6. Princípios da extraoperabilidade e da conexão:aproximação.
O quadro adiante aproxima os princípios e tenta realçar a natureza dos efeitos de sua observância. Não pretende ser exaustivo, mas suscitar reflexões:
Princípio da Extraoperabilidade |
Princípio da Conexão |
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1. Destinatários |
Dirige-se aos tecnólogos. Dá diretrizes para o desenvolvimento do SEPAJ com uso das eConexões para cognição e aporte estrutural |
Agentes humanos: autoriza ou impõe o uso das conexões (conexão inquisitiva). Não distingue as eConexões. |
2. Escopo /validez |
Só o Direito é fonte de legitimidade. Reserva frente à tecnologia. |
Tecnologicamente possível é igual a juridicamente legítimo (o meio é mensagem). |
3. Posição frente ao Devido Processo Legal (DPL) |
O DPL é o limite intransponível. Preservação da diferenciação funcional do processo. Radicali- zação da noção de mundo dos autos. Cuidado com os riscos à autonomia processual. Processo na internet, conectado – sim! Mas com segurança e aderência jurídica máxima. Não há verdade na rede. |
Flexibilização do DPL. Des-diferenciação. Desconstrução de direitos fundamentais (contraditório, livre conven- cimento), da estrutura proces-sual (instrução/decisão - deformalização). Autos difusos (mundo dos autos e o google). Crença na verdade da rede. |
4. Como vê a tecnologia |
Instrumento a serviço do instru- mento: papel subinstrumental. Code is not law. |
Tecnologia autorizada a impor-se ao jurídico. Assunção e reforço do code is law (Lessig). |
5. Enfoque sistêmico amplo |
SEPAJ sob as restrições impostas aos humanos. Conexão seletiva. Preservação dos papéis. Introdu- ção de eSujeitos: consciência da mudança lógica do modal (probabilístico) para o formal (determinístico). |
Uso da conexão pelos humanos. Alteração de papéis (julgador inquisitivo). Alimentação inces-sante. Revisão das preclusões (inviabilização operacional/re-cursividade sem fim). Inestabi- lidade contínua. Rejeição da seletividade. |
6. Diferenciação sistêmica: condição de autonomia do processo |
Preocupação com a diferenciação. Fechar a via do SEPAJ para o ingresso de influências espúrias no âmbito processual. Atenção aos novos riscos à diferenciação. |
Esmaecimento da diferenciação: abrandamento de institutos promotores da diferenciação. Obrigação de inquisitividade do julgador. |
7. Autonomia sistêmica |
Submete o SEPAJ às regras severas da diferenciação para garantir a legitimidade do processo. Preservação de direitos fundamentais processuais. |
Atua no sentido da desdiferenciação do sistema processual: desmonte de esteios constitucionais do DPL. Permissão da surpresa. |
8. Acoplamento estrutural / Interpenetração |
Recomenda e autoriza. O SEPAJ pode constituir-se utilizando virtualmente estruturas dos sistemas do entorno (Add-ons, plugins, externalização funcional), controlando esse afluxo estrutural virtual (abertura estrutural). |
Foco apenas no contato informacional/cognitivo, pela via dos agentes humanos. Desconsideração do SEPAJ como agente de conexão (eConexão). Não abertura estrutural. |
Considerações Finais
O processo eletrônico representa a instalação do processo no ambiente virtual (internet) com o uso de um novo agente processual eletrônico, o eSujeito que o legislador chamou de Sistema Eletrônico de Processamento de Ações Judiciais (SEPAJ) e que a resolução CSJT 136 chama de sistema ou de Pje-JT.
O SEPAJ é um software e permite utilizar um novo tipo de conexão, a conexão tecnológica (eConexão), diferente da conexão que existiu no processo, até agora, mediada pelos sujeitos humanos (sistemas psíquicos). O processo, no ambiente virtual, pode ser mais ou menos plugado na rede, conforme o nível de acionamento das eConexões pelo SEPAJ.
Tecnologicamente, as eConexões podem ser utilizadas para plugar o processo sob as óticas informacional (abertura cognitiva) e estrutural. O Direito deve definir os níveis de conexão permitidos aos SEPAJ e se os rendimentos desejados são apenas informacionais ou também estruturais.
A história do processo demonstra a promoção continuada da diferenciação sistêmica do procedimento, para garantir autonomia e decisões legítimas. Conectar o processo ao mundo da internet envolve efetivas possibilidades de ganhos e também riscos que devem ser adequadamente ponderados pelos juristas para, por um lado, perseguir o aperfeiçoamento do método de adjudicação do direito – uma necessidade inquestionável – e, por outro, não permitir retrocessos.
O princípio da extraoperabilidade preconiza, como balizas da autorização de conexão do processo na internet (demais sistemas do mundo), o aperfeiçoamento da autonomia sistêmica (intercâmbio informacional ativo com máxima aderência ao jurídico) e a permissão de acoplamento estrutural (sistemas do entorno compondo virtualmente o SEPAJ). Aberturas informacional e estrutural, portanto.
As reflexões sobre o princípio da extraoperabilidade levantam uma miríade de conceitos interdisciplinares, inovadores, desafiadores e necessários para a rearticulação teórica da TGP. E o princípio estabelece uma pauta fundamentada para o desenvolvimento consistente, juridicamente sustentável, dos SEPAJ.
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