Guarda compartilhada e seu reflexo na prole

22/01/2015 às 21:42
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Análise da questão da compartilhada diante da nova legislação referente ao tema e a sua aplicação no caso concreto.

                                                                                 

Resumo

Este trabalho tem como objetivo apresentar as modalidades de guarda existentes no ordenamento jurídico pátrio, promovendo uma melhor análise do reflexo de uma das modalidades de guarda mais comentadas e que gera ainda muitas dúvidas para a sociedade em geral, que é a guarda compartilhada, muitas vezes confundida pelos leigos como guarda alternada. A guarda compartilhada deve ser vista pelo enfoque da prole para o seu melhor desenvolvimento psíquico e emocional, no sentido de se evitar que disputas, ressentimentos e mal entendidos entre os pais sejam projetados muitas vezes de forma injusta nos filhos, sendo certo, que se acredita que este modelo de guarda, que é a regra no Brasil, independentemente do bom convívio entre os pais possa e deva ser aplicada pelo Poder Judiciário independentemente do consenso entre os pais, sempre buscando o melhor interesse da criança, que é ter ambos os pais com interesse legítimo em seu desenvolvimento emocional e psíquico saudável.

Palavras-chave: Guarda. Modalidades. Compartilhamento

  1. Introdução

Como se tem conhecimento, a melhor maneira de desenvolvimento intelectual e emocional de uma criança se dá com a harmonia de entendimento e amor dos seus pais, que são a sua primeira referência social.

         Todavia, cada vez mais se torna frequente a existência de famílias multifacetadas, sendo que se antes, se via um lar formado entre pais e filhos, sem se fazer juízo de valor da saúde emocional deste lar; com a Constituição Federal de 1988 se verifica em seu artigo 226, o reconhecimento de que a família pode ser composta por qualquer um dos pais e a sua prole, texto este que amplia juridicamente a visão do que se entende por família.

Objetivando a análise da família exclusivamente sob o ponto de vista da prole e seus pais, ou seja, do núcleo familiar, sem enveredar para a questão da família extensa (avós, tios, familiares em geral), importante se faz dispor que se antes entendia que para uma criança o melhor seria crescer e se desenvolver num lar com os seus pais. Hoje, o que realmente se observa é a necessidade de se vislumbrar que independentemente dos pais se encontrarem sob o mesmo teto, o que importa é a capacidade destes de transcenderem as suas questões pessoais de um relacionamento frustrado e, focarem juntos no bem estar da prole.

Assim, tem-se que com a inexistência ou perpetuidade de um relacionamento conjugal entre os pais, surge a figura da guarda da prole, que, nada mais significa de acordo com o artigo 33, do Estatuto da Criança e do Adolescente (“ECA”) o dever de assistência educacional, material e moral, garantindo-lhe a sobrevivência física e o desenvolvimento psíquico.

A guarda que é o dever jurídico dos responsáveis pelas necessidades e bem estar da prole pode ser promovida de diversas formas, entre os pais, avós, tios e terceiros, sendo que a regra hoje, ou melhor, desde o ano de 2008, é da modalidade de guarda compartilhada, a qual é vista como a melhor maneira para atender as necessidades dos menores, sendo que todos aqueles envolvidos, juízes, promotores, advogados, equipe multidisciplinar, partes, devem envidar os melhores esforços com o único intuito, qual seja, o bem estar daqueles que em fase de desenvolvimento precisam de muita atenção, cuidado e amor dos que o cercam.

  1. Da guarda

O ECA traz em seu espirito legislativo o direito de proteção integral da criança, sendo que esta proteção é obrigação da sociedade como um todo. Porém, o primeiro contato social de uma criança se dá em seu núcleo familiar, este que num primeiro momento tem o dever de proteção, promoção do desenvolvimento físico, psíquico e emocional da criança.

Quando os pais convivem sobre o mesmo teto o desenvolvimento da guarda se dá de forma natural, considerando que a autoridade sobre a prole e exercida de forma concomitante entre ambos, sendo que nem se cogita em se falar sobre guarda.

Porém, ocorre a individualização da guarda, quando ocorre a separação de fato ou legal dos pais ou também quando a prole é reconhecida por ambos os pais, mas estes residem em casas diferentes, sendo que nestas condições é que se começa a questão em si sobre a guarda, o poder-dever dos pais sobre os filhos, sendo importante dispor, que a guarda diz respeito a filhos menores e/ou incapazes apenas.

O instituto da guarda é em si uma relação de poder-dever dos pais relativamente ao menor, tendo aqueles o dever e a responsabilidade pelo desenvolvimento saudável, sob todos os ângulos, com relação a este, sendo certo que o estabelecimento da guarda se dá de acordo com quem tem melhores condições financeiras, afetivas, morais e educacionais.

O guardião pode ser qualquer pessoa, pais, avós, terceiros, mas, iremos sintetizar e olhar neste trabalho, a guarda sob o aspecto exclusivamente dos pais, que não convivem sob o mesmo teto, seja qual for a razão, separação de fato, separação legal/divórcio ou simplesmente uma produção independente.

A Lei nº 6.515/77 (“Lei do Divórcio”) disciplinou a guarda dos filhos em seus artigos 9º a 16, derrogando os artigos 1.583 a 1.590 do Código Civil de 1916. O Código Civil de 2002, por sua vez, teve os artigos 1.583 e 1.584 alterados pela Lei nº 11.698/08, que introduziu a guarda compartilhada como regra no ordenamento jurídico.

Todavia, por razões diversas à ausência de disciplinamento legal, no ano de 2014, foi promulgada uma nova lei reforçando a guarda compartilhada, como a espécie de guarda conjunta, que seria regra no Brasil, sendo esta a Lei nº 13.058/2014, a qual alterou os artigos 1.583, 1.584, 1.585 e 1.634, todos do Código Civil vigente.

Na prática, esta lei pouco alterará o que já vinha sendo aplicado pelos Tribunais, com a exceção de um ou outro magistrado, a guarda compartilhada vem sendo aplicada como a melhor forma de desenvolvimento da criança e o seu convívio mais direto com ambos os genitores.

  1. Das modalidades de guarda

No ordenamento jurídico brasileiro, há 02 (duas) modalidades de guarda, quais sejam, guarda unilateral/única e guarda conjunta.

A guarda unilateral é exercida por uma única pessoa, excluindo a outra de qualquer decisão acerca da vida e das necessidades da prole, sendo que dentro desta modalidade de guarda, há 03 (três) espécies, guarda exclusiva, guarda alternada e guarda nidal ou de aninhamento.

Pois bem. A guarda unilateral exclusiva, se refere à prática da guarda material/física e jurídica da prole em favor de uma única pessoa, literalmente, a posse do menor por um, excluindo o outro de qualquer decisão, por isso se diz que o guardião neste espécie de guarda tem o poder de imediatidade, por exemplo, escolha do médico, realização da matrícula na escola. Aquele que não detém a guarda, terá o direito a visitas e de supervisionar/fiscalizar a guarda do outro.

Importante se faz ressaltar, que o não guardião muitas vezes entende pela busca de como seu dinheiro é utilizado para o menor, sendo certo, que os Tribunais repudiam a possibilidade de propositura de ação de prestação de contas em alimentos, por conta do poder de imediatidade do guardião.

Já, a guarda alternada, reiteradamente criticada pelos especialistas na área, pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário, e, portanto, de baixíssima aplicabilidade no Brasil, é exercida de forma a ser promovida uma alternância fixa de períodos entre os genitores e, normalmente, períodos grandes, como meses; a criança se torna um turista literalmente, indo de uma casa para outra em determinados lapsos temporais, perdendo muitas vezes a referência de lar e de autoridade, pois os pais tem costumes e vidas diferentes, em sua grande parte.

Por última espécie de guarda unilateral, que é uma variável da guarda alternada, se tem a guarda nidal, de nidação ou de aninhamento, na qual a criança remanesce numa casa fixa e quem alterna são os pais, sendo que o reflexo sobre a saúde psíquica e emocional da criança é exatamente o mesmo da guarda alternada, ou seja, perda de referência para a prole.

Mas, hoje pela novel legislação há apenas 02 (duas) espécies de guarda, exclusiva ou compartilhada, as demais não terão mais aplicabilidade no ordenamento jurídico pátrio.

A outra modalidade de guarda existente, como acima mencionado, é a guarda conjunta, que se subdivide em 02 (duas) espécies, guarda simultânea e guarda compartilhada.

A guarda simultânea é a exercida por ambos os pais, quando se encontram morando sob o mesmo teto, ou seja, na constância do casamento ou da união estável.

Já, a guarda compartilhada, é aquela que é exercida por ambos os pais, que não residem sob o mesmo teto, sendo uma forma de minimizar os efeitos nefastos da disputa entre os pais, que muitas vezes se utilizam da prole como moeda de troca com o outro, uma forma de aprisionamento ou atingimento do outro, sem o mínimo interesse com relação à criança em si, restando esta em segundo plano, quando, na verdade, deveria ser o primeiro e totalmente independente do relacionamento frustrado dos seus pais.

Nesta última espécie de guarda, a custódia material/física da prole remanesce com um dos pais; já a guarda jurídica é de ambos os pais, sendo que estes em conjunto deverão em comum acordo reger a vida da prole, participando das atividades cotidianas do menor, bem como aquele que detém a guarda física da prole tem o dever de consultar o outro, não havendo subserviência daquele que não tem a guarda física, sendo de acordo com o Prof. Nelson Sussumu Shikicima[2] um sistema de co-responsabilização entre os pais compartilhamento de deveres (escolha de escola, médico, plano de saúde, curso extracurricular).

Conforme já mencionado anteriormente, a guarda compartilhada é a regra legal desde o ano de 2008, no Brasil, quando os pais não residem sob o mesmo teto, sendo importante mencionar, que qualquer das modalidades de guarda, haverá necessariamente a chancela judicial, após a oitiva do Ministério Público, considerando a vulnerabilidade do direito/interesse envolvido.

Todavia, qualquer que seja a espécie de guarda prevista em lei, acordada entre os pais ou a estes imposta pelo Poder Judiciário, nenhuma surtirá o efeito necessário em favor da criança, quando não houver entre os pais a consciência de sua responsabilidade com relação ao bem estar dos filhos, deixando de lado suas rusgas pessoais, mágoas, tudo em favor do bem maior, fruto daquele relacionamento, seja por acordo, seja por imposição, estes deverão conseguir se relacionar e ver a nova vida sob outra ótica.

Por isso, alguns doutrinadores, dispõem que a guarda unilateral teria um efeito pior para a prole do que a guarda compartilhada, mesmo havendo litigiosidade entre os pais, pois que na primeira modalidade, o distanciamento dos pais será patente e o que detém a guarda agirá de forma independente, resolvendo a vida da criança de forma totalmente independente, deixando de introduzir o outro no quotidiano, sendo a mesma postura, muitas vezes adotada por quem não detém a guarda, se distanciando naturalmente, o que buscaria ser evitado com a guarda compartilhada.

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  1. Da guarda compartilhada

O cerne deste trabalho é a análise da modalidade conjunta de guarda, que é a guarda compartilhada e o seu reflexo na prole.

Pois bem. Conforme mencionado, a guarda compartilhada foi introduzida no ordenamento através da Lei nº 11.698/08, que alterou os artigos 1.583 a 1.590, todos do Código Civil 2002. Porém, antes mesmo desta alteração legal, esta espécie de guarda já vinha sendo vista com bons olhos pelos Tribunais pátrios e também pela doutrina, diante do que já vinha preceituado no Código Civil em se artigo 1.634, antes mesmo da alteração legislativa de 2014, no sentido de que seria atribuição de ambos os pais a direção da criação e da educação dos filhos, bem como de tê-los em sua companhia.

Muitos confundem a guarda compartilhada com a guarda alternada, sendo que, conforme já exposto neste trabalho, são modalidades distintas e que não se confundem minimamente, até porque, na guarda compartilhada não há a alternância de lares pelo menor, sendo estabelecido um domicílio fixo a este, sendo que alternância de casa é repudiada pelos profissionais da área, por não ser saudável para a criança, o que é totalmente diferente para a guarda compartilhada, em que se busca esta saúde psíquica e emocional.

Como se sabe, por anos e anos, a aplicação da guarda unilateral foi o caminho mais fácil para os pais, os quais em sua grande maioria, ao se divorciarem, se separarem de fato ou legalmente, entendiam por estabelecer guarda unilateral e corriqueiramente em favor da mãe, seja por comodismo, costumes, seja por realmente entenderem ser uma decorrência natural, diante da gestação.

Todavia, os tempos se modernizaram e com eles a forma de ver a família, sendo que o que antes era algo chamado natural, passou a não ser mais, principalmente, porque aquele que não detinha a guarda material da prole, se limitando a visitas e ao pagamento de pensão alimentícia, passou a ver a necessidade de uma maior ingerência na vida de sua prole, afinal, o natural é que o poder familiar remanesceria independentemente da moradia sob o mesmo teto.

Existe ex-marido, ex-mulher, ex-companheiros, mas não existe ex-pai, ex-mãe, o vínculo familiar com a prole remanesce, independentemente da questão física/material, sendo que as responsabilidades e os deveres também, de forma que a prole deve estar totalmente dissociada de um relacionamento fracassado, muito menos ser utilizada como barganha ou forma de atingir o outro, pois os equívocos, incongruências dos pais não podem e nem deve atingir a criança.

Passou-se, portanto, a se observar que seria saudável para a criança ter ambos os pais regendo a sua vida, o seu cotidiano, como aconteceria se morassem sob o mesmo teto, não resumindo ao que não detenha a guarda material/física, o singelo papel de visitante e pagador de pensão alimentícia, o que retiraria da criança a possibilidade de referência da figura daquele que não se encontra com sua guarda física, sendo que de acordo com a Profª. Maria Helena Diniz, a guarda conjunta não é na verdade guarda, mas o exercício comum do poder familiar.

De acordo com Maria Berenice Dias, a guarda compartilhada é uma garantia para a criança de que terá os pais mais presentes em sua vida, do que teria com uma a guarda unilateral, cujo distanciamento daquele que não detém a guarda seria natural, “in verbis”:

Compartilhar a guarda de um filho se refere muito mais à garantia de que ele terá pais igualmente engajados no atendimento aos deveres inerentes ao poder familiar, bem como aos direitos que tal poder lhes confere. Segundo Maria Antonieta Pisano Motta, a guarda compartilhada deve ser tomada, antes de tudo, como uma postura, como o reflexo de uma mentalidade, segundo a qual pai e mãe são igualmente importantes para os filhos de qualquer idade e, portanto, essas relações dever ser preservadas para a garantia de que o adequado desenvolvimento fisiopsíquico das crianças ou adolescentes venha a o ocorrer. (DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5ªed. São Paulo: Revista dos Tribunais.2009. p. 403)

Com o entendimento pela saúde emocional e psíquica da aplicação da guarda compartilhada à prole, vieram outras questões, tais como, a dispensa do pagamento de pensão alimentícia, a ausência de regulamentação de visitas, bem como a necessidade de consenso entre os pais, a fim de que consigam exercer esta espécie de guarda.

No que se refere ao pagamento de pensão alimentícia, assim que a Lei nº 11.698/08 entrou em vigor, aquele, que deixou o lar conjugal ou que simplesmente não detinha a custódia física, viu na guarda compartilhada a possibilidade de se ver dispensado do pagamento de pensão alimentícia, o que é uma premissa falsa, uma vez que na guarda compartilhada, há o estabelecimento do domicílio para o menor com um dos pais, ou seja, o estabelecimento da  guarda material/física, remanesce o mesmo, com um dos pais, o que modifica é o estabelecimento da guarda jurídica, que ficará com ambos os pais.

Portanto, o dever de alimentos por aquele que não detém a guarda material do menor remanesce o mesmo, inalterado, considerando que os gastos do menor remanescerão sendo realizados por aquele que detém a guarda física/material, devendo ser auxiliado pelo outro que não a detém, sob pena de uma oneração despropositada e injusta, até porque nem sempre os genitores gozam das mesmas condições financeiras, sendo que aquele que detém maior condição financeira, deverá auxiliar no sustento na proporção de sua condição financeira.

De acordo com o Professor Nelson Sussumu Shikicima[3] a nova legislação pode ser vista como um precedente com a possibilidade de prestação de contas na nova redação do artigo 1.583, §5º, do CC:

§ 5º  A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos.”

Já, no que se refere ao regime de visitas, na guarda compartilhada não existe, pois em guarda compartilhada há regime de convívio e não de visitas, devendo de acordo com a nova lei haver uma divisão equilibrada entre os pais, devendo os pais terem em suas casas tudo em duplicidade, pois a criança vai para uma casa e outra, de forma equilibrada, devendo ter as mesmas coisas para não ficar com uma mochila para cima e para baixo e resvalar no efeito nefasto da então guarda alternada outrora mencionado.

O regime de convívio é muito mais que um simples regime de visitas, considerando que o não guardião, não aparecerá simplesmente a cada 15 (quinze) dias para visitar a prole, mas sim, participará ativamente da vida dos filhos, levando ou pegando na escola, decidindo médicos, dentistas, participando de reuniões escolares etc.

Até porque com a guarda compartilhada há uma interação maior de ambos os pais, uma vez que ambos serão os guardiões, com responsabilidade conjunta pelo bem estar da prole, participando de forma equilibrada, ou seja, responsabilidade partilhada.

Apesar da fixação de uma casa para o menor, diante da necessidade de referência deste para a sociedade, o regime de convivência é de livre disposição entre os pais, no sentido de que ambos possam de forma equânime interagir com a prole e participar de forma ativa e efetiva de sua vida, se não quando tinham guarda simultânea, mas pelo menos muito próximo disso.

Nesse diapasão, se faz relevante transcrever o quanto lecionado pelo Prof. Carlos Roberto Gonçalves, “(...) na guarda compartilhada, a criança tem o referencial de uma casa principal, na qual vive com um dos genitores, ficando a critério dos pais planejar a convivência em suas rotinas quotidianas e, obviamente, facultando-se as visitas a qualquer tempo (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 7ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 6, p. 234).

Portanto, com a guarda compartilhada, mudou o cerne da questão da guarda, deixando de atribuir apenas para um a responsabilidade integral pela prole, cabendo àquele  que não detém a guarda física apenas o direito à visita e ao pagamento de pensão, pois que este passará a interagir mais com o dia-a-dia da criança, ter o dever de decidir em conjunto as questões mais banais e as mais complexas com aquele que detém a guarda material, ou seja, terá a guarda jurídica conjunta da prole, que é muito importante, até mais, que a simples posse física.

Diante desta necessidade de maior proximidade entre os pais, no sentido de conversarem e decidirem em conjunto o que seria melhor para os filhos, muitos doutrinadores e até mesmo julgadores entendiam pela inviabilidade da guarda compartilhada entre pessoas em litígio, por não terem condições mínimas de contato, muito menos para decidirem sobre a vida dos filhos.

Todavia, há reiterados estudos psicológicos dispondo de forma divergente, no sentido de que independentemente de um bom convívio entre os pais, a guarda compartilhada é viável e saudável para a prole, sendo que, os pais acabam sendo forçados a engolir os ressentimentos e as mágoas, para o bem estar da prole.

Dentre as pessoas que assim pensam, está o grande familiarista, Professor Rolf Madaleno, que entende pela necessidade pelo bom convívio entre os pais, para a fixação da guarda compartilhada, mas até o referido doutrinador mitigou este seu pensamento, diante da necessidade de verificar esta guarda sob o ponto de vista do menor, texto este citado no v. acórdão de lavra da Ministra Nancy Andrighi, RESP nº 1.251.000/MG, “in verbis”:

“Talvez tenhamos que começar olhar com mais atenção para os países de sangue frio, nos quais a guarda compartilhada é imposta independentemente da resistência ou contrariedade da concordância do outro genitor, no comum das vezes representado pela mãe, que vê no pai inimigo e coloca toda sorte de obstáculos para o estabelecimento de uma custódia repartida da prole. A continuidade do convívio da criança com ambos os pais é indispensável para o saudável desenvolvimento psicoemocional da criança, constituindo-se a guarda responsável em um direto fundamental dos filhos menores e incapazes, que não poderão ficar ao livre, insano e injustificado arbítrio de pais disfuncionais. A súbita e indesejada perda do convívio com os filhos não pode depender exclusivamente da decisão ou do conforto psicológico do genitor guardião, deslembrado-se que qualquer modalidade de guarda tem como escopo o interesse dos filhos e não o conforto ou satisfação de um dos pais que fica com este poderoso poder de veto.

Talvez seja o momento de se recolher os bons exemplos de uma guarda compartilhada compulsória, para que as comece a vencer obstáculos resistências abusivas, muito próprias de alguma preconceituosa pobreza mental e moral, e ao impor judicialmente a custódia compartida, talvez a prática jurídica sirva pra que pais terminem com suas desavenças afetivas, usando os filhos como instrumento de sua desinteligências, ou que compensem de outra forma sua pobrezas emocionais, podendo ser adotadas medidas judiciais de controle prático do exercício efetivo da custódia compartilhada judicialmente imposta, como por exemplo, a determinação de periódicos estudos sociais, sob pena do descumprimento implicar reversão da guarda que então se transmuda em unilateral.” (MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 4ªed. Rio de Janeiro: Forense, 201. p. 435 apud voto da Ministra Nancy Andrighi no RESP nº 1.251.000/MG[4]) (destaque inserido)

A jurisprudência, por sua vez, apesar de vacilante até então, tem como substrato o bem estar da criança e observa que a fixação de uma guarda unilateral atenderia muito mais ao desejo dos pais do que do menor, de forma que a fixação da guarda compartilhada, seria uma forma de se impor aos pais o dever de urbanidade e convívio não por eles, mas pelos filhos, sendo este o parecer da Ministra Nancy Andrighi no RESP nº 1.251.000./MG, “in verbis”:

“Centrada nessas ponderações, concluo que o Tribunal de origem, quando manteve a sentença que fixou a guarda compartilhada, laborou com acerto, pois claramente interpretou os dispositivos legais todos por violados de forma sistemática e congruente com o princípio do melhor interesse da criança, afastando a necessidade de consenso entre os pais, para a sua implementação.”

Nesse diapasão, se observa que a novel legislação a respeito da guarda compartilhada veio em consonância com o entendimento já algumas vezes verificados nos Tribunais Pátrios, no sentido de que mesmo diante da ausência de consenso, deve o juiz aplicar a guarda compartilhada, “ipsis litteris”:                                         

Art.1.584.  ..................................................................

§ 2o  Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.

A doutrina traz algumas condições para a o estabelecimento da guarda compartilhada, que mesmo com o advento da legislação recente acerca do tema, serão certamente verificadas pelos juízes na hora de formar o livre convencimento motivado acerca da aptidão de ambos para o desempenho desta modalidade de guarda.

Pois bem. As condições para a fixação da guarda compartilhada são, de acordo com  a doutrina, de forma exemplificativa: (i) o consenso de ambos os pais, pois se um não quiser deter a guarda, não pode ser obrigado a isso; (ii) a residência dos pais ser próxima, como bairros e cidades vizinhas; (iii) os pais terem valores morais, éticos, profissionais afins de vida, de forma que não haja uma interferência gritante na vida dos menores, sendo que isso pode se vislumbrado apenas através de um estudo psicossocial, claro que a nova lei não será fácil de ser aplicada, tampouco, ser aplicada sem uma mínima análise de sua possibilidade para cada caso concreto.

O exame social deverá vislumbrar a possibilidade de cada um dos pais de manterem em favor da prole os quartos com as roupas e objetos utilizados por estes, no sentido de evitar que o menor tenha que se deslocar de uma casa para outra com os seus pertences, sendo que, muito se pode pensar que esta modalidade guarda beneficiará a classe média para alta apenas, sendo mais uma vez sufragado de uma classe menos favorecida os seus direitos.

Já, o exame psicológico será mais do que necessário, para se ter a ideia exata das condições morais e afetivas dos pais, bem como da prole para com eles, no sentido de que possa se ter a possibilidade de subsidiar a decisão que conceder a guarda compartilhada ou a negar.

O ECA, em seu artigo 129, inciso III, dispõe acerca da possibilidade do encaminhamento dos pais a tratamento psicológico ou psiquiátrico, que poderá e deverá ser utilizado nos casos de aplicação da guarda compartilhada, se necessário, para a verificação da aptidão dos pais, no sentido do exercício da guarda compartilhada, o que há também previsão no artigo 1.583, §5º, do CC.

Resta evidente da análise do artigo acima disposto, bem como dos artigos do Código Civil, que já existia legislação bastante versando acerca do tema referente à guarda compartilhada, sendo a nova legislação apenas um forma de enfatizar esta modalidade no país, como regra e aplicabilidade nos Tribunais pátrios.

  1. Conclusão

Da análise do quanto acima disposto, a guarda compartilhada foi escolhida como a espécie de guarda conjunta que melhor atenderia aos interesses dos filhos, independentemente dos pais, que deverão aprender a não mais utilizar as crianças como objeto de barganha e de troca, mas sim, como seres humanos cujos interesses devem ser respeitados e o devem ser de forma totalmente independente dos interesses daqueles que com suas mágoas, dores e, porque não, egoísmo, não conseguem assim vislumbrar.

A nova lei veio apenas para reforçar a previsão já contida no Código Civil, pois a guarda compartilhada existe no ordenamento jurídico pátrio desde o ano de 2008, mas talvez não tenha sido tanto utilizada até o presente momento, diante da belicosidade do povo brasileiros, cujas emoções à flor da pele põem em xeque a razão.

Todavia, se pensar na aplicação da guarda compartilhada como uma forma de proteção e bem estar da prole, faz com que os pais possam dar entrada a uma nova condição de vida, por meio da qual prevalecerá o mínimo de respeito e cordialidade, de forma que possam em conjunto decidir sobre o bem estar dos filhos.

Bibliografia

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5ªed. São Paulo: Revista dos Tribunais.2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil. 29ªed. São Paulo: Saraiva. 2014. v. 5.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 6.

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. São Paulo: Método, 2007, volume único.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 5ªed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 6.

TARTUCE, Flavio. Manual de Direito Civil. 4ªed. São Paulo: Método.2014. volume único.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 10ªed. São Paulo: Atlas.2010. v. 6.

WALD, Arnoldo; Fonseca, Priscila M. P. Corrêa. Direito Civil. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 5.


[1

[2] Aula disponibilizada no dia 19 de janeiro de 2015 no sítio na internet da Faculdade Legale (www.legale.com.br).

[3] Aula disponibilizada no dia 19 de janeiro de 2015 no sítio na internet da Faculdade Legale (www.legale.com.br).

[4] www.stj.jus.br

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Sobre a autora
Renata de Oliveira Silva

Advogada em São Paulo, formada Universidade Presbiteriana Mackenzie, pos graduada em Direito Societário pelo Insper. Membro efetivo da comissão de direito de família da oab/sp

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Este artigo foi elaborado como conclusão do curso de pós graduação em Direito Civil e Processo Civil da Faculdade Legale.

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