Da falência do sistema penitenciário e ineficácia da lei de execução penal

12/02/2015 às 11:51
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Execução Penal

1.1 Da Falência Prisional

Inúmeras são as causas que embasam as afirmações de que o atual Sistema Prisional está falido. Verifica-se a constatação da infração dos direitos do apenado, o descaso do Estado e da sociedade, bem como a inaplicabilidade da LEP.

Pode-se verificar, em uma realidade não muito distante, que a falência prisional começa pelos próprios estabelecimentos, observando a existência de presos que estão cumprindo as suas penas em locais inadequados, que deveriam comportar apenas presos Provisórios.

Em relação ao assunto em tela RIBEIRO DE SÁ[1] acrescenta:

A cadeia pública, conforme a LEP, destina-se ao recolhimento de presos provisórios e não sentenciados, condenados ou internados. Porém, pelas razões já mencionadas, no que diz respeito à ação do Estado, a cadeia pública guarda maior número de detentos do que os estabelecimentos a esta fim destinados.

Evidenciando-se a questão da superlotação, torna-se obrigatório a permanência dos apenados em Cadeias Públicas, ou como são popularmente chamados, os Presídios. Não havendo então, os benefícios oriundos do sistema progressivo, sendo que os regimes Semi-aberto e Aberto possuem características específicas de cada regime.

Consoante ao assunto discorre OLIVEIRA[2]:

Em primeiro lugar, é mínimo o número de estabelecimentos penais, tanto penitenciárias ou colônias e similares, para abrigar os condenados, de acordo com sua destinação. Os

estabelecimentos estão superlotados, com os presos em condições, muitas vezes, sub-humanas. Poucas são as colônias ou similares na fase do regime semi-aberto, para

devida progressão do cumprimento da pena. As casas de albergados existem em poucas comarcas, ainda com problemas graves, com raras exceções, não se podendo,

assim, cumprir a fase do regime aberto ou da pena de limitação de fim de semana.

1.1.1 Superlotação

A superlotação é um problema enfrentado em todo o sistema prisional. Inúmeros são os estabelecimentos penais que convivem em constante lotação, possuindo capacidade inferior aos presos que estão mantendo enclausurados.

A superlotação trás consigo inúmeros problemas, alguns relacionados aos direitos do preso, e outros relacionados à própria segurança da Sociedade. A lotação de presos apresenta-se como um “estopim” para a explosão de problemas que são os estabelecimentos penais.

Destarte, impossível não haver rebeliões ou revolta dos encarcerados em relação à superlotação, verificando que os mesmos estão sujeitos a situações sub-humanas e intoleráveis. Constata-se o desrespeito com a dignidade do preso, que não a perdeu em razão do cárcere, sendo que continuam sujeitos a proteção dos direitos inerentes a qualquer pessoa.

1.1.2 Precária Infra – estrutura

Outro problema constatado no sistema prisional é a precária infra-estrutura que é correlata da superlotação. Os estabelecimentos não possuem estrutura física adequada para comportar todos os presos, sendo que falta espaço para celas, local para banho de sol, lazer, ambulatório, consultório odontológico e local para desempenhar as funções administrativas e jurídicas.

Conforme a exposição de LEAL[3], pode-se vislumbrar a realidade e as condições em que se encontra o Sistema Penitenciário:

De fato, como falar em respeito à integridade física e moral em prisões onde convivem pessoas sadias e doentes; onde o lixo e os dejetos humanos se acumulam a olho, sendo as celas individuais desprovidas por vezes se instalações sanitárias; onde os alojamentos coletivos chegam a abrigar 20, 30 homens, onde permanecem sendo utilizadas a arrepio da Lei 7.210/84; onde a alimentação, o tratamento médico e odontológico são precários e a violência sexual atinge níveis desastrosos? Como falar, insistimos, em integridade física e moral em prisões onde a oferta de trabalho inexiste ou é absolutamente insuficiente, onde presos são obrigados a assumiram a paternidade de crimes que não cometeram por imposição dos mais fortes[...]

1.1.3 Falta de Profissionais

Fator que se apresenta preocupante no atual sistema prisional é o número insuficiente de profissionais que o Estado disponibiliza para atuar nos estabelecimentos penais. Esta insuficiência de profissionais gera a sensação de insegurança no próprio ambiente prisional, bem como na sociedade.

Os profissionais, em específico, que atuam no ambiente prisional, são os chamados Agentes Prisionais, estes devem manter a manutenção de todos os atos praticados pelos encarcerados, desde o controle da segurança nos estabelecimentos, evitando a violência entre os presos, até a escolta dos mesmos quando se fizer necessário.

Em conjunto com os Agentes Prisionais existe a necessidade de profissionais específicos como médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, educadores, advogados e funcionários que atuem nas questões administrativas dos estabelecimentos.

Entretanto, raros são os estabelecimentos que apresentam o quadro completo de funcionários, estando à segurança dos próprios Agentes Prisionais e da sociedade comprometida pela inobservância Estatal das necessidades contidas nos estabelecimentos penais.

THOMPSON[4] preleciona:

O fracasso de um estabelecimento carcerário, quanto ao alvoreeducação, seja no Brasil, nos Estados Unidos, na Inglaterra ou na Noruega, é atribuído, indefectivelmente, em sua maior parte, ao número deficiente de profissionais de tratamento (médicos, psicólogos, educadores, assistentes sociais) e à imperfeita instrução da guarda, no sentido de se preocupar mais em ajudar o preso a se reabilitar do que em cuidar da segurança e disciplina do estabelecimento.

1.2 Da Reincidência e a Ilusão de Recuperar

No atual sistema prisional, pode-se verificar que a reincidência é constatada em grandes números. Vários são os fatores que contribuem para esse desastroso índice.

Sabe-se que o atual sistema prisional ineficaz como se apresenta, torna-se cenário para o desrespeito com a dignidade dos presos a infração de vários Princípios Constitucionais garantidos, corroborando assim, para a falência da ressocialização carcerária.

É uma ilusão acreditar que o atual sistema é passível de recuperar alguma pessoa, em meio a tanta agressão, o apenado sabe e sente que esta posto a margem da sociedade, onde pouco importa a prestação de seus direitos básicos.

Newton e Valter Fernandes[5] quando verificam a pena privativa de liberdade e o atual sistema prisional, asseveram que a conclusão a que se chega é de lógica irretorquível: esse tipo de clausura funciona como forte fator de reincidência criminal, contribuindo vigorosamente para o aumento da criminalidade.

O Estado pouco se preocupa em efetivar as diretrizes contidas na LEP, os estabelecimentos penais, tornam-se apenas “depósitos de pessoas”, que ao invés de recuperar, “lançam”, ainda mais o apenado para o mundo do crime. Sendo assim, retornar a delinqüir torna-se uma conseqüência comum.

1.2.1 Dificuldade de Inserção Social

A inserção social corresponde ao retorno do apenado em convívio na sociedade. Este retorno deve ocorrer de forma gradativa, como por exemplo, o apenado que encontra-se no regime Semi-aberto e adquiri as saídas temporárias como forma de retorno gradativo a sociedade e porque não dizer ao convívio familiar.

Vários fatores estão interligados e dificultam o retorno do apenado à sociedade, o medo e voltar a delinqüir, o receio de ser sempre tratado como um criminoso, a dificuldade de se portar em grupo, observando o grande tempo enclausurado, entre outros temores que conciliados a falta de orientação nos estabelecimentos penais, acarretam na dificuldade de inserção social.

Assim, corrobora Romeu FALCONI[6]:

Inquestionável que se vive, nesta quadra do tempo, uma situação ímpar, onde homens julgam homens, olvidando entretanto, que, apesar dos crimes que estes hajam praticado,

são pessoas humanas. Se quisermos a reinserção social desse contingente humano, ou pelo menos de parte dele, teremos que, como primeira e principal providência, devolver-lhe o respeito que lhe tem sido subtraído.Falta-se-lhe com o respeito sob todas as formas e de todos os matrizes.

As dificuldades não partem tão somente dos apenados, mas sim das instituições prisionais que não oferecem (grande maioria), a assistência e o acompanhamento necessário com os profissionais qualificados como assistente social, o acesso à educação de forma básica e qualificadora, o oferecimento de atividades laborais de cunho profissionalizantes, entre outros recursos que estão previstos na LEP.

Todo esse acompanhamento prepara o apenado ao seu retorno social, de forma a lhe proporcionar oportunidades de ter uma vida honesta, longe das facilidades apresentadas pelo mundo do crime.

1.2.2 O Retorno a Criminalidade

Fator presente em todo sistema prisional é o retorno à criminalidade. Exorbitante se faz a parcela da população carcerária que retorna a delinqüir, tornando assim o número de reincidentes muito maior do que o desejável.

Vários são os fatores que impulsionam a reincidência, como por exemplo, a dificuldade de inserção na sociedade, a falta de estrutura familiar, o descaso em toda a execução penal, todos estes problemas são como impulsos a volta da pratica delituosa.

Observa-se que o próprio Estado possui relevante parcela de culpa no que tange a reincidência criminal. Quando se é colocado presos provisórios, junto com apenados de regimes Fechado e Semi-aberto, não havendo nenhuma distinção entre os apenados e as suas práticas criminosas, provoca-se um contato desabonador com a aprendizagem delituosa. Newton Fernandes e Valter Fernandes[7] constatam a difícil realidade da inexistência da separação dos apenados pelos crimes cometidos.

Apenas servem, essas prisões, para que novos crimes sejam ali aprendidos, planejados para o futuro e arquitetados, quase á perfeição, face ás experiências trocadas pelos colégio de marginais, dos mais diferentes crimes, que sem nenhuma racionalização são agrupados em expiação a seus delitos. A cadeia, então, ao invés de instrumento de custódia para recuperação de presos, passa a ser verdadeira escola de graduação e, não raro, pós-graduação, para o cometimento de toda espécie de delituosidade.

Em observância a realidade, verifica-se que os estabelecimentos penais, proporcionam mais chances do preso se inserir ao mundo do crime, do que possibilidades de recuperar-se.

Se o sistema não procurar soluções, com resultados de curto a longo prazo, manter o preso em cárcere será apenas um tempo para que o mesmo possa voltar a delinqüir, visto que, o mesmo está inserido em um meio completamente falido que o impossibilita de ressocializar-se.

1.3 Do Preconceito

No atual sistema e na atual sociedade, o preconceito e a discriminação se fazem presentes em todas as etapas da Execução Penal. O apenado é discriminado dentro dos estabelecimentos penais e posteriormente fora deles.

A sociedade possui um pensamento errôneo e infeliz, e por vezes alimenta um sentimento da época do período em que a pena tinha o cunho de vingança e não como apresenta-se hoje, com a finalidade ressocializadora.

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Como bem salienta COSTA JUNIOR[8], o preso não se reduz a simples objeto de um processo administrativo-penal. Deve ser considerado como titular de direitos e faculdades e não mais como mero detentor de obrigações.

O preconceito que é lançado ao apenado, não é apenas oriundo da sociedade, mas também das famílias, que por vezes, desestruturadas, excluem o apenado de ter a oportunidade de retornar ao convívio familiar.

1.3.1 Da Família e da Sociedade

A família é o primeiro grupo que se aprende a viver em sociedade, desta forma, apresenta grande influência no caráter e nossas atitudes. É preciso que os familiares transmitam ao apenado a segurança necessária para que o mesmo não volte a cometer nenhum ilícito.

Todavia, muitos são os casos em que a família não proporciona ao apenado condições de ter uma oportunidade de seguir o caminho correto, o que nem sempre se apresenta como o mais fácil.

Várias famílias almejam apenas que o apenado providencie os recursos necessários para sanar com todas as despesas, sendo que por vezes não importa o meio pelo qual se obtém o dinheiro, porque os valores estão distorcidos aos extremos, e o que vai importar é o valor arrecadado.

É necessário que o apenado sinta-se integrante de algo, e tenha motivos para evoluir a afastar-se de praticas que distorçam o seu comportamento e o levem a pratica delituosa.

Por vezes para família é difícil aceitar que um ente tão próximo possa ter cometido tamanha barbaridade, contudo, se os próprios familiares não poderem dar uma oportunidade do apenado demonstrar que se regenerou tão pouco, pessoas entranhas poderão proporcionar tal oportunidade.

A família, sendo a base da sociedade, deve romper as barreiras do preconceito, da hipocrisia e da desigualdade, sendo que sentimentos como o amor, amizade, respeito, compreensão e diálogo devem estar sempre presentes, para assim, constituir uma família estruturada que proporcione meios de recuperação ao apenado.

A sociedade apresenta duas fortes interferências no que se refere ao preconceito contra o apenado. A primeira corresponde à idéia de que preso esta em melhor situação do que as pessoas que vivem livres. A segunda, que o apenado sempre vai ser um criminoso, é impossível acreditar na sua recuperação.

O primeiro preconceito apresentado é inaceitável, como uma pessoa pode acreditar que o apenado que encontra-se em cárcere está em uma situação melhor do que um homem livre? Impossível de se responder.

Só pensam assim pessoas que não conhecem a realidade do sistema prisional, pessoas que estão alheias às informações que são diariamente transmitidas. O sistema prisional na atualidade apresenta-se como um cenário típico da infração dos direitos do apenado e do desrespeito a dignidade humana.

O apenado por vezes está desprovido de recursos que são básicos a sobrevivência humana, e não raro são obrigados a conviver com a dor por falta de assistência qualificada.

É muito melhor viver livre e desprovido de alguns recursos que a entendimento próprio possam ser excluídos, do que viver recluso e não ter direito algum de escolha e estar sujeito a condições severas que levem apenas a sobrevivência.

O segundo preconceito, está relacionado à indiferença da sociedade com os apenados que saem dos estabelecimentos penais em busca de novas oportunidades de vida. Que procuram condições que não os levem ao caminho da criminalidade.

Porém, fácil de vislumbrar é o comportamento hostil das pessoas com os apenados, muitas se sentem incomodadas e a simples presença torna-se uma ameaça, uma situação difícil de ser vivenciada. Em relação ao comportamento da sociedade,

FURTADO[9], assegura:

Na medida em que, como sociedade, estamos a fabricar criminosos, jogando homens mal formados( homens metade, pessoas abandonadas por um pacto social falido) dentro de um sistema penitenciário completamente abandonado pelo Executivo e desprezado pelo Judiciário, e de lá retiramos feras, estamos também, a ofender e atacar a nós mesmos[...]

O preconceito leva a prática de atitudes discriminadoras e cruéis, a pena ultrapassa a figura do apenado e toda uma família é exposta a  discriminação e a rejeição social. Torna-se impossível encontrar um emprego, os olhares discriminadores e reprováveis são freqüentes e implícitos.

Em consonância ao assunto, assevera MIRABETE[10]:

O mais grave inconveniente que, tradicionalmente, tem levado a pena privativa de liberdade é a marginalização do preso. Não obstante tenha ele alguma ou todas as condições pessoais para se reintegrar ao convívio comunitário a que esteve afastado. E apesar dos esforços que possam ser feitos para o processo de reajustamento é inevitável que o egresso encontre uma comunidade fechada, refratária e que ela mesma o acabe impulsionando para delinqüir.

Um exemplo típico do preconceito gerado na sociedade é o pedido de antecedentes criminais na concorrência de um emprego. A maioria da sociedade diz que não possui preconceitos contra pessoas que permaneceram reclusas, contudo não são capazes de ofertar um emprego para alguém que já foi preso.

E a problemática envolvida com o local da instalação dos estabelecimentos penais, ninguém deseja um presídio perto de casa. Como se fosse possível esquecer os encarcerados, de forma a “jogá-los” em celas e fazer do estabelecimentos vendeiros depósitos. Se o apenado cumpriu com suas obrigações, atingindo o tempo suficiente para a progressão de regime, ou então, tenha cumprido integralmente a sua pena, não possui o mesmo, nenhuma divida com o Estado, tão pouco com a sociedade. Não devendo assim, ser submetido a situações de constrangimento e discriminação.

1.4 O Descaso do Estado

Em toda Execução Penal, pode-se observar várias situações que levam a afirmação de que o Estado trata com descaso todo o processo executório penal. Impossível não se visualizar o caos em que se encontra os estabelecimentos penais, falidos e com estruturas ultrapassadas, parecendo mais “calabouços” do que celas.

A inobservância com a falta da prestação dos direitos básicos inerente aos presos, a situações negligentes a que estão submetidos, levam a um total esquecimento por parte dos governantes e legisladores.

Ao analisar esta questão FALCONI[11] ressalta:

Entre nós, ninguém está verdadeiramente preocupado com a reeducação, ou com qualquer outra atividade que diga respeito à reinserção do condenado. Apenas estão

preocupado, ou dizem que estão, em aumentar o número de prisões, na elaboração de leis cada vez mais virulentas e arrestos humanos cada vez maiores.

Uma vez que é retido do preso o direito de ir e vir, sendo que o mesmo fica impossibilitado para suprir sozinho com as suas necessidades básicas, o Estado passa a ser o seu tutor, sendo o mesmo o único detentor da capacidade sancionadora.

Deve então cumprir com as suas próprias determinações, fazendo valer os preceitos contidos em nossa Constituição e em legislação específica, como neste caso a LEP. Se o Estado através de seus representantes elabora as Leis, deve o mesmo ser o guardião delas, e fazer valer todo o seu conteúdo.

A crítica mais severa direcionada aos governantes que são efetivamente os representantes do Estado, está na questão da impossibilidade do preso votar. Após o trânsito em julgado de uma sentença condenatória, o preso perde, mesmo que momentaneamente, o seu direito ao voto.

Desta forma, não fazem os presos parte do público alvo dos governantes que, efetivam o desinteresse em propor soluções e alternativas ao caos que é o sistema prisional. Os estabelecimentos penais tornam-se “depósitos” de pessoas, que são visivelmente esquecidas pelo Estado.

O único interesse demonstrado é o de construir mais estabelecimentos, para que comportem mais presos, sendo que o problema seria resolvido apenas momentaneamente, pois sem a aplicação efetiva da Lei não há que se falar em ressocialização, tão pouco em solução para as demandas da Execução Penal.

Acerca do assunto TELES[12] enfatiza:

A história de nosso sistema penitenciário é essa, avançada na legislação, atrasada na prática. Cresce o país, a população, desenvolvem-se as cidades, a economia galga estágios de desenvolvimento, as péssimas condições de vida da maior parte do povo se agravam, aumentam a miséria e a fome, com elas a criminalidade, constroem-se penitenciárias e quantidade e qualidade insuficientes para atender à demanda, não restando ao legislador senão apresentar novas e modernas soluções, especialmente diante do descaso do Poder Executivo em todos os níveis.

Como exigir da sociedade comportamentos não discriminadores em relação aos apenados, se os próprios legisladores ignoram a situação do sistema prisional, empurrando os problemas visíveis e não oferendo nenhuma situação.

Doravante, com o descaso do Estado, o apenado, assim como o preso em todo o sentido lato, não possui apenas a sua pena a cumprir ou o tempo necessário a ficar recluso, mas deve o mesmo enfrentar situações sub-humanas e ao invés de recuperar-se e estar habilitado para retornar ao convívio em sociedade, nutre o mesmo sentimentos como ódio, raiva e revolta que o impulsionam cada vez mais ao mundo do crime.

1.4.1 O Desrespeito à Constituição

Em relação a todos os princípios basilares contidos em nossa Constituição, no que se refere à Execução Penal, verifica-se o desrespeito com praticamente todos os princípios nela contidos, sendo que o preso é lançado a condições degradantes e sub-humanas, infringindo assim inúmeros direitos e garantias constitucionais inerentes a qualquer pessoa.

Nesse sentido diz LEAL[13]:

Diante dos direitos e garantias constitucionais asseguradas a todo cidadão, o dispositivo pode parecer desnecessário. Porém, num país, onde a pessoa do preso não tem merecido a menor consideração, parece-nos que a disposição legal acima transcrita é de todo recomendável e útil. É preciso respeitar o preso, assegurando-lhe o cumprimento da pena dentro dos limites impostos pela própria lei.

A sanção imposta ao apenado ultrapassa os limites da pena, o cárcere é muito mais severo do que o próprio tempo de pena a cumprir, a falta de direitos basilares e a situação degradante a que estão inseridos torna a realidade o oposto das condições expressas na Constituição.

O próprio Estado que deveria resguardar os preceitos contidos na Constituição, é que com mais veracidade, desrespeita, infringe e não faz valer o valor contido na norma.

Não há que se falar apenas na ineficácia da Execução Penal, mas também na ineficácia da própria Constituição, que não deve ser vislumbrada como apenas uma carta de recomendações, com princípios utópicos. Se o legislador contemplou na Lei garantias fundamentais a todos os homens, deve o mesmo criar meios de executar todos estes preceitos e fazer valer o conteúdo de nossa Lei magna.

1.4.2 Da não Prestação dos Direitos

Constatando-se a infração de princípios Constitucionais e direitos expressamente garantidos na LEP, evidencia-se a não prestação de direitos oriundos ao encarcerado, sendo ele apenado, em regime de cumprimento de pena, seja ele provisório.

Os direitos que são negados aos apenados então inseridos em todos os estágios, desde os básicos, como alimentação, vestuário, saúde, educação, até os mais elevados como auto-estima e possível auto-realização.

Rejeitados pela sociedade, confinados à força, obrigados a uma coabitação não escolhida, privados de autonomia, de recursos, de bens e serviços de caráter pessoal, de iniciativa, de segurança, separados da família, submetidos a um regime asfixiante de regras abstrusas, obtêm, não adequado à condições artificiais de vida que lhes são impostas.

O próprio sistema agride o preso, como então ele poderá acreditar na sua ressocialização se o próprio órgão responsável em corrigir o seu desfio de conduta, o cola a margem da sociedade e o estigmatiza, incentivando toda a sociedade a pratica de atos preconceituosos.

Exigem do preso o seu retorno eficaz a sociedade, contudo não verificam a falência do sistema em que ele esta inserido, não sendo prestados os direitos básicos inerentes a qualquer pessoa.

Relevante é o entendimento de que parte da pessoa a intenção de mudar, todavia se não for proporcionado o meio de provocar esta mudança, de nada adiantará a ilusão utópica que o sistema prisional conseguirá recuperar algum dos seus milhares de encarcerados.

1.5 Ineficácia da Lei de Execução Penal

A palavra ineficácia em sentido stricto sensu está vinculada ao conceito de deficiência, ou seja, a carência, a falha na execução de algo.

Em relação à ineficácia da Lei de Execução Penal, afirmasse que a legislação referida possui defeitos e não está sendo aplicada de acordo com os seus preceitos, sendo impossível atingir os seus objetivos maiores, que são, a execução da sanção imposta pelo Estado, empregando em seus meios o respeito à dignidade do preso, e a ressocialização do encarcerado.

Os objetivos da Execução Penal, ora mencionados, estão inseridos no conteúdo do Artigo 1º da LEP, o qual vejamos:

Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

Estando postos os objetivos, devem ser apontados os meios pelo qual deve se percorrer para atingir o resultado final. É o que ocorre no decorrer dos 204 artigos da LEP.

Por várias vezes verifica-se elogios a LEP, entretanto lodo seguem as críticas direcionadas a sua inaplicabilidade. A Lei se distância da realidade que esta contida no sistema prisional e torna-se utópica frente à falência do Estado.

OLIVEIRA[14] entafiza:

A Lei de Execução Penal é, de uma maneira geral, inexeqüível. Suas disposições consubstanciam, sem duvida, o resultado dos estudos mais avançados sobre a matéria, mas não houve a preocupação de se alevantarem as estruturas existentes e necessárias para a sua efetivação, constituindo-se mais, em uma lei de caráter utópico, sem o devido embasamento na realidade social do nosso país.

A não prestação de direitos previstos na LEP acarreta na revolta dos presos, que estão expostos a superlotação, a falta de profissionais, a falta de infra-estrutura, e todos os demais problemas que concebem a falência prisional.

Impossível ressocializar alguém, em um ambiente inadequado e cenário para o cometimento de tantas ilegalidades. Não se pode repreender o encarcerado se o próprio Estado a quem estamos todos subordinados é o principal infrator das Leis que ele mesmo, cria e deve executar.

Em consonância ao apresentado, certa é a afirmação de BITTENCOURT[15]:

A superlotação das prisões, a alimentação deficiente, o mau estado das instalações, pessoal técnico despreparado, falta de orçamento, todos esses fatores convertem a prisão em um castigo desumano.

Bem verdade, que todo o sistema está falho, possuindo políticas que não atingem o público alvo, como por exemplo, a saúde, a educação e a segurança, entre outros.

Todavia o que se deve entender é que o encarcerado está em situação de desvantagem, de fragilidade, não podendo suprir por si as suas necessidades.

Deve-se planejar uma política de divulgação da humanização da execução penal, de forma a transmitir não somente aos operadores do direito, mas a toda sociedade a necessidade de ver o preso como ele realmente é, ou seja, uma pessoa igual a todas as demais.

Segundo ALBERGARIA[16] a política penitenciária terá que enfatizar a humanização da execução penal, privilegiando as medidas alternativas e a colaboração da comunidade.

Não somente as autoridades ou a o preso e sua família devem apontar a ineficácia da LEP, mas toda a sociedade deve priorizar os direitos humanos e exigir que o encarcerado tenha o tratamento adequado para estar apto ao retorno da sociedade, que é inevitável, observando que não existe pena de morte ou prisão perpétua em nossa legislação.

As péssimas condições do sistema prisional, o descaso do Estado, a inércia da sociedade apenas contribuem a falência do sistema e a revolta do encarcerado, que quando ganhar a liberdade não se sentira inserido em meio algum, e marginalizado não respeitara contrato social algum, e provavelmente voltara a interferir no bem comum, ou seja, a paz social.

Ao se falar em ineficácia, aponta-se as falhas da LEP, que são visíveis a qualquer pessoa, não sendo necessário a presença a opinião de um especialista, haja vista que a realidade esta posta.

Sobre o assunto discorre ALBERGARIA[17]:

Entre as dificuldades da política criminal inclui-se a deficiente informação estatística, ao lado da crônica escassez de recursos, ineficácia e burocratização dos programas sociais,

enfoque setorial, ausência de participação da comunidade, crônica escassez de recursos e outros fatores negativos.

Precisa-se ter a certeza ora afirmada, de que uma coisa é certa, o preso retornará a sociedade, e de acordo com o seu tratamento, sentirá a necessidade de retribuir as situações que foi exposto. Será um espelho de todas as desigualdades vivenciadas.

Sendo assim, as péssimas condições do sistema prisional, o descaso do Estado, a inércia da sociedade apenas contribuem a falência do sistema e a revolta do encarcerado, que ao ganhar a liberdade não se sentira inserido em meio algum, e marginalizado não respeitara contrato social algum, e provavelmente voltará a interferir no bem comum, ou seja, a paz social.

A ineficácia da LEP está explicita na realidade do sistema prisional, falida, inalcançável e inaplicável. Se não houver modificações em relação a exigibilidade do cumprimento do conteúdo exposto na Lei, continuarse- á a mesma como uma carta de intenção.


[1] SÁ, Geraldo Ribeiro de. A Prisão dos Excluídos: origens e reflexões sobre a pena privativa

de liberdade.Rio de Janeiro: Diadorim, 1996.p.119.

[2] OLIVEIRA, João Bosco. A execução penal: uma realidade jurídica social e humana. São

Paulo: Atlas, 1990.p.30.

[3] LEAL, César Barros. Prisão: crepúsculo de uma era. Belo Horizonte: Del Rey.1998.p.87-88.

[4] THOMPSON, Augusto. A Questão Penitenciária. Rio de Janeiro: Forense, 2000.p.17.

[5] FERNANDES, Newton, FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. 2.ed. ver., atual São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 429.

[6] FALCONI, Romeu. Sistema prisidial: reisenção social? São Paulo: Ícone, 1998.p.105

[7] FERNANDES, Newton, FERNANDES Valter. Criminologia integrada p. 82.

[8] COSTA JUNIOR. Paulo José da. Direito Pena Objetivo: comentários atualizados..92.

[9] FURTADO, Renato de Oliveira. Nós e eles: sitema penitenciário. Texto disponível em

http://www.direitocriminal.com.br. Acessado em 27.11.2010.p.02.

[10] MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-84. 8. ed.

rev e atual.p.88-89.

[11] FALCONI, Romeu. Lineamentos de Direito Penal . p. 111.

[12] TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral, arts. 1º a 120. p.298

[13] LEAL, João José. Direito Penal Geral. p.409.

[14] OLIVEIRA, João Bosco. A Execução Penal: uma realidade jurídica, social e humana. São

Paulo: Atlas, 1990.p.85

[15] BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito penal: parte geral. p.1993.

[16] ALBERGARIA, Jason. Comentários à lei de execução penal..p.94.

[17] ALBERGARIA, Jason.Comentários à lei d e Execução Penal .p. 106.

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Sobre o autor
Raphael Lopes Costa Bezerra

Formado no Curso de Graduação em Direito da Escola de Ciências Jurídicas do Centro de Ciências Jurídicas e Políticas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UniRio.

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