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O boletim de ocorrência policial militar no mundo jurídico

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17/04/2017 às 10:10

Resumo:


  • O boletim de ocorrência policial militar é um ato administrativo informativo que formaliza a intervenção policial em fatos sociais com relevância jurídica, visando levar ao conhecimento das autoridades competentes.

  • A condução compulsória de vítimas ou testemunhas para a delegacia não possui respaldo legal, sendo a representação um ato que não pode ser realizado perante o policial militar, conforme o art. 38 do Código de Processo Penal.

  • Os policiais militares podem testemunhar em ocorrências que presenciaram, e seu testemunho possui o mesmo valor probante que o de qualquer outra testemunha, conforme jurisprudência dos tribunais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Apontamentos jurídicos sobre os envolvidos no BO

No procedimento de registro do boletim de ocorrência policial é de suma importância o delineamento normativo sobre os envolvidos. Durante as ações procedimentais o policial militar deverá conhecer a temática relativa à autoria, à vítima e a testemunha.

Conforme prescrito pelo Código de Processo Penal (CPP) o cidadão que transgredir qualquer tipo penal incriminador deverá sofrer a sanção do Estado. Este para fazer valer seu direito de punir dever seguir todo o devido processo legal, iniciando com os subsídios mínimos de autoria e materialidade por intermédio do Auto de Prisão em Flagrante, Termo Circunstanciado de Ocorrência ou Inquérito Policial. Perceptível à importância da identificação do autor do delito para o bom andamento da persecução criminal e penal.

O policial militar, durante atuação na condução dos procedimentos em ocorrências, deve circunstanciar os elementos que permitiram a identificação do autor. Ademais, deve discorrer sobre o conjunto fático que indicaram a materialidade do delito, permitindo a subsunção formal da ação livre e espontânea do agente infrator ao tipo incriminador. Na velha terminologia, precisa da justificativa jurídica (crime cometido) e da justificativa circunstancial (estado de flagrante delito, mandado de prisão em aberto ou fugitivo recapturado). A condução de pessoas na situação de detidos ao DPJ deve ser amparada em indícios mínimos de autoria e materialidade, assim como a conduta levada a efeito pelo suspeito deve possuir enquadramento tipificado como crime ou contravenção penal. Exceção para pessoa com mandado de prisão em aberto e recaptura de fugitivo do sistema prisional.

A prática de detenção para averiguação de suspeito não foi recepcionada pela Constituição de 1988. Caso o policial consulte os sistemas informatizados é não haja restrição criminal deverá liberar o abordado. Quando a dúvida for relativa à identificação, o artigo 5°, inciso LVIII, da Carta Maior, prevê: “o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”. A Lei n° 12.307/2009 balizou as questões atribuídas à possibilidade de identificação criminal.

Art. 3º  Embora apresentado documento de identificação, poderá ocorrer identificação criminal quando:

I – o documento apresentar rasura ou tiver indício de falsificação;

II – o documento apresentado for insuficiente para identificar cabalmente o indiciado;

III – o indiciado portar documentos de identidade distintos, com informações conflitantes entre si;

IV – a identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da autoridade policial, do Ministério Público ou da defesa;

V – constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações;

VI – o estado de conservação ou a distância temporal ou da localidade da expedição do documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais.

Na mesma análise, avaliando a justificativa jurídica para condução de pessoas detidas para o DPJ, urge esclarecer o impasse relativo ao flagrante delito do crime de desobediência nos casos de medida protetiva da Lei n° 11.340/2006 - Maria da Penha. Para consecução do objetivo trago a baila a decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

RECURSO ESPECIAL N° 1.374.653/MG (2013⁄0105718-0)

Relator: Ministro Sebastião Reis Júnior

EMENTA: PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME DEDESOBEDIÊNCIA. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA PREVISTA NA LEI MARIA DA PENHA. COMINAÇÃO DE PENA PECUNIÁRIA OU POSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA. INEXISTÊNCIA DE CRIME.

1. A previsão em lei de penalidade administrativa ou civil para a hipótese de desobediência a ordem legal afasta o crime previsto no art. [330] do Código Penal, salvo a ressalva expressa de cumulação (doutrina e jurisprudência).

2. Tendo sido cominada, com fulcro no art. 22§ 4º, da Lei n. 11.340⁄2006, sanção pecuniária para o caso de inexecução de medida protetiva de urgência, o descumprimento não enseja a prática do crime de desobediência.

3. Há exclusão do crime do art. [330] do Código Penal também em caso de previsão em lei de sanção de natureza processual penal (doutrina e jurisprudência). Dessa forma, se o caso admitir a decretação da prisão preventiva com base no art. 313III, do Código de Processo Penal, não há falar na prática do referido crime.

A referida decisão representa o atual posicionamento da jurisprudência e doutrina majoritária. Em caso de descumprimento de medida protetiva, deferida com fulcro na Lei n° 11.340/2006, não há justificativa jurídica para condução do transgressor ao DPJ. O policial deverá qualifica-lo, identificar a favorecida pela decisão judicial, arrolar as testemunhas e lavrar um boletim de ocorrência que será encaminhando ao Ministério Público para as providências cabíveis. Não há crime pelo descumprimento da ordem devido à previsão de outras sanções, porém existirá crime de desobediência à ordem do policial em manda-lo cumprir a imposição judicial. Exemplificando, a medida tenha previsão de afastamento de 200 metros da residência de sua esposa. Caso ele esteja em distância menor, policial irá determinar que ele obedeça a ordem. Não sendo acatada haverá a desobediência da ordem legal do policial.

Na rotina policial militar outro assunto tormentoso é o relativo ao alvará de soltura. Tal documento atesta a concessão da liberdade do cidadão com pendências criminais. Além disso, descreve as restrições espaciais ou cronológicas impostas ao beneficiado. A falta do porte do documento não configura justificativa jurídica para a condução do cidadão ao DPJ, pelo mesmo raciocínio do descumprimento da medida protetiva. O militar deverá consultar os sistemas informatizados para verificar a situação criminal. Caso o abordado alegue que possui alvará e no sistema conste “PRESO” ou “CUMPRINDO PENA” deverá ser conduzido a Delegacia. Na impossibilidade de verificação do alvará o policial deverá qualificar o envolvido e as testemunhas, narrar horário e local da abordagem e lavrar BO. Posteriormente será encaminhado ao Juiz da execução penal para medidas de praxe.

Nos casos em que o autor necessitar de internação para tratamento médico, antes da entrega física a polícia judiciária, a escolta será responsabilidade da polícia militar. O agente deverá deslocar até a delegacia e registrar todo o fato em BO.  A autoridade judiciária irá analisar o enquadramento, havendo a flagrante a PM deverá custodiar o detido até a entrega física do preso. Caso seja pago fiança o policial militar deverá exigir a presença de um policial civil e a apresentação da documentação necessária para liberação do escoltado. Anexar cópia no BO.

Outro aspecto que deve ser observado pelo comunicante do fato são os procedimentos atinentes ao uso da força em ocorrências policiais. O agente poderá utilizar da força de forma escalonada. Tal fato possui amparo na legítima defesa (art. 23 do CP). Não sendo caso de repelir a injusta agressão, mas apenas para quebrar resistência poderá usar dos meios necessários.  Assim previsto no CPP:

Art.292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.

O documento que, obrigatoriamente, deverá ser lavrado no caso de uso da força é o Auto de Resistência. Tal documento inibe a possibilidade de autuação em flagrante delito do agente que fez o uso da força. Não possuí modelo formal fixo, mas deve apresentar o conteúdo exigido na lei. Assim deve constar: a) qualificação do detido, do agente da prisão e de duas testemunhas. Cabe ressaltar que o policial que não participou diretamente da ação poderá ser testemunha; b) qual tipo de resistência perpetrada; c) qual tipo de força foi utilizada; d) descrever o armamento ou técnica utilizada; e) justificativa jurídica para voz de prisão; f) data, hora e local; g) constar número do BO registrado.

A utilização da força poderá deixar lesões. Conforme art.6°, inciso VII, do Código de Processo Penal, a autoridade de polícia judiciária poderá determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias. Competência procedimental do delegado, porém o policial militar deve circunstanciar no BO os fatos que justifiquem a realização do exame.

Na esteira da análise procedimental dos envolvidos no BO adentramos aos aspectos da vítima. Durante ocorrência policial, caso a vítima se recuse a deslocar até a delegacia, o militar poderá conduzi-la forçadamente? Para responder tal indagação é necessário esclarecermos alguns pontos.

O procedimento policial com a vítima possui estreita ligação com a ação penal. Na esfera conceitual Guilherme de Souza Nucci (2007, pag. 217) assim define o instituto em baila “ação penal é o direito de pleitear ao Poder Judiciário a aplicação da lei penal ao caso concreto, fazendo valer o poder punitivo do Estado em face do cometimento de uma infração penal”. O Código Penal divide a ação penal em pública o privada.

A ação penal pública subdivide-se em incondicionada e condicionada à representação. A primeira caracteriza-se por ser a promovida pelo Ministério Público sem que esta iniciativa dependa ou se subordine a nenhuma condição. Nesse tipo de ação o MP deverá promover a ação automaticamente, desde que possua os indícios mínimos de materialidade e autoria que tornam verossímil a acusação.

A ação penal pública condicionada, mesmo continuando o MP como responsável pela interposição, fica condicionada à representação do ofendido ou requisição do ministro da Justiça. Mirabete (2000, pag. 104) afirma “São crimes em que o interesse público fica em segundo plano, dado que a lesão atinge primacialmente o interesse privado”. Nesse caso para que o estado possa apurar a infração ele necessita da autorização do ofendido. Esta é conhecida juridicamente como representação. 

Na ação penal privada a titularidade da persecução criminal pertence ao particular ofendido. Já a ação penal privada subsidiária da pública (APPSP) só ocorre quando o Ministério Público não cumpre sua função, não oferecendo a denúncia no prazo legal (art. 100, §3º, do Código Penal e art. 29 do Código de Processo Penal). Não é objetivo do trabalho delinear todos os aspectos relativos a ação penal, mas apenas criar um subsidio mínimo para compreensão do tema.

Na ação penal pública incondicionada a não apresentação da vítima no DPJ não impedirá os procedimentos rotineiros. O conjunto probatório para a autuação em flagrante delito ficará prejudicado. Porém, dependendo das provas apresentadas no BO a autoridade policial poderá confeccionar o APF. Não possuindo provas robustas será instaurada portaria de inquérito. Durante tal procedimento, conforme art. 201, parágrafo 1°, do CPP, poderá ser conduzido coercitivamente à presença da autoridade. Assim, a condução compulsória da vítima não possui amparo na legislação. O policial militar deverá qualifica-la, circunstanciar os fatos e arrolar as testemunhas. A condução do autor é obrigatória.

Na ação penal pública condicionada a representação e na privada o não comparecimento da vítima incidirá na impossibilidade da continuidade do procedimento de apuração por falta da representação. Não cabe condução forçada. O militar deverá deter o autor, qualificar a vítima, arrolar testemunhas e circunstanciar os fatos. Registrar o boletim de ocorrência.

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Na atividade policial militar é habitual a seguinte pergunta durante atendimento de ocorrência: o senhor quer representar? O policial militar pode colher representação no local da ocorrência e circunstanciar no BO?

No entendimento de Ferando Capez (2010) a representação consiste em uma espécie de pedido-autorização por meio do qual o ofendido ou seu representante legal expressam o desejo de instauração da ação, autorizando a persecução penal. Assim previsto no CPP:

Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial. (Grifo nosso)

 A interpretação gramatical do dispositivo processual penal apresentado deixa claro que o instituto da representação deverá ser levado a efeito ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou a autoridade policial. A extensão do termo autoridade policial não veio delimitada em lei. A corrente majoritária, capitaneada por Mirabete (1998), entende que as autoridades policiais são as que exercem a função de polícia judiciária com o fim de apuração das infrações penais e da sua autoria (art. 4º, CPP). Compartilha desse entendimento Nucci (2007) entendendo que autoridade policial é apenas o delegado de polícia, estadual ou federal. Desse modo, o entendimento atual é que o termo autoridade policial, esculpido no texto do Código de Processo Penal, refere-se ao delegado de polícia. Decorre disso que a representação não poderá ser feita ao policial militar, pois não se enquadra no conceito de autoridade policial previsto no art. 39 do CPP.

Atualmente, devido à alta demanda para os órgãos policiais e falta de recursos humanos e logísticos, nos crimes de ação pública privada sem lesão ou risco a integridade física dos envolvidos, o policial militar circunstancia no corpo do BO a vontade da vítima de representar ou não. Cabe ressaltar que a vontade livre de não reapresentar não inibe registro do BO com todos os envolvidos e narração do fato, pois a vítima poderá representar no prazo de seis meses (art. 38 do CPP).

Ainda na seara procedimento de registro do BO, é importante, em breves linhas, evidenciar a questão relativa à condução de testemunhas ao DPJ. A celeuma está na negativa de comparecimento, por parte da testemunha, nos casos em que haja detido em flagrante.  Assim prevê o Código de Processo Penal:

Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto (Grifo nosso).

Para a consecução da oitiva das testemunhas, sem muito esforço cognitivo, impera a necessidade da condução das pessoas arroladas até o Departamento de Polícia Judiciária. Assim figura a dicotomia jurídica sobre a legalidade da condução forçada de testemunhas para a Delegacia pelos policiais militares. É notório que a condução compulsória da testemunha por policiais militares até o Departamento de Polícia Judiciária, na situação de flagrante delito, não se amolda ao conceito de condução coercitiva prevista no corpo o IP ou do processo penal. Desse modo, não é plausível justificar tal procedimentos com base nos dispositivos apresentados anteriormente. Para compreensão da temática é necessário realizar um corte metodológico e utilizar os aspectos legais da condução coercitiva como parâmetros de interpretação.

Os defensores da legalidade da condução alegam que o procedimento é conditio sine qua non para o cumprimento do disposto no art. 6 e 304 do Código de Processo Penal.  Amparam a interpretação na a mens legislatoris, ou seja, na vontade do legislador. Realizam uma hermenêutica extensiva da norma. A corrente contrária justifica a interpretação com base na a mens legis, ou seja, a vontade da lei.

Tomando por base todo o arcabouço teórico apresentado, a carga axiológica imposta pela Constituição de 1988, a nova vertente de ultima ratio do cerceamento do direito de ir e vir, a contemporânea realidade do garantismo jurídico e do princípio da legalidade, data vênia, o procedimento policial militar de condução compulsória de testemunhas ao Departamento de Polícia Judiciária não encontra respaldo normativo. A vontade da lei expressa claramente à intenção do legislador. Em determinados procedimentos processuais, audiências e no corpo do inquérito policial, o legislador balizou claramente a obrigatoriedade de comparecimento da testemunha. Caso fosse a vontade do legislador teria esculpido-a na lei. O militar tem por função e competência realizar a cabal identificação das testemunhas. No curso do inquérito policial ou processo penal ela será intimida a comparecer e obrigada a depor.

A não apresentação das testemunhas a autoridade policial não inibe a prisão em flagrante, conforme art. 304 do Código de Processo Penal. Tal fato acarretará prejuízo para o conjunto probatório que subsidiará o Auto de Prisão em Flagrante. Já a condução forçada e errônea poderá configurar crime de constrangimento ilegal (art. 146 do CP).

Por fim, cabe evidenciar a função do agente da lei. Durante a ocorrência o policial militar tem por obrigação jurídica isolar e preservar o local de crime, prender o infrator, prestar socorro às vítimas, custodiar os bens e registrar todo o fato no BO. Durante o registro das informações o policial deve buscar evidenciar a autoria do fato e a materialidade.  A autoria diz respeito sobre a identidade de quem cometeu. Desse modo, deve narrar às versões da vítima, testemunha e sua própria constatação. A materialidade diz respeito à prova da existência do crime. Para atestar a autoria e materialidade, no caso de inexistência de testemunhas, o policial militar pode testemunhar? Conforme jurisprudência firmada nos tribunais:

TJ-SP - Apelação Criminal com Revisão APR 993070163046 SP (TJ-SP)

Data de publicação: 21/08/2008

Ementa: ROUBO QUALIFICADO - TENTATIVA - emprego de violência física e disparo de arma - intimidação caracterizada -consumação que não ocorreu ante a fuga empreendida pelo réu- depoimento de testemunha e policiais que se compatibilizam, delineando a autoria - não reconhecimento da participação de menor importância ante a divisão de tarefas realizada pelo grupo. Recursos nãoprovidos. AGENTES POLICIAIS - depoimentos considerados como base probatória à condenação - A circunstância de ser a testemunha policial militar não afetapositiva ou negativamente o valor probante de sua palavra. PROVA INDICIARIA -circunstância conhecida e provada sendo apta a sustentar uma decisão condenatória, considerando que tendo o indício relação com o fato, pode ser levada em consideração para fixação do juízo de valor, notadamente, para instalação da autoria (grifo nosso).

O valor probante do testemunho de policial militar é o mesmo atribuído a qualquer testemunha. Assim, o agente que presenciou o cometimento do crime ou a atuação procedimental do companheiro de serviço poderá ser arrolado como testemunha do fato.

Procedimento que gera dúvida rotineira é o registro do BO após o uso da arma de fogo nas seguintes situações: sem pessoas feridas, com lesões corporais e com vítima fatal. Para o entendimento sistemático do tema urge delinear a competência de apuração do fato. O Código Penal Militar descreve:

Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:

[...] 

c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil.

O diploma normativo deixa claro que o crime, com previsão no seu texto, quando cometido por policial militar em serviço ou em razão dele é tipicamente militar. O Código de Processo Penal Militar assevera que o crime militar possui apuração por intermédio de Inquérito Policial Militar.

No caso de disparo de arma de fogo sem vítima deverá narrar o fato, descrever numeração da arma utilizada. Não haverá necessidade de apreensão para perícia. Posteriormente, o fato será apurado por IPM visando analisar se o uso da arma foi legítimo. Nos casos de lesão corporal e vítima fatal, o registro do BO será focado na tipificação criminal cometida pelo ofendido. No corpo do histórico será descrito o fato da utilização da arma de fogo. Conforme já mencionado anteriormente, o policial lavrará Auto de Resistência, constará a numeração da arma, realizará sua apreensão e circunstanciará no histórico que a arma ficará a disposição para procedimentos de apuração na sala de armamento ou similar da unidade policial. 

É imperioso aludir que a Lei n° 12.432/2011 alterou o parágrafo único, do artigo 9° do Código Penal Militar, deslocando a competência para o julgamento dos crimes militares contra civil, quando dolosos e contra a vida, para justiça comum. Tal legislação mudou a competência para julgamento e não para o procedimento de apuração. O crime militar deve ser apurado por IPM e a atividade de polícia judiciária realizada por Oficial da PM.

Toda a gama teórica apresentada e debatida no corpo do estudo deve está em consonância com a doutrina da técnica policial militar. Além de atuar em conformidade com ela urge a necessidade de registrar no BO as ações que foram pautadas na doutrina vigente. Destarte, o militar deverá constar no BO todas as diretrizes de atuação oriundas da legislação institucional (Portarias, Recomendações do MP, Termo de Ajuste de Conduta) e ordens advindas por decisão judiciária (Mandado de Prisão, Medida Protetiva, Alvará de Soltura, Mandado de Condução Coercitiva e outros).

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Sobre o autor
Carlos Serrano

Tenente na Polícia Militar do Espírito Santo<br><br>Bacharel em Ciências Militares (Curso de Formação de Oficiais) pela Academia de Polícia Militar de Minas Gerais. <br><br>Bacharelando em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).<br><br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERRANO, Carlos. O boletim de ocorrência policial militar no mundo jurídico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5038, 17 abr. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/36239. Acesso em: 22 dez. 2024.

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