Artigo Destaque dos editores

Competência da Justiça do Trabalho para apreciar ações que pleiteiam danos morais

Exibindo página 2 de 4
01/03/2003 às 00:00
Leia nesta página:

5- Dano

O dano é uma condição indispensável da responsabilidade civil. É o prejuízo ou lesão causado em virtude do ato de outrem, do qual decorre diminuição ou destruição de qualquer bem ou interesse jurídico, seja de ordem material ou moral.

Existem doutrinadores que excluem da acepção de "patrimônio" os direitos não valorados economicamente de uma pessoa, entendendo portanto, que o dano moral, não gera uma diminuição no patrimônio.

Segundo Francisco Antônio de Oliveira [20] dano é: "um desequilíbrio sofrido pelo sujeito de direito, pessoa física ou jurídica, atingida no patrimônio ou na moral em conseqüência da violação de norma jurídica por fato ou ato alheio".

Em regra, todos os danos devem ser reparados, seja restabelecendo o status quo ante, seja indenizando ou compensando. Para que o dano seja efetivamente indenizável é necessária a ocorrência de alguns requisitos como: a certeza [21]; atualidade [22]; pessoalidade [23]; causalidade entre o dano e o fato [24]; legitimidade do autor para pleitear a indenização [25]; ausência de causas excludentes de responsabilidade. [26]

O instituto jurídico, dano, se divide em material e moral.

Danos materiais são as lesões e as diminuições ocorridas no patrimônio material de alguém. Este patrimônio é composto de direitos e bens valoráveis economicamente.

A vida humana não é só composta de valores materiais, a ela se integram valores imateriais. A ofensa ou violação a estes valores imateriais que compõem a vida humana, é denominada como dano moral, ou seja, dano à moral humana. Este se exterioriza no mundo jurídico ao provocar efeitos maléficos à liberdade, profissão, nome, imagem, à sua pessoa ou à sua família.

"Danos morais são lesões sofridas pelas pessoas, físicas ou jurídicas, em certos aspectos de sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem " [27].

" O dano moral consiste no prejuízo ou lesão de direitos, cujo o conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro, como é o caso dos direitos da personalidade, a saber, o direito à vida, à integridade física( direito ao corpo, vivo ou morto, e à voz), à integridade psíquica ( liberdade, pensamento, criações intelectuais, privacidade e segredo) e a Integridade moral( honra, imagem e identidade)"

Para fazer uma diferença essencial entre o dano material e o dano moral, leva-se em conta a esfera jurídica que a lesão reflete. Portanto se o prejuízo repercutir na esfera do patrimônio do lesionado, se estará diante do dano material. Porém, se ocorrer um ato ilícito, causador de prejuízo, sendo que este não atinge a esfera patrimonial do lesionado, se estará diante de um dano moral.

Vale ressaltar que, o suposto dano moral que refletir indiretamente de alguma forma o prejuízo na esfera patrimonial do lesionado, não se enquadrará na classificação dano moral, e sim, na de dano material. Existindo reflexos materiais no "dano moral", estará se indenizando dano material decorrente da lesão à esfera moral do indivíduo, e não o dano propriamente dito. Não obstante ao que foi relatado, nada impede que um ato ilícito cause dano material e dano moral ao mesmo tempo e conseqüentemente seja reparado pelos dois tipos de danos ocorridos.


6- Dano Moral

A expressão dano moral é utilizada por muitos de forma equivoca. Alguns doutrinadores costumam utilizar a expressão dano moral com o mesmo sentido de dano extrapatrimonial.

O dano extrapatrimonial é o gênero no qual dano moral é espécie. A espécie danos moral está contida no gênero dano extrapatrimonial. Dano moral não abarca todas as espécies de danos que o dano extrapatrimonial alcança, portanto ao se utilizar o termo dano moral com o mesmo sentido do termo dano extrapatrimonial, estará ampliando o alcance do mesmo, englobando todos os danos que não atingem o patrimônio nesta categoria. A real dimensão alcançada é mais restrita, atingindo apenas os danos que atingem a ordem subjetiva da pessoa física, jurídica, ou da coletividade.

"Isso porque adotamos a expressão ´dano moral’ somente por esta estar amplamente consagrada na doutrina e jurisprudência pátria. Todavia, reconhecemos que a mesma não é tecnicamente adequada para qualificar todas as formas de prejuízo não fixáveis pecuniariamente"

O termo mais tecnicamente adequado seria "dano não material" para se referir a lesões do patrimônio imaterial, se contrapondo com o dano material. Continuará a ser utilizado no texto o termo dano moral, pois este está consolidado pela doutrina e jurisprudência.

Outra questão que gera grande discussão acadêmica é a natureza da reparação dano moral civil. Questiona se a mesma tem caráter penalizador, indenizatório ou compensatório A reparação civil do dano moral é sancionadora, tendo a sansão como "conseqüência lógico-normativa de um fato ilícito" [28] que causa prejuízo moral. Sabendo que a reparação civil, em tela, é uma sansão, deve-se analisar se a mesma é uma pena ou uma compensação. Não será indenização, pois não será possível ressarcir em pecúnia os prejuízos causados pelo dano moral, pois este não tem um valor econômico. Também não pode ser classificado como pena civil, pois este "instituto no ponto de vista técnico, se presta a sancionar, como forma de reparação pública, quem lesiona, ainda que de forma mediata, interesses sociais tutelados pelo Direito Público. [29]". Portanto, a natureza da reparação civil do dano moral é compensatória, ou seja, a soma pecuniária paga ao lesionado moralmente, busca uma satisfação compensatória pelo dano sofrido, atenuando as conseqüências da lesão, buscando por vias reflexas a punição do lesianante. A reparabilidade civil do dano moral tem natureza híbrida, pois a prestação pecuniária em questão tem como principal função compensatória, e secundariamente objetiva sancionar o autor pela prática do ato Ilícito.

O dano moral pode ser classificado em: danos morais puros e danos morais reflexos. Essa classificação é muito controvertida, pois autores balizados como Júlio Bernardo do Carmo e Francisco Antônio de Oliveira, espancam a existência desta classificação.  Criticam o defeito lógico na definição de dano moral com reflexo patrimonial, argumentando que se há reflexo patrimonial, o dano é patrimonial e não moral. Os doutrinadores que defendem esta classificação, pretendem distinguir dano moral com reflexo patrimonial do dano moral puro, os quais, via de regra, visam defender a tese da restrição da reparabilidade do dano moral ao primeiro caso.

"A distinção supra (dano puro e reflexo), tirante o aspecto técnico, na prática acaba por perder sua significação, se considerar que o dano é, no fundo, moral ou material, conforme os reflexos produzidos na hipótese fática, mesmo quando puro ou reflexo" [30]

"(. . . ) Ora, o dano, já o dissemos, é uno, e não se discrimina em patrimonial e extrapatrimonial em atenção à origem, mas aos efeitos. . . " [31]

Outro questionamento que outrora se fazia era: A pessoa jurídica é susceptível de sofrer dano moral?

O código civil de 1916, nem a constituição nunca restringiram a lesão por danos morais à pessoa física, portanto a doutrina não pode restringi-lo como aconteceu por muito tempo. O novo código civil " deu força de lei" à pacificação deste questionamento já sumulado pelo STJ [32], no seu artigo 52. Não se tem mas dúvida que a pessoa jurídica, criação do direito, pode ser atacada na honra objetiva, o seu bom nome . . .

"A pessoa jurídica, criação da ordem legal, não tem a capacidade de sentir emoção e dor, estando por isso desprovida de honra subjetiva e imune a injúria . Pode padecer, porém, de ataque ‘a honra objetiva, pois goza de uma reputação junto a terceiro, passível de ficar abalada por atos que afetam o seu bom nome no mundo cível ou comercial onde atua"(STJ,4º T,Resp 60. 033-2-ME, rel. Min. Ruy Rosado. RSTJ 85/268-274).

Vale reproduzir a definição de danos morais do brilhante jurista, Jorge Pinheiro Castelo, no qual ratifica o já pacificado entendimento sobre a celeuma em tela:

"Os danos morais são lesões sofridas pelas partes, físicas ou jurídicas, em certos aspectos de sua personalidade. " [33]

É valido salientar que, o dano moral pode ser reparado, com fundamento nas Leis 7. 347/85 e 8. 884/94, quando causar prejuízos a direitos difusos e coletivos. O conceito de direitos da personalidade se estenderá para abranger esta possibilidade, pois não existe uma personalidade jurídica coletiva para ser atingida na sua moral. Para que este tipo específico de dano se caracterize é necessário uma lesão ao direito de toda e qualquer pessoa. [34][35]


7- Dano Moral e Reparação Trabalhista

È necessário fazer uma ressalva que muitos não atentam para ela, acabando por isso a formular opiniões equivocadas. O Direito é único. Ele se subdivide em ramos apenas por um critério sistemático e dogmático. Assim como o Direito, a Jurisdição é una, sendo dividida em competências apenas para torná-la eficaz e justa.

Portanto, deve-se relembrar que o dano moral é um instituto do Direito e não de um ramo específico. Não existe dano civil, dano penal, dano administrativo, dano trabalhista. Existe, sim, reparação penal, civil, administrativa, trabalhista, pelo dano ocorrido, a depender do ramo do Direito aplicável à pretensão deduzida, bem como a competência do Juízo para instruir e julgar a causa.

A relação de emprego é pautada na subordinação jurídica, gerando um campo fértil para a fruição do dano moral. Sendo a relação de emprego marcada pela " eletricidade social", ela necessita de uma analise cuidadosa em relação ao dano moral, tendo como parâmetro à natureza da relação empregatícia subordinativa, fazendo as ponderações devidas.

Devido ao elemento caracterizador, subordinação jurídica, da relação empregatícia, a relação de emprego se torna um campo propício a pratica de atos ilícitos e, conseqüentemente, a gerar danos morais. A subordinação jurídica encurta a distância entre as ações pautadas no poder delegado ao empregador de comando e o desrespeito dos direito de personalidade do empregado.

"Não há motivos, portanto, para excluir lesões de direito extrapatrinomial no âmbito da relação de emprego, eis que as relações sociais, normalmente já conflituosas quando as partes estão em pé de igualdade, tendem a se tornar mais tensas quando o próprio direito reconhece a desigualdade fática entre os contratantes, como é o caso do vinculo trabalhista" [36]

" Realmente são muitas as situações em que o empregador, ou seus prepostos podem causar Dano Moral ao empregado, ex-empregado ou até mesmo a candidato a emprego, nas fases pré-contratual, contratual e pós contratual" [37]

O empregado, ex-empregado ou candidato diariamente são submetidos a situações que podem configuram o dano moral.

A situação do candidato se diferencia dos demais supracitados. Na fase pré-contratual, o candidato não tem e nem teve uma relação de emprego. Portanto não tem o condão para gerar nenhum dano decorrente da relação de emprego, já que esta nunca existiu, para que a Justiça do Trabalho se torne competente para repará-lo.

Mesmo sendo possível a ocorrência do dano moral na fase pré-contratual, a sua reparação não é possível na Justiça do Trabalho, pois inexiste uma relação de emprego constituída. Portanto as hipóteses que podem configurar o dano moral na fase pré-contratual fogem a regra da competência material da Justiça do Trabalho, tendo como conseqüência a impossibilidade de sua reparação nesta Justiça. São exemplos destas situações: os atos discriminatórios.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Excetua uma hipótese em que é possível a reparação do dano moral na fase pré-contratual pela Justiça laboral, Rodolfo Pamplona Filho:

"Excetuamos, contudo, a hipótese de existir realmente um pré-contrato para uma relação de emprego, pelo fato de que, nesta hipótese, o contrato preliminar tem por objeto a constituição de uma fonte de obrigações trabalhistas" [38]

Na fase contratual, também existem situações que podem gerar danos morais, como; rebaixamento funcional; assédio sexual; revista pessoal. Estas hipóteses não são taxativas, são meramente exemplificativas.

Nesta fase já existe constituída a relação de emprego, podendo portanto ser reconhecida a competência da Justiça do Trabalho para a apreciação de pleito de reparação de dano moral decorrente da relação de emprego.

Na fase pós- contratual, assim como as supracitadas fases, podem ocorrer situações que causem danos morais como: informações desabonadoras ou inverídicas; difusão de "listas negras" [39]. Porem estes danos não podem ser reparados pela justiça em tela. Essa impossibilidade decorre da inexistência de relação de emprego. A condição de empregador e de empregado já se dissolveu, com o termino do contrato de trabalho. O dano não atingirá o ex- empregado como sujeito qualificado pela relação de emprego, mas sim, como cidadão.

As situações que se encontram na zona limítrofe, entre o ato licito e o ato ilícito gerador do dano moral, decorrente da relação de emprego, devem ser analisadas com as suas devidas cautelas, levando em consideração a especial natureza subordinativa da relação de emprego sob pena de transformar a Justiça do Trabalho em uma fabrica de indenizações por dano moral. A cautela necessária deve tomar como parâmetro a lei, ou seja, o limite do poder de comando concedido pela norma. Ocorrerá o dano, quando o empregador exceder a esse poder de comando.

A lei faculta ao empregador o poder de comando sem excessos. O poder diretivo e disciplinar tem limites na dignidade da pessoa humana do empregador. O rigor usado pelo empregador se tornará excessivo sempre que ferir tal dignidade.

Assim como o empregado tem o direito de ser reparado por danos morais, quando este decorrer da relação empregatícia, ao empregador é facultado esta possibilidade quando o ato praticado pelo empregado causar danos à moral objetiva do empregador.

Vale ressaltar que, o empregador tem responsabilidade perante a terceiros, por atos praticados pelas pessoas elencadas no artigo 932 e 933 do novo Código Civil e que causarem lesão material ou moral. Esta responsabilidade é objetiva, portanto não necessita do elemento culpa.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
João Alves de Almeida Neto

acadêmico de Direito na UNIFACS, Salvador (BA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA NETO, João Alves. Competência da Justiça do Trabalho para apreciar ações que pleiteiam danos morais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 63, 1 mar. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3857. Acesso em: 10 mai. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos