Introdução e Desenvolvimento
Primeiramente, cumpre destacar as alterações constitucionais que possibilitaram a criação do Fator Previdenciário, redutor do salário de benefícios para a aposentadoria por tempo de contribuição, obrigatoriamente, e para a aposentadoria por idade, de forma facultativa. A Emenda Constitucional nº 20/98, inseriu no caput do artigo 201 da Constituição Federal, quando referiu-se à organização da Previdência Social, o termo “... observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei,...”.
Referida alteração, realizada pelo constituinte derivado, delegou ao legislador ordinário a regulamentação da forma de cálculo dos benefícios previdenciários.
Citada EC é decorrente de longa discussão legislativa da Proposta de Emenda Constitucional nº 33, a qual cogitou a alteração da aposentadoria por tempo de serviço, combinando os requisitos tempo de contribuição com idade mínima, sob a justificativa de precoces aposentadorias por tempo de serviço, as quais originavam grande prejuízo ao sistema previdenciário. Com isso entendem que o adiamento das aposentadorias aliviaria os cofres públicos, já que em muitos casos o tempo de percebimento do benefício é superior ao tempo contribuído. Aliado a isso, tem-se as pensões provenientes destes benefícios e o cômputo dos tempos fictícios - sem contribuição.
Assim, verifica-se que a finalidade inicial da reforma previdenciária era uma aposentadoria que exigisse, ao mesmo tempo, idade mínima e tempo de contribuição, ou seja: obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição, com proventos integrais aos 60 anos de idade, e trinta e cinco anos de contribuição para o homem, e aos 55 anos de idade, e trinta anos de contribuição para a mulher, tanto para os servidores públicos como para os segurados do Regime Geral de Previdência Social. O Congresso Nacional, contido, rejeitou a proposta (SILVA, 2009, p. 127).
Muito embora vetada na PEC n.° 33, a alteração de idade mínima para a aposentadoria por tempo de serviço, retirada do texto da EC 20/98 aprovada, fora mantida quando da elaboração da Lei n.° 9.876/99. Lembrando, a Constituição deu ao legislador infraconstitucional competência para constituir normas de preservação do equilíbrio atuarial e financeiro. É utilizado pelo ordenamento previdenciário brasileiro como garantia do equilíbrio financeiro e atuarial a que se refere o art. 201 da Constituição da República (SILVA, 2009, p. 127-128). A referida Lei dispõe, entre outros assuntos, sobre o cálculo de benefícios do trabalhador da iniciativa privada, aumentou o período básico de cálculo, extinguiu a escala de salários-base para o contribuinte individual e, uma de suas principais modificações, estabeleceu o Fator Previdenciário.
O fator previdenciário encerrou a discussão do requisito mínimo de idade para aquisição da aposentadoria por tempo de contribuição, sendo certo que sua função é desestimular a aposentadoria precoce, posto tratar-se de um fator redutor do valor da renda mensal.
No cálculo do Fator Previdenciário leva-se em conta a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de sobrevida do segurado no momento da aposentadoria. Abrange também na fórmula a alíquota contributiva que, independente do valor real recolhido sobre o salário de contribuição, é de 0,31, ou seja, 31% (trinta e um por cento), refletindo a situação dos segurados empregados de renda mais elevada, que contribuem com 11% (onze por cento) e o empregador com 20% (vinte por cento). Horvath (2006, p. 188-189) ao definir e tratar sobre a concepção do fator previdenciário, assim escreveu:
Podemos definir fator previdenciário como um parâmetro de cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição (de forma compulsória) e da aposentadoria por idade (de forma facultativa) que considera a idade, expectativa de vida e o tempo de contribuição do segurado ao se aposentar.
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O Brasil, baseando-se na experiência da capitalização escritural, introduziu o fator previdenciário que foi denominado pelos técnicos como “capitalização virtual”, já que permite o atrelamento dos valores trazidos ao sistema pelos segurados aos valores dos benefícios, sem a necessidade imediata da troca do regime de repartição (que é o regime adotado pelo sistema previdenciário brasileiro, também conhecido como regime de caixa).
Neste mesmo sentido, Martinez, na sua obra “Subsídios para um modelo de Previdência Social para o Brasil” ao conceituar de forma genérica e técnica o instituto do Fator Previdenciário assim dispôs (2008, p. 64):
Estabelecimento de relação entre a contribuição e o benefício referente às prestações programadas baseadas no regime financeiro de capitalização e plano de benefícios de contribuição definida, a par de um período básico de cálculo adequado, exigência de um sistema equilibrado atuarialmente, aceitável e apoiado num instrumento promotor dessa correspectividade cientificamente técnico
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Número menor ou maior que a unidade capaz de expressar o elo entre a contribuição e a manutenção do benefício em termos de renda inicial, resultante de expressão matemática cujos componentes básicos levem em conta o tempo de contribuição (I), a duração do benefício (II) e a idade do aposentando (III).
Com tal inovação, o cálculo da aposentadoria por idade ou por tempo de contribuição teve sua base expandida, passando a ser efetuado através da média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo, desde julho de 1994 quando se implementou o Plano Real, multiplicado pelo fator previdenciário, nos moldes do artigo 29, I da Lei n.° 8.213/91, alterada pela Lei n.º 9.876/99, isto é, atualizando-se os salários-de-contribuição à Previdência Social, exclui-se os 20% dos menores salários e faz-se a média simples dos demais. A essa média multiplica-se o Fator Previdenciário para se obter o salário de benefício inicial.
Denota-se que o benefício teve duas importantes alterações, qual seja o Período Básico de Cálculo do salário-de-benefício passou a abranger todos os salários de contribuição desde 07/1994, além da introdução do fator previdenciário no cálculo do valor do benefício.
O fator previdenciário, como se sabe, leva em conta a idade do segurado quando da aposentadoria, além do tempo de contribuição. Desta forma, embora o limite mínimo etário não seja requisito da aposentadoria, passou a ser ponderado como mecanismo de cálculo do valor inicial do benefício. Assim, a expectativa de sobrevida acabará exigindo do segurado que pretenda receber proventos integrais a constância em atividade em período superior aos 35 anos, sobretudo quando se trata de pessoa que iniciou contribuições aos 14 ou 16 anos de idade.
A equivalência entre a contribuição e o benefício, é alcançada mediante a nova fórmula de cálculo do salário de benefícios abaixo descrita. Importa observar que ela considera praticamente toda a vida laborativa do segurado e não mais apenas os últimos anos.
Sb = M x f
Onde : Sb = salário de benefício;
M = média dos 80% maiores salários de contribuição do segurado, a partir de julho de 1994, corrigidos monetariamente;
f = fator previdenciário
Já o equilíbrio entre tempo de contribuição e tempo de recebimento é viabilizado pelo Fator Previdenciário propriamente dito, que é definido a seguir:
Onde:
f = fator previdenciário;
Tc = tempo de contribuição de cada segurado;
a = alíquota de contribuição do segurado;
s = expectativa de sobrevida do segurado na data da aposentadoria;
Id = idade do segurado na data da aposentadoria
Os elementos que compõem a fórmula do Fator Previdenciário indiretamente criaram uma modalidade mista de benefício, ou seja, uma aposentadoria em que é necessário cumprir os requisitos tempo de contribuição e idade mínima.
Vejamos, não há o requisito da idade mínima, entretanto, a idade influencia diretamente no valor do salário de benefício. Quanto menor for a idade quando da aposentadoria, maior o denominador ou expectativa de sobrevida, o que resultará em menor salário de benefício. Da mesma forma quanto ao tempo de contribuição, pois, com o tempo mínimo de 35 anos para homens e 30 anos para mulher, dificilmente o salário de benefício alcançará o mesmo valor do salário de contribuição.
O Fator Previdenciário é a variável que será aplicada ao valor do salário de contribuição para calcular o valor do salário de benefício. Nas palavras do Martinez (2007, p. 51), o fator previdenciário é o “número que resulta de uma fórmula matemática, em que entram o tempo de contribuição do segurado, sua idade e o tempo que se espera que ele viva, medidos na data do pedido da aposentadoria por tempo de contribuição.”
O tempo de contribuição é o período, em anos, em que o trabalhador ou qualquer outro contribuinte tenha recolhido aos cofres da Previdência Social a parcela referente ao seu salário de contribuição. Não há distinção na fórmula para homens e mulheres, o que deve ser feito para se ajustar o cálculo é adicionar cinco anos ao tempo de contribuição da segurada mulher ou segurado professor e dez anos para a segurada professora. Este acréscimo é para professores que comprovem efetivo exercício do magistério no ensino básico, fundamental ou médio.
Tempo de contribuição: composto de vários períodos de serviço: a) antigo tempo de serviço (trabalho); b) tempo de contribuição; c) tempo de gozo de benefício; d) tempo de facultativo; e) serviço militar; f) trabalho rural etc.
Comprovado com a CTPS, contratos sociais, guias de recolhimento ou mediante justificação administrativa ou judicial (MARTINEZ, 2007, p. 51).
A alíquota adotada é de 31%, essa multiplicação do tempo de contribuição pela alíquota reflete o número de anos trabalhados que o contribuinte dedicou à Previdência Social. Significa dizer que a cada dez anos trabalhados o contribuinte destinou 3,1 anos para sua aposentadoria.
A expectativa de sobrevida é o tempo médio de sobrevivência contado a partir do momento da aposentadoria. Conforme o artigo 29, § 8°, da Lei nº 8.213/91, incluído pelo artigo 2º, da Lei n° 9.876/99, “a expectativa de sobrevida do segurado na idade da aposentadoria será obtida a partir da tábua completa de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos”. Wladimir Martinez conceitua (2007, p. 51) como “esperança de vida: período de sobrevida fixado pelo IBGE e constante de uma Tábua de Expectativa de Vida, apurada anualmente.”
O tempo efetivamente destinado à Previdência Social deverá ser dividido pela expectativa de vida do segurado, ou seja, todo o valor contribuído para a previdência até o momento da aposentadoria é dividido pelo tempo que se prevê que o segurado ficará vivo. Juntando-se a isto o aumento do período da base de cálculo para todo o tempo de contribuição, torna muito semelhante aos sistemas de contas individuais de capitalização, no qual cada um recebe proporcionalmente ao que contribuiu. Indiretamente, discrepa do sistema adotado no Brasil que é o contributivo por repartição.
Ainda, a segunda parte da fórmula é um estímulo ao contribuinte para permanecer no exercício da atividade laboral contribuindo por tempo superior ao mínimo, na tentativa de ser um bônus pela permanência em atividade, afinal o resultado terá valor maior, por isso que Simone Barbisan Fortes, afirma: “em princípio, revelaria uma espécie de capitalização das contribuições (aplicação de taxa de juros), aumentando o valor do salário-de-benefício” (FORTES, 2003, p. 185). Nota-se na fórmula, também, o acréscimo de uma unidade visando garantir que essa remuneração seja constantemente positiva, e a divisão por cem modifica a idade e tempo de contribuição para porcentagem.
O fator previdenciário pode ser inferior ou superior à unidade. Se superior, irá aumentar o benefício do segurado, desde que sua média esteja abaixo do teto. Se inferior, o fator irá reduzir o benefício do segurado.
Não obstante às críticas pela criação do fator previdenciário, como limite de idade disfarçado, o STF reconheceu sua constitucionalidade, lembrando que a preservação do equilíbrio financeiro e atuarial está prevista na Constituição Federal, dando respaldo a que o fator previdenciário seja instituído por lei ordinária (Pleno, ADInMC 2.110-DF e ADInMC 2.111-DF, j. 16-03-2000, Rel. Min. Sydney Sanches, Informativo STF nº 181, de 13 a 17-03-200)
Conclusão
Conclui-se que o governo brasileiro, quando criou o instituto do fator previdenciário, tinha por objetivo proporcionar equilíbrio ao sistema público, buscando a equivalência entre a contribuição e o benefício, bem como, equilíbrio entre tempo de contribuição e tempo de recebimento. Por conseguinte, o fator previdenciário desestimula as aposentadorias precoces, de modo que os segurados mantenham vida laboral ativa. Pois ao se requerer o benefício muito jovem, logo ao completar o tempo mínimo de contribuição, seu valor será menor, sendo certo que irá receber o benefício durante muitos anos, em razão da probabilidade de sua longa expectativa de vida calculada pelo IBGE, com base na tendência demográfica da ampliação da longevidade. Assim, deixando para requer a aposentadoria mais tarde, próxima às idades consideradas como ideais - 60 anos para os homens e 55 anos para as mulheres, seu valor será maior, pois receberá o benefício durante menor período de tempo.
Em outras palavras, estabeleceu-se, por meio de legislação infraconstitucional, uma faixa de idade ideal para as aposentadorias por tempo de contribuição, todavia, sem o caráter de obrigatoriedade, já que a concessão do benefício não está condicionada a idade, mas tão somente haverá redução no valor do benefício.
Referência Bibliográfica
AMADO, Frederico Augusto Di Trindade,. Revisão e reajustamento dos benefícios da Previdência Social. Editora JusPODIVM, 2011.
FOLMAN, Melissa, João Marcelino Soares. Revisões de Benefícios Previdenciários. Juruá Editora, 2011.
FORTES, Simone Barbisan. A reforma previdenciária e seu reflexo na sistemática de cálculo da renda mensal inicial dos benefícios previdenciários. In: ROCHA, Daniel Machado da. Temas atuais de Direito Previdenciário e assistência social. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
HORVATH Junior, Miguel. Salário-maternidade. São Paulo: Quartier Latin, 2004.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Desaposentação. 3ª ed. São Paulo: LTr, 2010.
MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. Fator previdenciário. Acesso em 12 jan.2015.
SILVA, Roberta Soares da. Direito social: aposentadoria. São Paulo: LTr, 2009.