Estabelecimento comercial

11/01/2015 às 11:55
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Conceito de estabelecimento comercial, sua natureza, surgimento e evolução no direito brasileiro.

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo conceituar estabelecimento comercial, também conhecido como fundo de comércio, apontando aspectos relevantes como sua natureza, surgimento e evolução no direito brasileiro. Procurará de forma breve, analisar as regras pertinentes à alienação e responsabilidade do alienante e adquirente. O trabalho procurará também conceituar o que vem a ser os elementos do estabelecimento comercial, enfatizando um Bem incorpóreo relevante: o ponto comercial e sua proteção jurídica.

2. SURGIMENTO E EVOLUÇÃO DA NOÇÃO DE FUNDO DE COMÉRCIO NO DIREITO BRASILEIRO

Não é razoável pensar em uma atividade organizada de mercancia, sem pensar em um estabelecimento que apresente e acondicione produtos para servir de referência para o destino de uma clientela. Mesmo sem a organização facilmente identificada nos dias atuais, é provável que um minimo de organização com instrumentos que auxiliassem os mercadores era quase que obrigatório para que o comércio funcionasse.

Os romanos no século XIV já se referiam à taberna como o local onde se desenvolviam as atividades mercantis. Da mesma forma, os comerciantes italianos medievais, referiam-se a estabelecimentos como mensa, taberna, mercatura, funcandum, merx, qualificando-os como um corpus universalis. (BULGARELLI, 1980, p. 50).

Foi no séc. XIX, na França, que surgiu o fundo de comércio como categoria jurídica moderna, por meio do dispositivo da lei fiscal, que passou a onerar as transferências de propriedade do fundo de comércio ou de clientela.  A primeira vez que se mencionou sobre fundo de comércio como norma legislativa ocorreu na lei francesa de 28 de fevereiro de 1872. (REQUIÃO, 2009. p. 290). Foi só no ano de 2002, com o advento do atual Código Civil, que o estabelecimento comercial veio a ser disciplinado em nosso ordenamento jurídico.

3. CONCEITO E NATUREZA

Estabelecimento Comercial é o conjunto de bens corpóreos e incorpóreos reunidos pelo empresário para o desenvolvimento de sua atividade econômica, ou seja, o estabelecimento comercial é o instrumento da atividade do comerciante. Para que se exerça a atividade empresarial é necessário o capital, o trabalho e a organização.

É também definido pelo Código italiano como o complexo dos bens organizados pelo empresário, para a realização de atividade de uma empresa, o que também é visto semelhantemente pelo Código Civil Brasileiro, no art. 1142. É formado pela base física da empresa, ou seja, o local e todos os instrumentos ou elementos necessários para a realização desta atividade empresarial.

A verdadeira natureza jurídica do Fundo de Comércio não se encontra esclarecida. Algumas teorias foram construídas, mas em nenhuma delas se conseguiu explicar o estabelecimento comercial em nosso Direito, porque ele não possui autonomia patrimonial e nem possui personalidade jurídica. São estas mesmas teorias que concluem que o estabelecimento comercial é sujeito e não objeto de direitos.

De acordo com o Direito Brasileiro, o estabelecimento comercial é uma universalidade, visto que juridicamente, nada mais é que um complexo de coisas; bens corpóreos, incorpóreos e serviços, que são organizados para o exercício da atividade empresarial. Porém esta universalidade não poderia ser de direito, pois não tem a estrutura da mesma, que é quando se tem um complexo de coisas destinado a um fim pela vontade da lei, ou seja, ela só se constitui por força da lei.

Como exemplo, temos a herança. Portanto, é possível verificar que o estabelecimento comercial no Brasil, tem uma universalidade de fato, pois é um complexo de coisas destinado a um fim pela vontade de seu proprietário, que pode modificar a estrutura, organizar, mudar-lhe o destino, livremente, tanto no todo ou em cada um dos elementos que o compõem.

4. ALIENAÇÃO DO ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL

Como bem incorpóreo o estabelecimento pode ser alienado, ou seja, o estabelecimento pode ser transferido, de diversas formas, pode ser vendido ou cedido, empenhado e desapropriado. (REQUIÃO, 2009. p. 298).

Para que seja feita a alienação, não é necessário instrumento solene, é transferida a propriedade do estabelecimento comercial com todos os seus elementos, por meio de contrato de cessão ou de compra e venda, deixando o passivo esclarecido sobre a real situação do estabelecimento comercial.

 É visto também, que o empresário só pode vender ou transferir regularmente seu estabelecimento se fazer cumprir as condições que se segue: Pagar todos os seus credores, ou se não, obter dos mesmos, consentimento expresso; ficar com bens suficientes para pagar as dívidas adquiridas pela empresa aos credores; e por fim, notificá-los regularmente e eles não se opuserem dentro do prazo de trinta dias. Caso seja feita a venda sem observar estas condições, pode ser tornada ineficaz em face d massa falida, e consequentemente arrecado o estabelecimento pelo síndico.

“O código civil, em seu art.1144, demonstra os efeitos do contrato, que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou o arrendamento do estabelecimento, á averbação á margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Publico de empresas mercantis, exigindo-se também que o contrato seja noticiado na imprensa oficial.” (REQUIÃO, 2009. p. 299).

          

            Para que seja feita a averbação ou publicação, não existe prazo, porém é de total interesse das partes que a publicação seja imediata, para fins de efetividade da execução de direitos ou créditos, e também para a desoneração de responsabilidade, pois quem estiver adquirindo o estabelecimento torna-se responsável pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência se regularmente contabilizados, tendo a companhia do devedor primitivo, quanto aos créditos vencidos, até um ano á contar da publicação, já em relação aos créditos não vencidos, a responsabilidade do devedor primitivo perdura até um ano após o vencimento. (REQUIÃO, 2009. p.300).

“A contabilização á qual se refere o código pode ser comercial, elaborada segundo as técnicas recomendadas e escrituradas formalmente em livros, como também poderá ser feita em documento especialmente realizado para permitir a exata identificação de créditos e débitos do estabelecimento.” (REQUIÃO, 2009. p.300).

Estão dispensadas de conduzir escrituração completa, podendo-a fazer de modo simples, usando apenas o livro caixa algumas categorias de empresários ou de sociedades empresárias, micro ou pequenas empresas, fato este que não se encontra presente no código.

“Todo empresário deve, ao realizar a alienação de seu estabelecimento empresarial, recolher a concordância por escrito de seus credores, ou fazer a notificação a eles, pois somente em uma hipótese está dispensado da observância desta cautela: no caso de sobrarem, em seu patrimônio, bens suficientes para solvência do passivo. Se o empresário não observar tais cautelas, poderá ter sua falência decretada, com fundamento no art. 94, III, c, da LF, e, vindo a falir, a alienação será considerada ineficaz, perante a massa falida, nos termos do art. 129, VI. da LF, podendo com isto o estabelecimento empresarial ser reivindicado das mãos de seu adquirente.“ (COELHO, 2004. p. 59-60).

 De acordo com o art.448 da CLT, os contratos de trabalho que já existiam antes da mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa são imunes, e diante disto está protegido de modo particular o credor trabalhista do alienante daquele estabelecimento empresarial.

            No caso do alienante adquirir o estabelecimento mediante lance dado em leilão judicial promovido em processo de recuperação judicial ou falência, o adquirente não responde pelas obrigações do alienante, inclusive as de natureza trabalhista e fiscal, pois neste caso ele não é considerado sucessor do antigo titular do estabelecimento empresarial. O alienante também não poderá, nos cinco anos após a transferência, restabelecer-se em idêntico ramo da atividade empresarial, concorrendo com o adquirente, salvo se devidamente autorizado em contrato. (COELHO, 2004, p. 61).

5. ELEMENTOS DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL (FUNDO DE COMÉRCIO)[1]

            O Estabelecimento comercial é composto por elementos materiais, imateriais (COELHO, 2004. p. 100), bens corpóreos ou incorpóreos (REQUIÃO, 2009. p. 302). Os bens materiais, corpóreos são as mercadorias do estoque, instalações, utensílios, máquinas, e demais bens corpóreos que o empresário utiliza ou possa vir a utilizar na exploração da sua atividade econômica. Já os bens imateriais (FRANCO, 2001. p. 125), incorpóreos, são os bens industriais, assim exemplificados: contratos, ponto comercial, Créditos e dívidas, registro de desenho industrial, título do estabelecimento, marca registrada, dentre outros.

5.1 BENS CORPÓREOS

            Os bens corpóreos são aqueles que possuem existência física, material, como as mercadorias, as instalações, as máquinas e utensílios. As mercadorias são produtos que se destinam ao mercado e são preparadas para o consumo. Possui elementos que a caracteriza como: corporalidade, mobilidade, aptidão, valor patrimonial e permanência. (COELHO, 2004. p. 101)

            As Instalações são acomodações montadas no estabelecimento, para conforto dos clientes e apresentação dos produtos. Já as máquinas e utensílios são utilizados para a produção de coisas ou serviços e auxiliam também no desenvolvimento das atividades, facilitando os serviços, como caixas registradoras, computadores, calculadoras, limpeza do estabelecimento, dentre outras.

5.2 BENS INCORPÓREOS – Direito ao ponto comercial

            Os bens incorpóreos são aqueles que não possuem existência física, material, não ocupam espaço no mundo exterior (REQUIÃO, 2009. p. 304). Podemos citar os contratos, o ponto comercial, créditos e dívidas. Os contratos não são bens e não integram o estabelecimento comercial. Dizem respeito não ao estabelecimento, mas a empresa. (REQUIÃO, apud FRANCO, 2001, op. cit. p. 126). No exercício da empresa, o empresário é levado a firmar diversos contratos.

            O ponto comercial é o local do comércio onde se dirige a clientela. Pode ter existência física ou virtual (endereço eletrônico: site). Pode ser alugado ou pertencer ao imóvel do empresário. O ponto comercial possui uma consideração relevante, a renovação do contrato de locação comercial, é um direito protegido. Com tal medida, a lei visou garantir e proteger o empresário, dando a este o desfrute e o direito ao ponto comercial.[2] No entanto, a lei estabelece algumas condições para proteção ao empresário, são elas: o contrato com prazo determinado; o prazo contratual deve ser de no mínimo cinco anos; pelo prazo ininterrupto de três anos o arrendatário deve estar em exploração do seu comércio ou indústria, no mesmo ramo. Cumpridos estes requisitos o empresário tem o direito à renovação do contrato, direito este que se transfere a seus herdeiros e sucessores.

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O ponto comercial é um local que desempenha papel primordial na atividade exercida pelo empresário, influindo no resultado desta atividade, pois os clientes, cientes dos produtos oferecidos e da qualidade destes, fazem opção por determinado local em detrimento a outro.

“O ponto ou local de negócios, portanto, é o fator de atração da clientela que, como tal, resulta da atividade desenvolvida pelo empresário. Se outro pode dele se valer, ocorrerá o desvio da clientela, com o desapossamento injusto daquele que, por seu esforço, tornou conhecidos seus produtos e serviços.” (FRANCO, 2001, p. 128)

            Com a preservação do ponto, o Estado garante de forma indireta a continuidade da empresa exercida pelo empresário. A proteção ao ponto se fundamenta na teoria da preservação da empresa, que em ultima instância, garante a função social que lhe cabe, ser fonte geradora de empregos e tributos. A proteção ao ponto confere ao empresário-locatário o direito de pedir a Renovação compulsória de seu contrato de locação não residencial, uma vez presente os requisitos supra transcritos.

            Cabe ressaltar que a renovação compulsória não é absoluta. Sempre que houver conflito entre direitos, o do locatário, voltado à renovação da locação, e do locador, no tocante ao uso pleno do seu bem, prevalecerá o fundado no texto constitucional, em detrimento do previsto na legislação ordinária. Mesmo que a locação atenda todos os requisitos constantes na Lei de Locações, ela não será renovada[3] porque, se o fosse, o direito de propriedade do locador restaria desprestigiado. (COELHO, 2004. p. 107).

            O Direito de inerência ao ponto é exercido através de uma ação judicial própria, denominada ação renovatória. O prazo decadencial para a propositura da ação renovatória pelo locatário assinalado pela lei, é entre um ano e seis meses antes do término do prazo do contrato a renovar. Não conseguindo negociar com o locador, antes do fim desse prazo, a assinatura de novo contrato de locação por escrito, deve promover a ação renovatória, para assegurar o seu direito. Como o prazo é decadencial, não se interrompe, nem se suspende. (COELHO, 2004, p. 109).

            Afirma o parágrafo 3º  do artigo 52 da Lei de Locações, que se a renovação não ocorrer na hipótese de terem sido oferecidas melhores condições por terceiros, ou se o locador, no prazo de três meses da entrega do imóvel, não der o destino alegado ou não iniciar as obras determinadas pelo Poder Público ou que declarou pretender realizar, ocorrerá a indenização do ponto.

            No caso da ação renovatória em shopping center[4], a lei de locações também assegura a renovação compulsória. Cabe ressaltar, contudo, que se a renovação importa prejuízo ao empreendimento, caberá a exceção da retomada. Ora, se injustificadamente ocorrer a redução da receita do locador, por inadequação do negócio do locatário às evoluções do mercado de consumo, é um direito constitucional que lhe assiste, impedir a renovação compulsória do contrato.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei 8.245 de 18 de outubro de 1991. Dispõe sobre a locação dos imóveis urbanos e os procedimentos a ela pertinentes. Diário oficial, Brasília, 21 out. 1991.

BULGARELLI, Waldirio. Sociedades, Empresas e Estabelecimento. São Paulo: Atlas, 1980.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v. 1. 8 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2004.

FRANCO, Vera Helena de Mello. Manual de direito comercial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. v. 1. 28 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

ROCHA FILHO, José Maria. Curso de direito comercial. 3 ed. rev. atual. ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

NOTAS


[1]           Enquanto (REQUIÃO, 2009) e (ROCHA FILHO, 2004) adota como sinônimos a expressão “fundo de comércio e estabelecimento empresarial”, (COELHO, 2004) prefere conceituar Estabelecimento Empresarial como “fundo de empresa”. No entanto, o referido autor deixa claro que não é correto tomar por sinônimos “estabelecimento empresarial e fundo de empresa”. Este é um atributo daquele; não são, portanto, a mesma coisa. O primeiro é o conjunto de bens que o empresário reúne para explorar uma atividade econômica, e o fundo de empresa é o valor agregado ao referido conjunto, em razão da mesma atividade. Cf. COELHO, F. U. 2004. p. 98; REQUIÃO, R. 2009. p. 290; ROCHA FILHO, José Maria, 2004. p.207. Neste trabalho seguiremos a doutrina majoritária, conceituando como iguais: “estabelecimento comercial e fundo de comércio”. Não nos enveredaremos pelas discussões que envolvem o tema, pois esta não é a finalidade que nos propomos.

[2]           Cf.: Decreto 24.150, Regula as condições e processo de renovação de contratos de locação de imóveis destinados a fins comerciais ou industriais.

[3]           A lei de Locações estabelece algumas condições em que havendo oposição dos interessados, prevalece o direito do locador, são elas: realização de obras no imóvel, reformas no imóvel, que o valorizem, pretendidas pelo locador; insuficiência da proposta apresentada pelo locatário, na ação renovatória; proposta melhor de terceiros; transferência de estabelecimento existente há mais de um ano, pertencente ao cônjuge, ascendente ou descendente do locador, ou a sociedade por ele controlada. Cf. Artigos 52 e 72 da Lei 8.245 de 18 de outubro de 1991.

[4]           Empreendimento em que um empresário, proprietário de um determinado prédio, constituído de espaços relativamente autônomos, organiza e distribui estes espaços, para locá-los a pessoas interessadas em desenvolver e explorar atividades econômicas previamente determinadas. Cf. COELHO, 2004. p. 112.

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Sobre o autor
Eliel Geraldino da Silva

Bacharel em Teologia, Licenciado em Filosofia, Bacharel em Direito. Pós Graduado em Direito Constitucional. Pós graduado em Criminalidade e Segurança Pública.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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