Cirurgia plástica estética: obrigação de meio x obrigação de resultado

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31/03/2015 às 14:39
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3. DA INJUSTIÇA ESTIMULADA PELA JUSTIÇA

Nota-se que a caracterização da obrigação deste profissional como de resultado, fomenta esta iníqua industria do dano, pois fica bastante fácil para o paciente afirmar que não era aquele resultado que pretendia, pela simples definição da obrigação como de resultado, a CULPA do médico já passa a ser presumida.

O médico poderá ser acusado de não ter adimplido suas obrigações frente a um possível descontentamento do paciente, mesmo tendo feito tudo que estava a seu alcance e ao alcance da ciência médica.

Não  terá o paciente o ônus de comprovar a culpa do profissional, caberá ao profissional já saturado de tantas demandas e tantos institutos ao seu desfavor, comprovar que o simples "não era o que eu pretendia", não decorreu de culpa, e sim de fatores aleatórios que interferem diretamente no seu atuar.

Caberá ao profissional para não haver responsabilização a prova de sua conduta diligente, pois a simples afirmação pelo paciente de que o resultado não fora adimplido, caracterizará consequentemente na presunção de culpa do profissional. Ressalta-se que tal presunção afronta o Código de Defesa do Consumidor, artigo 14, parágrafo 4, que tipifica expressamente que a responsabilidade civil do profissional liberal será apurada mediante verificação de culpa.

Todas as falhas e imperfeições devem ser aferidas com base na isonomia e dignidade da pessoa humana, a culpa presumida não se coaduna com a proteção à dignidade da pessoa humana do profissional liberal, pois reduz suas chances de defesa na lide, além do mais, a inversão do ônus da prova não pode ser automática. Sendo tal instituto descabido e ilegal frente as demandas entre médicos e pacientes.

Assim, a autora Hildegard destaca que paralelamente à injustiça organizada pela tipificação da obrigação de resultado para algumas especialidades, há ainda outro ponto a ser destacado de extrema importância:

"propicia-se o fomento da "indústria da indenização por erro médico", pois fica bastante fácil para o cliente afirmar que não era aquele o resultado que ele pretendia. Pela simples definição do que seja uma obrigação de resultado, a prestação obrigacional do médico, numa situação como esta, já passa a ser considerada como inadimplida."[10]

A. PACIENTES: APROVEITAM OS INSTITUTOS A SEU FAVOR E PROCESSAM MÉDICOS DE MANEIRA ABUSIVA

Ressalta-se que a aplicação da obrigação de resultado é apenas um dos institutos que propiciam o crescimento de demandas contra médico. Há diversos institutos que são utilizados pelos julgadores que colocam o médico em desvantagem exagerada na comprovação de sua inocência.

Todos estes institutos, são considerados incentivos aos agentes da industria do dano, em que seus percussores estão em busca de ganho fácil, assim qualquer descontentamento, qualquer "achar" é levado ao judiciário sob o título de "erro médico". Alguns podem dizer que esse pensar seria menor, mas a realidade brasileira, demonstra claramente essa utilização, Miguel Kfouri em seu livro, traz a afirmação que 80% dos casos envolvendo médicos são julgados improcedentes. Portanto esses rigorosos institutos aplicados na responsabilidade civil médica demonstram que é excessiva a desvantagem na aferição de supostos erros médicos em detrimento dos profissional que necessitam ter sua dignidade auferida como o mesmo rigor, garantido pela Constituição.[11]

Com estas porcentagens é fácil chegar a conclusão de que o médico é hoje a real vítima de nosso sistema jurídico e de nossa jurisprudência.

Ora, a maioria das demandas contra médicos constituem apenas especulações emocionais em que a família ou o paciente procuram lançar a culpa no médico. Há apenas inconformismo, não há fundamentos fáticos para amparar a demanda. Tratam de questões fadadas a improcedência.

Como citado pela autora Hildegard:

Na pratica, o que se vê em algumas situações, é que basta um hematoma- intercorrência a que todo operado pode estar sujeito- para que um cliente descontente (ou menos bem intencionado), já comece a refletir sobre os "bens patrimoniais"que se médico possui. Ainda que tal afirmativa pareça um tanto drástica, mais drástica ainda é ter-se obtido tal informação a partir da simples observação de casos concretos.[12]

Hildegard, analisou a classe de demandantes do dito "erro médico", em livro publicado em livro de edição de 2004.

Ressalta-se que tal tendência esposada pela autora cresceu em números absurdos. Infelizmente a tendência datada de 2003, nos dias atuais tem tomado proporções absurdas.

Infelizmente, constatamos na observância de casos concretos que na seara da cirurgia plástica, os pacientes buscam o judiciário, mesmo após um bom resultado, não havendo culpa do profissional, mas a lide é atribuída a um descontentamento do paciente consigo mesmo ou com a vida. Assim processa o profissional conceituando como erro o achar, como "não era bem isso que eu queria".

A autora Hildegard cita :

"e, veja-se: não estamos a falar de erro. É um mero "achar", entender que o resultado que desagradou, ou que veio diferente do esperado, deve ser enquadrado no perfil do "erro"e, contra isso, não há nenhuma barreira, não há nada que impeça que o paciente- meramente descontente- leve seu médico aos tribunais. E na maioria das vezes o faz servindo-se das benesses da Justiça Gratuita, não tendo portanto, nada a perder, não importa qual o resultado da ação."[13]

Há nestas cirurgias o depósito pelos pacientes de expectativas que o procedimento, irá mudar sua vida social.

E infelizmente esta postura protecionista do judiciário fomenta este consumo inconsciente do procedimento estético, pois o paciente tem a certeza que qualquer "achar"será apreciado pelo Poder Judiciário.

Como cita Hildegard :

"pois não é raro encontrarem-se pacientes que depositam em um novo nariz ou no final de sua rugas, a expectativa de toda a mudança de suas vidas. E, quando essas "mudanças"ou essa "nova vida", não vem embutida no pós-operatório, este "ato falho" passa a ter, potencialmente, a condição de se transformar em mais uma ação judicial."

Infelizmente este é o fundamento encontrado na maioria das demandas contra os profissionais. Na grande maioria não há erro do profissional, e sim um descontentamento pessoal do paciente, excesso de expectativa e até mesmo ganância.  

O Professor Irany Novah Moraes ciente desta avalanche de ações contra médicos infundadas, escreveu celebre artigo sobre o "erro imaginário". Citando que o assunto em pauta deve ser bem estudado por estudiosos do direito, jornalistas e médicos, pois estes são os profundamente envolvidos na problemática do erro médico, assim afirma o autor, que a leitura fomentará ideias claras sobre o tema, para encontro da verdade em cada ocorrência.[14]

Ressalta-se que é grande o desconhecimento da obrigação do médico, assim como desconhece-se os fatores aleatórios que cercam sua atividade. Contudo, não há fomento para este tipo de estudo no Brasil. Infelizmente há uma avalanche de processos contra médicos em que não há na realidade o dito "erro médico".

A avalanche de processos infundados trazem danos a toda a sociedade brasileira, mas principalmente ao médico, que na grande maioria das vezes luta contra as pré-suposições e os pré-conceitos em busca de provar sua inocência.


4. DA NECESSIDADE DE REVISÃO DE POSICIONAMENTOS PARA COMBATE DA INDÚSTRIA DO "ERRO MÉDICO"

Neste condão, ressalta-se que há necessidade de  uma revisão  na consideração da natureza da  obrigação do  médico, adequando-a  à sua verdadeira natureza, sob o ponto de vista científico; isto é, o resultado dependerá  também de  fatores   relacionados ao  próprio paciente,  além da técnica e preparo do médico.

Cabe ao judiciário e aos juristas a interação com o cenário atual. E a conscientização do verdadeiro fundamento da justiça, despedindo de  pré-suposições perpetradas por nós juristas leigos em medicina, onde foram criadas teorias de culpa presumida, e outras formas de direito descomprometido com a justiça.  

Salienta-se que neste condão é de bom alvitre que sejam analisados os processos do dito "erro médico"com extrema cautela. Os requisitos indispensáveis para ensejamento do dever de indenizar devem ser devidamente comprovados.

Ora, requisito indispensável é a culpa comprovada. Assim, demonstra-se de essencial importância a conscientização da real responsabilidade civil do médico.

O mero descontentamento com o resultado pelo paciente não enseja na responsabilidade do cirurgião plástico, haja vista, que tal especialização enfrenta a mesma álea de qualquer procedimento médico. Para responsabilizar o médico é necessária a comprovação de que o resultado não fora alcançado por ter sido o médico negligente, imperito ou imprudente.

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A. O MÉDICO COMO VÍTIMA  

Como citado em artigo do ANADEM,

Em medicina, seja pela gravidade da doença seja pela inexatidão da ciência, morre gente mesmo. Mas, agora, num mundo onde os governos alimentam os "direitos dos coitadinhos", a "morte tem de ser culpa de alguém", "a morte tem de ser culpa dos "poderosos" e arrogantes médicos. A isto se ajunta o monetarismo, pragmatismo da vida moderna: "Vamos aproveitar e arrancar dinheiro de quem tem, o médico".[15]

A autora HILDEGARD reflete que médico brilhante, que estuda e se atualiza, que tem seu nome entre os melhores, fruto de esforço contínuo e ingente é infelizmente o mais visado:

 "Esse, infelizmente, é o mais visado como alvo para vultuosas indenizações. No que diz respeito aos cirurgiões da área da plástica estética, o que se tem visto na prática é quanto mais em foco estiver o nome do profissional, maior é a ameaça que paira sobre sua pessoa, em especial por parte de certos tipos de pacientes, que nem sempre têm escrúpulos uma de suas características primordiais. [16]"

A indústria do dano contra médico, não atinge apenas a esfera patrimonial do médico, que ao contrário dos demais fornecedores de serviço, não conta com vultuoso poder econômico e nem mesmo com a justiça distributiva, ora, colocar sobre o médico o encargo financeiro de uma demanda infundada, é uma flagrante lesão a seus direitos fundamentais como a dignidade da pessoa humana, presunção de inocência, direito à vida, à intimidade ao patrimônio e etc. E como a maioria dos demandantes conta com a justiça gratuita o médico mesmo que ao final seja tido como inocente não conseguirá reaver a quantia gasta. Ora, não é justo e nem digno que o médico arque com tamanho ônus.

Apesar de todo o desgaste financeiro estas demandas ainda trazem sérios prejuízos ao nome, honra, intimidade e etc. Em alguns casos os médicos são expostos pela imprensa sensacionalista em pré-suposições e pré-conceitos, tendo seu nome e sua fama, construído com anos de estudo jogados na lama. Além do constrangimento e da perda de clientes ao ser colocado como réu em uma ação por erro médico. Em uma pesquisa no "Google", o paciente ou futuro paciente tem em mãos livremente as informações judiciais de seu médico.

"Concluindo, pode-se dizer que é deveras impressionante a devastação psicológica que ocorre na vida de um profissional médico cada vez que se vê envolvido em uma ação judicial. (...) Todavia quando se trata de um médico, parece que o impacto é mais amplo, os danos são maiores, o sofrimento é  mais profundo, isto porque, na grande maioria dos casos a queixa é infundada. Então, aquele processo transforma-se em uma fonte perene de desestímulo para o trabalho e de desencanto pelo ser humano".

"Como justificar, também, o tremendo dano sofrido por aquele profissional, se a estatística de nossa casuística particular comprova que na grande maioria dos casos não ocorreu erro médico, mas sim erro de avaliação por parte do paciente, por excesso de expectativa, por seu descontentamento pessoal, por sua baixa auto-estima, por mal-entendidos e, infelizmente, às vezes, até por ganância...?[17]

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Sobre a autora
Amanda Bernardes

Advogada Especialista em Defesa Médica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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