Auxílio-reclusão:uma garantia constitucional ameaçada pelo populismo punitivo

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Resumo: O presente artigo tem por objeto o estudo do benefício do auxílio-reclusão, a partir de uma abordagem histórico constitucional e previdenciária, bem como, a quem ele se destina e suas previsões legais no ordenamento jurídico.

 

 

ResumoO presente artigo tem por objeto o estudo do benefício do auxílio-reclusão, a partir de uma abordagem histórico constitucional e previdenciária, bem como, a quem ele se destina e suas previsões legais no ordenamento jurídico. Desta forma, elenca quais os requisitos que deverão ser preenchidos para o seu cabimento, bem como, sua finalidade como função social, provendo a subsistência da família do reeducando, uma vez que esta dependia do preso. O referido artigo sustenta-se no estudo de livros, legislação e artigos, que possibilitam um melhor entendimento acerca da temática, visto que o assunto é atual e de significativa repercussão na sociedade.

Palavras-chave: Auxílio- reclusão. Previdência Social. Prisão. Benefício. Dependentes.

Abstract: This article focuses on the study of the benefit of the reclusion support, before the constitutional and welfare history unfold, as well as to whom it is intended and its legal provisions in the legal system. Thus, lists what requirements must be completed for your appropriateness as well as their purpose as a social function, supporting the family through education, since this depended on the prisoner. The article argues that in the study of books, legislation, articles, enabling a better understanding of the subject, since the matter is current and significant impact on society.

Keywords: Reclusion support. Social Security. Prison. Benefit. Dependents.

Sumário: Introdução; 1- Seguridade Social; 1.1- Alguns dos Princípios Regentes da Seguridade Social; 1.2- Da Saúde; 1.3- Da Previdência Social; 1.3.1- Benefícios; 1.3.2- Beneficiários: Segurados e Dependentes1.3.3- Dos Segurados, 1.3.4- Dos Dependentes; 1.4- Da Assistência Social; 2-. Auxílio-reclusão: conceito e origem; 2.1- Previsão legal; 2.2- Concessão e Requisitos; 2.3- A Emenda Constitucional nº20/98; 2.4- Dos Dependentes; 3- Da condição de Suspensão do Auxílio-reclusão; 4- Cessação do Benefício; 5- Da Carência e do Período de Graça do Benefício; 6- O Auxílio-reclusão e o populismo punitivo; 7- Considerações Finais; Referências.

Introdução

O auxílio-reclusão constitui benefício da previdência social, previsto na Constituição Federal e regulado pela Lei de Benefícios da Previdência Social – Lei nº 8.213/91 de 24 de junho de 1991, sendo pago aos dependentes do segurado de baixa renda preso, já que, no período de segregação, o mesmo encontra-se impossibilitado de prover a subsistência de seus dependentes

O auxílio-reclusão é uma garantia constitucional que se mostra vulnerável e questionável diante de uma população ausente de informações e de um governo que não dispõe de métodos para explanar a real aplicação do benefício em questão, haja vista que no presente ano eleitoral, foi possível verificar que em todos os debates dos candidatos a presidência, os mesmos sequer conseguiram formular ou responder algum tema acerca da Previdência Social. Esse fato, por si, já demonstra o desconhecimento do tema previdenciário no país.

Através dos meios de comunicação, circulam informações equivocadas, sem respaldo jurídico ou qualquer tipo de veracidade da fonte acerca do referido benefício. Diante desta situação, o auxílio-reclusão se tornou vulnerável a um populismo punitivo ignorante da sociedade. Dessa forma, o presente artigo trabalha com as percepções no âmbito social e no âmbito do estado democrático de direito, através de uma trajetória coadunando os princípios constitucionais e demais legislações, entre elas, a legislação previdenciária, com a devida explanação sobre a seguridade social, e outras mais que tratem da temática trazida à baila.

O artigo pretende sanar os equívocos fartamente reproduzidos pela ignorância de indivíduos que sustentam que o auxilio-reclusão é uma “bolsa bandido”, “bolsa marginalidade”, “bolsa prisão” ou até mesmo “salário presidiário”. Diante desta situação, propagada em rodas de conversas ou mesmo pelas redes sociais, o auxílio-reclusão se tornou vulnerável perante o populismo punitivo e eleitoreiro o que vem contribuindo para a degradação do instituto. Por isso, este artigo demonstra e comprova que o auxílio-reclusão é um benefício devido aos dependentes do segurado a Previdência Social. Ou seja, não é uma regalia oriunda de ganhos eleitorais, muito menos uma bolsa, mas um seguro contratado junto a Previdência Social pelo trabalhador que mantém as suas contribuições em dia, uma garantia fundamental temperada pela manutenção da dignidade da pessoa humana e pela individualização da pena elencados pela Carta Magna de 88.

A principal finalidade deste artigo é explanar fundamentadamente a trajetória deste benefício, de modo que, o mesmo, sirva como instrumento para embasar a formação do debate, verificando as possibilidades de análise, reflexão e crítica, por ser o referido auxílio um instituto paradigmático, para que não haja um confinamento de uma repulsa social que gera o preconceito, a política da exclusão social.

1- Da Seguridade Social

A seguridade social está prevista na Constituição Federal de 1988, e tem por seu objetivo, assegurar aos indivíduos um conjunto de ações, diretrizes por meio das quais se pretende alcançar o bem estar social, diminuindo, assim, as desigualdades sociais que tanto assolam a população. Estas ações são concretizadas através de intervenções do Poder Público, sendo significativamente influenciada pelo regime político no qual se desenvolve juntamente com a sociedade.

A seguridade social envolve um conceito amplo, universal, que se destina a todos aqueles que necessitem, desde que haja previsão legal sobre a contingência a ser coberta, Trata-se de gênero do qual a previdência social, a assistência social e a saúde pública são espécies. (MARTINS, 2011, p. 23)

Inicialmente, para que haja a diminuição das disparidades sociais, é elementar que seja conhecida e assegurada à aplicação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, disposto no artigo 1º, inciso III da Carta Magna, de modo que este princípio está além da aplicação jurídica, passando a tutelar o indivíduo integrante da sociedade para a manutenção da Ordem Social, também prevista na CF/88. A seguridade social compreende a Previdência Social, a Assistência Social e a Saúde.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 194, dispõe sobre o conceito de seguridade social, assim como os seus objetivos:

Art. 194 A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I - universalidade da cobertura e do atendimento;

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - eqüidade na forma de participação no custeio; VI - diversidade da base de financiamento;

VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados. (BRASIL, 1988)

Ademais, os princípios da dignidade da pessoa humana, princípio da individualização da pena e o princípio da proteção familiar estão intimamente ligados ao Auxilio-Reclusão, objeto do presente artigo, princípios estes que serão abordados ao decorrer do artigo.

1.1- Alguns dos Princípios Regentes da Seguridade Social

A. Universalidade da Cobertura e do Atendimento: estes princípios estão dispostos no artigo 194, § único, I da Constituição Federal de 1988. O princípio da universalidade do atendimento assegura que todos os indivíduos devem ser cobertos pela proteção social, sendo a assistência social e a saúde, objetivos que deverão estar sempre a serviço de todos. Todavia, a previdência social é o único objetivo da Seguridade Social que possui regime contributivo de filiação obrigatória para todos que exercem atividade remunerada.

Já o princípio da universalidade da cobertura delimita a necessidade de que a proteção da seguridade deve alcançar todos os riscos sociais, quais sejam, os riscos e indenizações previamente definidos mediante contribuição do segurado. Ou seja, este princípio é objeto da relação previdenciária que se dá através da contribuição do segurado e consequente prestação de benefícios e serviços pela previdência.

B. Uniformidade e Equivalência dos Benefícios e Serviços às Populações Urbanas e Rurais: elencado no inciso II, do artigo 194 da Constituição Federal, este princípio acaba com as diferenças entre trabalhadores urbanos e rurais, de forma que através da uniformidade é demonstrado que os trabalhadores urbanos e rurais têm direito ao mesmo plano de proteção social. Já a equivalência é transmitida através da proporcionalidade no valor dos benefícios entre estes trabalhadores.

C. Seletividade e Distributividade na Prestação dos Benefícios e Serviços: situados no inciso III do artigo supramencionado, estes princípios impedem a concessão ou a extensão de prestações diversas das previstas taxativamente pela lei. A seletividade é caracterizada quando as prestações dos benefícios e serviços forem fornecidas apenas a quem realmente necessitar, de forma que se enquadre nas situações que a lei dispuser.

A seletividade é um contrapeso ao princípio da universalidade da cobertura, pois se a previdência social tem de abranger todos os riscos sociais existentes, de outro modo os recursos oferecidos pelo Estado não são inacabáveis, forçando o Estado a triagem dos benefícios e serviços a serem prestados, através da contribuição do trabalhador a previdência, de modo que, configura também o princípio da reserva do possível, onde é regulada a possibilidade e a extensão da atuação estatal a certos direitos, no caso em tela, os direitos sociais, condicionando-os ao limite de recursos públicos disponíveis.

O princípio da distributividade é senão a justiça social, ou seja, deve-se distribuir para os que mais precisarem da proteção da seguridade social, com o objetivo de reduzir as disparidades.

D. Irredutibilidade do Valor dos Benefícios: Esse dispositivo constitucional é previsto no artigo 201, §4º: “É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios definidos em lei.” Vale ressaltar que, esse princípio está relacionado à previdência social, pois somente quem contribui receberá o benefício ou a prestação de serviço.

1.2- Da Saúde:

A saúde está disposta na Constituição Federal de 1988, como direito social, sendo dever do Estado provê-la a todos. A Lei Magna, em duas passagens, faz menção expressa à saúde como direito do cidadão:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 196 A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL, 1988)

É assegurada pelo Ministério da Saúde, através do Sistema Único de Saúde - SUS. Com efeito, o acesso a saúde independe de pagamento e é irrestrito. Ou seja, não importando a classe social que o indivíduo pertença, o Estado não poderá deixar de assegurar a saúde. O autor Sérgio Martins (2003, p. 46) entende que “A saúde pretende oferecer uma política social e econômica destinada a reduzir riscos de doença e outros agravos, proporcionando ações e serviços para a proteção e recuperação do indivíduo”.

1.3- Da Previdência Social

A Previdência Social é um dos ramos da seguridade social, com o fito de proporcionar uma rede de proteção social, tem como requisito indispensável a contribuição para poder usufruí-la e obter a condição de segurado.

Nesta senda, o direito a previdência social, engendra a concessão de diversos benefícios tais como, pensões, aposentadoria, incluindo o benefício do auxílio-reclusão, objeto deste artigo, de viés social com finalidade de atender os dependentes do segurado recolhido à prisão.

Senão vejamos:

Visando amparar materialmente os dependentes do recolhido a prisão, este benefício [auxílio-reclusão] se coaduna com os objetivos maiores da previdência social, a saber, sua inserção na trajetória da evolução histórica do Estado Democrático de Direito, bem como com correspondência com o ideal de solidariedade que orienta todo o sistema, tendo em vista a manutenção da dignidade da pessoa humana- um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. (PEREIRA NETTO; SILVA; SILVA, 2005, p.803).

A previdência brasileira apresenta dois regimes, quais sejam: o Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e os Regimes Próprios de Previdência de Servidores Públicos (RPPS) - estes últimos para servidores de cargos efetivos (incluindo vitalícios) e militares. Existe também o Regime Complementar, mas ao contrário dos outros, é facultativo, ficando a escolha de cada um optar por este regime.

Insta registrar que, há dois tipos de proteção: a obrigatória e a facultativa. A obrigatória abrange todos os cidadãos que exercem atividade remunerada, os quais estarão vinculados ao regime geral ou aos regimes próprios. Esta proteção tem o escopo de substituir os rendimentos do trabalho e desta forma, os benefícios previdenciários concedidos partem de uma média das remunerações recebidas pelo trabalhador durante toda sua vida laboral.

Além disso, a Carta Magna dispõe da proteção complementar ou facultativa, conforme se infere no artigo 202 da Constituição Federal de 1988. A proteção complementar faz parte do regime da previdência privada, e tem como finalidade garantir a manutenção do mesmo padrão de vida do trabalhador, complementando a aposentadoria dos regimes obrigatórios.

A Previdência Social estabelece um sistema de proteção social com o fito de propiciar meios de sustento do segurado e da sua família, reduzindo as disparidades de classes, de modo que garanta uma vida digna ao trabalhador ao conceder benefícios para as populações mais carentes. Para isso, o poder público exige contribuições, garantindo aos beneficiários as prestações previdenciárias.

É o que se observa nas palavras precisas de Sérgio Martins:

A Previdência Social consiste, portanto, em uma forma de assegurar ao trabalhador, com base no princípio da solidariedade, benefícios ou serviços quando seja atingido por uma contingência social. Entende-se, assim, que o sistema é baseado na solidariedade humana, em que a população ativa deve sustentar a inativa, os aposentados. As contingências sociais seriam justamente o desemprego, a doença, a invalidez, a velhice, a maternidade, a morte etc. (MARTINS, 2003, p.301).

A previdência tem como objetivo social a proteção não só do segurado, mas também de seus dependentes. Aliás, desse entendimento não diverge a jurisprudência:

AUXÍLIO-RECLUSÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. ARTS. 39, I E 80 DA LEI Nº 8.213/91. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL.

O auxílio-reclusão é devido aos dependentes dos segurados especiais, no valor de 01 salário- mínimo, a teor do art. 39, I, da Lei 8.213/91 e está disciplinado pelo art. 80 do mencionado diploma legal. - Considera-se

beneficiários do RGPS na qualidade de dependentes do segurado, nos termos do art. 16, I da Lei 8.213/91, o cônjuge e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido, sendo a dependência econômica dessas pessoas presumida conforme § 4º, do referido dispositivo legal. - É possível a comprovação da condição de trabalhador rural através de depoimentos testemunhais e de documentos os quais, apesar de não servirem como prova documental stricto sensu, já que não previstas na legislação, têm o condão de fortalecer a prova testemunhal, funcionando como início de prova material, tais como certidão de casamento na qual consta a profissão do instituidor do benefício de agricultor e cópias do ITR relativa ao imóvel rural, onde era exercida a atividade rural, de propriedade do genitor do segurado. - O STJ firmou entendimento no sentido de admitir, como início razoável de prova material, certidões de registro civil nas quais conste a profissão de agricultor da pessoa interessada em comprovar sua qualidade de rurícola. - Direito ao benefício reconhecido desde a data do requerimento administrativo e apenas durante o período em que o segurado estiver recolhido à prisão sob regime fechado ou semi-aberto a teor do art. 116, § 6º, do D. 3.048/99. - Correção monetária das parcelas em atraso de acordo com a Lei 6.899/81 e legislação subseqüente. - Juros moratórios à razão de 1% ao mês e a contar da citação. - Honorários advocatícios à razão de 10% sobre o valor da condenação, observado os termos da Súmula 111/STJ. Apelação provida. (TRF 05ª R.; AC 397603; Proc. 2006.05.99.001431-2; PB; Primeira Turma; Rel. Des. Fed. José Maria Lucena; Julg. 04/12/2008; DJU 13/02/2009; Pág. 236)

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Reiterando, é imprescindível a contribuição do segurado a previdência social para a validação e consequente cobertura dos eventos como doença, desemprego, invalidez, e a prisão, conforme explanado no quadro comparativo.

1.3.1- Benefícios Previdenciários

Para melhor compreensão acerca do objeto desta monografia, é necessário o aprofundamento na área da Previdência Social, de modo que, o auxílio-reclusão é caracterizado por ser um benefício. Mas, o que significa benefício? Nada mais preciso do que o conceito emitido pelo site da Previdência Social:

Benefícios consistem em prestações pecuniárias pagas pela Previdência Social aos segurados ou aos seus dependentes de forma a atender a cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; maternidade; salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; e pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes.

[...] A dinâmica dos benefícios no sistema previdenciário compreende os seguintes processos: a) Concessão que trata do fluxo de entrada de novos benefícios no sistema; b) Manutenção que abrange os benefícios ativos e suspensos constantes no cadastro; c) Cessação que corresponde aos benefícios que não geram mais créditos e são excluídos do cadastro; e d)Emissão que trata dos créditos emitidos para pagamento dos benefícios que estão ativos no cadastro. Um benefício está na condição de suspenso quando não está gerando créditos para pagamentos, podendo ser reativado a qualquer momento.

1.3.2- Beneficiários: Segurados e Dependentes

A cobertura previdenciária se destina aos segurados e aos dependentes, ocorre que, os mesmos possuem relações jurídicas diferentes com a previdência. A relação do segurado começa com o ingresso no sistema, e se prolongará enquanto estiver filiado. Contudo, a relação jurídica do dependente só se concretiza quando não houver mais a possibilidade de se formalizar uma relação jurídica com o segurado. Pois não há, no ordenamento previdenciário, nenhuma hipótese de cobertura simultânea para segurado e dependente.

1.3.3- Dos Segurados

Vejamos o conceito de Marisa dos Santos acerca do segurado:

Segurados são sempre pessoas físicas, isto é, que contribuem para o regime previdenciário e, por isso, terão direito a prestações – benefícios ou serviços- de natureza previdenciária. São sujeitos ativos da relação jurídica previdenciária, quando o objeto for benefício ou serviço de natureza previdenciária. (SANTOS, 2012, p.91)

Os segurados podem ser classificados como segurados obrigatórios ou facultativos, conforme a Lei nº 8.213/91, onde os segurados obrigatórios estão elencados no artigo 11, abrangendo todos que exercem atividade remunerada, de natureza urbana ou rural, com ou sem vínculo empregatício, quais sejam, empregado, empregado doméstico, contribuinte individual, trabalhador avulso e segurado especial.

Já os segurados facultativos, estão previstos no rol do artigo 13 da lei supracitada, sendo o segurado facultativo o maior de 16 anos que se filiar ao RGPS, mediante contribuição, desde que não se encaixe em nenhuma das categorias do artigo 11 da Lei nº 8.213/91, ou seja, o rol que está previsto no artigo 11, não é taxativo.

1.3.4- Dos Dependentes

A relação dos dependentes com a Previdência Social será iniciada apenas quando deixar de existir relação entre este e o segurado, o que ocorre nos casos de morte ou recolhimento à prisão do segurado, hipótese que é objeto do presente artigo. Desta forma, não há como assegurar a cobertura legal do segurado e de um dependente simultaneamente.

A inscrição do dependente será realizada por meio da solicitação do benefício a que tiver direito, tudo, conforme artigo 17, §1º, da Lei 8.213/91, bem como, para efetivação deverá ser apresentados os documentos prescritos pelo artigo 22, do Decreto nº 3.048/99 – Regulamento da Previdência Social.

As classes dos dependentes estão enumeradas nos incisos I a III, do artigo 16 da Lei nº 8.213/91, quais sejam:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.(BRASIL, 1991)

1.4- Da Assistência Social

A assistência social é prevista nos artigos 203 e 204 da CF/88, além da Lei nº 8.742/93 Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), e tem a finalidade prestar amparo aos hipossuficientes, independentemente de contribuições à Seguridade Social.

O artigo 6º da Constituição Federal elenca os denominados direitos sociais, assegurados como garantia fundamental, destacando-se neste momento o direito a saúde, a previdência social e assistência aos desamparados.

A assistência social visa a atender os hipossuficientes, com destinação de benefícios àqueles que, preenchidos os requisitos determinados em lei, fazem jus a benesse, mesmo sem ter vertido qualquer contribuição para o sistema. A saúde pública visa a oferecer políticas econômicas e sociais destinadas a reduzir riscos de doenças, com ações destinadas a proteção dos indivíduos. (MARTINS, 2011, p.24)

Ou seja, assistência social deve ser prestada independentemente de contribuição, o que afasta o cumprimento de carências. A Constituição Federal, ao deliberar acerca da assistência social, não trata dela apenas no caráter assistencialista, indo mais além, ao dispor da assistência social como fator transformação social, haja vista ser incessante a busca pela promoção da integração e inclusão do indivíduo na sociedade, de forma que a contraprestação recebida através do amparo assistencial gere atividades ao indivíduo que possa assegurar a subsistência da família, diminuindo as disparidades sociais.

2- Auxílio-reclusão: Conceito e Origem

O auxílio-reclusão é em um benefício da Previdência Social, regulado pela Lei nº 8.213/91, que tem como finalidade a proteção dos dependentes carentes do segurado preso, o qual fica impedido de prover a subsistência de seus dependentes em decorrência da segregação, pois a prisão é tratada como risco social a merecer proteção do direito.

Segundo Dantas, Rodrigues (2009, p.56) O auxílio-reclusão foi criado pelo extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), em 1933, seguido pelo também extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários (IAPB), em 1934.

Segundo nos ensina Hélio Gustavo Alves:

[...] o auxílio-reclusão é um benefício que garante a proteção da família e dependentes, além da fundamental importância para o equilíbrio da economia do País, ou seja, proporciona aos recebedores uma qualidade de vida digna, servindo a renda mensal para sustentação às bases alimentar e educacional e à saúde. (ALVES, 2007, p.16)

A instituição do auxílio-reclusão se deu pela Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, quando houve uma reestruturação do sistema brasileiro. No âmbito constitucional, a Carta Magna de 1988 foi a primeira a deliberar acerca do auxílio-reclusão.

2.1- Previsão Legal

O direito ao auxílio-reclusão é assegurado como fundamento constitucional e infraconstitucional. A previsão constitucional do auxílio-reclusão está disposta no artigo 201 da Carta Magna, que diz:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998). (BRASIL, 1988)

O benefício em comento também é previsto no artigo 80, da Lei 8.213/91:

Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.

Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário. (BRASIL, 1991)

2.2- Concessão e Requisitos

Destarte, a data base para que seja realizado o pagamento do benefício em comento, será a mesma do efetivo recolhimento do segurado à prisão, de modo que o requerimento deverá ser feito em até trinta dias após a prisão. Com efeito, decorrido os trinta dias a data inicial do pagamento será a data do requerimento.

Para obtenção do auxílio, os dependentes do segurado deverão agendar atendimento em uma agência da Previdência Social, podendo ser agendado pela internet através do site da Previdência ou pelo telefone 135, levando todos os documentos requeridos pela Instituição.

Para ter direito ao benefício, o último salário-de-contribuição do segurado tomando seu valor mensal deverá ser igual ou inferior ao valor de R$ 1.025,81 (um mil e vinte e cinco reais e oitenta e um centavos) independentemente da quantidade de contratos e de atividades exercidas, conforme se infere na Portaria Interministerial MPS/MF nº 19, de 10 de janeiro de 2014:

Art. 5º O auxílio-reclusão, a partir de 1º de janeiro de 2014, será devido aos dependentes do segurado cujo salário-de-contribuição seja igual ou inferior a R$ 1.025,81 (um mil e vinte e cinco reais e oitenta e um centavos), independentemente da quantidade de contratos e de atividades exercidas.

§ 1º Se o segurado, embora mantendo essa qualidade, não estiver em atividade no mês da reclusão, ou nos meses anteriores, será considerado como remuneração o seu último salário-de-contribuição.

§ 2º Para fins do disposto no § 1º, o limite máximo do valor da remuneração para verificação do direito ao benefício será o vigente no mês a que corresponder o salário-de-contribuição considerado. (BRASIL, 2014)

Com efeito, em toda a sua trajetória, o benefício consolidou alguns requisitos para a sua concessão, nas situações elencadas a partir da análise de Daniel Raupp:

a) A prisão do segurado, entendida de forma ampla, como qualquer forma de restrição de liberdade imposta pelo Estado;

b) A condição de segurado- junto ao Regime Geral da Previdência Social- do indivíduo recolhido à prisão;

c) A condição de dependente, em relação ao preso, do postulante ao auxílio-reclusão, já que beneficiários deste;

d) E, que o segurado, no período de encarceramento, não esteja recebendo remuneração de seu empregador, nem esteja em gozo de auxílio- doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço. (RAUPP, 2009, p.64-66)

Ademais, para manutenção do benefício, é imprescindível que a família compareça trimestralmente a Previdência Social para apresentar o atestado de reclusão sob a condição de o pagamento ser suspenso. Vale registrar que, o auxílio-reclusão é pago diretamente aos dependentes do segurado, e não ao recluso.

Ressalta-se, por oportuno, que o exercício de atividade remunerada pelo segurado recluso em cumprimento de pena em regime fechado ou semi-aberto que contribuições para o Regime Geral da Previdência Social, na condição de segurado contribuinte individual ou facultativo, não acarreta perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão pelos seus dependentes, conforme artigo. 2º da Lei 10.666/03.

O benefício possui natureza substitutiva, pois será devido nas mesmas condições da pensão por morte, conforme estabelece o art. 80 da lei 8.213/91. Nesse aspecto, Fábio Zambitte Ibrahim pontifica:

Caso o segurado sofra um acidente ou preencha os requisitos para a aposentadoria, não poderá cumular os benefícios decorrentes destes eventos com o auxílio-reclusão, recebido por seus dependentes. Todavia, se o novo benefício for superior ao auxílio reclusão, poderá haver a opção por aquele. Naturalmente, tratando-se de auxílio-doença e existindo a percepção do mesmo (em razão de opção do segurado), quando da consolidação futura das lesões, o auxílio-doença extinguir-se-á e voltará a ser pago o auxílio- reclusão. (IBRAHIM, 2008, p. 600)

Todavia, ocorre uma mudança substancial com a Emenda Constitucional nº20 de 15 de dezembro de 1998, que limitou a prestação do benefício aos dependentes do segurado de baixa renda, gerando ponderações que serão analisadas no próximo tópico.

2.3- A Emenda Constitucional nº 20/98

O objetivo da Emenda Constitucional foi o de reduzir o número de beneficiários do auxílio-reclusão, de modo que somente será realizado o pagamento do benefício apenas aos dependentes oriundos de famílias carentes. A justificativa utilizada pelo Estado para a realização da alteração é situação de superação do déficit da previdência, com a finalidade de torná-la financeiramente sustentável.

Outro ponto divergente é a matéria discutida pelo Supremo Tribunal Federal, que assegurou que a expressão “baixa renda” se refere ao segurado e não aos dependentes do mesmo. Matéria que foi discutida em sede de Recurso Extraordinário, com consequente repercussão geral, ou seja, houve o interesse comprovado de parcela significativa da sociedade acerca da matéria, não sendo apenas interesse exclusivo de quem interpõe o presente recurso, senão vejamos:

“PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998. SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.

I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes.

II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio- reclusão, a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários.

III - Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade.

IV - Recurso extraordinário conhecido e provido” (DJE 8.5.2009-Relator: Ministro Ricardo Lewandowski)

Desta forma, o Supremo Tribunal Federal sedimentou a orientação acerca da concessão do auxílio-reclusão, devendo ser considerada a renda do segurado preso, de modo que o benefício previdenciário somente pode ser concedido aos dependentes do segurado que ganhe até o teto previsto legalmente, conforme Portaria Interministerial MPS/MF nº 19, de 10 de janeiro de 2014. A matéria foi discutida através de dois Recursos Extraordinários (RE587365 e 486413) interpostos pelo INSS. Sendo reconhecida pelo STF a repercussão geral, razão pela qual a decisão obrigatoriamente tem que ser aplicada pelas demais instâncias do Poder Judiciário.

Sob a ótica da inconstitucionalidade, Daniel Raupp reforça:

Assim, dita exclusão desrespeitou o objetivo da seguridade social de universalidade de cobertura e do atendimento (art.194, parágrafo único, I da Constituição da República) que garante a Proteção Social a todos que dela necessitem. A hipótese não se aplica o princípio da seletividade” dado que não há motivo concreto que justifique a presunção de desnecessidade dos dependentes segurado de maio renda. [...] Não há justificativa, portanto, para a discriminação, o que fere o princípio da isonomia (art.5º, I, da Constituição da República). (RAUPP, 2009, p.68)

2.4- Dos Dependentes

O artigo de 16 da Lei 8.213/91 elenca o rol dos dependentes, que estão dispostos em classes conforme os incisos, ou seja, há uma preferência a ser seguida para recebimento do benefício:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011);

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente. (BRASIL, 1991)

Existindo mais de um dependente, o auxílio-reclusão será rateado entre todos, em partes iguais, ou seja, havendo mais de um dependente de uma mesma classe, os mesmos irão concorrer entre si, pois deverá ocorrer a divisão proporcional do auxílio-reclusão com a quantidade de dependentes.

Insta registrar que, o auxílio-reclusão não é pago e nem aumenta conforme com a quantidade de filhos que o reeducando possua, o referido benefício será dividido entre os dependentes da mesma classe, pois em havendo dependentes em uma classe anterior, excluem-se os posteriores, elencados no artigo 16 da Lei nº 8.213/31.

3- Da Condição de Suspensão do Auxílio-Reclusão

O requerimento do auxílio-reclusão deve ser instruído com certidão de efetivo recolhimento do segurado a prisão, ratificada pela autoridade competente. O benefício será mantido enquanto o segurado permanecer detento ou recluso.

Contudo, o pagamento do auxílio reclusão será suspenso nas seguintes situações elencadas no artigo 344 da Instrução Normativa INSS 45/2010:

Art. 344 Os pagamentos do auxílio-reclusão serão suspensos: I - no caso de fuga;

II - se o segurado, ainda que privado de liberdade, passar a receber auxílio- doença;

III - se o dependente deixar de apresentar atestado trimestral, firmado pela autoridade competente, para prova de que o segurado permanece recolhido à prisão; e

IV - quando o segurado deixar a prisão por livramento condicional, por cumprimento da pena em regime aberto ou por prisão albergue. (BRASIL, 2010)

Caso haja a recaptura do segurado, o benefício é restaurado a contar da data em que esta ocorrer, sem efeito retroativo, desde que o reeducando possua mantida a qualidade de segurado, com fulcro no artigo 117, § 2º, do Decreto 3.048/99. Todavia, se o segurado foragido for capturado após o período de graça que é de doze meses conforme artigo 15, IV, da Lei 8.213/91, o benefício somente será concedido novamente aos seus dependentes se o detento tiver exercido atividade remunerada durante o interregno da fuga, dada a condição de segurado obrigatório, ou, se tiver contribuído como segurado facultativo.

4- Da Cessação do Benefício

O benefício será extinto nas seguintes situações apresentadas no artigo 343, da Instrução Normativa INSS 45/2010:

Art. 343. O auxílio-reclusão cessa:

I - com a extinção da última cota individual;

II - se o segurado, ainda que privado de sua liberdade ou recluso, passar a receber aposentadoria;

III - pelo óbito do segurado ou beneficiário; IV - na data da soltura;

V - pela ocorrência de uma das causas previstas no inciso III do art. 26, no caso de filho ou equiparado ou irmão, de ambos os sexos;

VI - em se tratando de dependente inválido, pela cessação da invalidez, verificada em exame médico pericial a cargo do INSS; e

VII - pela adoção, para o filho adotado que receba auxílio-reclusão dos pais biológicos, exceto quando o cônjuge ou o companheiro(a) adota o filho do outro.

Caso o segurado recolhido à prisão venha a falecer, o auxílio-reclusão que estiver sendo pago será, automaticamente, convertido em pensão por morte, nos moldes do artigo 118 do Decreto Lei 3.048/99. Vale ressaltar que, a conversão automática, decorre do fato de que Previdência Social já possui conhecimento de quem são os dependentes habilitados do segurado.

5- Da Carência e do Período de Graça do Benefício

Uma vez demonstrada a dependência econômica da família em relação ao recluso, bem como a comprovação do recolhimento a prisão, haverá a concessão do benefício sem a necessidade de comprovação de carência.

Mas o que se entende por carência? Inicialmente, para se ter direito a usufruir de alguns benefícios previdenciários é necessário um determinado número de contribuições mensais. Carência é, portanto, o número de contribuições mensais, necessárias para efetivação do direito a um benefício. Ocorre que, alguns benefícios não exigem carência, entre eles estão auxílio-reclusão, conforme artigo 26, I da Lei nº 8.213/91.

O auxílio-reclusão, especificadamente não necessita de comprovação de carência, ou seja, não é necessário demonstrar a comprovação de 12 ou 180 contribuições do segurado, sendo necessário apenas que o recolhimento a prisão tenha ocorrido enquanto o segurado mantiver a qualidade de segurado, ou seja, que o segurando estava contribuindo para previdência ou estava no período de graça que é um período em que a pessoa não esta mais contribuindo, mas por ela já ter contribuído em outros períodos ela ainda mantém todos os direitos inerentes como segurado.

O estado de graça é verificado no artigo 15, inciso IV da Lei 8.213/91, ao assegurar que após o livramento, o segurado, que estava detido ou recluso, mantém a sua qualidade de segurado pelo prazo de doze meses, desta forma, o segurado ficará mantido na sua qualidade de segurado pelo prazo de doze meses sem pagar qualquer tipo de contribuição.

6- O auxílio-reclusão e o populismo punitivo

O auxílio-reclusão é um instituto bastante polêmico, de forma que repercute na sociedade sensações de indignação e revolta, por conceder um benefício àquele que cometeu um ato ilícito, e teve a sua liberdade segregada como forma de sanção pelo ato praticado. Ocorre que, este indivíduo que praticou o ato ilícito tem família, da qual dele necessita.

O populismo punitivo que envolve o auxílio-reclusão está ultrapassando os limites do direito penal e previdenciário, atingindo os direitos sociais e transformando-os em direitos de exclusão social.

Esta repulsa social demonstra a vulnerabilidade que o auxílio-reclusão enfrenta. O benefício agoniza perante a inércia da sociedade civil, e, além disso, sofre com intervenção de ganhos eleitorais obtidos pela utilização do direito penal como efetiva e rigorosa “crucificação” do detento.

Assevere-se que, o auxílio-reclusão tem por uma de suas finalidades a prevenção de delitos, pois os dependentes do detento ficarão desamparados com a ausência do seu provedor, e poderá buscar outras formas de conseguir a subsistência, seja de forma lícita ou ilícita, de modo que atualmente a situação mais comum é a prática de crimes, devido às dificuldades socioeconômicas e preconceito que a mesma encontra-se.

Não nos surpreende o cenário de reprovação acerca do instituto nos meios de comunicação:

“O cara é preso come e dorme na cadeia com o dinheiro do meu imposto, e ainda tenho que sustentar a família [...] isso é Brasil, porque o individuo não é submetido ao trabalho forçado pra sustentar quem ficou lá fora”. 3

Nessa esteira, encontra-se pendente de análise da Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda à Constituição nº 304/2013, de autoria da deputada Antonia Lúcia que propõe a extinção do auxílio-reclusão e substituí-lo por um auxílio as vítimas.

Vejamos como ficará o artigo 201 e 203 da Carta Magna se a proposta for promulgada:

Art. 1º O inciso IV do art. 201 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 201(...)

IV – salário-família para os dependentes dos segurados de baixa renda;

Art. 2º Acrescente-se o seguinte inciso VI e parágrafo único ao art. 203 da Constituição Federal:

 

3Reportagem disponível em: para-mil-familias-em-ms>. Acesso realizado em: 29 de novembro de 2014.

Art. 203(...)

VI – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa vítima de crime, pelo período que for afastada da atividade que garanta seu sustento e, em caso de morte da vítima, conversão do benefício em pensão ao cônjuge ou companheiro e dependentes da vítima, na forma da lei.

Parágrafo Único. O benefício de que trata o inciso VI deste artigo não pode ser acumulado com benefícios dos regimes de previdência previstos no art.40, art. 137, inciso X e art. 201.” (BRASIL, 2013)

É possível verificar que extinção do auxílio-reclusão, proposta pela PEC nº 304/2013 não trará avanço para a sociedade, pois o benefício é de cunho previdenciário, devido apenas aos dependentes do segurado, de modo que qualquer pessoa que for vítima de um crime e estiver coberto pelo sistema previdenciário será beneficiado com o auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou, em caso de morte, os dependentes contarão com a pensão por morte.

Nessa esteira, o que deve ser ponderado é o cabimento do “auxílio-vítima” pois se o mesmo for pago a qualquer cidadão, independentemente da condição de segurado do INSS, é patente a incompatibilidade da referida PEC com a Previdência Social, haja vista a falta de contribuição do segurado, transformando-se em um benefício de caráter assistencial, ou seja, independe de contribuição, de modo que é regido pela Assistência Social e não pela Previdência Social.

Segundo (INFOPEN, 2012), no ano de 2012, a população carcerária do país era de 549.577 mil pessoas. Do total, 527.778 mil estavam presas em regime fechado, semiaberto ou provisório ou cumpriam medida de segurança, sendo 493.344 mil, 93% homens e 34.434 mil, 7% das mulheres. Sendo pagos neste ano, 37.899 mil benefícios de auxílio-reclusão, representando aproximadamente 7% das pessoas presas no Brasil. Nessa linha, é possível concluir que o auxílio-reclusão é um direito assegurado a poucos, haja vista a maioria dos presos não possuir emprego no momento da prisão.

A carência de dados precisos da população carcerária, tais como o da situação laboral anterior ou informações previdenciárias acerca de quantos presos recebem o auxílio-reclusão, dificultam a compreensão por parte da sociedade, assim como, a implantação de medidas que ampliem o acesso ao referido benefício.

7- Considerações Finais

O presente artigo permitiu concluir que o auxílio-reclusão é um benefício previdenciário e não assistencial, ou seja, o benefício somente será concedido aos dependentes, se no momento da prisão o reeducando tinha a condição de segurado perante a Previdência Social, em outras palavras, é preciso que preso esteja contribuindo ao sistema previdenciário.

Além desse requisito, é imprescindível que o segurado possua baixa renda, advento oriundo da Emenda Constitucional 20/98, de modo que o reeducando receba até o teto estipulado pela portaria emitida e atualizada anualmente, através do Ministério da Fazenda. Esta Emenda Constitucional passa a contrariar e restringir a percepção do benefício delimitando o seu campo de abrangência.

É oportuno ressaltar que o referido benefício detém tamanha importância como justiça social, pois mantém a ordem social por proporcionar aos dependentes do segurado o meio de subsistência, e principalmente a base educacional aos dependentes menores.

Além disso, o auxílio-reclusão é norteado pelo princípio da dignidade humana e pelo princípio personalidade da pena, princípios que validam a proteção de um direito devido ao segurado. Diante disso, verifica-se que a concessão do benefício concretiza a evolução dos direitos humanos fundamentais.

De todo o exposto, há necessidade de conscientizar a sociedade acerca da eficácia e importância do benefício, para que haja a percepção do mesmo para aqueles que necessitarem, de modo que ao aplicar efetivamente a lei vigente à mesma terá a finalidade de justiça social.

Ademais, o presente artigo almeja servir como ponto de partida para estudos acadêmicos de operadores do direito e outras áreas, e de leigos que queiram estudar acerca do tema, com a finalidade de obter conhecimento sobre o auxílio-reclusão.

Referências

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. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providencias. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons..htm>. Acesso em: 05 set. 2014

. Ministério da Previdência Social. Auxílio-reclusão. Disponível em:< http://www.previdencia.gov.br/conteudoDinamico.php?id=22> Acesso em: 05 set. 2014.

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. Portaria Interministerial MPS/MF nº 19, de 10 de janeiro de 2014. Dispõe sobre o reajuste dos benefícios pagos pelo Instituto Nacional de Seguro Social- INSS e dos demais valores constantes do Regulamento da Previdência Social (RPS). Disponível em:< http://www.receita.fazenda.gov.br/LEGISLACAO/Portarias/2014/MinisteriodaFazenda/portm f19. Htm>. Acesso em: 10 set. 2014.

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Artigo Científico apresentado ao Curso de Direito da Universidade Católica do Salvador, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

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