5. Da não recepção do art. 166 do CTN pelos princípios da legalidade e da moralidade administrativa
Ao Estado não é dado se locupletar indevidamente, como se tivesse a prerrogativa de cometer abusos e ilegalidades, sem ter que devolver o produto do ilícito – o produto da cobrança indevida –, situação que viola o caput do art. 37 da CF, especialmente os princípios da legalidade e da moralidade administrativa[15].
Conforme tratado alhures, dar validade ao art. 166 do CTN significa na pratica a negar a existência de seu dever de restituição, tendo em vista que a prova que exige é diabólica, e que subordina o acesso à justiça a um direito potestativo de outrem. Portanto, se o Estado não tem a obrigação de devolver o que cobrou ilicitamente, o que o impediria de cobrar sempre?
Diante disso, é de se concluir que o art. 166 do CTN não foi recepcionado pela ordem democrática constitucional, tendo em vista que viola os princípios da legalidade e da moralidade administrativa (caput do art. 37 da CF).
Conclusão
Diante do exposto, é natural concluir que o art. 166 do CTN não é compatível com a atual ordem constitucional, especialmente por violar os arts. 1º, III; 3º, II; 5º, XXXV;170, caput; 37, caput; e 150, IV da Constituição de 1988, devendo ser afastado pelo controle difuso e concentrado[16] de constitucionalidade pelo Poder Judiciário brasileiro.
Referências
ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 6ª ed. São Paulo: Método, 2012.
ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. Direito ao Desenvolvimento. (Saraiva Reader Edition) São Paulo: Editora Saraiva, 2013
FARIAS, Cristiano Chaves; ALVES, Leonardo Barreto Moreira; ROSENVALD, Nelson. Temas atuais do Ministério Público. 5ª ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2014.
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988. 15ª ed. São Paulo: Malheiros, 2012.
NUSDEO, Fábio. Curso de economia. São Paulo: RT, 7ª. Ed, 2013
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2012.
MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
SEN, Amartya. A ideia de justiça. Traduzido por Denise Bottmann e Ricardo Doninelli Mendes, São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
SOUSA, Vinícius Eduardo Silva. Enriquecimento sem causa como cláusula geral do Código Civil: Interpretação civil-constitucional e aplicabilidade judicial. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 90, jul 2011. Disponível em: < http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9921 >. Acesso em jun 2015.
Notas
[1] ALEXANDRE, 2012, p. 70. ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 6ª ed. São Paulo: Método, 2012.
[2] Neste sentido: (TRF-2 - AC: 129586 97.02.01242-2, Relator: Desembargador Federal RICARDO REGUEIRA, Data de Julgamento: 16/11/1999, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJU - Data::27/01/2000)
[3] 2012, p. 421.
[4] Disponível em < https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=897279&num_registro=200602520769&data=20100426&formato=HTML > acesso em 12 de junho de 2015.
[5] O sentido da palavra “receita” aqui empregado é o mesmo usado pelo STF no RE 240785, ou seja, é mais amplo que o de faturamento, engloba todos os tipos de valor obtido pela pessoa, e não somente aqueles ligados à atividade fim.
[6] NUSDEO, 2013.
[7] SOUSA, 2011.
[8] Em que pese o previsto no art. 206, § 3º, IV do CC, a prescrição contra a fazenda pública é de 5 anos, nos termos do Decreto 20.910/32.
[9] A expressão “Direito ao Desenvolvimento” deve-se ao jurista senegalês Etiene Keba M’Baye, que a utilizou em 1972 na conferência inaugural do Curso de Direitos Humanos do Instituto Internacional de Direitos do Homem de Estrasburgo, publicada com o título de “O direito ao desenvolvimento como um direito do Homem”. (ANJOS FILHO, 2013, p. 78.
[10] O Direito ao Desenvolvimento ocupa hoje um lugar central no Sistema Internacional de Direitos Humanos, sendo de observância obrigatória para todos os Estados, entendido ainda como integrante do chamado jus cogens, que é o conjunto de normas imperativas de direito internacional, as quais não podem ter sua observância negada sequer pelos Estados vencidos em votações não unânimes (ANJOS FILHO, op. cit., p. 103), vinculando, ainda, Estados não participantes de sua formação, pois já é superada a doutrina voluntarista do Direito Internacional (MAZZUOLI, 2013, p. 168 a 173).
[11] SILVA, 2002, p. 212 a 222.
[12] JATAHY, Carlos Roberto de C., in FARIAS; ALVES; ROSENVALD, 2014, p.33.
[13] SEN, 2011, p. 325 a 326.
[14] GRAU, 2012, p.16.
[15] MELLO, 2008, p. 1020.
[16] Por meio de ADPF, nos termos do art. 102, § 1º da CF e da Lei 9.882/99.