INTRODUÇÃO
Automação, globalização, informatização, competitividade e informação são uns dos temas em discussão neste século em que as inovações tecnológicas criam novos parâmetros de organização da empresa.
Para Peter Drucker[1], o recurso econômico básico não é mais o capital, nem os recursos naturais, nem a mão-de-obra, mas sim o conhecimento e suas aplicações ao trabalho. Embora ainda não compreendamos bem a forma pela qual o conhecimento se comporta como recurso econômico, certamente não custa pouco, uma vez que os paises desenvolvidos gastam em torno de um quinto de seu PNB na produção e disseminação de conhecimento. O retorno obtido pelo país ou empresa certamente constitui fator determinante de sua competitividade, dessa forma, a geração de conhecimento será decisiva para o sucesso econômico social e também para seu desenvolvimento econômico como um todo.
Indiscutivelmente o investimento em conhecimento, bem imaterial, necessita de proteção jurídica, uma vez que a cobiça dos concorrentes se apresenta cada vez mais voraz, atingindo o empregado que passa a ser objeto de desejo de concorrentes na guerra pela produtividade. Isto porque, este tem o acesso ao conjunto de bens imateriais que constituem o conhecimento da empresa, sendo portanto, ferramenta essencial para a efetiva competitividade do negócio.
A legislação brasileira concede proteção, de forma diversificada aos bens imateriais (Lei n. 9279/96 – Lei de Propriedade de Industrial; Lei n. 8.884/94 – Lei Antitruste, entre outras). Além dessas há, ainda, artigos de garantias tanto pela Consolidação das Leis do Trabalho (art. 482, c e g) como pelo art. 195, IX, X e XI, da Lei n. 9279/96. Resta questionar se a proteção conferida pela legislação citada em relação a atos do empregado é suficiente e adequada.
No Direito do Trabalho, a empresa, um dos fatores da produção, necessita do trabalho, para um sistema de livre iniciativa, atingir seu objetivo último: o Lucro. Por isso a Constituição Federal resguarda os interesses de ambas as partes: da empresa, quando garante a livre concorrência (art. 179, IV, e art. 173, par.4º) e do trabalhador, quando valoriza o trabalho associando-o à livre iniciativa (art.170,caput).
Nesse sentido a Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 482, c e g, protege o empregador de atos do empregado que impliquem concorrência ou de violação de segredo, durante o contrato de trabalho. Os incisos IX, X, XI do art. 195 da Lei n. 9279/96 cuidam da concorrência desleal, tipificada como crime, assim como, à exceção do inciso XI, de ato praticado por empregado na constância do contrato de trabalho
A questão torna-se mais delicada quando é cessado o contrato de trabalho, o empregado, por sua vez, torna-se livre para vincular-se a concorrente de seu antigo empregador. Evidentemente que essa nova relação de trabalho pode gerar prejuízos ao ex- empregador, uma vez que este pode utilizar-se do conhecimento de segredos de indústria e de comércio da empresa que trabalhara colocado em favor, agora, da concorrente.
Vale destacar que o conhecimento a que faço referência se trata de um conhecimento objetivo do empregado, diferentemente do conhecimento subjetivo, que consiste na sua habilidade manual ou intelectual adquirida pela experiência profissional. O dever de fidelidade e lealdade do empregado ao seu empregador se traduz principalmente em 2 (duas) obrigações: o dever de guardar os segredos profissionais e a abstenção de atos de concorrência ilícita.
Com o fulcro na prevenção, os empregadores, vêm buscando cada vez mais proteção em cláusulas de não concorrência inseridas no contrato de trabalho. Em contrapartida, existe uma ausência de norma legal que autorize e regulamente pactos de não concorrência após a extinção do contrato de trabalho, o que torna a matéria complexa e controvertida e sendo merecedora de toda a atenção no presente estudo.
CLAUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA
- Pacto de não concorrência nas relações comerciais
Excluída análise da questão envolvendo as ralações de trabalho, o que será objeto de tópico específico, faz-se agora até por motivo de diferenciação das cláusulas em matérias distintas. As questões mais comuns referem-se à “cláusula de não-restabelecimento” e à “cláusula de não concorrência em contrato social”. A Doutrina utiliza-se de diversas expressões com significados semelhantes, como “proibição de concorrência”, “cláusula de não-restabelecimento”, cláusula de interdição da concorrência”, entre outras.
Para melhor entendimento do problema relacionado ao contrato de trabalho, questão de fundo do presente estudo, impõe-se, ainda que em caráter introdutório, a análise dos referidos pactos no âmbito das relações comerciais.
As teorias sobre a vigência da cláusula são, basicamente, três: a primeira, originariamente defendida por Rui Barbosa, segundo a qual a liberdade de comércio constitui princípio de direito público e a obrigação de não restabelecimento somente pode decorrer de contrato, porquanto inexiste previsão em nosso ordenamento, devendo, ainda, ser limitada, sob pena de nulidade; uma segunda corrente defende que a proibição do restabelecimento deve decorrer ou de cláusula expressa, ou de circunstância que induza, de forma inequívoca, ser essa a intenção dos contratantes; finalmente, a terceira corrente entende que a proibição de concorrência decorre, de forma implícita, dos negócios com o estabelecimento.
De maneira geral, as convenções que visem sobre a concorrência poderão ser consideradas lícitas ou ilícitas. São consideradas ilícitas, notadamente, quando ocorrem abuso de poder econômico, “quando a atividade empresarial, tem por escopo a destruição de empresas concorrentes, para a denominação da clientela dos mercados e subseqüente imposição de preços mais elevados”, impondo-se, pois, a ação do poder público para combater os excessos do domínio econômico.[1]
Algumas convenções são, todavia, lícitas tendo sido admitidas pela doutrina e pela jurisprudência, como é a hipótese da cláusula de não concorrência de sócio após retirar-se da sociedade que integrava: lembrando-se que a vedação do exercício de atividade concorrente pelo empregado, após a cessação do contrato de trabalho, será objeto da próxima análise.
Quando o pacto de não restabelecimento versar sobre a venda de estabelecimento comercial, a intenção de preservar a sua clientela virá por cláusula convencional em que o empresário-vendedor se absterá de organizar no fundo de comércio. Impõe-se cláusula expressa, pois não se considera, pelo menos no direito brasileiro, implícita como obrigação do vendedor.
A cláusula de não-concorrência em contrato social decorre do fato de não ser razoável admitir-se a um sócio, participante da administração de uma sociedade, tornar-se sócio de empresa concorrente. A situação é repelida por questões de segurança e de segredo de negócio
Doutrina autorizada entende, em casos tais, ser implícita a proibição, face aos princípios da má-fé e dos bons costumes, que devem ser reservados no âmbito do direito comercial. Assim, o contrato social poderá consignar cláusula que vede aos sócios, gerentes ou não, direito a associar-se a uma empresa concorrente.
Deve ser ressaltado que as cláusulas impeditivas de concorrência não são irrestritas, mas, ao contrário, devem sofrer determinadas limitações modificadas pelo princípio da razoabilidade, para que sejam consideradas válidas. Nas hipóteses mais comuns, as principais limitações são de índole temporal, territorial e quanto ao objeto. Quanto ao primeiro aspecto, tem-se que a proibição deve ser limitada, razoavelmente, no tempo. No que se refere ao segundo aspecto, razoável entender-se que a obrigação de não-estabelecimento deva ser situada no espaço. Nenhuma justificativa, por exemplo de cláusula que vede ao alienante estabelecer-se com o mesmo ramo de atividade em território distante, de forma a não interferir, direta ou indiretamente, na clientela do empresário adquirente do estabelecimento transferido. Não há como entender a proibição se o alienante dá início a nova atividade, totalmente diversa daquela que primitivamente desenvolvia.
Resta avaliar as conseqüências do eventual descumprimento da cláusula de não-concorrência. Várias hipóteses poderão ser consideradas em caso de inadimplemento: a) a rescisão contratual, com apuração de perdas e danos decorrentes; b) o eventual fechamento judicial do novo estabelecimento, tendo em vista as obrigações de não fazer, com perdas e danos; c) a postulação pura e simples de indenização pelos prejuízos; d) a cobrança de multa contratual, se esta dor pactuada; e) eventuais medidas cautelares.
- Pacto de não concorrência. Conceito.
O pacto de não concorrência implica a obrigação pela qual uma das partes contratantes se compromete a não praticar ação que induza desvio de clientela da outra.
Se a relação jurídica vinculante é a venda de um estabelecimento comercial, haverá cláusula expressa assegurando que alienante deixará de organizar um novo fundo de comércio.
No que diz respeito ao contrato social, a vedação decorrerá de cláusula que impeça que um sócio, participando de administração de uma sociedade, venha a se tornar sócio de empresa concorrente.
Quando a origem da cláusula remonta ao contrato de trabalho, entende-se como de não concorrência a obrigação em virtude da qual o empregado se compromete a não praticar ação que acarrete desvio de clientela do empregador. Acrescenta-se, desde logo, que, na vigência do contrato de trabalho, há disposição expressa na Consolidação das Leis do trabalho, condenando a negociação habitual, por conta própria ou alheia, sem permissão do empregador e quando constituir ato de concorrência à empresa para qual trabalha o empregado, for prejudicial ao serviço
Se, todavia, o escopo das partes é a abstenção de concorrência após a extinção do contrato de trabalho, pode-se conceituar como de não concorrência à obrigação em virtude da qual o empregado se compromete a não praticar, por conta própria ou alheia, após a vigência do contrato de trabalho, ação que implique desvio de clientela de seu antigo empregador.
Na vigência do contrato de trabalho tal dever de não concorrência, decorre naturalmente, da essência do próprio contrato de trabalho, existindo previsão legal específica no texto consolidado.
Assim é que o artigo 482, alínea “c”, da Consolidação das Leis do Trabalho, inclui, no elenco de hipóteses que constituem justa causa para a rescisão do contrato de trabalho, a negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço, enquanto a alínea “g” capitula a hipótese de violação de segredo da empresa.
A análise das mencionadas faltas justificadoras da rescisão contratual por culpa do empregado não oferece dificuldades, sendo, costumeiramente, tratadas pela doutrina, sem maiores discrepâncias.
Tem-se considerado que justa causa da negociação habitual caracteriza violação do dever de fidelidade do empregado. É certo que, havendo o consentimento do empregador, seja tácito ou expresso, a negociação habitual por conta própria ou alheia não constitui ilícito contratual, nem quebra do dever de fidelidade. Ressalte-se que a negociação por conta própria ou alheia que não constitui ato de concorrência à empresa, que não infere nos horários de trabalho, nem afeta as atividades normais e a produção do empregado, igualmente deixa de caracterizar a falta em comento. Em contrapartida, havendo prejuízo ao serviço por motivo da negociação, mesmo que esta não implique concorrência à empresa, a justa causa estará configurada violação de um dever contratual (ilícito contratual), enquanto este último constitui atividade ilícita, que lesa o direito de outrem, pelo modo por que é desenvolvida a atividade (ilícito extracontratual).[2]
A justa causa consistente em violação de segredos da empresa, igualmente, atinge, de forma capital o dever de fidelidade3 do empregado, ínsito no contrato de trabalho . Pode ser caracterizada pela violação de patentes de invenção, métodos de trabalho , segredos de fabricação, informações comerciais etc., assumindo maior gravidade quando os beneficiários da infidelidade forem concorrentes do empregador.
O ponto fulcral da questão ocorre, todavia, na segunda situação antes mencionada, ou seja, quando a cláusula de não-concorrência é pactuada com escopo de impedir determinados atos do empregado, que possam acarretar desvantagem ao seu empregador, após extinto o contrato de trabalho.
Em tal hipótese, entendemos ser mais técnica a conceituação que entende como de não concorrência à obrigação em virtude da qual o empregado se compromete, mediante remuneração, a não praticar, por conta própria ou alheia, após a vigência do contrato de trabalho, dentro de limites de objeto, tempo e espaço, ação que implique desvio de clientela de seu empregador, sob pena de responder por perdas e danos.
O nosso ordenamento não estabeleceu qual quer previsão ante a perspectiva em análise, deixando, assim de acompanhar a legislação de alguns países que, de há muito, mantêm regramento sobre a matéria, enquanto outros tratam a questão por meio de consolidações coletivas.
Outras cláusulas restritivas à liberdade de trabalho
Como as cláusulas de não concorrência, as cláusulas de permanência, confidencialidade e não solicitação são também restritivas da liberdade de trabalho.
Cláusula de permanência
Tem-se que o pacto de permanência com exceção de justa causa do empregador, condiciona a liberdade de o trabalhador rescindir o contrato de trabalho. Isso ocorre da seguinte forma: O empregador proporciona ao empregado curso de especialização, mestrados, doutorados entre outros.
Para Edilton Meireles[3], basta que a empresa conceda alguma vantagem ao empregado em seus estudos para poder exigir a sua permanência por determinado período, firmando o pacto previamente. A cláusula de permanência ou, ainda, seu prazo, deverá, no entanto, guardar uma certa proporção com o benefício concedido.
O mencionado autor lembra que o Estatuto do Trabalhador Espanhol tem disciplina sobre essa situação, que pode servir de amparo doutrinário para concluir pela licitude da cláusula de permanência quando preenchidos alguns requisitos básicos.
O pacto de permanência será válido se: o empregado houver recebido uma especialização profissional, às custas da empresa, para pôr em marcha projetos determinados ou realizar um trabalho específico, por período não superior a dois anos, desde que a cláusula seja formalizada por escrito. A regra espanhola estabelece, ainda, que, caso o empregado abandone o trabalho antes desse período, a empresa terá direito a receber uma indenização por danos e prejuízos – em geral na falta de parâmetros a jurisprudência fixa no mesmo valor desembolsado pelo empregador.
Cláusula de confidencialidade
Tratam-se, as cláusulas de confidencialidade, de uma obrigação de não revelar dados confidenciais durante ou após a rescisão do contrato de trabalho. O período em que o empregado se obriga a não revelar os segredos deve atender aos critérios de razoabilidade.
Os requisitos mais importantes são: 1) descrição do que são considerados informações ou dados confidenciais do empregador; 2) período no qual o empregado se obriga a não revelar os segredos; 3) declaração de que dados e informações confidenciais serão utilizados única e exclusivamente a serviço do empregador.
Cláusula de não solicitação
Com o objeto mais restrito que a cláusula de não concorrência à cláusula de não solicitação consiste na proibição do ex-empregado de aliciar clientes, fornecedores ou empregados do ex-empregador. Na cláusula em análise não existe a proibição de vincular-se a concorrente ou estabelecer concorrência por conta própria, no entanto, o que se proíbe é a procura dos mesmos clientes para oferecer os mesmos serviços contratação de fornecedores ou empregados do ex-empregador.
As cláusulas de não solicitação estão sujeitas aos mesmos requisitos das cláusulas de não concorrência, sendo assim, devem seguir os padrões de razoabilidade, limitação temporal e geográfica e legítimo interesse do empregador, e, é cabível em casos em que o empregado tem estreito relacionamento com esta.
A fim de melhor ilustrar dentro do quadro jurídico será demonstrado uma das diversas decisões em que O Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE se manifestou condenando o aliciamento de empregados e clientela.
Criação de dificuldades – aliciamento de representantes de empresa concorrentes – reconhecimento. O aliciamento de empresa concorrente constitui ema das formas de criação de dificuldades ao funcionamento e desenvolvimento de empresa, nos termos do artigo 2º, inciso I, alínea g, Lei 4.137, de 1962 (Averiguações Preliminares 146, de 7-4-88; Representantes: Cia. São Paulo Distribuidora de Derivados de Petróleo; Representadas: Arcobrasil Participações Ltda. E outras; Conselheira-Relçatora: Ana Maria Ferraz Augusto – DOU de 11-4-88, seção I, p. 6117)
Ausência de disposição legal específica
A discussão em torno do tema ora em análise fica complexa principalmente pela presunção de necessidade de proteção ao empregado, que por muitas vezes ser hipossuficiente, presume-se ser incapaz de pactuar direta e livremente certas condições do contrato de trabalho, acabando por praticamente aderir ao que é estipulado pelo empregador.
Importante far-se-á destacar que o trabalhador que se faz menção aqui, é um altamente especializado e que detém informações sigilosas e estratégicas da empresa. Nesse sentido é fundamental uma cláusula que resguarde a empresa de futura concorrência desleal por outra empresa que atue na mesma área, no entanto, o que não se deve esquecer é que o empregado também deve ter garantias de seus direitos.
Tudo seria mais fácil se já houvesse normas específicas sobre o tema regulando o pacto de não concorrência e equilibrando os interesses de ambos os lados. Até porque é cediço entre os doutrinadores do direito do trabalho que a profusão de Leis trabalhista editadas ao longo dos anos pouco espaço deixou para as negociações coletivas que poderia ser uma solução para o caso.
Destarte para princípios gerais como os contidos nos arts. 8º e 444 da Consolidação das Leis do Trabalho. Na contramão disso a ausência de previsão legal termina por acentuar o conflito. Ora se não Há lei o que se espera que se faça é que os atores sociais preenchão as lacunas da lei por outros meios.
Inicialmente, a possibilidade de empregado e empregador pactuarem a inclusão de cláusula de não concorrência no bojo do contrato de trabalho é plenamente admitida pelo art. 444 da Consolidação das Leis do trabalho, nesse sentido:
As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
Ocorre que o entendimento majoritário da doutrina e da jurisprudência em relação à elaboração de cláusula de não concorrência de acordo com o art. 444 da CLT, limita o princípio constitucional da liberdade de trabalho e a restrição sobre contravenção às normas de proteção ao trabalho.
Assim, o conflito já está criado, e a melhor solução ainda não foi encontrada. Isto porque negar validade a esta cláusula é deixar o direito à margem da corrente mundial, haja vista que diversos países contam em sua legislação com a previsão da cláusula de não concorrência.
Nesse sentido cabe ressaltar que a proteção à liberdade de trabalho, na legislação portuguesa, é muito mais explícita e efetiva que aquela que se pretende atribuir ao inciso XIII do art. 5º da Carta Constitucional brasileira. Mesmo assim, Portugal se apresenta como exemplo de um regime que, conquanto considere expressamente nula qualquer cláusula de contrato individual ou convenção coletiva de trabalho que obste a liberdade de trabalho, reconhece validade à cláusula de não concorrência.
No sistema jurídico brasileiro a possibilidade de inserção das cláusulas de não concorrência,após a ruptura do contrato, de forma harmônica, ocorre como convenção entre empregado e empregador para expandir os efeitos do art. 482, c e g , bem como se encontram em harmonia com o disposto no art. 195, IX, X e XI, da Lei 9.279/96.
Nota-se, portanto, que a licitude de uma cláusula de não concorrência deve ser avaliada caso a caso, sempre tendo por parâmetro os arts. 8º e 444 da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como o art. 122 do Código Civil, dispõe que são lícitas, em geral, todas as condições que a lei expressamente não vedar. Deve ainda ser observado se a cláusula de não concorrência atende aos critérios de razoabilidade bem como ao legítimo interesse do empregador e se assegura todos os direitos do trabalhador bem como compensação salarial semanal, décimo terceiro, e ainda defendo um pagamento de curso de especialização para o empregado enquanto estiver no período de “quarentena”.
Proteção aos direitos do trabalhador
A partir da analise da conjuntura do ambiente trabalhista, não se pode negar que existem empresas que se utilizam da cláusula de não concorrência para limitar direitos dos trabalhadores.
Nesse sentido o interesse do empregador em restringir a possibilidade de o empregado vincular-se a concorrente após a rescisão contratual pode ter por objetivo reduzir o poder desse empregado de barganhar melhores condições ou aumentos salariais. Aqui se deve fazer uma ênfase que o equilíbrio da relação entre o empregado e o empregador estaria prejudicado pela pactuação da restrição da liberdade de aderir a contrato de trabalho com outra empresa do mesmo ramo de atividade.
Por isso que, de maneira consciente, a cláusula de não concorrência no contrato de trabalho deve ser analisada com muita cautela pelos magistrados e, caso a caso, evitando que não se preste a abusos por parte do empregador para com o empregado, e apenas permitindo que se preste ao objetivo de proteção dos interesses lícitos e legítimos do empregador.
Cabe ressaltar que as Cortes francesas, ao apreciarem as cláusulas de não concorrência, a partir do final dos anos 80, passaram a considerar, como requisito essencial para a validade destas, a exigência de um legítimo interesse do empregador na proteção conferida pela cláusula.
Nesse sentido, a Suprema Corte francesa, em decisão de 19 de setembro de 1989, considerou ilícita uma cláusula de não concorrência por entender que, em razão das funções do empregado, essa cláusula não era indispensável à proteção dos interesses legítimos da empresa.Varias decisões da Corte de Cassação trilharam o mesmo caminho, pelo o fato de os empregados exercerem funções de motorista de ambulância, secretária-datilógrafa, dentre outras.[4]
Com certeza que, por conta disso, não se pode deixar o direito brasileiro fechar os olhos para a cláusula em questão haja vista que há empresas que dependem da manutenção de fórmulas em segredo, assim, conferem tratamento especial para os empregados que lidam diretamente com estas, visto que a eles esta se confiando o futuro dessas companhias.
São cada vez mais freqüentes os casos de vazamento de informações sigilosas de empresas por parte dos empregados. Sendo assim o empregador tem o interesse de manter intactos os segredos da companhia que dirige, não desejando transformar seus colaboradores em concorrentes perigosos.
Portanto entende-se que é lícita a cláusula em comento quando for especificamente de interesse efetivo da empresa e especialmente quando elabora para os trabalhadores de alta direção das companhias.
Razoabilidade das cláusulas de não concorrência
A pactuação entre empregado e empregador, com relação às cláusulas de não concorrência não pode ser fator de desequilíbrio das obrigações assumidas pelo assalariado e os interesses legítimos da empresa contratante.
Quando há desequilíbrio na estipulação da cláusula em voga tem-se que o seu cumprimento acaba por implicar ônus excessivo e injustificado ao empregado através de uma interdição absoluta e geral.
Dessa forma não há razoabilidade em tal cláusula e, portanto, eivada de nulidade. Do contrário, para que seja válida deve ser delimitado o tempo e o espaço do pacto para a restrição da concorrência.
È importante que a referida cláusula tenha caráter transitório, perdurando apenas o tempo necessário para que as informações consideradas protegidas percam o impacto de novidade e tornem-se obsoletas.
A delimitação geográfica do território onde se pretende a abstenção do empregado é igualmente importante que seja especificada na pactuação da cláusula de não concorrência.
Nota-se, portanto, que o critério da razoabilidade deve permear a conjunção dessas duas limitações, tempo de duração e espaço geográfico relativa ao contrato celebrado pelo empregado.
Liberdade de contratar
É de suma importância para que seja atribuída validade à cláusula de não concorrência a discussão a cerca de uma questão muito debatida em relação ao contrato de trabalho, é esta a autonomia da vontade e a liberdade de contratar.
Tendo vista que o direito que é essencialmente regulador das condutas humanas em sua função criadora de valores, entendendo-se esta como uma verdadeira responsabilidade social , cujo fim é de garantir a liberdade da vontade individual, não pode ser suprimida, mas, ao contrário, devem traçar-lhe os limites.
Nesse sentido, a vontade privada contida no direito do trabalho, tal como assegurar a integridade física do trabalhador (a exemplo das leis protecionistas contra a exploração excessiva da Revolução Industrial), e tanto quanto os esforços para superar o desequilíbrio econômico entre empregado e empregador, são limites que devem nortear a liberdade da vontade.
Nas palavras de Orlando Gomes[5] “ o princípio da autonomia da vontade particulariza-se no direito contratual na liberdade de contratar. Significa o poder dos indivíduos de suscita, mediante declaração de vontade, efeitos reconhecidos e tutelados pela ordem jurídica. No exercício desse poder, toda pessoa capaz tem aptidão para provocar o nascimento de um direito, ou para obrigar-se”.
O que não se pode deixar acontecer é que as limitações impostas pelas normas de proteção ao trabalho desvirtuem-se do seu foco original relacionado à responsabilidade social e como proteção à livre manifestação da vontade das partes segundo o art. 444 da Consolidação das Leis do Trabalho, passando a servirem como proibição à criação de regras que convenham às partes.
Especificamente com relação às cláusulas de não concorrência, importante é identificar que é efetivamente livre e soberana, não se encontrando eivada de vício que comprometa sua validade.
Assim para que seja invalida, deve ser demonstrada a existência de erro, dolo ou coação na pactuação da cláusula em análise, segundo orientação jurisprudencial n. 160 da SDI-I do Tribunal Superior do Trabalho.
Da cláusula em si e seu objeto:
Contrato de trabalho em geral trata de obrigação de fazer, no entanto existem casos em que a obrigação é de não fazer como por exemplo a de não revelar segredos da empresa não causar danos intencionais ao empregador e, ainda, não praticar contra estes atos de concorrência.
A princípio cabe ressaltar que a cláusula de não concorrência tem como característica a obrigação de não fazer, uma obrigação negativa encarada como uma abstenção.
Importante far-se-á destacar a distinção entre objeto da obrigação e o objeto de proteção dentro dessa obrigação de não fazer.
Nesse sentido tem-se que o objetivo da obrigação inserida na cláusula de não concorrência é a restrição transitória da liberdade de o ex-empregado ativar-se, por conta própria ou alheia, em determinada região geográfica em funções iguais ou semelhantes àquelas exercidas durante o contrato de trabalho para o antigo empregador e que implique concorrência a este.
Já com relação ao objeto de proteção àquele que é visto por alguns autores como o verdadeiro objeto da obrigação de não concorrência é de preservar o empregador da concorrência inoportuna, isto é, quando o empregado tirando proveito de todos aqueles elementos imateriais que não sendo ou não podendo ser objeto de proteção legal direta, como por exemplo o nome, a marca, etc, carecem de proteção contratual nestes pactos.
Agora, em se tratando da eficácia da obrigação de não concorrência, deve retratar que a importância da obrigação depende evidentemente de elementos fornecidos pelo contrato de trabalho e pela convenção coletiva no que diz respeito às atividades proibidas, ao tempo de proibição, aos lugares onde a concorrência não pode ser exercida, aos eventos que dão origem àquela obrigação.
Dos efeitos para terceiros
Cabe ressaltar que, os efeitos da obrigação de não concorrência também abrangem terceiros alheios ao contrato de trabalho.
Entende-se, que os efeitos de obrigação resultante de uma clausula inserida em um contrato de trabalho, distancia-se em certa medida no aspecto contratual para atingir terceiros, estranhos à convenção, mais que estarão se relacionando com o trabalhador posteriormente à ruptura contratual que o vinculava ao empregador credor da obrigação de não concorrência.
Isso ocorre, porque as pessoas acabam por se envolver com intuito de obter alguma vantagem da violação do trabalhador em relação a sua obrigação de não concorrência; trata-se essencialmente do novo empregador, mais também do sócio da sociedade criada com, ou pelo antigo empregado.
Nota-se, portanto, que a obrigação assumida pelo trabalhador, em relação ao seu antigo patrão deve ser respeitada pelo eventual novo empregador. O que se é exigido desse novo chefe é que se abstenha de todo ato suscetível que possa auxiliar o empregado á violar o compromisso.
Caso o dever - Lê-se responsabilidade, do novo empregador não for respeitado, aja violação do trabalhador com relação à sua obrigação de não concorrência surge então, um novo problema: como punir o desrespeito da obrigação ora em estudo.
As sanções que esta sujeito o novo empregador só poderá lhe ser atribuída, caso ele não ignorasse a existência da obrigação de não concorrência a que esta vinculado o empregado contratado.
Contudo, havendo conhecimento da proibição não concorrência por parte do novo empregador, a responsabilidade dele é a responsabilidade delituosa do terceiro cúmplice da violação de uma obrigação contratual. Não é o caso de distinguir quanto ao momento em que o novo empregador tomou conhecimento da proibição de não concorrência, ou seja, se antes da admissão ou após, sendo que neste último caso ele poderá ser condenado a indenizar as perdas ao primeiro empregador se não terminar com o contrato de trabalho assim que informado da cláusula de não concorrência.
Segundo Arion Sayon Romita a violação de obrigação de não concorrência pode gerar a responsabilidade do empregado do novo empregador; ela não implica, no entanto, na nulidade do contrato de trabalho celebrado entre ambos.
Das indenizações
São duas as formas de compensação econômica com relação à clausula de não concorrência; ou o ex- empregador compensa o ex-empregado, em virtude de sua abstenção laboral, ou então, o ex-empregado, compensa economicamente o ex-empregador, tendo em vista a violação do pactuado.
Em caso de pagamento efetuado pelo ex-empregador, ao ex-empregado a principal questão que se apresenta e quanto à natureza jurídica do pagamento efetuado ao ex-empregado.
A corrente majoritária da doutrina é o de que esse pagamento não pode ser considerado salário.
Isso porque só pode ser considerado juridicamente salário a remuneração paga pelo empregador, como contraprestação do trabalho realizado pelo empregado.
A critica que se faz á esse entendimento é que o período para o qual se exclui a possibilidade de concorrência é tempo á deposição do empregador justificando a natureza jurídica salarial do valor a ser pago.
A fim de por um ponto final na questão, será citado Orlando Gomes, ‘’só há salário quando há trabalho’’[1].
O salário distingue da indenização no direito trabalhista brasileiro: o salário pressupõe sempre o trabalho em ato. A indenização, nem sempre. A indenização pressupõe também que o trabalho não seja ou não possa ser prestado.
A compensação econômica decorrente de pacto de não concorrência pode ser considerada indenização.
A indenização corresponde ao ato de fazer cessar o prejuízo causado a alguém e que deve ser suportado pelo causador, podendo ainda ser entendido como equivalente pecuniário do dever de ressarcir prejuízo.
Na hipótese do pacto de não correspondência, o prejuízo que se verifica é a redução da liberdade de estabelecimento, ou ainda a redução da liberdade de estabelecer relação de emprego ou de trabalho, limitação esta caracterizada pela exclusão da possibilidade de concorrência ao ex-empregador.
Já com relação à outra forma de compensação econômica, aquele do valor pago pelo ex-empregado ao ex-empregador ocorre em caso de descumprimento da obrigação de não concorrência assumida.
Parte dos doutrinadores nacionais refere-se a esse valor como multa, enquanto considerada esta como sanção pecuniária.
No entanto, a adoção de multa no direito do trabalho brasileiro é amplamente repudiada, tendo como justificativas para a sua não autorização no direito do trabalho, no fato de que se entende, que a multa é um desconto, ou redução salarial.
A legislação trabalhista contempla expressamente uma forma de um antigo pregador ressarcir-se dos eventuais prejuízos causados pela violação do pacto de não concorrência por ex-empregados.
Assim, entendemos que o § 1° do art. 462 da consolidação das leis do trabalho é o verdadeiro fundamento da natureza jurídica da verba devida pelo ex-empregado ao ex-empregador em caso de violação à obrigação contratual de não concorrência.
O valor estipulado neste caso constitui mais uma reparação dos prejuízos ao ex-empregador que propriamente uma sanção. O direito do trabalho brasileiro condena a aplicação de multa, permitindo, contudo, a previsão contratual de indenização por danos (art. 462, § 1º, da CLT).
CONCLUSÃO
Atos que caracterizam concorrência durante a vigência do contrato de trabalho, resultam na rescisão motivada do contrato de trabalho, por determinação expressa da CLT ( art. 482,c), haja vista que o empregado tem o dever legal de lealdade a seu empregador.
As cláusulas restritivas de liberdade de trabalho são ferramentas eficazes para evitar a revelação ou utilização não autorizada pelo ex-empregado de informações confidenciais.
Ocorre que não há tratamento específico, no sistema normativo, para a cláusula da não concorrência após a extinção do contrato de trabalho. Tornando importante agora analisar se essa lacuna legal consiste em impeditivo à validade desses pactos.
Nesse aspecto o art. 444 da Consolidação das Leis do trabalho admite a livre estipulação do objeto das relações contratuais trabalhistas contanto que não contrarie as disposições de proteção ao trabalho.
No direito brasileiro não existe proibição para a cláusula de não concorrência após findado o contrato de trabalho. Desta forma, não se deveria admitir que a ausência de disposição expressa implicaria em vedação a cláusula de não concorrência, pois que colidiria com a garantia constitucional de que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei, além desse, o dispositivo no art. 122 do CC de 2002, que define como lícita todas as condições que a lei expressamente não vedar.
O art. 8º da CLT determina como fonte do direito do trabalho o direito comparado. Em sendo assim a França torna-se grande exemplo para o Brasil, haja vista que a ausência de lei sobre cláusulas de não concorrência não constitui fator impeditivo à validade dessas cláusulas.
Existem requisitos essenciais, entre eles legítimo interesse do empregador, limitação de tempo e de espaço geográfico onde não produzirá efeitos , e alternativa ao trabalhador de exercer a sua profissão.
Importante far-se-á destacar que os requisitos devem ser apreciados segundo critério de razoabilidade, de maneira que a proteção garantida não corresponda ônus demasiado ao trabalhador e sua família.
Não se pode deixar de mencionar a importância da exeqüibilidade do pacto de não concorrência. Sendo necessário, que seja proporcionado às partes, mecanismos que tornem exeqüível aquilo que for pactuado.
Outro ponto relevante do nosso estudo refere-se à competência da matéria em análise. Sendo que esta deve ser apreciada segundo o teor do art. 114 da Constituição Federal, tendo em vista que a origem da estipulação da cláusula de não concorrência é o contrato de trabalho; e conseqüentemente é a justiça do trabalho a competente para apreciar e julgar tais questões.
Por fim, cabe frisar que como o sistema tecnológico e informacional evolui imensuravelmente mais depressa que as Leis, a lacuna normativa poderia ser compensada pela negociação coletiva enquanto não seja regulamentada a matéria pelo legislador.
[1] GOMES, Orlando. O salário no direito Brasileiro. São Paulo:LTr, 1996. p. 24.
[1] REQUEIÃO, RUBENS, Curso de Direito do Trabalho 1º Volume, São Paulo, Saraiva, 2000, pág 253.
[2] GOMES, Orlando e GOTTSHALK,Élson “Curso de Direito do Trabalho”, Rio, Forense, 1998, pág 385.
[3] MEIRELES, Edilton. Abuso do Direito na Relação de emprego, Ed. LOTr, 2005, pág. 139
[4] MELLO Teresinha, Regiane. Cláusula de não concorrência no Direito do Trabalho . São Paulo. Ed. Saraiva, 2003. p. 41
[5] GOMES, Orlando, Contratos, cit.,p.26.
[1] Drucker, Peter. Sociedade pós-capitalista. 6.ed. São Paulo: Pioneira, 1997.p.XVI e 143.