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Aspectos e estruturação do Imposto sobre Serviços

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VIII – FATO GERADOR

Em relação ao fato gerador da respectiva obrigação tributária, dispõe a legislação maior:

"Art. 156. Compete aos Municípios instituir imposto sobre:

(...)

IV – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, I, "b", definidos em Lei Complementar." (Constituição Federal, de 1988)

"Art. 8º. O imposto, de competência dos Municípios sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviços constante da lista anexa." (Decreto Lei nº 406, de 1968)

Assim, a causa jurídica que dá lugar á incidência do ISS é a seguinte situação de fato: prestação de serviços definidos em Lei Complementar.

Prestação de serviços, já vimos, é a transferência onerosa, por parte de uma pessoa (empresa ou profissional autônomo) à outra, de um bem imaterial. Traduz-se pela venda de bens imateriais, de bens incorpóreos que se acham no circuito econômico produção–circulação.

Tal prestação de serviços abrange tanto o fornecimento de trabalho como a locação de bens móveis, a locação de espaço em bens imóveis com determinado objetivo e a cessão de direitos. O fato de haver fornecimento de materiais não desnatura a espécie de circulação e, em conseqüência, o respectivo fato gerador.

A expressão definida em Lei Complementar, contida na Constituição (art. 156, inciso IV) esclarece que o instrumento legislativo compete para definir os serviços alcançados pelo ISS é exclusivamente a Lei Complementar. A Lei Complementar, instrumento jurídico de hierarquia intermediaria entre a Constituição e a Lei Ordinária, terá a função de integrar a eficácia da norma constitucional. Na elaboração da Lei Complementar, já salientou IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, "a União empresta apenas seu aparelho legislativo como o faz para a elaboração das Emendas á Constituição" (27, pg. 111). Somente mediante Lei Complementar é que se pode definir os serviços tributáveis, ficando os Municípios na dependência de tal escolha, para que, posteriormente, legislem sobre a matéria. "A lei municipal não poderá fazer incidir o imposto sobre serviço não especificado" por Lei Complementar, diz CARLOS MEDEIROS SILVA (28, pg. 44). No lembrar de RUY BARBOSA NOGUEIRA, "a União resolveu estabelecer o critério de que os serviços tributáveis pelos municípios seriam os constantes de uma lista que elaborou" (29, pg. 96), No dizer de IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, a Lei Complementar "explicita quais os serviços atribuídos á competência de tributar" (27, pg. 111). Em verdade, a competência tributária dos Municípios, em relação ao ISS, é complementada pela lista de serviços baixada pela Lei Complementar. Dinamarca (Lei nº 102, de 31 de março de 1967) e Bélgica (Lei de 03 de julho de 1969), da mesma forma, oneram apenas os serviços incluídos em uma listagem.

A lista de serviços, baixada por Lei Complementar, portanto, é taxativa ou exaustiva, sendo vedado aos Municípios ampliar as atividades indicadas pela lei hierarquicamente superior á lei ordinária Municipal. Serviços tributados pelo ISS são somente os constantes da lista de serviços. Esta, de fato, contém o rol integral dos serviços alcançados pelo ISS. Dispõe o Decreto-lei nº 406, de 1968, que o ISS tem como fato gerador à prestação "de serviços constante na lista "anexa" (art. 8º). No regime constitucional tributário atual, se o serviço não vier previsto em Lei Complementar, jamais ele poderá servir de hipótese de incidência do ISS, por impedimento constitucional.

Inúmeros tratadistas da matéria já atestaram ser a lista de serviços, ditada pelo Legislador complementar, uma lista taxativa, exaustiva ou limitativa. A lista, diz CARLOS MEDEIROS SILVA, "é exaustiva e não meramente exemplificada" (28, pg. 44). Da mesma forma afirmam DAGOBERTO LIBERATO CANTINZANO (30, pg. 181), ZOLA FLORENZANO (31, pg. 112), MANUEL LOURENÇO DOS SANTOS (32, pg. 262), ALIOMAR BALEEIRO (33, pg. 297), BERNARDO RIBEIRO DE MORAES (34, pg. 453), RUY BARBOSA NOGUEIRA (29, pg. 96), RUBENS GOMES DE SOUZA (35, pg. 362), JOSÉ AFONSO DA SILVA (36, pg. 147), ARNOLDO WALD (37, pg. 57), FÁBIO FANUCCHI (38, pg. 130), GONÇALVES DE OLIVEIRA (39, pg. 353), A.A. CONTREIRAS DE CARVALHO (40, pg. 402), MARILENE TALARICO MARTINS RODRIGUES (44, pg. 43), além outros.

A jurisprudência dos Tribunais, conforme não poderia deixar de ser, também considera taxativa a lista de serviços. Esta é taxativa, "embora cada item da relação comporte interpretação ampla e analógica" (STF, RE nº 75.952-SP, Ac. de 25.10.73, 2ª Turma, relator Ministro THOMPSON FLORES, RTJ 68/198; no mesmo sentido: STF, RE nº 69780, RDA 105/109; STF, RE nº 81.621-SP, Ac. de 30/03/76, 2ª Turma, relator Ministro LEITÃO DE ABREU, RTJ 78/928; STF, RE nº 84.597-SP, Ac. de 17/08/76, 2ª Turma, relator Ministro CORDEIRO GUERRA, RTJ 79/1008). Embora taxativa, exaustiva, a lista de serviços permite o exame da compreensão das palavras nela inseridas. Segundo decisão do TACSP, quando se afirma que tal lista é taxativa, a obstar interpretação ampliativas ou analógicas, "não se esta, obviamente, a dizer que os serviços nela referidos sejam, exclusivamente, os que tenham tal nomenclatura, compreendendo ao revés, todos os que nele sejam espécies" (TACSP, Ac. de 21/02/78, Apelação nº 242.251-Santos, 1ª Câmara, relator Juiz CARLOS ORTIZ, RT 513/164). Na Apelação nº 247.500-Santos, assim entendeu a 1ª Câmara ao examinar a atividade de "desinsetização", espécie do gênero "higienização":

"A idéia de uma atividade (espécie) estar contida na outra (gênero) não representa, de forma alguma, interpretação extensiva ou analógica. Porque, na verdade, muito mais do que a denominação impede pesquisar objetivamente a natureza dos serviços prestados. A entender de outra forma, bastante ao contribuinte adotar em sua atividade uma denominação não expressamente indicada na lista, e ficaria imune ao tributo. Bem por isso, adverte Aliomar Baleeiro ("Direito Tributário Brasileiro ", pág. 270, 8ª ed.): "Decreto, o artigo 97, do Código Tributário Nacional, não tolera analogia para definição do fato gerador. Não se pode incluir na lista categoria que nela inexiste. Mas o que existe pode ser interpretado amplamente. Não deixa de ser taxativa a lista se a interpretação, por exemplo, incluir o solicitado ao lado do provisionado ou o parecerista ao lado do advogado (item n. 5), o agente de propriedade autoral científica ao lado do que agência e propriedade literária ou artística; a sauna ao lado da ducha (item 26); análise científica a par da análise técnica (item 33); figurinistas ao lado de modistas (item 45); encadernação de manuscrito, documentos, mapas e jornais ao lado de encadernação de livros e revistas do item 60, etc." (TACSP, Apelação nº 247.500-Santos, Ac. de 19.09.78, Primeira Câmara, Relator Nelson Altemari, in JTACSP, Lex., vol. 58, pág. 29)."

Portanto, a lista de serviços, a que se refere à Constituição (art. 156, inciso IV) e o Decreto-lei nº 406, de 1968, é taxativa. O Município não pode fazer incidir o ISS sobre serviços não constantes da lista.

Todavia, esclarece-se, mesmo que um determinado serviço não conste da lista a que se refere a Constituição (art. 156, inciso IV), ainda assim permanece dentro da competência tributária do Município, salientando-se que, tal serviço não definido na lista apenas não é alcançado pelo ISS, por estar fora do alcance do poder fiscal tributário Municipal.

Assim, nesta parte, já podemos concluir:

A) Em razão do OBJETO DO IMPOSTO, a Lei Complementar pode arrolar, como serviço, qualquer bem imaterial, respeitada a discriminação constitucional de rendas tributárias. Pode colocar, na lista, fornecimento de trabalho, locação de bens móveis, locação de espaços em imóveis com determinado objeto, e até cessões de direitos. O imposto é SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA, sendo vedado, ao Legislador complementar, colocar sob a incidência do ISS, serviços que estão compreendidos na competência tributária dos Estados-Membros ("não compreendidos no art. 155, inciso I, ‘b’", dispõe a Constituição, art. 156, inciso IV).

Destaca-se, e aqui começa, em parte, a remissão anterior citada por nós, que, hoje, o poder para imposição fiscal do ISS deferida aos Municípios, NÃO É MAIS RESIDUAL, como vigia sob a égide da Constituição Federal, de 1967/69. O art. 24, inciso II, da Carta Política revogada, tinha disposição diversa ("não compreendidos na competência tributária da União ou dos Estados"); e, a Carta Magna vigente, em seu art. 156, inciso IV, remete-se única e exclusivamente o art. 155, inciso I, "b", que são os serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, de competência tributária dos Estados e do Distrito Federal.

Exata é a mais significante modificação introduzida na sistemática e no poder fiscal tributário para instituir o ISS, conferido aos Municípios. Entendemos que, com a Constituição Federal, de 1988, ao discriminar o poder fiscal dos Estados e do Distrito Federal, para instituir Imposto Sobre Serviços, APENAS E TÃO SOMENTE de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, exclui a competência destes, o poder fiscal para instituir o ICMS sobre quaisquer outros serviços, restringindo-o e limitando-o à instituição daqueles discriminados no art. 155, I, "b"; e, "a contrario sensu", ampliou o poder fiscal dos Municípios para instituir o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, para alcançar aqueles de que gênero ou espécie forem, exceto os supra citados, de competência daqueles outros entes políticos.

Assim, no novo Sistema Tributário Nacional, os Estados e o Distrito Federal, em relação ao poder fiscal para instituir o Imposto Sobre Serviços, estes ficaram restritos ao serviços de transporte interestadual e intermunicipal e aos serviços de comunicação; aos Municípios restou ampliado o poder fiscal para instituir imposto sobre qualquer serviço e de qualquer natureza que seja, com exceção dos direitos citados; à União, é para quem coube a competência residual do poder fiscal para instituir imposto sobre serviços, mas somente em caso extremo de "iminência ou no caso de guerra externa", tal como previsto no art. 154, inciso II.

Por estes motivos, toda a doutrina, a jurisprudência e a legislação que dispunha sobre a competência dos Municípios para instituir o ISS, no sentido de conferir-lhes natureza residual, em face do Texto constitucional anterior, com a edição da Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988, principalmente diante da redação do art. 156, IV, entendemos estar desatualizada, inaplicável e revogada, respectivamente.

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Concluindo, em resumo, entendemos que houve uma grande modificação na estrutura do ISS, com a nova redação dada pelo art. 156, IV, da Constituição Federal de 1988, porque, antes o ISS dos Municípios era tributo que não incidia sobre serviços de competência da União e dos Estados; e, agora a União não mais pode tributar serviços, a não ser em caráter residual, e os Estados e o Distrito Federal não podem tributar serviços que não os discriminados sob sua competência, ou seja, aqueles do art. 155, I, "b", e mais nenhum.

B) Em razão do direito positivo, somente os serviços arrolados na lista aprovada por Lei Complementar são tributáveis. O Município, em relação aos serviços não incluídos na lista da Lei Complementar, não recebe o poder fiscal para tributa-los (é o caso de inincidência, por falta de previsão legal complementar). Na lição de ALIOMAR BALEEIRO, tributáveis serão tão somente os serviços mencionados na lista, "embora cada item dessa lista comporte interpretação ampla e analógica" (33, 10ª ed., pg. 297). Os serviços que o Legislador ordinário pode escolher, para integrar a hipótese de incidência do imposto, não está na Constituição, mas, sim na Lei Complementar. Está, na sua incumbência de integrar a norma constitucional, definir os serviços incluídos dentro do poder fiscal tributário dos Municípios, e não poderá se afastar dos contornos constitucionais. Por outro lado na constituição do crédito tributário, a autoridade administrativa não pode deixar de determinar a matéria tributável com a necessária clareza e individualização, esclarecendo, não somente o fato de que a pessoa presta serviço, mas, também, é preciso que o lançamento indique qual o tipo de serviço prestado e "qual o dispositivo legal que justifica a incidência " (TJMG, Ac. de 29/04/ 69, Ag. Pet., n¢ 10.976-BH, relator Des. JACOMINO INACORATO, RDA 99/79). O ISS não pYde incidir, por não constarem da lista de serviços definidos em LDi Complementar, sobre os serviços de: tatuador, bibliotecário, escafanärIsta, aplicação de injeção (STF, RE nº 82.961-RJ, Ac. de 25/11/75, 2ª Turma, relator Min. THOMPSON FLORES, DOU |e 20/02/76, pg. 1087), coleta de lixo (STF, RE nº 76.272-SP, Ac. de 17/05/73, 1ª Turma, relator Min. OSWALDO TRIGUEIRO, RTJ 65/884; 1º TACSP, Ap. nº 383.622, A>. de 13/04/88, 5ª Câmara, relatwr Juiz MAURÍCIO VIDIGAL, RT 632/140) det8tive particular, depósitos bancários (STF, RE nº 71.177-SP, Ac. de 18+04/74, Tribunal Pleno, relator Min. RODR‡GUES ALCKIMIN, RTJ 70/121), e muitos outros (est jurhsprudência é anterior a Lei Complementar nº 56, de 15/52/87).

C) Mister se faz a existência de lei ordinária Municipal para criar a respectiva obrigação tributária. Lei ComplÖmentar apenas@define a área do poder tributário0dos Municípios, deixandoUpara a lei ordinária do Poder Tributante a criação do tributo, como afirma MARILENE T. MARTINS RODRIGUES (44, pg. 37).

D) Prestar serviços é executar, de forma habitual e contrapVestacional, a venda oneros de qualquer serviços, realizada a título oneroso, com ou sem 4 fOrnecimento de material, pouco importando a designação dada ao contrat$. Para a incidência do ISS, "basta a transferência do bem imaterial (serviços), a título oneroso, de uma pessoa para outra", na forma definida por MARILENE T. MARTINS RODRIGUES (44, pg. 45).

Quanto ao enquadramento da atividade na lista de serviços, afirma o Ministro OSWALDO TRIGUEIRO, como relator do RE nº 76.272-SP:

"decidir se determinÏdo serviço é bu não tributável, em cace da Lei Complementar, diz òespeito a interpretação e aplicação desta lei, sem possibilidade de ofensa à regèade competência inserta naquele preceãto constitucional." (RE nº 76.272-SP, Ac. de 17/05/82, 1ª Turya, rel. Ministro OSWALDO TRIGUEIRO, RTR 65/886)

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Sobre o autor
Carlos Henrique de Mattos Franco

advogado tributarista em São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRANCO, Carlos Henrique Mattos. Aspectos e estruturação do Imposto sobre Serviços. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3400. Acesso em: 29 mar. 2024.

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