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As pessoas jurídicas no Novo Código Civil

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O REGISTRO

Depois de examinarmos com a profundidade que o tema societário merece, conceituando o que é estrutura, organização, elemento e o exercício profissional de atividade econômica, interpretando esses institutos jurídicos, dentro do nosso sistema e de acordo com o Direito Comparado, é de rigor examinar aspecto essencial às "sociedades civis e comerciais", que "dependem, para a sua existência plena no mundo do Direito, de certas formalidades que se chamam formalidades de registro" [21].

Há Direito especial a reger os registros das sociedades, sendo da competência privativa da União legislar sobre registros públicos (Constituição Federal, art. 22, XXV, em distinção expressa constitucional ao Direito Civil e Comercial, previstos no mesmo artigo, porém no inciso I); e da competência concorrente da União, dos Estados e dos Municípios, para legislar sobre as Juntas Comerciais (Constituição Federal, art. 24, III).

Esse Direito especial encontra-se, hoje, regulado nas Leis n° 8.935, de 18 de novembro de 1994, no tocante aos Registros Civis de Pessoas Jurídicas; e, n° 8.934, de 18 de novembro de 1994, quanto ao registro público de Empresas Mercantis e atividades afins.

A importância do estudo das formalidades de registro está na disposição contida no artigo 1.153 do novo Código Civil, que determina

Art. 1.153. Cumpre à autoridade competente, antes de efetivar o registro, verificar a autenticidade e a legitimidade do signatário do requerimento, bem como fiscalizar a observância das prescrições legais concernentes ao ato ou aos documentos apresentados.

Esse dispositivo deixa clara a responsabilidade com que se devem haver as autoridades competentes ao registro, obrigados a verificar, dentre outros aspectos, a adequação do ato levado a registro à sua competência legal, conforme atribuído nas respectivas leis de regência (8.934/94 ou 8935/94).

Por isso, força é reconhecer o equívoco com que vem se manifestando alguns vogais da Junta Comercial do Estado de São Paulo, que não apreenderam a exata exegese dos dispositivos do novo Código Civil sobre os institutos acima referidos, quanto ao Direito de Empresa.

Assim, equivoca-se, no nosso sentir, o douto vogal CASSIO PORTUGAL GOMES FILHO, ao entender que

Não existe mais a distinção entre sociedades comerciais e sociedades civis, as primeiras reguladas pelo Código Comercial de 1850 ou pelo Decreto 3.708, de 1919, e as segundas pelo Código Civil de 1916, artigos 1.363 e seguintes. A típica sociedade civil, de prestação de serviços, registrada no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, passa agora, com o novo Código, a ser uma sociedade empresária, e como tal, sujeita a registro na Junta Comercial.

De acordo com a colocação do novo Código, afigura-nos difícil vislumbrar para que finalidade será constituída uma sociedade simples, já que não terá atividade econômica. [22]

Como já visto ad nauseam, acima, não houve extinção do Direito Comercial e, muito menos, das sociedades por ele reguladas, nem às reguladas pelo Código Civil. De igual modo, já vimos que as típicas sociedades civis, de prestação de serviços, não passaram a ser sociedades empresárias, muito menos sujeitas a registro nas Juntas Comerciais. E não há nenhuma dificuldade em vislumbrar a natureza jurídica que estrutura as sociedades de Direito Civil e sua organização pela via simples ou qualquer dos tipos das societárias admitidas para sua constituição, porque o que as rege é a atividade exercida, o objeto da sociedade.

Nem dá margem a dúvidas ou dificuldades, data venia, as apontadas pelo referido Vogal, ao dizer que

Parece-nos que vai ser difícil fazer a distinção se determinado artista ou intelectual é empresário ou não, tomando-se, por exemplo, o caso de Paulo Coelho, que exerce profissão intelectual e literária, escrevendo livros que são vendidos no mundo inteiro, e também do conhecido artista plástico Gustavo Rosa, que pinta e vende lindos quadros no país e no exterior, sob encomenda. Será que ambos serão considerados empresários, ante as disposições do novo Código? Parece-nos que sim, por estar evidente o intuito de ganhar dinheiro e ter lucratividade, porém não se sabe até que ponto se tornará obrigatória a inscrição de ambos no Registro Público de Empresas Mercantis, isto é, na Junta Comercial, que é condição para serem considerados empresários. [23]

Em primeiro lugar, Paulo Coelho não vende seus livros, quem os vende são as livrarias, lojas de conveniências, bancas de jornais, etc. A natureza jurídica do contrato entre o "Mago" e sua editoras, é de contrato típico, de edição, que, inclusive, dá, ao autor, privilégio especial, na massa falida do editor, sobre os exemplares da obra existente (art. 964, VII, do novo Código Civil). Em segundo, porque tanto Paulo Coelho, quanto Gustavo Rosa, são remunerados pela sua própria elaboração, literária e artística, ou como diz REALE, a razão da qualificação de civil a uma atividade econômica que pode dar resultados às vezes iguais ou superiores aos obtidos no plano industrial ou mercantil, é que o profissional "não tem por escopo adquirir matéria-prima para fins de produção, mas sim vende, ou elabora bens de seu próprio cultivo. Não é também um intermediário, ou seja, alguém situado entre o produtor e os consumidores a fim de auxiliar ou possibilitar o fenômeno da circulação da riqueza, com ou sem a transformação dos bens negociados." [24]

É, também, REALE, quem informa que as sociedades civis de caráter econômico são as que visam fins de lucro, sem praticarem atos de comércio [25]. O fim de lucro em nada altera a estrutura civil da sociedade, como vimos.

Equivoca-se mais, com a devida venia, o Vogal e ex-presidente da JUCESP, MORELLO NETTO, ao afirmar que "se a sociedade simples revestir-se dos tipos societários referentes à sociedade em nome coletivo, à sociedade em comandita por ações, em sociedade limitada, e tiver as características empresariais, inclusive a sociedade cooperativa, deverá registrar-se no Registro Público das Empresas Mercantis". [26] Tal interpretação peculiar é, na verdade, contra legem. Em primeiro lugar, porque a sociedade simples só pode ser registrada no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local da sua sede, como diz, com todas as letras, o artigo 998 do novo Código Civil. Em segundo, porque se a lei facultou, às sociedades simples, constituir-se sob qualquer dos tipos societários previstos nela previstos, à exceção das sociedades por ações (artigo 983, segunda parte), o inverso não é verdadeiro, porque a lei não abriu a faculdade de constituir-se simples às sociedades empresarias. E, em terceiro, porque as sociedades cooperativas serão sempre simples (assim como as por ações serão sempre empresárias) por força da exceção expressa no parágrafo único do artigo 982 do novo Código Civil.

Retratam, na verdade, e até pela pouca profundidade com que versado o tema nas matérias citadas, publicações ad usum delphini, olvidando que os registros públicos são regidos pelas regras do Direito Público, seguindo, sempre, critérios objetivos e expressos nas leis próprias, não podendo ficar ao sabor das opiniões ou entendimentos contra legem. Não há, no direito público, autonomia da vontade, nem discricionariedade

Temos, assim, que, observada a atividade profissional exercida, é que se diagnostica a estrutura jurídica a que estará sujeita a sociedade, Civil ou Comercial, e sua organização se dará por qualquer dos tipos societários admitidos no Código Civil (que unificou, não extinguiu, o Direito Civil e o Comercial), salvo as sociedades por ações, que sempre serão empresárias, e as cooperativas, que sempre serão simples.

Resta, assim, em matéria de formalidades de registro, acrescentar que, face às disposições transitórias do novo Código Civil, os contratos sociais e estatutos de sociedades, constituídos antes da entrada em vigor da nova lei, obedecem ao disposto nas leis anteriores, para fins de registro no Registro Civil das Pessoas Jurídicas (arts. 998, 1151 e §§, e 2035 do Código Civil), independente da prova de data.

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Também as modificações dos atos constitutivos das pessoas jurídicas, avençados antes da vigência do novo Código Civil, obedecerão ao disposto nas leis anteriores, exceto se contrariarem preceitos de ordem pública ou a função social da propriedade ou dos contratos (art. 2035, parágrafo único).

De igual modo, a dissolução ou liquidação de pessoas jurídicas, iniciadas antes da vigência do novo Código Civil, obedecerão ao disposto nas leis anteriores (art. 2.034, CC).

Por fim, vale frisar que o novo Código Civil utiliza o vocábulo "autenticidade" em sua acepção jurídica, ou seja, de autêntico, firmado por quem tem legitimidade para faze-lo, devendo ser provada essa condição.


CONCLUSÃO

Vimos, ao longo deste trabalho, que o que define a estrutura jurídica da empresa, ou seja, o regramento a que está sujeita, pelo Direito Público ou Privado, Civil ou Comercial, é o seu objeto social, a atividade que irá exercer profissionalmente. Se for de índole comercial ou afim, estará sujeita às regras do Direito Comercial e no Registro Comercial será feita sua inscrição; se for de índole não comercial, ou comum, ou civil, ou sujeito à forma de organização simples, qualquer que seja a forma de sua organização (simples, limitada, etc.) será regrada pelas normas de Direito Civil e no Registro Civil das Pessoas Jurídicas será feita sua inscrição.


NOTAS

01. MAXIMILIANO, Carlos; Hermenêutica e Aplicação do Direito, Forense, Rio de Janeiro, 2000, pág. 16.

02. Ob. cit., pág. 107.

03. Ob. cit., pág. 128.

04. Ob. cit. pág. 129.

05. Ob. cit. pág. 131.

06. LIMA, Hermes; Introdução à Ciência do Direito, Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1955, 8ª. ed., pág. 134.

07. BOBBIO, Norberto; O Positivismo Jurídico, lições de filosofia do direito, Ícone, São Paulo, 1999, pág. 164, destaques no original.

08. REALE, Miguel; Lições Preliminares de Direito, Saraiva, São Paulo, 25ª ed., 2000, pág. 365.

09. Ob. Cit. Págs. 30-31.

10. FERRARA, Francesco; Trattato di Diritto Civile Italiano, vol. I, 1921, p. 210; apud MAXIMILIANO, Carlos, ob. cit. pág. 30-31, destaques no original.

11. Ob. cit., pág. 366-367.

12. Ob. cit., págs. 368-369, destaques no original, negrito nosso.

13. Ob. cit., pág.242-243, destaques no original, negrito e sublinhas nossos.

14. Ob. cit. pág. 243, destaques em itálico no original, em negrito nossos.

15. Código Civil Italiano, Record, 1961, trad. SOUZA DINIZ, apres. JOSÉ DE AGUIAR DIAS.

16. SILVA, De Plácido; Vocabulário Jurídico, vol. III, Forense, São Paulo, pág. 1102; destaques em itálico no original; em negrito, nossos.

17. MAXIMILIANO, Carlos, ob. cit. pág.250.

18. Ob. cit., pág.242-243.

19. RÁO, Vicente; Ato Jurídico, noção, pressupostos, elementos essenciais e acidentais. O problema do conflito entre os elementos volitivos e a declaração, RT, São Paulo, 4ª ed., 2ª tir., 1999, pág. 89, destaques em itálico no original; em negrito, nossos.

20. GOMES, Orlando; Introdução ao Direito Civil, Forense, Rio de Janeiro, 2001, pág. 205-207, at. HUMBERTO THEODORO JUNIOR, destaques em itálico no original, negrito nosso.

21. REALE, Miguel, ob. cit. pág.248.

22. GOMES F°, Cássio Portugal; Novo Código Civil – Direito de Empresa – Sociedades Limitadas; in DOE, Caderno Junta Comercial, São Paulo, 11 de dezembro de 2002, pág. 2; destaques nossos.

23. Idem, ibidem.

24. Ob. cit., pág. 245.

25. Ob. cit., pág. 244.

26. MORELLO NETTO; João Baptista; in Do Registro Público de Empresas Mercantis, DOE, Caderno Junta Comercial, São Paulo, 11 de janeiro de 2003, pág.2; destaques nossos.

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Sobre o autor
Paulo Roberto de Carvalho Rêgo

oficial do Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Cidade de São Paulo, vice-presidente do Centro de Estudos e Distribuição de Títulos e Documentos da Cidade de São Paulo, diretor da Associação de Notários e Registradores do Estado de São Paulo (ANOREG-SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RÊGO, Paulo Roberto Carvalho. As pessoas jurídicas no Novo Código Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 63, 1 mar. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3813. Acesso em: 5 nov. 2024.

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