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O registro de imóveis como instrumento de proteção socioambiental

29/06/2015 às 22:25
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A possibilidade de informações ambientais e fatos relacionados ao meio ambiente, não previstos em lei, constarem nos assentos de Registro de Imóveis, proporcionando uma maior publicidade e segurança jurídica a respeito de tais informações ou fatos.

A função registral e a segurança jurídica

O Registro de Imóveis tem por função primordial proporcionar segurança para a sociedade a respeito da situação dominial de um determinado imóvel. Quanto mais seguras (e completas) as informações contidas no fólio real, mais se possibilitará o conhecimento sobre o bem, e de todos os seus contornos e características. Nesse sentido, contribui sobremaneira o Registro de Imóveis com o próprio desenvolvimento da sociedade, diminuindo o custo das transações e os riscos de eventuais litígios.

Muito bem enfrenta o tema Francisco de Assis Palácios Criado (p. 124), Registrador Imobiliário na Espanha, ao dizer que “hoje, mais do que nunca o tráfego imobiliário necessita de um pressuposto: CERTEZA. Pois a incerteza e a desordem produzem a falta de progresso em qualquer país”.

No mesmo sentido, o entendimento de Luiz Guilherme Loureiro (p. 271) sobre a publicidade registral:

O Direito registral imobiliário tem por objeto a publicidade da propriedade de bens imóveis e de outros direitos reais imobiliários, visando a proteção dos titulares de tais direitos reais publicidade estática) e também a garantia do trafico jurídico dos bens imóveis (publicidade dinâmica). Destarte, a razão de ser do Direito registral é diminuir o risco dos adquirentes de imóveis ou direitos reais a eles relativos, por meio de uma maior segurança jurídica no trafico imobiliário e, consequentemente, diminuindo os custos da transação e contribuindo para a diminuição dos litígios envolvendo imóveis.

Questiona-se, entretanto, como se buscar essa certeza se existem inúmeras informações (não somente ambientais, mas aqui o foco são essas) que são deixadas à margem do Registro de Imóveis?

Nesse sentido, deve se ter presente a modificação do conceito da propriedade, a partir da Constituição Federal de 1988, como destaca a doutrina de Marcelo Augusto Santana de Melo (p. 29):

A CF, ao instituir em cláusula pétrea a função social da propriedade (art. 5º, XXIII) e ao declarar que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225), atribui ao Registro de Imóveis características que outrora não possuía. Dentre elas, está a necessidade de incorporação do conceito de função social da propriedade e do meio ambiente, percepção claramente observada pelo legislador no Estatuto da Cidade e na legislação ambiental.

(…)

Esse é o conceito tradicional do Registro de Imóveis; contudo, hodiernamente ele não mais merece somente a função de guardião do direito de propriedade, mas também a novel missão de guardião da função social da propriedade, nesta incluída a ambiental. Cabe observar que a facilidade natural de concentração das informações imobiliárias e o fato de se tratar de órgão constitutivo da propriedade por meio do registro levaram o Registro de Imóveis, no decorrer dos anos, a exercer funções atípicas como fiscalizar o recolhimento de tributos (imposto predial e territorial urbano, imposto de transmissão de bens imóveis, imposto territorial rural, entre outros).

A falta de informações de natureza ambiental no fólio real é evidente gerador de incertezas. Em quais e quantos órgãos um potencial comprador de um imóvel deve buscar informações para ter conhecimento de todas eventuais pendências ambientais sobre o bem? Qual o custo dessa busca? Não seria mais fácil que essas informações de natureza ambiental viessem a ser informadas no fólio real para o conhecimento do possível adquirente?

Um exemplo interessante da problemática pode ser evidenciado na apelação cível n. 2009.005843-1[1] do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, cujo relator fora o Desembargador Luiz Fernando Boller. No caso em questão foi realizada a alienação de lotes integrantes de um loteamento urbano que se encontrava aprovado pelo órgão ambiental estadual (no caso a FATMA), mas que havia sofrido embargo do IBAMA poucos dias antes da alienação. Ou seja, o alienante tinha conhecimento de que pairava sobre o imóvel um embargo de órgão ambiental, mas, não obstante, realizou a alienação sem mencionar tal pendência. Posteriormente, foi ajuizada ação civil pública pelo Ministério Público Federal com objetivo de declarar a nulidade da licença ambiental concedida pela FATMA, bem como condenar o proprietário à recuperação integral do dano ambiental. Tanto o embargo do IBAMA, como a ação civil pública, resultaram na inutilidade dos lotes para a finalidade pretendida pelo adquirente, ou seja, a construção de residências. Com base no “dolo negativo” (art. 147 do Código Civil), o Tribunal anulou o negócio jurídico e determinou o restabelecimento das partes à situação original, com a devolução dos valores pagos aos compradores. 

Trata-se de caso emblemático, pois o loteamento encontrava-se licenciado pelo órgão ambiental estadual. No momento da aquisição, todavia, pairava sobre o imóvel embargo ambiental pelo IBAMA, que não era, na época, de potencial conhecimento dos adquirentes. Como se precaver de um caso como este? No mínimo o potencial comprador teria que diligenciar perante os órgãos federais de todos os entes federativos e perante a Justiça Federal e Estadual, cível e criminal. Mesmo assim, ainda não conseguiria informações sobre o embargo em questão. O custo desse cuidado é inegável, e poderia ser facilmente evitado com a realização de um ato registral por parte no IBAMA no Registro de Imóveis, tão logo efetivado o embargo.

Torna-se evidente, neste caso em concreto, o quão importante para a segurança jurídica buscada pelo Registro de Imóveis se mostra a inserção de informações a respeito de passíveis ambientais existentes.

Deve se ter presente que já existem informações ambientais sujeitas aos registros imobiliários, como a Reserva Legal Florestal (art. 16 do Código Florestal) e a Servidão Ambiental (art. 44 – A) do Código Florestal – institutos eminentemente relacionados à propriedade rural. Todavia, estas não se mostram suficientes, sendo possível que se faça constar no Registro de Imóveis informações outras, ainda que decorrentes de situações jurídicas não consolidadas, mas que podem gerar efeitos na propriedade, tais como a existências de áreas contaminadas, autuações ambientais, ações penais por crimes ambientais, ações civis públicas, dentre outras.

Os princípios da taxatividade e da concentração

O princípio da taxatividade é um dos princípios basilares do registro imobiliário. Segundo ele, somente podem ter acesso ao fólio real os atos que previstos expressamente em lei, mais especificamente, no artigo 168 da Lei n° 6.015/73. Com base nisso, evita-se que conste no Registro de Imóveis atos irrelevantes e que visem apenas causar prejuízos ao detentor de um direito real.

Este princípio, contudo, vem sofrendo relativização com a introdução no direito registral brasileiro do princípio da concentração. Esse princípio foi sendo desenvolvido no Brasil pelos estudos de Décio Erpen, Desembargador aposentado do TJRS, e de João Pedro Lamana Paiva, registrador imobiliário em Porto Alegre.          Veja-se como Paiva (apud Melo, p. 38) define o princípio em questão:

(...) nenhum fato jurígeno ou ato jurídico que diga respeito à situação jurídica do imóvel ou às mutações subjetivas, pode ficar indiferente à inscrição na matrícula. Além dos atos translativos de propriedade, das instituições de direitos reais, a ela devem acorrer os atos judiciais, os atos que restringem a propriedade, os atos constritivos (penhoras, arrestos, sequestros, embargos), mesmo de caráter acautelatório, as declarações de indisponibilidade, as ações pessoais reipersecutórias e as reais, os decretos de utilidade pública, as imissões nas expropriações, os decretos de quebra, os tombamentos, comodatos, as servidões administrativas, os protestos contra a alienação de bem, os arrendamentos, as parcerias, enfim, todos os atos e fatos que possam implicar a alteração jurídica da coisa, mesmo em caráter secundário, mas que possa ser oponível, sem a necessidade de se buscar alhures informações outras, o que conspiraria contra a dinâmica da vida.

A ideia lançada por esse princípio é que devem ser atraídas ao fólio real todas as informações diretamente relacionadas ao direito inscrito e que tenham consequências diretas sobre sua extensão e qualificação. Ainda que tais informações sejam apenas declaratórias, sem consequências práticas que não a mera publicidade.

Esse princípio ganha particular importância na proteção ambiental. A grande parte das informações que são relacionadas a passivos ambientais são meramente informativas, não se relacionando com a formação do direito propriamente dito. Não obstante, tem consequências inegáveis no que tange à qualidade do direito e eventuais passivos pendentes.

Marcelo Augusto Santana de Melo (p. 41) trata da questão:

O sistema de registros públicos brasileiro, e em especial o Registro de Imóveis, tem-se tornado exemplo para o mundo, principalmente por sua seriedade e eficácia, de sorte que o efeito da concentração deve ser aplicado somente em casos de que a publicidade é necessária, especialmente em situações que possam trazer alguma limitação ou restrição ao direito de propriedade. Nesse propósito, questões ligadas ao meio ambiente se enquadram perfeitamente, pois além de ordem pública estão protegidas pela CF. O princípio da publicidade ambiental também corrobora a possibilidade de o Registro de Imóveis averbar determinadas informações. Foi esse princípio que trouxe ao Registro de Imóveis a possibilidade de averbação de reserva legal para imóveis rurais e do ato definitivo de tombamento de bens imóveis.

Assim, entendemos que os atos registráveis (latu sensu) não são taxativos, malgrado os direitos sejam numerus clausus, aplicando-se o efeito da concentração para interpretar o art. 246 da Lei n. 6.15/73, permitindo a averbação de qualquer ato que altere o registro, outorgando publicidade para casos não expressamente autorizados por essa lei; mas que, de qualquer forma, mesmo reflexamente, possam limitar o direito de propriedade ou ainda de grande relevância para o direito inscrito, justificando o ingresso por meio de averbação de institutos decorrentes do direito ambiental, estabelecendo-se uma fusão entre a publicidade ambiental e registral.

Percebe-se, dessa forma, a importância de se mitigar a taxatividade registral, em prol da possibilidade de acesso ao fólio real de informações de natureza ambiental não expressamente tipificadas na legislação.

Princípios ambientais relacionados ao registro de imóveis

A importância da utilização do Registro de Imóveis como instrumento também de proteção ambiental passa por uma análise, ainda que superficial, dos princípios constitucionais ambientais, relacionados à atividade registral.

Sem dúvida, o primeiro princípio a ser considerado é o da informação, fundamental à proteção ambiental, sendo também base do sistema registral.

No âmbito nacional, a criação do SISNAMA, pela Lei n° 10.650/03, buscou a implementação prática deste princípio. Contudo, a falta de uma efetiva utilização do sistema tem comprometido esta publicidade almejada.

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Outro princípio de grande relevância é o da responsabilidade, também conhecido como o do poluidor-pagador[2]. Por meio deste princípio, a responsabilidade pelos danos ambientais é daquele que teve possível benefício com a exploração do aludido bem. A importância dele no Registro de Imóveis decorre do fato de que qualquer obrigação decorrente de dano ambiental é propter rem, ou seja, uma obrigação de natureza pessoal, mas que segue a coisa. Dessa forma, eventual transferência do bem determina que o novo proprietário seja responsável pelo cumprimento da obrigação, independentemente do fato de ter ou não conhecimento do fato ou ter assumido a responsabilidade pelo mesmo.

Veja-se que, estando publicizada a informação de passivo ambiental, por meio do registro, qualquer potencial adquirente terá conhecimento, podendo considerar esse passivo no momento da sua aquisição. Tal fato desde já proporciona uma responsabilização do causador original do dano ambiental (que tem no valor da sua propriedade este passivo considerado), bem como gera maior proteção ao meio ambiente, evitando-se alegações de boa-fé do adquirente que, atualmente, muitas vezes são consideradas quando da análise do caso concreto.

Por fim, outro princípio de inegável importância é o da natureza pública da função ambiental. Trata-se de princípio que encontra fundamento no art. 225 da Constituição Federal e que basicamente determina que a proteção ambiental é dever de todos – tanto do Poder Público, como da coletividade.

Evidentemente, neste dever se insere também o registrador imobiliário, notadamente pela função de relevância pública que exerce e por sua relação direta com a proteção do bem jurídico imobiliário.

A competência normativa das corregedorias de justiça dos estados

A competência legislativa para a atividade notarial e registral é privativa da União, nos termos do art. 22, XXV da Constituição Federal. Com base nesta competência, foi editada a Lei nº 8.935/94 e, ao lado desta norma, outras tantas, merecendo destaque a Lei nº 6.015/73 que, disciplina os Registros Públicos.

O art. 236 da Constituição Federal estabelece, em seu §1º, ser da competência do Poder Judiciário a fiscalização das atividades notariais e registrais. Em virtude desta competência, surgiram diversos julgados e orientações administrativas voltadas a normatizar peculiaridades da atividade não exaustivamente estipuladas pela legislação federal. Assim, com o tempo, foram traçadas orientações das Corregedorias de Justiça estaduais sobre procedimentos notarias e registrais a serem adotados.

Em muitos estados houve uma união dessas decisões e orientações em textos únicos, que gerou a criação de normas estaduais, destinadas a regrar de forma mais abrangente e de acordo com as peculiaridades locais, as atividades notarias e registrais em cada estado da federação.

Devido aos limites deste artigo, a investigação não foi exaustiva em todas as normas estaduais, havendo a busca apenas nos normativos do estado do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Bahia.

É de se mencionar, desde já, que apenas a norma de São Paulo traz algumas situações, não previstas na legislação federal, aptas a promover a proteção do meio ambiente. Nas normas dos demais estados consultados – SC, RS, PR e BA – não há regras de relevo a ser aqui destacadas, uma vez que apenas as questões ambientais já consolidadas pela norma federal estão ordinariamente estipuladas (tais como a reserva legal e as servidões ambientais).

A consolidação normativa do estado de São Paulo

O estado de São Paulo foi pioneiro na interação entre o registro imobiliário e a proteção do direito ambiental. A principal contribuição da norma estadual é previsão de averbação de áreas contaminadas na matrícula do imóvel. Essa necessidade decorreu de um acontecimento prático, em que muitos adquirentes de imóveis se viram surpreendidos, posteriormente à aquisição do bem, pela informação de que o imóvel estava localizado em área contaminada por substâncias perigosas.

Por conta disso ficou decidido no Processo Corregedoria Geral de Justiça/SP nº 167/2005 a possibilidade de averbação na matrícula do imóvel das informações constantes no Cadastro de Áreas Contaminadas da CETESB – Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental.

Atualmente, encontra-se expressamente previsto no Item 11[3], subitens 39 a 41, Capítulo XX do Provimento n. 58/89 a possibilidade de averbação na matrícula de: a) área contaminada sob investigação; b) área contaminada com risco confirmado; c) área reabilitada com uso declarado. Trata-se de averbação de mera notícia, ou seja, de conteúdo publicitário e sem consequências modificativas ou qualitativas do direito de propriedade propriamente dito.

Outro tipo ato de publicidade possível e que também auxiliaria na proteção ao meio ambiente é a publicidade de atos de investigação de danos ambientais, autuações ambientais, ou mesmo ações judiciais ambientais de reparação dos danos.

Nas normas estudadas não se encontrou qualquer previsão neste sentido. Contudo, novamente no estado de São Paulo, a questão foi examinada no Processo CG 1.994/95 (DOE 28.07.2000), no qual se aceitou a possibilidade de publicidade pelo Registro de Imóveis de instauração de inquérito civil investigativo e outras espécies de informação, sem a necessidade de averbação, conforme interpretação constante do no art. 18 da Lei n° 6.015/73[4].

Identifica-se aqui a prevalência da publicidade registral e do direito à informação ambiental, em detrimento das normas que obrigam a certeza jurídica acerca das situações retratadas no Registro de Imóveis, bem como da tipicidade dos atos registrais.

Seguindo essas orientações, o Superior Tribunal de Justiça decidiu no Recurso Especial nº 1.161.300 – SC, pela possibilidade averbação no fólio real do ajuizamento de ação civil pública na qual se questionava a legitimidade de um determinado empreendimento. No julgado, ficou assentado que referida averbação serviria para “tornar completa e adequada a informação sobre a real situação do empreendimento, o que se coaduna com a finalidade do sistema registral e com os direitos dos consumidores[5].

É de se destacar que não se está aqui advogando a tese de que essas limitações de fato se efetuarão na prática, tanto que os processos administrativos podem ser anulados, as ações judiciais podem ser julgadas improcedentes. Mas a informação sobre a existência dessas pendências é certa, o seu resultado final é que não. Assim, importante é a publicidade desses fatos para que potenciais compradores possam avaliar os riscos existentes quando da aquisição de determinada propriedade, o que gerará certeza a todos os envolvidos no negócio a ser entabulado.


[1] APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA EM AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO C/C. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES. PEÇA DE COMPLEMENTAÇÃO DAS RAZÕES RECURSAIS. INADMISSIBILIDADE, ANTE A PRECLUSÃO CONSUMATIVA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E DENUNCIAÇÃO DA LIDE. INDEFERIMENTO MOTIVADO DO PEDIDO DE INTERVENÇÃO DE TERCEIRO QUANDO DA REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO, POR INCABÍVEL À ESPÉCIE. PRONUNCIAMENTO QUE NÃO FOI ALVO DE IMPUGNAÇÃO A TEMPO E MODO OPORTUNOS (ART. 523, § 3º, DO CPC). MATÉRIA PRECLUSA DIANTE DO QUE ESTABELECE O ART. 473 DO MESMO CÓDICE. INVIABILIDADE DE SE REDISCUTIR A QUESTÃO. RÉU/APELANTE QUE, NA CONDIÇÃO DE TITULAR DO DOMÍNIO, CONTRATOU COM O AUTOR/APELADO A ALIENAÇÃO DE BENS IMÓVEIS. PACTO CUJA VALIDADE CONSTITUI OBJETO DA CONTROVÉRSIA. PERTINÊNCIA SUBJETIVA CARACTERIZADA. PREJUDICIAL AFASTADA. MÉRITO: COMPRA E VENDA DE VÁRIOS TERRENOS INTEGRANTES DE LOTEAMENTO ALVO DE EMBARGO AMBIENTAL EFETIVADO, MAS, PORÉM, AINDA NÃO AVERBADO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. CIRCUNSTÂNCIA NÃO INFORMADA PELO VENDEDOR. RELEVÂNCIA DA OMISSÃO, POR IMPLICAR DESCONHECIMENTO, PELO ADQUIRENTE, ACERCA DA REAL SITUAÇÃO DOS IMÓVEIS, SEM O QUE O NEGÓCIO NÃO TERIA SIDO EFETIVADO, VISTO QUE A RESTRIÇÃO INVIABILIZA A DESTINAÇÃO ALMEJADA. VÍCIO DE CONSENTIMENTO CONFIGURADO, NA MODALIDADE DE DOLO NEGATIVO (ART. 147 DO CÓDIGO CIVIL/02). ACERTO DA SOLUÇÃO APLICADA PELO JUÍZO DE 1º GRAU, NO SENTIDO DE ANULAR A AVENÇA CONTRATADA, ORDENANDO O RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE, POR MEIO DA DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO COMPRADOR/APELADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. "Age com dolo ou culpa grave o contratante que, intencionalmente, omite informações desfavoráveis a respeito do bem que pretende alienar, de modo a viciar a declaração de vontade do adquirente, ensejando, assim, a anulação do pacto, com o inafastável retorno das partes ao status quo ante à sua celebração. [...]" (Embargos Infringentes nº 2001.023080-1, da Capital, rel.: Des. José Volpato de Souza, j. 10/03/2004). "Pelos princípios da boa-fé objetiva e da eticidade, constitui omissão dolosa - negligência - o réu deixar de informar ao autor sobre questões essenciais ao negócio jurídico, que se fossem conhecidas pelo autor, este não o celebraria. Anula-se negócio jurídico em que uma das partes se aproveita dolosamente da ignorância alheia, objetivando obter lucro fácil" (AC nº 2008.030793-9, de Otacílio Costa, rel.: Des. Monteiro Rocha, j. 09/10/2008).

[2] Neste sentido a lição de Millaré (pg. 267): “Assenta-se esse princípio na vocação redistributiva do Direito Ambiental e se inspira na teoria econômica de que os custos sociais externos que acompanham o processo produtivo (v.g., o custo resultante dos danos ambientais) precisam ser internalizados, vale dizer, que os agentes econômicos devem levá-los em conta ao elaborar os custos de produção e, consequentemente, assumí-los. Busca-se no caso, imputar ao poluidor o custo social da poluição por ele gerada, engendrando um mecanismo de responsabilidade por dano ecológico, abrangente dos efeitos da poluição não somente sobre bens e pessoas, mas sobre toda a natureza. Em termos econômicos, é a internalização dos custos externos”.

[3] No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos: (…) b) a averbação de: (…) 39. informação de classificação da área, pela CETESB, como Área Contaminada sob Investigação (ACI); 40. informação de classificação da área, pela CETESB, como Área Contaminada com Risco Confirmado (ACRi); 41. informação de classificação da área, pela CETESB, como Área Reabilitada para o Uso Declarado (AR).

[4]  (...) a todos interessa a publicidade da informação de que houvera sido proposta ação civil pública ou recebida denúncia criminal pertinente a irregular parcelamento do solo, razão pela qual se mostra correto o recebimento e arquivamento, pelo oficial registrador, de oficio encaminhado pelo Ministério Público noticiando tais fatores e, como consequência, a inclusão dessa circunstância nas certidões expedidas. Assim, encaminhada pelo Ministério Público ao oficial de registro de imóveis a comunicação oficial da instauração de procedimento ou ação que versa sobre irregularidades no parcelamento do solo, deve esse oficio ser recepcionado e arquivado, informação quem constará das certidões dos registros abrangidos pela notícia. Essa medida viabiliza, sem ofensa as normas regentes dos registros públicos, assegurar a necessária publicidade as informações constantes do registro, encontrando ampara do art. 18 da Lei 6.015/73 e no item 136, do Capítulo XX, do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria-Geral de Justiça.(apud Melo, p. 80).

[5] Retratou-se dessa forma, mais um importante direito a ser defendido pela publicidade registral, ou seja, o direito a informação dos consumidores. Nesses termos: “Inicialmente, observo que a recorrente carece de interesse jurídico tutelável, porque a averbação em si não lhe impõe restrição alguma, servindo apenas para informar os pretensos adquirentes da existência de Ação Civil Pública em que se questiona a legalidade do empreendimento. Na verdade, o interesse implícito da empresa é de que não haja prejuízo mediato à sua atividade comercial com a ampliação da publicidade acerca da situação do empreendimento, em negativa ao direito básico à informação dos consumidores, bem como aos princípios da transparência e da boa-fé, o que não se mostra legítimo. Com efeito, o direito à informação adequada e precisa sobre o produto comercializado e à efetiva prevenção de danos está expressamente estatuído nos arts. 6º e 31 do CDC (grifei), in verbis: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (…) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (…) VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; (…) Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores. É com esse legítimo escopo que se determinou, in casu, a ampla publicidade a respeito da existência de demanda judicial, mediante averbação no registro imobiliário.

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Sobre o autor
Ingrid Noetzold de Almeida

Graduada em Direito pelo Centro Universitário Franciscano - UNIFRA. Pós-graduada em direito tributário pela Universidade Anhanguera. Pós-graduada em direito notarial e registral pela Universidade Cândido Mendes

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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