4 BASE DE CÁLCULO INCIDENTE SOBRE OS SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS
Além das questões apresentadas que já foram superadas, a outra problemática acerca do ISSQN cinge-se à definição de sua base de cálculo, que deve ser apurada em conformidade com o explicitado na Lei Complementar n. 116. Referido diploma legal revogou expressamente alguns dispositivos do Decreto-Lei n. 406, de 31 de dezembro de 1968 e do Decreto-Lei n. 834, de 8 de setembro de 1969 e também a Lei Complementar n. 22, de 9 de dezembro de 1974, a Lei n. 7.192, de 5 de junho de 1984, a Lei Complementar n. 56, de 15 de dezembro de 1987 e a Lei Complementar n. 100, de 22 de dezembro de 1999, que anteriormente disciplinavam o referido tributo. Entretanto, permaneceu em vigor o artigo 9º do Decreto Lei n. 406 que dispõe:
Art 9º A base de cálculo do impôsto é o preço do serviço.
§ 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o impôsto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho[33].
Desta forma, estabeleceu duas possibilidades para a base de cálculo do ISS: o preço do serviço ou alíquotas fixas ou variáveis quando da hipótese do §1º, mencionado. Diversas legislações municipais reconhecem a aplicabilidade do dispositivo legal citado acima mantendo redação muito semelhante àquela.
A tributação no momento inicial foi realizada considerando quantias fixas, contudo, ultimamente tem sido feitas alterações nas legislações municipais determinando que a apuração seja realizada em percentuais sobre os valores recebidos a título de emolumentos que “são a retribuição pecuniária por atos praticados pelo Notário e pelo Registrador, no âmbito de suas respectivas competências, e têm como fato gerador a prática de atos”[34] pelos tabeliães e registradores. Esta modificação culminou com o surgimento de demandas judiciais e a diversidade de decisões acarreta grande insegurança jurídica.
Algumas decisões se fundam em antigos posicionamentos, rebatidos por este estudo e inclusive já superados pela doutrina, conforme se verifica:
A prestação de serviços de registros públicos (cartorário e notarial) não se enquadra no regime especial previsto no art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei 406/68, pois, além de manifesta a finalidade lucrativa, não há a prestação de serviço sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, especialmente porque o art. 236 da CF/88 e a legislação que o regulamenta permitem a formação de uma estrutura economicamente organizada para a prestação do serviço de registro público, assemelhando-se ao próprio conceito de empresa[35].
Em sentido contrário, considerando que a base de cálculo do tributo não deve ser o preço do serviço, temos:
Desta forma, os Notários e Registradores fazem jus a regime especial de recolhimento do ISSQN, com alíquota fixa, e não em percentual sobre toda a importância recebida a título de remuneração pela totalidade do serviço prestado, evitando-se a sobrecarga tributária da categoria profissional em comento. Em suma, a base de cálculo do ISSQN sobre serviços notariais e de registros públicos não deve ser o preço do serviço (art. 7º, ‘caput’, da Lei Complementar n.º [116]/03), mas aquela estabelecida na forma do art. 9º, § 1º, do Decreto-lei n.º [406]/68[36].
E ainda,
APELAÇÃO AÇÃO DECLARATÓRIA - ISS. ISS incidente sobre prestação de serviços prestados por notários e oficiais de registro. Serviços delegados pelo Poder Público e exercidos em caráter privado. Sujeição ao imposto. Trabalho intelectual jurídico prestado em caráter pessoal, mesmo que com o auxílio de colaboradores, o que permite a aplicação do art. 9º, § 1º, do Decreto Lei nº 406/68 e o art. 287, parágrafo único, da Lei Complementar Municipal 224/08. Atividade que não é empresarial, mesmo quando há concorrência[37].
A natureza da atividade notarial e registral, de fato, já foi matéria bastante controvertida e isso gerou posicionamentos conflitantes. Entretanto, atualmente os tribunais têm se alinhado, e a mudança de posicionamento que foi elucidada demonstra evolução e decorre do crescente conhecimento acerca desta área.
5 CONCLUSÃO
A natureza jurídica da atividade desempenhada pelos notários e registradores é fruto de suas peculiaridades. Trata-se de múnus público exercido por particulares, que arcam com todas as responsabilidades pelo seu desenvolvimento, podendo para tanto, contratar auxiliares e escreventes em consonância com a legislação do trabalho.
Compete ao titular do serviço o seu gerenciamento, pessoalmente, sem possibilidade da criação de uma pessoa jurídica, que compreende desde a manutenção do local de funcionamento até os investimentos em tecnologia.
Prestam os oficiais um serviço e como tal, devem ser tributados pelo ISSQN, contudo, verifica-se que a subsunção perfeita ocorre com o §1º do artigo 9º do Decreto Lei n. 406, ainda em vigor, que considera sua base de cálculo, alíquotas fixas ou variáveis e não o preço do serviço.
Assim, em consonância com o exposto, verifica-se que é desnecessário fazer qualquer tipo de analogia entre a atividade notarial e registral e qualquer outra, vez que existe na legislação o enquadramento perfeito, que permite a tributação considerando alíquotas fixas, haja vista sua natureza e o trabalho a ser desenvolvido pessoalmente pelo próprio contribuinte, demonstrando por fim, ser tal forma de tributação é a mais adequada.
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