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A garantia constitucional da intimidade e a quebra do sigilo bancário consoante a Lei Complementar nº 105/2001

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Capítulo I: Da Intimidade

Com a evolução natural do homem, este passou a integrar a sociedade e o meio em que vive não apenas como mais um dentre tantos iguais; adquiriu personalidade e cada vez mais busca seu espaço com o fito de tornar-se especial dentre tantos iguais; o homem reconhece suas obrigações e, sobretudo, pleiteia seus direitos, quer diante da sociedade, quer intimamente.

No entanto, em que pese a necessidade de evoluir, oq eu impõe a relação com seus iguais, o homem é carente de sua individualidade, da querida restrição de seus pensamentos e valores. Paulo José da Costa Jr. preconiza que a intimidade é "a necessidade de encontrar na solidão aquela paz e aquele equilíbrio, continuamente prometidos pela vida moderna; de manter-se a pessoa, querendo, isolada, subtraída ao alarde e à publicidade,fechada na sua intimidade, resguardada dos olhares ávidos. A intimidade corresponderia à vontade do indivíduo de ser deixado só" [1].

Nesse diapasão, a intimidade guarda relação com a vontade individual, com a necessidade de se expor e, igualmente, de se retrair frente aos demais homens, guardando para si, assim necessitando, seus pensamentos, seus desejos, suas informações pessoais. Nessa seara, "é a personalidade parte do indivíduo; é a parte que lhe é intrínseca, pois através dela a pessoa poderá adquirir e defender os demais bens. É da personalidade que emanam os demais bens jurídicos" [2]; nesse sentido é que afirmamos que a intimidade integra a personalidade do indivíduo.

Sendo assim, o sigilo às informações financeiras consta daqueles direitos inerentes à intimidade do homem, do livre arbítrio de dispor daquilo que é inerente à sua personalidade.

A Constituição da República Federativa do Brasil tutela a intimidade em seu artigo 5º, X, a seguir:

"Art.5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Nesse lanço, forçoso é afirmar que a intimidade encontra respaldo no sobre dito artigo; contudo, consoante o sigilo bancário a discussão já se impõe: - acentuam alguns doutrinadores que o sigilo tem fundamento não na intimidade preconizada no inciso X, mas guarda relação com o sigilo de "dados" apontado no inciso XII do artigo 5º da Consituição, a seguir:

XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Nessa vereda, doutrinadores há que apontam para o inciso X do artigo 5º, apregoando que o sigilo guarda assento e relação com a intimidade. Nesse diapasão, Tércio Sampaio Ferraz Jr. (apud Paulo Quezado e Rogério Lima, Sigilo Bancário, pág.31), ensina "que a privacidade se funda no princípio da exclusividade, o qual tem como característica a solidão ("desejo de estar só"), o segredo ("exigência de sigilo") e a autonomia ("liberdade de decidir sobre si mesmo emanador de informações"). Ademais, descarta a possibilidade de o sigilo encontrar fundamento no inciso XII porquanto "dados, no inciso XII, quer significar, restritivamente, dados informáticos". Em sentido contrário, Ives Gandra da Silva Martins aponta que o sigilo de dados abarca o conceito de sigilo bancário. Com mais razão, uma terceira corrente se faz presente, da qual comungo, idealmente, seguidor dos pensamentos de Paulo Quezado e Rogério Lima (op. cit. pág.36), na qual o sigilo bancário encontra guarida no inciso X por tratar-se de característica da intimidade, porquanto há o direito de exercer a liberdade de negação, e, igualmente, no inciso XII, conquanto a interpretação de dados não pode ser feita de maneira restritiva, o que nos obriga a firmar que dados faz referência ao sigilo bancário.

Posta assim a questão, mister acentuamos as minúcias em face do sigilo e de sua (in)violabilidade.


Capítulo II: Do Sigilo Bancário

Postas as assertivas consoante à intimidade, faz-se necessário discorrer acerca do sigilo das informações e dados pessoais assegurado na Carta Constitucional hodierna. Todavia, sem o fito de procrastinar o entendimento do presente trabalho, necessário se faz, s.m.j., situar a garantia ao sigilo frente às Constituições Brasileiras pretéritas, ademais de conceitua-lo, a seguir:

1.Sigilo e Segredo

O "sigilo" há muito é discutido, sobretudo quanto ao seu caráter garantidor, demonstrando sua real importância. Contudo, necessário se faz entender o significado jurídico de "sigilo", com o fito de encerrar – pretensiosamente – um completo estudo acerca do tema. De Plácido e Silva impõe que o sigilo " [3]é empregado na mesma significação que segredo [4]. No entanto, imperando nele a idéia de algo que está sob selo ou sinete, o sigilo traduz, com maior rigor, o segredo que não pode nem deve ser violado, importando o contrário, assim, em quebra de dever imposto à pessoa, geralmente em razão de sua profissão, ou ofício". Nesse diapasão, Marco Antonio de Barros apregoa que "sigilo é o meio, o instrumento de que servem os interessados para manter íntegro o desconhecimento de um fato" [5]. Assim, necessário esclarecer que, ademais de um e outro conceito guardarem relação, sigilo "é o segredo que não deve ser violado" [6].

2.Histórico Constitucional

2.1. A Constituição Política do Império do Brasil - 1824

As primitivas linhas traçadas em nosso Ordenamento acerca do sigilo de informações pessoais nos remetem à Constituição jurada em 25 de março de 1824 por D.Pedro I. Poder-se-ia dizer, permissa vênia., guardar semelhança o artigo 179 da Carta Imperial com o hodierno artigo 5º, resguardando – com as devidas proporções (temporais, inclusive) – os direitos e as garantias de cada cidadão.

A inviolabilidade individual vinha consubstanciada no citado artigo 179, in verbis:

"Art.179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade,a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte: XXVII: O Segredo das Cartas é inviolável. A administração do correio fica rigorosamente responsável por qualquer infracção deste Artigo(...)" [7].

Vê-se que o "sigilo" não era citado explicitamente; fazia menção à garantia da liberdade e a segurança individual, conceitos tais que, certamente, haviam de englobar quaisquer direitos civis ou políticos, dentre os quais as informações e os valores (individuais), resguardando-se, outrossim, o seu sigilo.

Menção explícita havia consoante as cartas porquanto os "segredos" nelas contidas eram, sob a égide Constitucional, invioláveis. Nesse diapasão, mister atentarmos para o período temporal no qual a sobre dita Carta Constitucional foi promulgada, conquanto a correspondência, por via de cartas, era o único meio utilizado para a comunicação entre os cidadãos, quer de um mesmo Estado, quer além de suas terras. No mais, a Lei reflete, dentre outros valores e sentimentos, a realidade temporal em que se vive, e assim sendo, seria abstrair-se hipocritamente esperar do legislador Constitucional assegurar meios de comunicação, v.g., sigilo das informações bancárias, eis que não existiam à época de sua promulgação, ou seja, não deixou de lado certas inviolabilidades – permitindo-as; mas sim, não citaram-nas, porquanto inexistentes.

Ademais, o citado segredo das cartas era resguardado não só pela Carta Maior, eis que "o Estado tomou para si o privilegio de correio de cidadãos, e pune os que transportão cartas sem ser pelo seu vehiculo, e esquivando-se do pagamento" [8], mas igualmente pelas Cartas Penais, a demonstrar sua necessidade e importância: O Código Criminal do Império do Brasil, nos Artigos 215 a 218, da Secção VII, do Capítulo I, sob a rubrica "Abertura de Cartas", impunha pena aos que violavam o segredo das cartas que variava de 1 a 3 meses, havendo casos em que tais penas eram tidas em dobro, somando-se, ademais, àquelas do uso da violência ou arrombamento [9].

2.2. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil - 1891

Adiante, em 24 de fevereiro de 1891, a fim de organizar um regime livre e democrático foi promulgada a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Cuidou esta Carta Maior de unir as existentes províncias, transformando-os em Estados, assim como o Distrito Federal; como não havia de ser diferente, passou a tutelar novos direitos e garantias; os Estados possuíam a prerrogativa de editar suas próprias Leis, seguindo, de certo, a norma Constitucional.

Consoante o sigilo, encontrava-se subscrito na Secção II sob a rubrica das Declarações de Direitos, no artigo 72, in verbis:

"Art.72. A Constituição assegura a brazileiros e estrangeiros residentes no paíz a inviolablidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança, individual e á propriedade nos termos seguintes:

§18. É inviolável o sigilo da correspondência" [10].

Vê-se que o legislador não aponta explicitamente as cartas, mas fala, sim, da "correspondência" em linhas gerais. Nesse sentido, o Código Penal Brasileiro, promulgado em 11 de Outubro de 1890 passou a tutelar não só os segredos das cartas; cuidava-se de um Capítulo especial (IV), do Título IV, sob a rubrica "Dos crimes contra o livre gôso e exercício dos direitos individuais" [11], nos artigos 189 a 195, ad litteram:

"Art.189. Abrir maliciosamente carta, telegramma, ou papel fechado endereçado a outrem, e apossar-se de correspondência epistolar ou telegraphica alheia, ainda que não esteja fechada, e por qualquer meio lhe venha ás mãos; tiral-a de repartição publica ou do poder de portador particular, para conhecer-lhe o conteúdo:

Pena- de prisão cellular por um a seis mezes.

Paragrapho único. No caso de ser revelado em todo, ou em parte, o segredo da correspondência violada, a pena será augmentada de um terço.

Art.190. Supprimir correspondência epistolar ou telegraphica endereçada a outrem:

Pena- de prisão cellular de um a seis mezes.

Art.191. Publicar o destinatário de uma carta, ou correspondência, sem consentimento da pessoa que a endereçou, o conteúdo, não sendo em defesa de direitos, e de uma outra, restando damno a remettente:

Pena- de prisão cellular por dois a quatro mezes.

Art.192. Revelar qualquer pessoa o segredo de que tiver notícia, ou conhecimento, em razão de officio, emprego ou profissão:

Penas – de prisão cellular por um a três mezes e suspensão do officio, emprego ou profissão por seis mezes a um anno.

Art.193. Nas mesmas penas incorrerá o empregado do correio que se apoderar de carta não fechada, ou abril-a, si fechada, para conhecer-lhe o conteúdo, ou comunical-o a alguém, e bem assim o do telegrapho que, para fim idêntico, violar telegramma, ou propagar a communicação nelle contida.

Paragrapho único. Si os empregados supprimirem ou extraviarem a correspondência, ou não a entregarem ou communicarem ao destinatário:

Penas – de prisão cellular por um a seis mezes e perda do cargo.

Art.194. A autoridade que, de posse de carta ou correspondência particular, utilisal-a para qualquer intuito que seja, embora o da descoberta de um crime, ou na prova deste, incorrerá na pena de perda do emprego e na multa de 100$ a 500$000.

Art.195. As cartas obtidas por meio criminosos não são admittidas em juízo".

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Como se verifica – repita-se – poder-se-ia afirmar que o conceito "correspondência" apontado na Carta Magna de 1891 abarca uma gama maior de "meios de informações", a despeito de não citar, explicitamente, o sigilo das relações bancárias.

2.3. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil - 1934

Seguindo os passos históricos, o sigilo – consoante a Carta promulgada em 16 de julho de 1934 – estava assegurado no artigo 113, VIII, in verbis:

"Art. 113. A Constituição assegura a brasileiros e estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á subsistência, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes:

VIII -É inviolável o sigilo da correspondência" [12].

2.4. Constituição dos Estados Unidos do Brasil - 1937

A Magna Carta decretada em 10 de novembro de 1937 assegurava o sigilo consoante seu artigo 122, sob a rubrica Dos Direitos e Garantias Individuais, a seguir exposto:

"Art.122. A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no país o direito à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

VI – A inviolabilidade do domicílio e de correspondência, salvas as exceções expressas em lei".

Nesse diapasão, a exemplo da Carta pretérita, o legislador assegura outras inviolabilidades, ademais daquela postada nas cartas. No mais, acentuou que tal inviolabilidade pode excluir-se por exceção constada em Lei. Cuida-se, s.m.j., do que vem regrado no artigo 123 da Mesma ordem legal, in verbis:

"Art.123. A especificação das garantias e direitos acima enumerados não exclue outras garantias e direitos, resultantes da forma de governo e dos princípios consignados na Constituição. O uso desses direitos e garantias terá por limite o bem público, as necessidades da defesa, do bem estar, da paz e da ordem coletiva, bem como as exigências da segurança da Nação e do Estado em nome dela constituído e organizado nesta Constituição" [13].

2.5. Constituição dos Estados Unidos do Brasil - 1946

Promulgada em 18 de setembro de 1946, sob a égide de um regime democrático, a Constituição de 1946 resguardou o sigilo em seu artigo 141, §6º, a seguir:

"Art.141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

§6º. É inviolável o sigilo da correspondência.

Ademais da garantia Constitucional, o sigilo encontrava respaldo no Ordenamento Penal [14], sob o manto dos artigos 153 e 154, ad litteram:

"DIVULGAÇÃO DE SEGREDO

Art.153. Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

§1º-A. Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública:

Pena – detenção, de um a quatro anos e multa.

(...)

VIOLAÇÃO DO SEGREDO PROFISSIONAL

Art.154. Revelar a alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão da função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem:

Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa (...)

Nesses termos, a Carta penal impunha ao violador dos segredos uma pena que variava de um mês a um ano, em casos tais. No mais, cuidou o legislador de criar duas vertentes para o sigilo, ou seja, àquele inerente à determinada função, ministério, ofício ou profissão do agente infrator, e ao constante de documentos ou correspondências particulares, violadas por distintas pessoas.

2.6. Constituição do Brasil - 1967

Publicada no Diário Oficial da união em 24 de janeiro de 1967, e sob a guarda do artigo 150, §9º, o sigilo manteve-se inviolável, nos exatos termos:

"Art. 150. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

§9º. São invioláveis a correspondência e o sigilo das comunicações telegráficas e telefônicas.

Aqui, tratou o legislador de acrescentar o sigilo expresso das comunicações telegráficas e telefônicas. Igualmente, a Constituição da República federativa do Brasil, acrescida pela Emenda Constitucional nº. 1, de 17 de outubro de 1969 – que vigorou em seu período – manteve a guarda do sigilo em seus ulteriores termos.

2.7. Constituição da República Federativa do Brasil - 1988

Atualmente, passados mais de dezesseis décadas da primeira Carta Magna brasileira, vige a Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988. Este atual "conjunto de normas que regem uma corporação" [15], funda-se na soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana e nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, resguardando seu caráter de "Lei fundamental de um Estado" [16]; qualquer direito, garantia ou dever instituído deve, necessariamente, basear-se nos sobre ditos conceitos - ainda que implicitamente - sob pena de eivar-se de inconstitucionalidade, sendo, por conseqüência, inaplicável.

O sigilo, nestes termos, encontra guarida no citado artigo 5º, X e XII, o qual se faz necessário transcrever, novamente, in verbis:

"Art.5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Assim sendo, vê-se que o sigilo encontra-se resguardado desde a primeira Carta Constitucional; certamente, o legislador tratou de inovar – no tempo – os conceitos e os direitos resguardados pelo sigilo. Todavia, mister apontar que em nenhuma Carta o sigilo bancário – móvel do presente estudo – foi citado de maneira explícita. Nesse diapasão, QUEZADO e LIMA [17] acentuam que, "a despeito de nenhuma trazer expressamente o direito ao sigilo de informações bancárias, deixam claro, em suas disposições, o intuito de resguardar-se a intimidade das pessoas". Com mais razão asseveram ademais os doutrinadores que, "evidentemente, nenhum legislador pode fugir, pois a esfera íntima do cidadão, em diversos aspectos, faz parte da natureza humana".

Desta arte, ainda que não expressamente apontado na Constituição, o sigilo encontra-se resguardado pelos incisos X e XII, por caracterizar, s.m.j., os conceitos de "intimidade" e "dados" – constante- da Carta – respectivamente.

3.Fundamento Jurídico

Consoante o sigilo lato sensu e o sigilo bancário – como espécie daquele, sem o condão de procrastinar o entendimento do presente estudo, repita-se, não podemos olvidar de esclarecer qual o seu fundamento, ou seja, "dizer o seu porque, a sua razão de ser" [18]; muitas teoria foram elaboradas com o fito de esclarecer tais questionamentos; a seguir vejamos – em epítome – algumas delas:

3.1.Teoria Consuetudinária

Segundo a teoria consuetudinária, o sigilo bancário funda-se no costume comercial dos bancos de respeitar o segredo bancário; com assento nas doutrinas jurídicas italianas e espanholas, "o equívoco dessa teoria está em confundir fundamento jurídico com fonte jurídica" [19].

3.2.Teoria Contratualista

Igualmente esclarecendo qual é a fonte, e não o seu fundamento, os defensores dessa teoria "justificam o sigilo como um dever jurídico oriundo da relação contratual que une o banco ao cliente. Dentro deste quadro, o sigilo bancário coloca-se como uma das arestas fundamentais em que se sustentam as operações bancárias, ou seja, os contratos bancários que constituem sua forma jurídica principal" [20].

3.3.Teoria da Responsabilidade Civil

Assim como as citadas teorias, essa limita-se a esclarecer qual a fonte do sigilo, deixando-nos carente quanto ao seu fundamento, ou seja, não responde o porque de sua existência. Àqueles que comungam dessa teoria afirmam que o sigilo tem assento no dever do banco de não prejudicar aqueles que se servem de seus serviços, sendo certo que "a conseqüência de uma possível violação será a reparação do dano pelo responsável" [21].

3.4.Teoria do Segredo Profissional

Com assento na doutrina jurídica francesa, os seguidores dessa teoria apregoam que o fundamento do sigilo encontra-se no dever de segredo, que é inerente ao profissional bancário. Mais uma vez, a tese afirmada pela maioria dos doutrinadores franceses limita-se a determinar a fonte do sigilo, e não o seu fundamento.

3.5.Teoria da Liberdade de Negação

Apregoam os doutrinadores afeitos a essa teoria – na qual, permissa vênia – me incluo, que o fundamento do sigilo é a liberdade, "especificamente, a liberdade vista por uma ótica negativa. Com base na liberdade, tem o cidadão o direito de não permitir que sua privacidade seja revelada. Todo sigilo existe, em última análise, como expressão da liberdade; direito este inerente ao ser humano. O homem exercita a liberdade tanto de maneira positiva, como negativa" [22].

Assim sendo, o porque da existência do sigilo está, fundamentalmente, na necessidade e no direito de um cidadão desejar que seu segredo não seja revelado, importando conhecimento apenas aos seus interessados. Vale dizer, que o sigilo não guarda relação – consoante seu fundamento – com a profissão ou o exercício financeiro; este, a exemplo de outros serviços prestados é que depende, sob pena de falibilidade – do sigilo e do segredo entre seus operadores, bancos e clientes.

Desta arte, em que pese a existência de teses e teorias com o escopo de determinar o fundamento do sigilo, bancário inclusive, a teoria da liberdade de negação o faz com esmero, apontando àquelas apenas a sua fonte.

Assim sendo, posta desta feita as assertivas consoante ao conceito e ao fundamento do sigilo (bancário), ademais dos apontamentos históricos e da necessidade de se tutelar – Constitucionalmente – a intimidade, faz-se necessário acentuar, adiante, questões deveras imperiosas acerca da quebra do sigilo bancário.

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Sobre os autores
Marcelo Amaral Colpaert Marcochi

pós-graduando em Direito Penal pela UniFMU

Reinaldo Ribeiro Checa Júnior

delegado de polícia em São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARCOCHI, Marcelo Amaral Colpaert ; CHECA JÚNIOR, Reinaldo Ribeiro. A garantia constitucional da intimidade e a quebra do sigilo bancário consoante a Lei Complementar nº 105/2001. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 62, 1 fev. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3756. Acesso em: 18 abr. 2024.

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