Persecução penal e identificação genética

20/04/2015 às 18:14
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É muito importante a identificação genética. O presente artigo visa identificar e analisar, com base na aprovação da Lei 12.654/2012 que regulamenta utilização dos bancos de perfil no Brasil, na esfera criminal, com base no sistema jurídico brasileiro.

Introdução

As descobertas na área da genética são amplas e sua aplicação técnica cada vez mais diversificada.

Os resultados genéticos são significativos e seu principal benefício consiste na possibilidade de prevenir doenças ou evitar o seu desenvolvimento, já que é possível descobrir a presença de genes e cromossomos alterados, os quais são responsáveis por inúmeras enfermidades genéticas. 

Nos últimos anos, com o avanço da tecnologia, ou seja, com a possibilidade de estabelecer a função e regulação dos genes, a pesquisa e a medicina são as áreas que contam com uma estrutura mais avançada, em relação a outras como a do Direito Penal.

No entanto, a omissão normativa, existente em diversos países, não é empecilho para a criação de bancos de perfis genéticos para fins de persecução criminal.

Ao contrário, a criação dos referidos bancos acaba servindo como força  impulsora a elaboração normativa.

No Brasil, não foi diferente, houve a aprovação da Lei º12.654/2012, que autoriza a coleta de material genético para fins de persecução criminal e regulamenta o banco de perfis genéticos, para essa mesma finalidade, nos seguintes termos:

"(...)Art. 5º-A. Os dados relacionados a coleta do perfil genético deverão ser armazenados em banco de dados de perfis genéticos, gerenciado por unidade oficial de perícia criminal.

§ 1º As informações genéticas contidas nos bancos de dados de perfis genéticos não poderão revelar traços somáticos ou comportamento das pessoas, exceto determinação genérica de gênero, consoante as normas constitucionais e internacionais sobre direitos humanos, genoma humano e dados genéticos.

§ 2º Os dados constantes dos bancos de dados de perfis genéticos terão caráter sigiloso, respondendo civil, penalmente e administrativamente aquele que permitir ou promover sua utilização para fins diversos dos previstos nesta Lei ou em decisão judicial.

§ 3º As informações obtidas através da coincidência de perfis genéticos deverão ser consignadas em laudo pericial firmado por perito oficial devidamente habilitado.

Art. 7º -A. A exclusão dos perfis genéticos dos bancos de dados ocorrerá no término do prazo estabelecido em lei para a prescrição do delito.''Art. 7º-B. A identificação do perfil genético será armazenado em banco de dados sigiloso, conforme regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo.

Art. 9º-A. Os condenados por crime praticado, dolosamente, com violência de natureza grave contra a pessoa, ou por qualquer dos crimes previstos no art. 1º da Lei 8.072/1990, serão submetidos, obrigatoriamente, a identificação do perfil genético, mediante extração do DNA, por técnica adequada e indolor.'

§ 1º A identificação do perfil genético será armazenada em banco de dados sigiloso, conforme regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo.

§ 2º A autoridade policial, federal ou estadual, poderá requerer ao juiz competente. no caso de inquérito instalado, o acesso ao banco de dados de identificação de perfil genético. "

A respeito da presença de biotecnologias e pesquisas genéticas no país, a população brasileira é afetada pela criminalidade e por um sistema jurídico ineficiente e deficiente.

Os bancos genéticos foram criados por finalidades distintas, no entanto é preciso analisar a complexidade e a ligação dessas finalidades, especialmente na gestão e criação dos novos biobancos, pois há um fator comum anterior a todos os bancos que é o acesso ao material biológico ou genético humano.

Inclusive, quando da criação de bancos de perfis genéticos para fins de persecução penal.

Com base nesses pressupostos, o presente artigo tem como objetivo identificar e analisar, com base no sistema jurídico brasileiro e no direito comparado, os possíveis riscos/benefícios e limites/possibilidades à utilização do DNA para fins de persecução criminal, de forma a respeitar os direitos e garantias fundamentais do cidadão, seja em termos de efetiva tutela jurisdicional, seja em termos de privacidade e autodeterminação corporal e informacional.

Da Coleta do Material Biológico ao Armazenamento do Perfil Genético

O material genético, neste caso o humano, pode ser uma amostra de sangue, saliva, bulbo capilar, entre outros, que permitirá a análise para extração do chamado "perfil genético".

O perfil genético traz informação sobre a descrição étnica do sujeito (independente dessa característica ter se manifestado fenotipicamente) e sobre o sexo (o que poderia revelar alguma anomalia patológica ou mesmo uma característica psicológica e social relacionada ao sexo).

Como as pesquisas genéticas são recentes e avançam rapidamente, não se descarta que futuramente os estudos do DNA apontem outro tipo de informação (como a cor dos olhos).

Porém, é preciso salientar que existe sempre a coleta da amostra de DNA que contém toda a informação genética humana que pode ser utilizada inadequadamente , inclusive como meio de atribuir uma culpa ou discriminar.

Um exemplo ocorreu nas décadas de 1960 e 1970, quando surgiu um debate sobre a aptidão dos homens com um Y a mais ("síndrome XXY") a cometer crimes.

Segundo o doutrinador Guilherme Silveira Jacques, na obra "Aspectos éticos e legais dos bancos de dados de perfis genéticos: "Após alguns estudos indicarem que a freqüência de homens XXY era maior em presídios do que na população em geral, os portadores do cromossomo Y passaram a ser discriminados, mesmo que não apresentassem comportamento agressivo ou criminoso" (página 8).

Assim, qualquer dado pessoal de caráter genético deve ser considerado um dado que afeta a intimidade genética do indivíduo e, portanto, deve ser protegido pelo direito fundamental a intimidade.

A Genética de Indivíduos e Populações

Nesses casos, a informação genética será necessariamente objeto de comparação com a finalidade de obter alguma valor cientifico e jurídico probatório.

Diante disso, destaca-se o caráter probabilístico dessa informação genética, e a relação com estudos populacionais e comparativos.

Também é preciso considerar a "teoria do mosaico", no qual existem dados que isoladamente não conduzem informação pessoais, mas que uma vez cruzados com outros dados, podem trazer informações que afetam a intimidade genética pessoal.

Por exemplo, Casabana e Mandala mencionam a descoberta da existência ou da inexistência de relação parental biológica desconhecida anteriormente.

Os dados apurados pelos arquivos genéticos para fins criminais se limitam ao ambito não codificado do DNA, que possibilita aos biólogos moleculares determinar a identidade da pessoa e possíveis relações de parentesco.

Vale lembrar, que o material genético contém todas as informações genéticas do indivíduo.

Por outro lado, mesmo se tratando de perfil genético, é preciso avaliar os riscos envolvidos no armazenamento destas informações em um banco, ou seja, é preciso avaliar a vulnerabilidade das mesmas em termos de acesso ou em termos de codificação.

Esses fatos demonstram que o acesso a tecnologia e a informação por ela produzida pode ser utilizada de diversas maneiras, muitas vezes desconhecidas ou não previstas, inclusive de forma antiética ou ilegal.

Dessa forma, é responsabilidade do direito levar em consideração essas possibilidades (ainda que não desejadas) no momento da elaboração de uma legislação.

De modo geral, os biobancos e os bancos de dados genéticos podem ser classificados a partir dos seguintes critérios: estatuto jurídico público ou privado (se foi criado por uma lei ou contrato); finalidade (destinação do banco, amostras e dados armazenados), conteúdo (tipo de material ou dado armazenado); tamanho e grau de organização, e, por fim, circulação das amostras e dados ao exterior.

Conclusão

É possível perceber que, apesar da crescente expansão do direito penal e o surgimento de diversas leis referentes a novas situações antes desconhecidas por nosso ordenamento jurídico, apenas está resolvendo de forma simbólica as necessidades da sociedade no momento em que se criaram leis que muitas vezes não são efetivas, pois tem que haver parâmetros bem definidos quanto a sua utilização e aos seus limites imposto pelo Direito.

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Primeiramente, é preciso analisar se é constitucional que a coleta de material genético ocorra compulsoriamente ou voluntariamente, segundo os direitos fundamentais afetados.

Dessa forma, decorre a necessidade de analisar qual o sentido do princípio constitucional relativo à proibição de produção probatória contra si mesmo no direito brasileiro, pois nesse caso o DNA trata-se de um ato de investigação (identificação) e um ato de produção probatória (prova).

Em segundo lugar, é preciso analisar se é adequado criar um banco de perfis genéticos cujas amostras coletadas originam-se de um determinado grupo da população, e, nesse caso, quais critérios de coleta de material biológico deveriam ser utilizados com base na proporcionalidade, ou se seria mais adequado criar um banco universal, com amostras de todos os cidadãos de determinado Estado, sem qualquer distinção ou critério para realização da coleta.

Assim, a criação de um banco de perfis genéticos para fins de persecução criminal ofenderia ou restringiria direitos e garantias fundamentais, como a privacidade e intimidade da pessoa e se haveria algum outro princípio que justificaria tal relativização ou restrição aos direitos fundamentais.

Os perfis genéticos não oferecem resultados de plena identificação (100%), plena, portanto, não são incontestáveis.

Trata-se, portanto, de um resultado ou prova de probabilidade, e os resultados não podem ser aceitos de forma automática.

De fato, para que haja efetivamente um resultado mais próximo da realidade, é preciso levar em consideração dados adicionais e não estatísticos que são conhecidos pelo juiz e não pelo perito.

Portanto, é preciso ampliar os resultados da prova genética e compreender que o poder da perícia é limitado.

Os operadores do Direito, não devem aceitar o resultado do perfil genético como prova incontestável, mas também não deve apresentar rigor e fundamentação na valoração dessa perícia. Elas devem estar em conjunto com as demais provas e indícios do caso concreto, ou seja, em harmonização.

É fundamental enfrentar questões como:

a) os critérios de inserção, manutenção e exclusão tanto dos perfis extraídos e analisados, quanto das amostras coletadas;

b) os requisitos para que não haja anulação pelo Poder Judiciário da prova produzida caso não observe os direitos e as garantias constitucionalmente reconhecidos;

c) a eventual necessidade de que a coleta da amostra genética seja realizada com o acompanhamento de um advogado;

d) a possibilidade de utilizá-la para a apuração de outros delitos (prova emprestada).

Uma lei que tenha uma grande mudança na forma de investigação e identificação criminal deve vir acompanhada de estudos aprofundados sobre o assunto, por meio de estudos de casos, análise de constitucionalidade em relação ao mérito, dos benefícios e prejuízos por eles trazidos, da segurança e garantia que deve envolver os materiais coletados, tudo isso para que não tenha mais uma lei sem utilidade prática e que não satisfaça suas necessidades, ou pior, que agrida os direitos dos cidadãos e os princípios assegurados pela Constituição Federal brasileira.

Por isso, é preciso considerar os postulados processuais penais de moda que se compreenda o Direito Processual Penal não apenas como instrumento do Direito Penal, mas como mecanismo efetivo das promessas constitucionais.

Bibliografia

JACQUES, Guilherme Silveira; MINERVINO, Alice Costa. Aspectos éticos e legais dos bancos de dados de perfis genéticos.

                        

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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