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Guarda compartilhada

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01/11/2002 às 00:00
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6 CONSEQUÊNCIAS DA GUARDA COMPARTILHADA

6.1 Responsabilidade civil

Quando falamos em responsabilidade civil, primeiramente é necessário diferenciarmos a responsabilidade civil objetiva da subjetiva.

A responsabilidade civil subjetiva pressupõe a culpa. "Em não havendo a culpa, não há responsabilidade. Diz-se, pois, ser subjetiva a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável." 30

No que tange a responsabilidade objetiva, podemos dizer que é aquela que prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade.

Essa teoria, dita objetiva, ou do risco, tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independente da culpa. Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano. 31

Dessa forma, o CC vigente e o novo CC adotaram a responsabilidade civil subjetiva com regra e a objetiva como exceção, como se percebe nos art. 159 do CC vigente e 186 c/c o art. 927 do novo CC:

Art.159 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

Art.186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927 - Aquele que por ato ilícito(arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigá-lo a repará-lo.

O novo CC praticamente transcreveu o CC vigente, a única diferença foi a introdução do complemento: ainda que exclusivamente moral.

Após essa introdução, nos remetemos a responsabilidade civil dos menores, englobando tanto o menor impúbere quanto o púbere.

Para o menor púbere o CC vigente traz a sua regra no art. 156.

Portanto, o que o legislador quis foi caso o menor também tenha bens, poderá ser ele também responsável solidariamente com o pai ou sozinho. O novo CC não traz artigo semelhante a esse, mas diminui a maioridade para 18(dezoito) anos.

Com relação ao menor impúbere, o novo CC adotou posicionamento diferente do CC vigente.

Para o CC vigente a responsabilidade civil do menor impúbere é subjetiva, em que não havendo culpa não há motivo para indenizar com é demonstrado no art. 1521, inc. I c/c o art. 1523:

Art. 1521 – [...]

I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob seu poder e em sua companhia.

Art. 1523 – Excetuadas as do art. 1521, V, só serão responsáveis as pessoas enumeradas nesse e no art. 1.522, provando – se que elas concorreram para o dano por culpa, ou neglig6encia de sua parte.

Já, no novo CC, conforme transcreve o art. 932, inc. I c/c o art. 933, modifica o pensamento do CC vigente e qualifica a responsabilidade dos menores como objetiva, impondo-se a teoria do risco.

Art. 932 – [...]

I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia.

Art. 933 – As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

Na constância do casamento/união estável, quando falamos da responsabilidade civil dos filhos, estamos nos referindo a uma responsabilidade civil solidaria.

Quando ocorre a ruptura conjugal, e consequentemente o deferimento da guarda única( modelo de guarda que o magistrado sempre adota), cessa a solidariedade da responsabilidade civil dos pais, passando o encargo apenas para o cônjuge/companheiro que fica com a guarda do menor, seja ele impúbere ou púbere, lhe restando apenas atribuir todas as provas lícitas para se isentar da responsabilidade, como por exemplo a "inexistência de dependência material, não Ter cometido falta na educação ou vigilância do menor, além das causas gerais: força maior, caso fortuito, culpa do terceiro." 32

Portanto, na guarda única fica claro que o legislador incubiu o detentor da guarda pela responsabilidade civil, salvo suas excludentes.

Porém, caso a opção seja pela guarda compartilhada, seja ela somente jurídica ou jurídica/física, a ruptura conjugal não modificará a situação na constância da união; ou seja: continuará a responsabilidade solidaria de ambos os pais, uma vez que o quadro não se alterou e dessa forma não existe a figura da imediatidade e fiscalização.

6.2 Alimentos e visitas

No deferimento da guarda única, como ocorre normalmente, existe duas possibilidades: na primeira o não guardião tem direito de visita livre, o que costumeiramente acontece numa separação consensual, não ocorrendo desgaste entre o triângulo pai/mãe e filho, gerando consequentemente para o não guardião uma certa satisfação no pagamento da pensão alimentícia, uma vez que está sempre em contato com seu filho. A outra hipótese é do não guardião ter seu direito de visita restrito a finais de semana alternados, o que normalmente ocorre numa dissolução litigiosa, no qual o não guardião acaba se tornando um mero pagado de pensão alimentícia, destruindo gradativamente a relação com seu filho.

Com a opção do grupo que defende a guarda compartilhada jurídica, estará apenas ratificando a guarda única de uma ruptura conjugal consensual, uma vez que criança terá um lar fixo(referencial) mas o guardião de vez em quando permite que o menor fique um período no domicílio do não guardião, o que ajuda na satisfação do pagamento da pensão alimentícia, o que não consideramos ruim, pois os cônjuges ficam protegido pela lei, mas entendo ser muito pouco, uma vez que o principal prejudicado são aqueles casais em litígio.

A partir desse ponto que vejo a importância da guarda compartilhada jurídica/física, que como já foi mencionado após um processo de mediação familiar, talvez os cônjuges possam ter exposto sua amarguras, angustias e tristezas, conseguindo consequentemente separar a relação deles com a dos filhos.

Ao conseguirem essa separação de ideais, dependendo do arranjo não vai precisar de visitas como ocorre nos dois casos elencados no item 5.2, ou se o arranjo for um pouco mais longo poderá ter visitas.

O relevante que tanto na guarda compartilhada jurídica quanto na jurídica e física, a questão da pensão alimentícia não desaparece.

O art. 20 da Lei do Divorcio é bem claro: para a manutenção dos filhos, os cônjuges, separados judicialmente, contribuirão na proporção de seus recursos.

Esse artigo ilustra o binômio necessidade/possibilidade; ou seja; aquele que tem necessidade terá ajuda do outro cônjuge dentro das suas possibilidades, não importando qual modelo de guarda adotado.

Mesmo que seja no modelo da guarda compartilhada jurídica/física o cônjuge mais necessitado terá direito a ter do outro ajuda dentro das suas condições.

Alguns doutrinadores fazem a colocação de que alguns pais pedirão esse tipo de guarda somente para ter uma redução no "quantum" da pensão alimentícia. Porém, esse não é nosso entendimento, pois mesmo que se tenha uma pensão menor, quando o filho estiver em sua companhia, o alimentante terá um custo para mantê-lo sob sua custódia.

6.3 Mudança de domicilio

Um outro grande ponto de questionamento dos pais que não detém a guarda é do direito que o guardião tem de mudar de domicílio, e, principalmente para qualquer parte do território nacional, como se vê na decisão datada do ano de 1998, pela 5ª Turma do STJ:

Desde que a mãe diga para aonde vai, pode ela fixar novo domicilio, levando os filhos, em qualquer parte do território nacional (....). (HC 7.670-BA, rel. Min. Edson Vidigal).33

Tendo em vista a grande extensão do nosso território, isso é uma verdadeira aberração jurídica, uma vez que contraria o interesse do menor. Imaginem o gasto que teria o não detentor da guarda que mora por exemplo em Vitória-ES para se deslocar para o Acre por exemplo.

Com a opção da guarda compartilhada, tanto jurídica quanto jurídica e física, os guardiões serão ambos os cônjuges, não existindo mais esse privilégio, uma vez que para fazer isso um cônjuge terá que ter a permissão do outro, senão quebrará a igualdade de direitos e deveres que eles possuem.

6.4 Aspectos psicológicos

No atual estágio do direito de família, a questão da guarda de menores está sendo alvo de inúmeros debates. Dentre eles podemos destacar a guarda compartilhada.

Como se trata de um ramo do direito que lida diretamente com pessoas, e como sabemos que cada ser humano tem a sua singularidade, é necessário que junto com a analise jurídica esteja também uma analise de outros ramos de profissionais, como psicologia, psiquiatria e sociólogos, para que tenhamos uma menor possibilidade de cometermos equívocos.

Sob o prisma da analise psicológica da guarda compartilhada, torna-se necessário fazermos uma distinção da guarda compartilhada jurídica e da guarda compartilhada jurídica/física, ao qual estamos debatendo ao longo desse estudo.

A respeito da guarda compartilhada jurídica, como já foi dito trata-se do compartilhamento dos direitos-deveres sem a existência da imediatidade ou fiscalização, tendo sempre o menor um domicilio fixo( referencial)

Portanto, os defensores dessa corrente argumentam que sociologicamente a criança ou adolescente não poderia ter dois lares em virtude que isso lhe traria instabilidade, devendo o menor evitar grandes alterações em sua vida e rotina, permanecendo tudo o que não for imprescindível mudar.

Assim, o menor necessita contar com a estabilidade de um domicilio, um ponto de referência e um centro de apoio para as suas atividades no mundo exterior, enfim, de uma continuidade espacial(além da afetiva) e social, aonde finquem suas raízes físicas e sociais, com o qual ele sinta uma relação de interesse e onde desenvolva uma aprendizagem doméstica, diária, da vida.34

Com a relação da guarda compartilhada jurídica/física, além dos direitos e deveres, também serão decididos em conjunto o melhor arranjo para criança, ou seja, o menor também terá dois lares.

Dentre os principais defensores para que a criança tenha dois lares encontramos os psicólogos Lino de Macedo e Evandro Luis Silva.

Na opinião do Dr. Lino de Macedo:

A criança é extremamente flexível. Rapidamente ela assimila as diferenças entre a casa do pai e a da mãe. Mesmo quando as regras não são exatamente as mesmas, ela sabe o que pode e o que não pode, diz. O fato de ter duas casas, segundo ele, às vezes até ajuda a criança a concretizar a nova situação. Até os dez anos, a criança tem necessidade da expressão física dos acontecimentos. Ela tem dificuldade de elaborar internamente que o pai se separou da mãe, mas não dela, que, apesar de não morar na mesma casa, ainda a ama. Então, ter um lugar seu na casa e no dia-a-dia do pai concretiza esse amor, explica. 35

Outro defensor dessa corrente é o Dr. Evandro Luis Silva. Nos próximos parágrafos citaremos trechos de seu estudo intitulado "Dois lares é melhor do que um", estudo este que reforça a possibilidade da guarda jurídica/física.

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Pensar que a guarda deva ficar somente com um dos cônjuges, para que a criança não perca o referencial do lar, é um equívoco. O referencial a não ser perdido é o dos pais. A criança filha de pais separados vai adaptar-se à nova vida, criará o vínculo com duas casas. Permitir à criança o convívio com ambos os pais deixa-a segura, sem espaço para o medo do abandono. (...). [grifo é nosso]

Vimos que normalmente os argumentos em prol da guarda exclusiva da mãe giram em torno das dificuldades que a criança teria em adaptar-se a duas casas, e da necessidade de que ela tenha um referencial de lar. No entanto, não há qualquer fundamentação técnica para tais suposições. Uma única tentativa que vimos repetidas várias vezes em processos judicias ou teorias psicológicas a respeito do assunto, foi uma alusão de Françoise Dolto, com uma citação de seu livro "Quando os pais se separam". Nesse livro, a autora discorda com a guarda compartilhada estabelecida em dois casos, na França. Um, porque o pai morava no Norte daquele país e a mãe ao sul, A criança passaria meio ano letivo com cada progenitor. No segundo caso, o pai morava numa cidade e a mãe em outra, distantes, e a criança alternaria metade da semana com cada genitor. Em ambos os casos a criança teria dois colégios, e não criaria vínculos afetivos. [grifo é nosso]

(...); na guarda compartilhada, com alternância de casas, tais comportamentos não acontecem ou são muito reduzidos; as crianças têm condições internas para se adaptarem a duas casas, realizando uma adaptação rápida que não dá lugar a nenhum dano psíquico; por fim, acreditamos que uma separação que atenda às necessidades dos filhos - contato freqüente com ambos os pais - traria os seguintes benefícios:

* diminuição de estresse e maior produção (escola, trabalho, etc.);

* melhoria na qualidade de vida;

* menor custo num processo judicial. Com um saber estabelecido, evitar-se-ia uma quantidade grande de perícias e diminuir-se-ia a morosidade do processo;

* diminuição da gravidez na adolescência2 (nota referente aos restantes tópicos);

* diminuição do suicídio em crianças e adolescentes;

* diminuição do uso de drogas entre crianças e adolescentes;

* diminuição da evasão escolar;

* diminuição de problemas emocionais ou comportamentais;

* diminuição de prisões de menores. 36

O posicionamento do psicólogo vai mais adiante, acreditando que a guarda compartilhada com a alternância de casas só é possível quando os pais residem na mesma cidade.

Interrompendo rapidamente os comentários de seu estudo, para nos, esse posicionamento tem que ser ainda mais restrito, determinando que seja no mesmo Município ou até no mesmo bairro.

Nesse estudo, Evandro Luis Silva, procura também apontar que ao contrário que a maioria pensa, a criança tem capacidade desde muito cedo para se relacionar com o mundo externo.

Segundo Melanie Klein - psicanalista pioneira no tratamento de crianças e cujas teorias, juntamente com as de Freud, servem de base para todo um campo, o psicanalítico, na compreensão da mente e na análise -, a criança de um ano de idade já pode e deve afastar-se do lar, ter outras relações, freqüentar jardins de infância, criar outros vínculos. Já possui condições internas para isso. [grifo é nosso]

É possível e importante afastar-se da mãe, pois é assim que a criança consegue saber internamente que as situações boas e ruins desaparecem e voltam: pernoitar em outra casa, ficar todo o dia numa escolinha etc.37

Na mesma linha de raciocínio segue a psicanalista Arminda Aberastury, que faz o segunite comentário:

Já na Segunda metade do primeiro ano, a criança precisa explorar o mundo e, além disto, distanciar-se da mãe. Esse distanciamento é essencial para que a criança possa experimentar o estranho, desenvolver os seus mecanismos de defesas e enfrentar os conflitos inerentes às fases do desenvolvimento.

Segundo Freud, o movimento da criança para além do lar e em direção ao mundo exterior vai propiciar ao ego desenvolver meios adequados para fazer frente às ansiedades atinentes àquele momento e modificá-las.

Freud considera que a partir de um ano de idade as crianças começam a entender que as pessoas vão e voltam; que os pais saem para trabalhar e depois retornam; que elas vão à escola e depois voltam para casa etc. Tratam-se de situações essenciais para o bom desenvolvimento das crianças. Ou seja, vão-se adaptando diante das exigências do seu meio.

Por conseguinte, não podemos evitar as frustrações da criança, pois estas são inevitáveis e as ajudam a enfrentar os seus sentimentos, "porquanto a própria experiência de que a frustração é superável pode fortalecer o ego, e faz parte da atividade do pesar que serve de apoio à criança no seu esforço para eliminar a depressão.

Arminda Aberastury afirma a importância do fato de o bebê ou de a criança pequena ir se acostumando com as necessidades dos pais. "A vida de uma criança não pode anular a dos pais". Se os seus pais agora terão casas separadas, também os filhos, consequentemente, terão duas casas, pois não é por causa da separação que se deixou de ser pai ou mãe. Por ser inevitável que cada um tenha uma casa, temos de permitir que a criança se adapte a essa nova situação.

Assim vejo que se os pais estão em litígio, os problemas de obstrução de contato com o progenitor que não detém a guarda podem ficar explícitos para a criança, pois a própria palavra "visita" já é por si só restritiva, e o progenitor que detêm a guarda já será legalmente considerado "mais importante", já que é ele que tomará as decisões na vida da criança, tendo isso um peso simbólico considerável, podendo esta situação induzir a criança ao afastamento do outro. Logo, mesmo em litígio, a guarda compartilhada - em termos psicológicos, é a melhor solução para os filhos. Os filhos precisam conhecer individualmente cada um dos progenitores, independente da idéia que um progenitor faça do outro, ou seja, que a criança forme sua própria verdade na relação com seus pais. Os problemas que os litígios causariam, não modificariam com o tipo de guarda. E, para que a criança conheça intimamente seus pais, não basta algumas horas de visita, mas sim um contato íntimo, como passar a noite, ser levada aos compromissos, fazer as tarefas de aulas etc. 38

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Sobre o autor
Luiz Felipe Lyrio Peres

acadêmico de Direito do Centro Universitário do Espírito Santo (UNESC)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PERES, Luiz Felipe Lyrio. Guarda compartilhada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3533. Acesso em: 23 dez. 2024.

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