As duas ideias centrais do nosso movimento (fim da reeleição no executivo e fim do político profissional no legislativo) acabam de receber o apoio de vários senadores. São auspiciosas, embora demandem ajustes e discussões, as novas PECs nesse sentido. Lídice da Mata (PB-BA), com o apoio de outros 27 senadores, está propondo (PEC 32/2015) o fim da reeleição para todos os cargos executivos (presidente da República, governadores de estado e do Distrito Federal e prefeitos). Já a PEC 50/2015, assinada pela senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e outros 27 parlamentares, tem o propósito de acabar com o político profissional no âmbito do Poder Legislativo. Sua proposta restringe o número de reeleições dos parlamentares. O objetivo muito salutar, segundo a senadora, é evitar a profissionalização na política: "A atividade política se tornou uma carreira, em que muitos dos que nela ingressam não mais retornam para as suas atividades profissionais de origem", argumenta.
O Brasil necessita de muitas reformas (política, tributária, judicial etc.). Sem elas jamais elevaremos o status da nossa democracia meramente eleitoral para o patamar de uma democracia cidadã, que respeita seriamente os direitos políticos, civis e sociais. Já não basta apenas evitar o retrocesso aos regimes autoritários de exceção, que nos privaram (particularmente no âmbito da América Latina) das liberdades mais elementares para a consciência cidadã e democrática. O decisivo agora é o progresso: da democracia eleitoral (relativamente consolidada) temos que avançar para a democracia cidadã. Esse é um triunfo jamais conquistado em toda nossa história, marcada por uma férrea estrutura de poder que privilegia uma elite, deixando a maioria na insegurança, no desespero, na pobreza ou na miséria. Se em 1985 o horizonte utópico era a redemocratização, trinta anos depois tudo mudou. Os novos desafios passam pelo doloroso processo de efetivação real e até mesmo de ampliação dos direitos políticos, civis e sociais previstos na Constituição brasileira de 1988. Os fantasmas de outrora, apesar de algumas manifestações recentes, nitidamente minoritárias, radicais e reacionárias, praticamente desapareceram. A tarefa doravante é a de dar sustentabilidade para nossa organização política, começando pelo relevante questionamento a respeito da vinculação entre dinheiro, poder econômico, poder político e democracia.
O dinheiro (privado ou público) pode desvirtuar a vontade dos votantes e, desde logo, torna a competição eleitoral claramente desigual. Quem recebe altas somas de dinheiro ou quem já ocupa cargo público é enormemente favorecido no processo eleitoral (o que impede o nascimento de novas lideranças assim como a renovação das ideias e das ideologias). Os recursos públicos são utilizados para incrementar o clientelismo, promover acordos, otimizar a propaganda oficial, gerar inaugurações das obras públicas (inacabadas) ou o uso intensificado dos meios de comunicação, sem contar a colocação de toda máquina pública a serviço de um partido político (nisso consiste o aparelhamento do Estado). O edifício democrático pode ter seus pilares corroídos quando o eleito é concebido sob o império de um processo eleitoral desenganadamente viciado. Pior ainda quando essa mácula reside precisamente na corrupção, visto que, nesse caso, o que emerge é a criminalidade organizada (e, consequentemente, a cleptocracia: Estado cogovernado por ladrões). A esse vício de origem normalmente se agregam outros, como são o vício de exercício (dominado pelo dinheiro) e o vício de finalidade (não promoção dos direitos políticos, civis e sociais). Todos em conjunto afastam o governo eleito dos seus compromissos eleitorais (o que gera desconfiança na cidadania).
A PEC 50/2015 prevê para os senadores uma só reeleição e para os deputados e vereadores duas reeleições. Nesse ponto discordamos da proposta. Se queremos realmente o fim ao político profissional no âmbito legislativo, não se pode permitir a reeleição do senador (que já conta com mandato de 8 anos) nem tampouco mais que uma reeleição dos deputados e vereadores. Encerrado esse período (de 8 anos), impõe-se que o político retorne às suas atividades privadas, pelo menos por igual período, pois do contrário tornar-se-á um irreciclável para o mercado de trabalho ou para o exercício da sua profissão de origem. Quanto aos escassos políticos realmente relevantes para a República, nada impede que continuem sendo políticos orgânicos (dentro dos seus partidos), até que possam voltar a ser políticos institucionais (eleitos).
É preciso romper o vínculo nefasto entre o político e a dinheirama que circula (abundantemente) em torno da res pública, sob pena de se tornar irreversível sua adesão à corrupta-existência, o que significa (a partir daí) uma vida e uma carreira enlameada pela mais desbragada corrupção, sempre à espera de uma morosa e incerta decisão judicial definitiva que interrompa a trambicagem e a bandalheira que enodoam seu nome e sua reputação para toda eternidade.