5. O BEM JURÍDICO TUTELADO
Primeiramente, insta salientar que definir o que é bem jurídico não é tarefa das mais fáceis, haja vista sua vital importância. Importante destacar que o bem jurídico não é escolhido pelo direito penal. É uma questão de política criminal e de imposição da sociedade.
Digo imposição da sociedade porque bem jurídico é todo aquele bem considerado extremamente importante por todos e por isso merece a tutela do direito penal, sendo por este reconhecido.
João Marcello de Araújo Júnior foi muito preciso ao dizer que “o bem jurídico é como uma faca de dois gumes, pois ao mesmo tempo em que exerce uma função de garantia contra os abusos do Estado, atua com instrumento de organização repressiva”.6
Assim sendo, só há que se falar em bem jurídico penal quando se entende ser esta uma medida absolutamente necessária e última para a proteção daquele determinado bem, devendo inclusive se encontrar respaldo na própria constituição para proteger aquele determinado bem.
Ora, o direito penal é a chamada “ultima ratio”, assim só deve proteger os bens que outros ramos do direito se mostram incapazes ou ineficientes nessa tarefa. Como bem observado por Luiz Regis Prado, “o direito penal só deve atuar na defesa dos bens jurídicos imprescindíveis à coexistência pacífica dos homens e que não podem ser eficazmente protegidos de forma menos gravosa7
Após essa breve explanação a respeito do bem jurídico e o direito penal, vamos nos ater ao tema central do nosso trabalho e que é a grande polêmica e fonte de discórdia doutrinária hoje no que tange ao delito de lavagem de capitais: o bem jurídico tutelado.
O tema, como não poderia deixar de ser, é bastante controvertido e discutido na doutrina, tendo vários brilhantes doutrinadores posições diferentes acerca de qual seria o bem jurídico tutelado nesta lei, todos com suas fundamentações, havendo até quem defenda a inexistência de bem jurídico a ser tutelado na referida lei.
Entre os diversos bem jurídicos apontados, iremos trabalhar aqui os mais relevantes e fundamentados para, ao final, expormos nossa opinião a respeito de tão delicado tema.
5.1. A ORDEM SOCIOECONÔMICA
Primeiramente, importante tecer um conceito a respeito da ordem econômica ou ordem financeira. Ordem financeira é o conjunto de normas ou de instituições jurídicas que possibilitam o pleno e regular funcionamento do sistema financeiro nacional, regulando os limites de atuação do Estado e da iniciativa privada frente às operações financeiras realizadas no país.
Entre os mais diversos autores que defendem essa corrente doutrinária, encontramos nomes de peso, como Luiz Flávio Gomes, Raúl Cervini e William Terra, que em obra conjunta afirmam que “com a criação de tipos penais especiais direcionados a combater os procedimentos de lavagem de capitais, busca-se fundamentalmente proteger a normalidade do tráfego jurídico no mundo da economia”.8 Concluem ainda afirmando que o crime de lavagem de dinheiro “atinge interesses metapessoais ou transindividuais, e por esse motivo o bem juridicamente protegido não poderia ser outro senão a própria ordem socioeconômica”.
Marco Antônio de Barros afirma que a lei tutela o sistema financeiro e econômico do país. Através da lei, “busca-se garantir a mínima segurança das operações e transações de ordem econômico-financeira. A lei também visa impedir a oculta ou dissimulada inserção no mercado, que é regido e se desenvolve segundo a ordem vigente, de dinheiro, bens e direitos provenientes de alguns crimes graves que são costumeiramente praticados pelos criminosos ou por associações criminosas organizadas. Em suma, este novo diploma foi ditado com a nítida intenção de prevenir a utilização dos sistemas financeiro e econômico do país, para fins ilícitos, sobretudo com o propósito de impedir a legalização do patrimônio de origem criminosa, isto é, do produto ou resultado dos crimes antecedentes nela especificados”.9
No mesmo sentido, José Neto aduz que o mecanismo da lavagem de dinheiro coloca em perigo a livre concorrência e o sistema de economia de livre mercado, pois uma empresa que utiliza dinheiro sujo se encontra em uma situação de superioridade em relação àquela que se utiliza apenas de meios lícitos para obtenção de recursos no mercado e para o seu próprio desenvolvimento.
Juana del Carpio afirma que o bem jurídico seria a circulação de bens no mercado e não propriamente a ordem sócio-econômica.10
Willian Terra afirma ainda que o bem jurídico protegido, de fato é a ordem econômico-financeira, entretanto assevera que tal afirmação deve ser avaliada em cada caso concreto, pois, segundo o próprio autor, determinadas condutas típicas da lei de lavagem de capitais lesaria apenas a órbita individual de determinadas pessoas e não propriamente a ordem socioeconômica.
Entendo que o ilustre Willian Terra se precipita ao buscar explicar o bem jurídico tutelado. Ora, como o bem jurídico tutelado é ordem econômico-financeiro, mas que em certos casos, a depender de tais circunstâncias, o bem a ser tutelado não seria esse.
Entendo ser inconcebível que um crime possa ter um bem jurídico tutelado que, em certas ocasiões não foi lesionado. Ora, se o bem jurídico que a lei tutela não foi lesionado, então não ocorreu aquele determinado crime.
Os que defendem a ordem econômica como bem jurídico da lei de lavagem afirmam que a enorme quantidade de dinheiro lavado no mundo todo causa um grande impacto à ordem socioeconômica, fazendo como que empresas regulares não consigam acompanhar a concorrência com essas empresas que tem seus recursos advindos do cometimento de crimes.
Uma crítica razoável que se faz aos que entendem que o bem jurídico tutelado seria a ordem socioeconômica é que este é um conceito muito vago e não tangível, portanto complicado seria demonstrar que a ordem socioeconômica foi lesada por essa ou aquela conduta delitiva.
A título exemplificativo, como conceber que a ordem socioeconômica foi lesada na conduta de um organizador de bingo que ocultou seus rendimentos? Ora, essa ocultação, dissimulação é irrisória se a compararmos com toda a estrutura socioeconômica do país.
5.2. DA ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA
Entre os doutrinadores que defendem tal posicionamento, temos Rodrigo Tigre Maia, que aduz que “o bem jurídico protegido é a administração da justiça, pois as condutas descritas no tipo atingem a justiça enquanto instituição e como função, prejudicando-a em sua realização prática e ofendendo o seu prestígio e confiança.11
Há ainda quem afirme que o bem jurídico é a Administração da Justiça porque como a lavagem de dinheiro, os rastros que o crime antecedente praticado deixaria são apagados, prejudicando assim sobremaneira o esforço estatal em identificar e punir as condutas criminosas. Dessa forma, a lavagem de dinheiro atinge o regular funcionamento da justiça.
O autor Marcelo Mendroni reconhece tanto a Administração da Justiça quanto à ordem socioeconômica como bens jurídicos a serem tutelados pela lei. Explica o autor que com a incriminação dos ditos “crimes parasitários” (aqueles que dependem de outro antecedente para subsistir), a justiça tem mais força para fazer valer a sua força e poder impedir que o agente delituoso goze os ganhos com os demais crimes.
No mesmo sentido, temos a posição dos autores Márcia Monassi Mougenot Bonfim e Edílson Mougenot Bonfim, que indicam que a lei de lavagem de capitais tutela, a um só tempo, os sistemas econômico e financeiro do país e a Administração da Justiça.
Em que pese as argumentações acima expostas, há quem discorde de considerar a Administração da Justiça como bem jurídico tutelado. Antonio Sergio Pitombo, por exemplo, afirma que ao considerarmos a Administração da Justiça como bem a ser tutelado pela referida lei desaparecia o critério limitador do ius puniendi, critério esse que é inerente ao conceito de bem jurídico. Segundo o autor, sob esse fundamento seria possível criar Direito Penal submisso a qualquer tendência ideológica.12
Há outras críticas também no sentido que o bem jurídico teria uma natureza difusa, portanto não haveria como comprovar uma efetiva lesão, portanto não poderíamos tratar o “regular funcionamento da justiça” como um super bem jurídico e dizer q abstratamente ele foi lesionado e que o agente delituoso deve ser punido com base na lei de lavagem.
Os críticos afirmam ainda que o delito de lavagem de capitais ora estudando assemelha-se ao delito de favorecimento real, previsto no artigo 349 do Código Penal, qual seja:
“Art. 349: Prestar a criminoso, fora dos casos de co-autoria ou de receptação, auxílio designado a tornar seguro o proveito de crime.”
Alguns defendem essa ideia em virtude de ambos os crimes terem como objetivo direito proibir que o agente possa usufruir do proveito do crime. Assim sendo, eventual lesão à Administração da Justiça já estaria abrangida pelo crime de favorecimento real. Dessa forma, dizer que o bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais é a Administração da Justiça seria, portanto, uma tutela dobrada a um bem jurídico de conceito amplo, difuso.
Uma vez que nem a vida, que é o bem jurídico mais relevante existente, possui uma tutela dobrada, não há que se pensar que o delito de lavagem de capitais mereça tal proteção.
5.3. SEGURANÇA INTERNA
Embora não seja uma corrente tão forte como as outras duas acima mencionadas, há uma parte da doutrina que defende que o que a lavagem de capitais mais compromete é a segurança interna de um país.
Os partidários dessa corrente, em verdade, preocupam-se muito com as organizações criminosas. Argumentam que os agentes da lavagem se alimentam de capital ilícito e que, para que possam cada vez mais lavar seus capitais de origem ilícita passam a corromper as atividades estatais, fortalecendo-se assim economicamente e politicamente dentro do país em que estiverem atuando, criando uma força paralela ao Estado.
Interessante a posição desse seguimento da doutrina, entretanto entendo que ela foge um pouco a delimitação do bem jurídico da lei de lavagem, pois preocupa-se muito mais com a força que organizações criminosas possam exercer em um país. A lavagem acaba por ficar de lado na análise por parte desses doutrinadores. Criticados a esse respeito, os defensores alegam que a lavagem de capitais e a corrupção de um país são faces da mesma moeda.
Essa posição sofre forte crítica, pois para os críticos, ela busca fazer um juízo de presunção, ou seja, presume-se que os recursos lavados serão utilizados para corromper os agentes estatais, influenciando assim nos destinos políticos e econômicos do país, deixando assim o Estado de procurar o bem comum, uma vez que sua estrutura se encontraria corrompida.
Ora, fazer essa presunção já não é a melhor forma de se buscar delimitar o bem jurídico. Para refutar de vez essa teoria, basta exemplificarmos algumas condutas típicas de lavagem. Uma vez que o bem jurídico é a segurança interna do país, se o agente lavasse dinheiro apenas com o objetivo de comprar um imóvel, não estaria comprometendo a segurança interna do país, logo não estaria cometendo o crime de lavagem, uma vez que o bem jurídico tutelado não foi atingido.
Com a devida vênia aos doutrinadores que seguem esse posicionamento, de todas as correntes aqui expostas, entendemos que essa não realmente não merece prosperar.
5.4. DO CRIME ANTECEDENTE
Há ainda autores que defendem a ideia de que o bem jurídico tutelado pela lei de lavagem seria o mesmo bem protegido pelo delito antecedente ao próprio crime de lavagem.
Dessa forma, se o delito antecedente for o de tráfico ilícito de entorpecentes, o bem jurídico que a lei de lavagem tutelaria seria a saúde pública, que é o bem jurídico tutelado pela Lei de drogas.
Entretanto entendemos que este posicionamento também não deve prosperar no que tange ao assunto aqui debatido, uma vez que o agente que se propõe ao lavar o dinheiro não tem intenção de atingir o bem jurídico do crime antecedente, algumas vezes o agente “lavador” nem tem conhecimento a respeito do crime anteriormente cometido.
De outro lado, citamos mais uma vez a questão da proporcionalidade, uma vez que nem o bem jurídico da vida (bem jurídico de maior relevância existente) possui uma dupla proteção jurídica, seria totalmente desproporcional que o crime antecedente ao de lavagem possua uma repressão maior que a vida.
Ainda sustentando a impossibilidade de se acolher o bem jurídico do crime antecedente com o tutelado pela lei de lavagem, temos a questão da causalidade, invertendo-se os papéis. Ora, quando o agente procura ocultar, dissimular ou integrar o recurso ilícito no sistema financeiro nacional o crime antecedente já ocorreu, o bem jurídico do crime antecedente já foi lesado quando ocorre a lavagem, não havendo assim nexo de causalidade entre a conduta da lavagem e o bem jurídico do crime antecedente.
O doutrinador Fernando Capez foi bastante feliz ao afirmar, acerca do tema que, “tal posição, no entanto, tem sido refutada, haja vista que se estaria criando um tipo cuja função não seria reprimir o cometimento de uma nova conduta, mas sim agir quando demonstrada a ineficácia de um tipo penal já existente”.13
5.5. PRETENSÃO DE CONFISCO DO CRIME
Trata-se de mais uma pequena parcela doutrinária, mais uma vez bastante ligada à questão das organizações criminosas. Os defensores dessa corrente alegam que a grande base das organizações criminosas é o produto do crime e por isso é a parte que deve ser combatida.
Assemelha-se, em partes, à doutrina que defende que o bem jurídico tutelado é o sistema econômico financeiro. A ideia central defendida pelos partidários desse posicionamento é a de que sempre que o crime é cometido, deve o Estado confiscar esse produto do crime para que se possa reestabelecer o status quo, ou seja, fazer retornar a situação anterior ao delito.
Daí tais doutrinadores defenderem a pretensão de confisco do crime como bem jurídico a ser tutelado pela lei de lavagem, pois a lavagem de capitais torna bastante complicado o reestabelecimento desse status quo. Dessa forma, entendem que o legislador buscou incriminar a lavagem de capitais para que, com a força do aparato estatal, possa facilitar a questão referente ao confisco do proveito obtido de maneira ilícita.
Com a devida vênia, entendemos mais uma vez ser um posicionamento raso, que não encontra fundamentação constitucional ou mesmo legal para que se possa ser definido como bem jurídico tutelado na lei aqui estudada.
Da mesma forma que na questão do bem jurídico da Administração da Justiça, aqui encontramos um artigo no nosso Código Penal que já prevê expressamente o perdimento de produtos do crime, senão vejamos o artigo 91:
Art. 91. - São efeitos da condenação:
(...)
II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:
a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;
b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.
§ 1o Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior.
§ 2o Na hipótese do § 1o, as medidas assecuratórias previstas na legislação processual poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda.
Além do mais, elevar a pretensão de confisco de um produto do crime a condição de bem jurídico parece ser forçar uma pouco a barra, como exposto em tópico anterior, bem jurídico é algo de tamanha relevância que seu reconhecimento é algo imposto ao Direito Penal. Dessa forma, entendemos que a pretensão de confiscar não encontra qualquer fundamento para ser tutelado pela norma jurídica penal, ainda mais na lei de lavagem de capitais.
5.6. DA PLURALIDADE DE BENS JURÍDICOS
Em que pese a “inovação” de se admitir mais de um bem jurídico tutelado para um único crime, aqui encontramos vários doutrinadores defendendo esse ponto de vista, até mesmo alguns que já citamos acima acabam por se “render” também a esse ponto de vista.
Marco Antônio de Barros aduz que os bens jurídicos (isso mesmo, no plural) “são a estabilidade e a credibilidade do sistema econômico e financeiro do país”.14 Já para Marcelo Mendroni os bens tutelados são a Administração da Justiça e a ordem socioeconômica.15
Como já citado em tópico anterior, temos também a posição dos autores Márcia Monassi Mougenot Bonfim e Edílson Mougenot Bonfim, que indicam que a lei de lavagem de capitais tutela, a um só tempo, os sistemas econômico e financeiro do país e a Administração da Justiça.
Explicam os supracitados autores que a Administração da Justiça é lesada nas 2 primeiras fases da lavagem de capitais, quais seja, a da separação física do dinheiro e o mascaramento de sua origem. Por mim, na sua última fase que é a reinserção desse dinheiro no mercado financeiro é onde o sistema financeiro é lesionado, daí o fato de se lesionar a ordem socioeconômica, afetando inclusive a livre concorrência de mercado.
Além dos bens já citados, há ainda autores que aproveitam o termo pluriofensivo e vão mais longe, arguindo a ideia de que o crime de lavagem de capitais não prejudica apenas a ordem socioeconômica e a administração da justiça, mas alimenta também as organizações criminosas, facilitando assim o seu crescimento e fortalecimento e consequentemente, a diminuição da soberania do Estado (aqui lembramos os partidários da corrente que defende a segurança interna do país como bem jurídico).
Uma vez que a lavagem prejudica de tal forma a vida social, definir apenas um bem jurídico para ela tutelar não “faria justiça” à lei, por isso podemos considerar a pluralidade de bens jurídicos tutelados, podendo ser a ordem econômica e o sistema financeiro, a Administração da Justiça, assim como a segurança interna e o bem jurídico do crime antecedente.
Nesse sentido, temos o posicionamento do ilustre Guilherme Nucci, que afirma que o bem jurídico tutelado na lei de lavagem é “a ordem econômica, o sistema financeiro, a ordem tributária, a paz pública e a administração da justiça”.16
Dessa forma, a lei de lavagem seria um instrumento de persecução sobre fatos que atingem diversos interesses da sociedade. Interesses esses que são tão importantes que todos merecem a tutela penal estatal.
No que diz respeito ao bem jurídico antecedente, já afirmamos aqui que quando a lavagem é praticada o bem anteriormente protegido já foi lesado, não havendo o que se falar em nova lesão. Entretanto os que defendem sua inclusão aqui nessa pluriofensividade afirmam que a ocultação dos proventos de origem ilícita atinge os trabalhos de investigação das autoridades competentes, impedindo o sucesso do Estado na descoberta do crime antecedente e, por reflexo, seus bens tornam-se mais frágeis. Assim sendo, ao praticar o crime de lavagem de capitais, o agente de uma só vez está a atingir a Administração da justiça e o bem tutelado pelo crime anterior, uma vez que dificultou ainda mais a sua proteção ou reprimenda ao agente que já lesinou o bem.
Todas as críticas feitas anteriormente a cada bem jurídico de maneira isolada podem se repetir aqui. Os que divergem dessa corrente de pluralidade de bens jurídicos limitam-se a dizer que os partidários dessa doutrina simplesmente buscam na pluralidade de bens jurídicos uma saída para a falta de um bem específico e determinado.
Afirmam que se já está complicado legitimar um único bem jurídico a ser tutelado pela lei, quem dirá legitimar todos os bens postos em discussão, parece ser uma maneira de “buscar a agradar a todos”.
5.7. AUSÊNCIA DE BEM JURÍDICO
Na contramão da teoria que defende a ideia do crime de lavagem de capitais ser pluriofensivo e por isso possuir uma pluralidade de bens jurídicos estão aqueles que afirmam que a referida lei não possui bem jurídico algum.
Ora, mas como pode existir um crime, uma lei penal, sem um bem jurídico a proteger? É justamente aí que os defensores dessa corrente querem chegar, buscam comprovar a ilegitimidade da lei. Se não há bem jurídico a proteger, não há razão para o crime existir.
Alegam que mesmo que se considerarmos, dentro dos padrões dogmáticos e políticos criminais, os bens jurídicos acima citados como bens legitimados a serem protegidos, todos eles já estão protegidos por outros instrumentos no nosso ordenamento jurídico.
Dessa forma, atrelar qualquer bem acima citado também ao crime de lavagem seria incorrer em “bis in idem”, algo que, em regra, é vedado no nosso ordenamento jurídico pátrio.
Assim sendo, defendem os partidários dessa teoria que, uma vez que a lei continua vigente, só resta ao operador do direito ignorá-la, deixando de aplicá-la nos casos concretos.