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As competências administrativas ambientais:

comparação entre a proposta do Executivo sobre a cooperação entre os entes federativos (PLP 388/2007) e a LC 140/2011

23/10/2015 às 15:21
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A LC 140/2011 parece indicar que há uma relativa vinculação entre a competência de licenciar e a competência de fiscalizar.

A leitura comparativa entre a proposta do Poder Executivo sobre a cooperação entre os entes federados em matéria ambiental (PLP 388/2007) e a Lei Complementar nº 140/2011 permite sejam apontadas algumas diferenças.

Em primeiro lugar, observa-se que o PLP 388/2007 previa expressamente a possibilidade de atuação subsidiária dos entes federativos em seu artigo 3º, parágrafo único e artigo 13. Com efeito, o parágrafo único do art. 3º da mencionada proposição legislativa previa o seguinte: “O disposto no caput não afasta a atuação subsidiária dos demais entes federativos, de acordo com o disposto nesta Lei Complementar.”

Por sua vez, o art. 13 continha a seguinte redação: “Nos casos de iminência ou ocorrência de dano ambiental o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá agir para evitar ou cessá-lo. Parágrafo único. O ente que atuou para evitar ou cessar o dano ambiental comunicará imediatamente o ente federativo responsável, para as providências devidas.”

Ressalte-se que essa atuação subsidiária dos entes federativos referia-se tanto à questão do licenciamento ambiental quanto à questão do poder de fiscalização, não havendo atrelamento entre as atividades de fiscalização e licenciamento.

No entanto, a LC 140/2011 reformulou o conceito de atuação subsidiária, passando a defini-la como “ação do ente da Federação que visa a auxiliar no desempenho das atribuições decorrentes das competências comuns, quando solicitado pelo ente federativo originariamente detentor das atribuições definidas nesta Lei Complementar” (art. 2o, inciso III, LC 140/2011).

Além disso, estabeleceu que essa ação administrativa subsidiária dar-se-ia “por meio de apoio técnico, científico, administrativo ou financeiro, sem prejuízo de outras formas de cooperação” e desde que solicitada “pelo ente originariamente detentor da atribuição nos termos desta Lei Complementar” (art. 16, caput e parágrafo único, da LC 140/2011).

No que se refere à competência para o licenciamento ambiental, a LC 140/2007 revogou expressamente os arts. 10 e 11 da Lei n. 6.938/81, pondo aparente fim à atuação supletiva do IBAMA nos casos de licenciamento ambiental, concentrado essa competência nos Estados, encampando, assim, a tese do único ente licenciador em seu art. 13.

Por seu turno, o PLP 388/2007 mantinha intactos os arts. 10 e 11 da Lei n. 6.938/81 e preservava essa competência subsidiária no parágrafo único de seu art. 3º, conforme já mencionado acima.

Além disso, o PLP 388/2007 valia-se do critério da magnitude do impacto ambiental para fins de atribuição das competências para o licenciamento ambiental (art. 6º, XV, a; art. 7º, XIV, a e art. 8º, XIV, a), ao passo que a LC 140/2011, além de revogar o § 4º, do art. 10, da Lei nº 6.938/81, que dispunha sobre a competência da União, por meio do IBAMA, para licenciar empreendimentos em razão da magnitude do impacto ambiental, nacional ou regional, limitou a competência da União à localização do empreendimento e não ao âmbito do impacto ambiental (veja o inciso XIV, do art. 7º, da LC nº 140/2011, principalmente a alínea “e”).

No que se refere à competência para fiscalizar, observa-se que a LC 140/2011 procurou estabelecer uma relativa vinculação entre a competência para licenciar e a competência para fiscalizar, pois o art. 17 da referida LC conferiu ao órgão licenciador uma certa prevalência para o consequente exercício do poder de polícia ambiental, caso ocorra um ilícito administrativo-ambiental. O PLP 388/2007, por sua vez, não fazia qualquer vinculação entre as atividades de fiscalização e licenciamento, conforme já mencionado acima e tampouco estabelecia qualquer prioridade ao órgão licenciador.

Pode-se dizer que, no modelo anterior à Lei Complementar n. 140/2011, não havia qualquer vinculação entre a competência de licenciar e fiscalizar, tendo o Superior Tribunal de Justiça firmado posição de que, em havendo risco ambiental, mesmo que o ente autônomo não seja o competente para licenciar, deverá agir na atividade de fiscalização (CIRNE, 2013, p. 15).

Da mesma forma, o Supremo Tribunal Federal, nos autos da STA n. 286/STF, concordou que fiscalização e licenciamento são temas diversos e reconheceu não só a possibilidade de quem não é competente para licenciar atuar na qualidade de fiscalizador, mas também asseverou que tal ato é um dever do IBAMA.

No entanto, as inovações trazidas pela LC 140/2011 parecem indicar que no modelo atualmente vigente há uma relativa vinculação entre a competência de licenciar e a competência de fiscalizar, pois o art. 17 da referida Lei Complementar conferiu uma certa prioridade ao órgão licenciador para o consequente exercício do poder de polícia ambiental, caso ocorra um ilícito administrativo-ambiental, conforme já mencionado acima. E essa vinculação é relativa porque ainda continua sendo possível que os órgãos ambientais das esferas que não licenciaram o empreendimento exerçam o seu poder de polícia ambiental, pois se trata de competência comum material.

Com efeito, o disposto no § 3º do art. 17 permite inferir que não há exclusividade do órgão com competência para licenciar determinada obra ou atividade a competência para fiscalizá-la.

A Orientação Jurídica Normativa n. 49/2013/PFE/IBAMA faz uma distinção entre competência para a fiscalização de empreendimentos licenciados e o poder de polícia ambiental geral, vislumbrando diferentes situações concretas e pressupondo ser a atividade passível de fiscalização: “(I) foi licenciada ou autorizada por órgão ambiental; (II) é sujeita em tese a licenciamento ou autorização, mas não está sendo praticada de forma regular; ou (III) outras infrações que não estejam atreladas a processo de licenciamento ou autorização” (IBAMA, 2013).

A leitura da Orientação Jurídica Normativa n. 49/2013/PFE/IBAMA permite concluir que o poder de polícia ambiental geral incide nas três hipóteses acima descritas, apenas com a ressalva de que, na primeira hipótese, havendo atuação dúplice dos entes federados, prevalecerá a auto de infração lavrado pelo órgão licenciador competente, ainda que esse não seja o primeiro. Tal fiscalização pode ocorrer em atividade sujeitas ou não a licenciamento ou autorização e em momento anterior, concomitante ou posterior à emissão da licença.

Da análise conjunta dessas duas proposições normativas, infere-se que um dos objetivos da reforma legislativa era reduzir a competência da União, saindo de uma federalização em direção a uma estadualização da questão ambiental.

Depreende-se, também, que um dos pontos almejados pelo legislador ordinário seria a exclusão da atuação subsidiária de um ente federado sobre o outro e isso é bastante evidente no que se refere à competência da União para os licenciamentos e para fiscalizar as infrações ao meio ambiente. Essa exclusão teria por objetivo evitar a sobreposição de atuação entre os estes federados.

Nada obstante a tentativa da LC 140/2011 de suprimir da legislação ambiental a atuação subsidiária dos entes federados, a pretexto de se evitar a sobreposição de atuação dos entes federados e, consequentemente, a ocorrência de conflitos de atribuições, o certo é que as disposições da referida lei complementar devem ser lidas em conformidade com os arts. 18, caput; 23, caput, III, VI e VII; e 225, caput e seus parágrafos, todos da Constituição Federal.

Assim, as disposições da LC 140/2011 não comportam interpretações que levem à anulação da autonomia dos entes federados prevista no art. 18, caput, da CF/88 e tampouco que levem à transformação da competência comum prevista no art. 23, caput, da Constituição Federal em competência privativa, única ou especializada e muito menos que desconsiderem os princípios fundamentais do Direito Ambiental, insculpidos no art. 225 da Constituição Federal.

Nesse sentido, o licenciamento obrigatório por um único ente federado, previsto no art. 13 da LC 140/2011, não pode ser visto como um dogma, pois, como ensina Paulo Affonso Leme de Machado (2012, p. 80), “o exame conjunto, não apenas opinativo, mas vinculante por diversos entes federados pode propiciar o aporte de um maior e melhor conhecimento sobre o empreendimento a ser licenciado ou autorizado e a utilização de tecnologias não degradadoras do meio ambiente.” e isto está em consonância com o compartilhamento de competências entre os entes federados exigido pelo art. 23, caput, da CF/88.

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Da mesma forma, o art. 17, caput, e seus parágrafos, somente são compatíveis com o texto constitucional se forem interpretados de modo a não excluir a competência fiscalizatória dos demais entes federados (poder de polícia ambiental geral), nos casos de omissão ou desconhecimento do órgão competente para licenciar ou, ainda, nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da qualidade ambiental (medidas cautelares). E isto porque o ordenamento constitucional brasileiro rege-se pelos princípios da subsidiariedade e da proibição de proteção deficiente.

Desse modo, todas as disposições da LC 140/2011, sobretudo as relativas a licenciamento ambiental e poder fiscalizatório, para serem válidas, devem ser interpretadas à luz texto constitucional, especialmente em consonância com os princípios fundamentais previstos no art. 225 e com os conceitos de competência comum e autonomia, previstos, respectivamente, no art. 23 e art. 18, da Constitucional Federal


REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei Complementar nº 140. Presidência da República. Casa Civil da Presidência da República, Brasília, DF, 8 de dezembro de 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp140.htm>. Acesso em: 6 nov. 2012.

________. Lei nº 6.938. Casa Civil da Presidência da República, Brasília, DF, 31 de agosto de 1981. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm>. Acesso em: 06 jan. 2013.

CIRNE, Mariana BarbosaTexto-base 2: As competências administrativas ambientais e Lei Complementar n. 140/20211. Brasília - DF: CEAD/UnB, 2013. (Pós-graduação lato sensu em Direito Público). Disponível em: < http://moodle.cead.unb.br/agu/course/view.php?id=9>. Acesso em: 03 out. 2013.

IBAMA. “ORIENTAÇÃO JURÍDICA NORMATIVA Nº 49/2013/PFE/IBAMA” AGU, 22 de maio de 2013. Disponível em: <http://www.agu.gov.br/sistemas/site/TemplateTexto.aspx?idConteudo=96663&id_site=1514>. Acesso em: 26 jun. 2014.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Legislação Federal (Lei n. 12.651/2012) e Competência e Licenciamento Ambiental (Lei Complementar 140/2011). São Paulo: Malheiros, 2012.

PODER EXECUTIVO. PLP 388/2007. Brasília, Distrito Federal, 24 jan. 2007.

SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIAPADA. STA: n. 286. 286. Supremo Tribunal Federal, Presidência, Ministros Cesar Peluso e Gilmar Mendes, Diário de Justiça, Brasília, DF, 10 fev. 2009.

- Sítios eletrônicos.

AGU. Disponível na URL: http://www.agu.gov.br/.

INCRA. Disponível na URL: http://www.incra.gov.br/portal/.

STJ. Disponível na URL: http://www.stj.jus.br/.

STF. Disponível na URL: http://www.stf.jus.br/.

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Sobre o autor
Jose Domingos Rodrigues Lopes

Graduado em Direito pela Universidade de Brasília - UnB. Pós-Graduado em Direito Público pela Universidade de Brasília - UnB. Procurador Federal (PGF/AGU) atuante no STJ e STF.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOPES, Jose Domingos Rodrigues. As competências administrativas ambientais:: comparação entre a proposta do Executivo sobre a cooperação entre os entes federativos (PLP 388/2007) e a LC 140/2011. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4496, 23 out. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35223. Acesso em: 21 nov. 2024.

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