis que participarão das assembleias mensais ordinárias de contemplação, juntamente com os demais consorciados ativos. De modo que, uma vez contemplado (art. 22 da lei), o consorciado excluído passará a fazer jus ao recebimento dos valores pagos ao fundo comum do grupo.

Essa é a previsão da lei, que vem sendo confirmada pelos tribunais estaduais, conforme algumas decisões trazidas abaixo:

“TJSP – APELAÇÃO Nº 0000517-25.2013.8.26.0333, 19ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO. REL. DES. RICARDO NEGRÃO. J. 13.10.2014.

CONSÓRCIO – Desistência – Restituição da quantia paga antes do encerramento do grupo – Possibilidade – Contudo, não de imediato, mas na data da contemplação por sorteio, na forma do art. 30 da Lei n. 11.795/2008, com incidência de juros a partir dessa data – Recurso parcialmente provido, por maioria”. (grifamos)

“TJSP, APELAÇAO Nº 0039664-10.2010.8.26.0577, 21ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, REL. ITAMAR GAINO. J.23/11/11.

“Consórcio- Contrato firmado após a vigência da Lei 11.795/08 - Restituição das parcelas - Correção monetária

1. Em caso de desistência nos contratos de consórcio celebrados após a vigência da Lei 11.795/08, a restituição das parcelas pagas deve ocorrer na oportunidade da contemplação da cota do consorciado excluído ou em até sessenta dias do encerramento do grupo, caso não seja sorteada a sua cota.

2. Na oportunidade da restituição, as parcelas deverão ser corrigidas monetariamente com base no percentual amortizado do valor do bem vigente à data da restituição. Inteligência do artigo 30 da Lei 11.795/08.

3. Não é possível a aplicação de redutor que resulte a perda total da quantia paga pelo consorciado desistente.

Ação parcialmente procedente. Recurso parcialmente provido”. (grifamos).

“TJMG. APELAÇÃO Nº 1.701.12.006544-9/001. 17ª CÂMARA CÍVEL. RELATOR DES. LEITE PRAÇA. J. 18/06/2014.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE COBRANÇA. CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS. 30 DIAS APÓS A CONTEMPLAÇÃO DO CONSORCIADO RETIRANTE OU DO ENCERRAMENTO DO GRUPO. LEI Nº. 11.795/2008. APLICABILIDADE. LIVRE E EXPRESSA DECLARAÇÃO DE VONTADE. E LEGALIDADE. PRECEDENTES DO STJ. CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA. DIREITO DE RETENÇÃO CONDICIONADO À PROVA DO EFETIVO PREJUÍZO. PRECEDENTES DO STJ. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. IMPOSIÇÃO DA INTEGRALIDADE DAS VERBAS AO AUTOR. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. PRIMEIRO APELO DESPROVIDO E SEGUNDO APELO PARCIALMENTE PROVIDO”. (grifei).


5 – APURAÇÃO DO VALOR A SER RESTITUÍDO

Diz o art. 30 da Lei nº 11.795/2008:

“O consorciado excluído não contemplado terá direito à restituição da importância paga ao fundo comum do grupo, cujo valor deve ser calculado com base no percentual amortizado do valor do bem ou serviço vigente na data da assembleia de contemplação, acrescido dos rendimentos da aplicação financeira a que estão sujeitos os recursos dos consorciados enquanto não utilizados pelo participante, na forma do art. 24, § 1º”. (grifei).

Inicialmente, importante salientar que fundo comum é aquele constituído através da contribuição de todos os consorciados, para o atingimento do fim comum – a aquisição de bens ou serviços. De maneira que, outras importâncias pagas, como taxa de administração, seguro etc., não compõem o fundo comum do grupo.

E para o cálculo do valor a ser restituído ao consorciado excluído, basta aplicar-se o percentual até então por ele recolhido ao fundo comum sobre o valor do bem ou do serviço objeto do contrato vigente na data da assembleia de contemplação. E partir daí, esse valor é destacado do restante dos recursos do grupo e passa a ser acrescido dos rendimentos da aplicação financeira a que estão sujeitos os recursos dos consorciados, até sua efetiva utilização, assim entendido o recebimento pelo excluído, o qual é o beneficiário desses rendimentos.

5.1 – TAXA DE ADMINISTRAÇÃO

Taxa de administração[15] é a remuneração auferida pela administradora[16] pela formação, organização e administração do grupo de consórcio, até seu encerramento.

E o legislador, quanto ao patamar da taxa de administração, não impôs qualquer limitação, como de fato nem poderia, sobretudo em obediência à  ordem econômica, que tem dentre os seus fundamentos, a livre iniciativa, garantia constitucional estampada no art. 170, inciso IV e § único da Constituição Federal.

Ademais, caso tivesse o legislador a intenção de limitar a taxa de administração, o teria feito expressamente, o que não fez, confirmando assim que o que prevalece é o pactuado entre as partes.

E sobre o assunto o Superior Tribunal de Justiça já pacificou seu entendimento, no sentido de liberdade de fixação da taxa de administração, conforme se observa pela decisão abaixo:

“RECURSO ESPECIAL. RITO DO ART. 543-C DO CPC. CONSÓRCIO. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. FIXAÇÃO. LIMITE SUPERIOR A 10% (DEZ POR CENTO). AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE E ABUSIVIDADE. LIVRE PACTUAÇÃO PELAS ADMINISTRADORAS. POSSIBILIDADE. ANÁLISE DE OFENSA A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL – ARTIGO 22, INCISO XX. IMPOSSIBILIDADE. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARTIGO 421 DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 282/STF.

1 – As administradoras de consórcio têm liberdade para fixar a respectiva taxa de administração, nos termos do art. 33 da Lei nº 8.177/91 e da Circular nº 2.766/97 do Banco Central, não havendo falar em ilegalidade ou abusividade da taxa contratada superior a 10% (dez por cento), na linha dos precedentes desta Corte Superior de Justiça (AgRg no REsp nº 1.115.354/RS, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 27/3/2012, DJe 3/4/2012; AgRg no REsp nº 1.179.514/RS, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 20/10/2011, DJe 26/10/2011; AgRg no REsp nº 1.097.237/RS, rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 16/06/2011, DJe 5/8/2011; AgRg no REsp nº 1.187.148/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 3/5/2011, DJe 10/5/2011; AgRg no REsp nº 1.029.099/RS, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 14/12/2010, DJe 17/12/2010; EREsp nº 992.740/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 9/6/2010, DJe 15/6/2010.

2 – O Decreto nº 70.951/72 foi derrogado pelas circulares posteriormente editadas pelo BACEN, que emprestarem fiel execução à Lei nº 8.177/91.

3 – Descabe ao Superior Tribunal de Justiça examinar a suposta violação de matéria constitucional, porquanto enfrentá-la significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Constituição Federal, pertence ao Supremo Tribunal Federal.

4 – Ausente o prequestionamento, até mesmo de modo implícito, de dispositivo apontado como violado no recurso especial, incide o disposto na Súmula nº 282/STF.

5 – Refoge à competência desta Corte, nos termos da Súmula nº 7/STJ, qualquer pretensão de análise de prejuízo relativo à desistência de consorciado quando dependa de efetiva prova, ônus que incumbe à administradora do consórcio (REsp nº 871.421/SC, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 11/3/2008, DJe de 1º/4/2008).

6 – Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte, provido.”

(RECURSO ESPECIAL Nº 1.116.604-PR (2009/0069918-8), REL. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, julgado 13/06/2012).

Portanto, sendo a taxa de administração a remuneração da administradora e tendo ela claramente prestado serviços aos consorciados, inclusive àqueles excluídos, tal taxa em hipótese alguma poderá ser restituída.

5.2. CLÁUSULA PENAL

A administradora, para a captação de um consorciado, necessariamente suporta gastos com pessoal, comissões, impostos, marketing etc., além de ter a expectativa de receita gerada com o investimento realizado.

E a desistência/exclusão de consorciado, obviamente frustra todas essas expectativas, na medida em que os valores desembolsados acabam por não serem recuperados, suportando assim a administradora os prejuízos com a quebra do contrato por parte do consorciado.

Convém frisar que a desistência ou a exclusão dos consorciados do grupo por falta de pagamento das parcelas ajustadas, levará à resolução do contrato por inexecução voluntária, podendo a parte lesada (administradora) exigir perdas e danos. É o que prevê o artigo 389 do Código Civil[17].

E considerando que a apuração dos prejuízos pode ser penosa e de difícil mensuração e até de interesse das partes que seja evitada, o mesmo Código Civil autoriza às partes convencionarem cláusula penal (art. 408 e seguintes), a qual tem claramente duas funções, conforme a doutrina já se posicionou:

“De acordo com a melhor doutrina, a cláusula penal tem basicamente duas funções. Primeiramente, a multa funciona como uma coerção, para intimidar o devedor a cumprir a obrigação principal, sob pena de ter que arcar com essa obrigação acessória (meio de coerção, com caráter punitivo). Além disso, tem função de ressarcimento, prefixando as perdas e danos no caso de inadimplemento da obrigação (caráter de estimação”).[18]

No mesmo sentido, Sílvio de Salvo Venosa[19] que diz:

“Há inafastável efeito intimidativo e coercitivo na cláusula penal. O devedor, sabendo que se sujeitará a um maior valor no pagamento, envidará melhores esforços para cumprir sua obrigação. Trata-se, portanto, de um reforço para o cumprimento da obrigação, uma forma de garantia de adimplemento.

Outra importante e curial utilidade da cláusula é fixar antecipadamente as perdas e danos, evitando que as partes lancem-se em um tortuoso processo de apuração de prejuízos. Essa fixação de perdas e danos está nas origens históricas do instituto, no Direito Romano (cf. Rodrigues, 1981, v. 2:290).

Tanto na forma moratória, como na compensatória, a cláusula penal amplia as possibilidades de cumprimento da obrigação”.

E a lei do consórcio (11.795/08) também expressamente autoriza a estipulação de cláusula penal, dizendo em seu art. 10, § 5º: “É facultada a estipulação de multa pecuniária em virtude de descumprimento de obrigação contratual, que a parte que lhe der causa pagará à outra”.

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A jurisprudência compartilha do mesmo entendimento, senão vejamos:

“Consórcio - Contrato firmado após a vigência da Lei 11.795/08 - Correção monetária Legitimidade ativa. 1. Não é abusiva a cláusula que penaliza o consorciado em caso de saída antecipada do grupo, eis que serve como ressarcimento pelos danos causados pelo seu ato aos demais consorciados. Inteligência do parágrafo segundo do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor. (TJSP, Apelação nº 0002039-55.2010.8.26.0604. Órgão julgador: 21ª Câmara de Direito Privado. Relator: Itamar Gaino. Data: 23 de novembro de 2011)”. (grifei).

Sendo assim, lícita é a pactuação de cláusula penal, cujo percentual fixado deve incidir sobre o valor que foi apurado na forma do art. 30 da Lei 11.795/08. E, por óbvio, se a cláusula penal tem justamente a finalidade de prefixação de perdas e danos, em havendo tal estipulação no contrato, não há que se falar em necessidade de demonstração do prejuízo.

5.3. JUROS MORATÓRIOS

Como o próprio nome diz, os juros moratórios decorrem da mora. E, conforme o art. 394 do Código Civil, “Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer”.

No caso da lei do consórcio e dos contratos firmados entre administradora e consorciado, importante frisar que a restituição dos valores aos desistentes/excluídos ocorrerá após regular contemplação do excluído por sorteio (art. 30) ou, se esta não ocorrer, no prazo de 60 dias contados da data da realização da última assembleia de contemplação do grupo (art. 26 da Circular Bacen 3432/2009).

Se assim é, somente estará a administradora em mora se, contemplado o consorciado ou decorrido o prazo de 60 dias do encerramento do grupo, não efetuar a restituição.

Ausentes essas situações, não há que se falar em mora e, menos ainda, em juros moratórios.

Nesse sentido decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

“APELAÇÃO CÍVEL. CONSÓRCIO DE BEM IMÓVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PAGAS. PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO AFASTADA. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS. CABIMENTO. RESTITUIÇÃO ATÉ 30 DIAS DA DATA PREVISTA PARA ENCERRAMENTO DO PLANO. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N. 1.119.300-RS. DEDUÇÃO DE TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. PEDIDO NÃO CONHECIDO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. CORREÇÃO MONETÁRIA MANTIDA CONFORME SENTENÇA.

I-A restituição de parcelas adimplidas pelo consorciado excluído dar-se-á, em tese, nos termos do REsp. 1.119.300-RS, ou seja, em trinta dias a contas do prazo previsto para o encerramento do plano.

II- A correção monetária – que objetiva unicamente a recomposição da moeda frente a inflação do período – deve ser aplicada a contar da data de casa desembolso sob pena de enriquecimento sem causa da administradora de consórcios. No caso concreto, mantida a decisão que determinou a correção pelo IGP-M.

III- Os juros de mora devem ser contados do trigésimo primeiro dia do encerramento, momento em que restará configurada a mora. (grifamos)

TJRS, Apelação Cível 70041323379, Relatora Liége Puricelli Pires

Também o Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

“APELAÇÃO. RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA OU EXCLUSÃO DO CONSORCIADO. RESTITUIÇÃO 30 DIAS APÓS O ENCERRAMENTO DO GRUPO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DESCONTO DO SEGURO. VALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCTÍCIOS. PARÂMETRO PARA FIXAÇÃO. – Rescindo o contrato de CONSÓRCIO pela desistência ou exclusão do consorciado, deve lhe ser restituído o montante que pagou em até trinta dias após o encerramento do grupo. – Os juros de mora incidem desde quando se esgota o prazo para a administradora proceder ao reembolso, isto é, a partir do 31º dia posterior ao fim do grupo. – O pedido para que não seja descontado o valor atinente ao seguro da quantia a ser devolvida pela administradora do CONSÓRCIO não prospera, tendo em vista que o desistente desfrutou da cobertura correspondente enquanto esteve consorciado. – Para a fixação da verba honorária deve-se levar em consideração a proporcionalidade do quantum a ser arbitrado com o grau de zelo do profissional, o local da prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço (art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC). (grifamos)

Apelação cível nº 1.0701.09.277923-3/001, relatora Cláudia Maia.

5.4. CORREÇÃO MONETÁRIA

Como é sabido, a correção monetária não constitui parcela que se agrega ao principal, mas trata-se simplesmente de recomposição do valor e poder aquisitivo do mesmo, ou seja, trata-se de nova expressão numérica do valor monetário aviltado pela inflação. Quem recebe com correção monetária não recebe um “plus”, mas apenas o que lhe é devido, em forma atualizada.

Diante da conceituação acima, facilmente entenderemos que a expressão “correção monetária” é gênero, do qual os diversos índices inflacionários (IGPM, IGP, INCC, CUB, TR, etc) são espécies.

Tanto assim que os contratantes, livremente, podem, em todas as relações (comerciais, locatícias etc), definir a forma de correção monetária (qual o índice a ser utilizado naquele contrato por ocasião da atualização do valor). “Assim como os juros, a correção monetária, quanto à sua origem, pode ser convencional ou legal. Será convencional na hipótese de acordo de vontade entre as partes que, no instrumento de constituição da obrigação, estipulam sua incidência”.[20]

Isso não significa dizer que com a estipulação de determinado índice, se no momento da atualização, representar valor inferior ou superior a outro, possa caracterizar enriquecimento ilícito de uma ou outra parte.

A situação não é diferente nos contratos de consórcios, onde as partes (administradora e consorciados), até por força da própria sistemática do consórcio e da legislação imposta, se submetem, para atualização dos valores das parcelas mensais (portanto, espécie de correção monetária), aos valores dos bens objetos dos planos consorciais pactuados, vale dizer, mensalmente, recolhe o consorciado determinado percentual aplicado sobre o valor do bem objeto do contrato, sendo que, todas as vezes que aquele bem tiver seu valor alterado, modificada também será sua parcela mensal.

Notável, cristalino que a moeda do consórcio, para fins de atualização, de recomposição dos valores, é o valor do bem objeto do contrato.

Razão não há, portanto, para se aplicar, em determinado momento, outro fator de atualização. Ora, se aquele consorciado adimplente, para pagar sua parcela mensal se utiliza do valor do bem; se até mesmo aquele consorciado já contemplado que venha se tornar inadimplente, para restabelecer sua condição, efetuará seus pagamentos também considerando o valor do bem (jamais outra espécie de correção monetária), não há razão para aplicar ao desistente/excluído a correção por outra moeda, sob pena até de enriquecimento ilícito.

Tanto assim é que o legislador, ao prever a forma de restituição ao consorciado excluído (art. 30 da Lei 11.795/08), diz claramente que o mesmo terá direito à restituição da importância paga ao fundo comum do grupo, cujo valor deve ser calculado com base no percentual do valor do bem ou serviço vigente na data da assembleia de contemplação (portanto correção monetária). E nem poderia ser diferente, sob pena de desequilíbrio financeiro do grupo (o grupo não pode receber de uma forma e devolver por outra).

Sobre o assunto, o Tribunal de Justiça de São Paulo já se pronunciou:

“Consórcio – Contrato firmado após a vigência da Lei 11.795/08 – Restituição das parcelas – Correção monetária.

1.Em caso de desistência nos contratos de consórcio celebrados após a vigência da Lei 11.795/2008, a restituição das parcelas pagas deve ocorrer na oportunidade da contemplação da cota do consorciado excluído ou em até sessenta dias do encerramento do grupo, caso não seja sorteada a sua cota.

2.Na oportunidade da restituição, as parcelas deverão ser corrigidas monetariamente com base no percentual amortizado do valor do bem vigente à data da restituição. Inteligência do artigo 30 da Lei 11.795/08. (grifamos)

Não é possível a aplicação de redutor que resulte a perda total da quantia paga pelo consorciado desistente.

Ação parcialmente procedente. Recurso parcialmente provido”.

TJSP, Apelação nº 0039664-10.2010.8.26.0577, rel. Itamar Gaino, j. 23 de novembro de 2011

5.5. SEGURO

A Circular BC nº 3432, de 03 de fevereiro de 2009, que dispõe sobre a constituição e funcionamento de grupos de consórcios, editada com base na Lei nº 11.795/2008, autoriza a contratação de seguro (art. 5º, inciso VII, letra “a”).

Afasta-se, portanto e desde logo, qualquer alegação de ilegalidade em tal contratação.

E o seguro visa a proteção ao grupo de consorciados, lembrando que o prêmio recolhido mensalmente (seguro prestamista) pelo consorciado é imediatamente repassado à seguradora contratada (prêmio), para garantia da devida indenização em caso de ocorrência de sinistro.

Logo, em todos os meses que pagou a parcela do seguro, está o consorciado se beneficiando, pois tem garantida a cobertura em caso de eventual sinistro. Quando esse consorciado desiste ou é excluído por falta de pagamento das parcelas mensais do consórcio, obviamente não fará jus à restituição dos valores pagos a título de seguro, pois, como dito acima, tais valores foram recolhidos à seguradora como prêmios, em seu benefício.

Igualmente nesse sentido já houve manifestação dos tribunais:

“CONSÓRCIO - Desistência - Pedido de devolução - Necessidade de se aguardar o prazo estabelecido no contrato - Valor a ser devolvido corrigido, com a exclusão da taxa de administração paga e do valor relativo ao prêmio de seguro - Recurso provido em parte.(T.J.S.P., 17º Câmara de Direito Privado, Apelação n.º 991.04.087576-0, julgado em 19/05/2010, Relator Paulo Pastore Filho, acórdão registrado sob o n.º03025654)”

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Sobre o autor
Alberto Branco Júnior

Pós-Graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Paulista de Direito – EPD Pós-Graduado em Direito Contratual pela Escola Paulista de Direito – EPD Advogado especializado em Consórcio

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRANCO JÚNIOR, Alberto. Consórcio: as regras de devolução de valores e a posição dos tribunais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4465, 22 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33452. Acesso em: 19 abr. 2024.

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