Transação penal e a Lei 9.099/1995

30/06/2015 às 16:58
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Aspectos da delação premiada com a ótica do direito comparado

“O Estado já está barganhando com o autor de infração penal, como se pode constatar pela transação, prevista na Lei 9.099. A delação premiada é, apenas, outro nível de transação”[1]

A Lei 9.099 de 1995 representa um importantíssimo marco no processo penal brasileiro, na medida em que, rompendo com a estrutura tradicional de solução dos conflitos, estabeleceu uma substancial mudança na ideologia até então vigente.

A adoção de medidas despesnalizadoras e descarcerizadoras marcou um novo paradigma no tratamento da violência.

A autorização constitucional para tal mudança veio junto ao art. 98, I da Constituição Federal, que previa a criação dos Juizados Especiais Criminais, para a resolução de infrações penais de menor potencial ofensivo.

Mas não só a criação dos Juizados foi revolucionária, também o foram a inserção de diversos institutos na sistemática do direito processual penal brasileiro, como a composição dos danos civis, a transação e a suspensão condicional do processo.

Acerca da transação penal, consistia à época do oferecimento, por parte do Ministério Público, de pena antecipada restritiva de direitos ou multa, a título de direito subjetivo do Indiciado, haja visto a não apresentação de denuncia neste momento. Portanto, a discricionariedade do Ministério Público apenas diz respeito à pena a ser proposta na transação, se restritiva de direitos (qual) ou multa (quanto), nos termos do art. 76 da referida Lei.

Analogamente aplica-se o disposto na regra do art. 28 do Código de Processo Penal quando o Ministério Público deixa de oferecer proposta de transação, remetendo-se os autos ao Procurador Geral. Entendimento corroborado pela súmula nº 696 do STF:

"Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal."

Uma característica marcante do sistema Norte Americano é a discricionariedade dos atos do Promotor de Justiça. O Promotor controla e supervisiona todo o inquérito, sendo o responsável pela correção e efetividade da colheita de elementos probatórios.

O Chefe da Promotoria é, na maioria dos Estados, eleito pela comunidade da Comarca onde atua. Pode dispor de verbas significativas e de pessoal próprio de apoio que lhe dará suporte para realizar diligências, sendo requerida autorização judicial nos casos em que estão envolvidas regras de direitos humanos ou garantias constitucionais. Tem, ainda, a opção de determinar o arquivamento de inquéritos, sem que haja ressalva semelhante ao art. 28 do nosso Código de Processo Penal. 

Quando decido por dar curso à ação, submete a denúncia, em alguns estados, ao Grand Jury. Geralmente, ele oferece a denúncia diretamente ao Juiz-Presidente do Petty (ou Petit) Jury. É aí que tem lugar a plea bargaining, oportunidade em que a acusação pode pleitear uma plea of guilty de iniciativa do acusado em troca de uma capitulação do crime mais branda.

O Sistema Judicial Americano parece muito complexo num primeiro momento, todavia, devido a alguns institutos típicos dos Estados Unidos o número de ofensas criminais que realmente vão a julgamento pelo Tribunal do júri é infimamente menor que o número de casos que chegam ao conhecimento da Justiça. Isto se dá através da renúncia do acusado ao julgamento pelo júri, optando, assim, pelo julgamento feito exclusivamente por um juiz, havendo, ainda, a possibilidade de negociação para que a denúncia seja mais branda, mediante a admissão de sua culpa.

O princípio da oportunidade passou a ter plena vigência nos Estados Unidos da América a partir de 1960. Ao Ministério Público outorgou-se plena disponibilidade da ação penal, que é ajuizada de acordo com sua própria conveniência e oportunidade, sendo admissível, ainda, a solução por institutos transacionais.

Adota o sistema conhecidos instrumentos de encerramento do conflito postos à disposição do acusador e do acusado, baseado na obtenção da verdade real através da confissão do acusado, que se constitui em prova de valor absoluto.

Aliás, a própria Suprema Corte dos Estados Unidos reconhece que a jurisdição penal não pode desconsiderar a confissão. A decisão do caso Blackledge vs. Allinson, transcrita por Jorge de Figueiredo Dias e Manuel da Costa Andrade, ressalta que a confissão da culpa e a negociação que leva à sua obtenção são componentes essenciais do sistema da justiça criminal. As vantagens, decorrentes da solução rápida do caso, podem ser vislumbradas por parte do acusado, que “evita longas detenções preventivas e as ansiedades e incertezas do julgamento”, iniciando incontinenti os programas de reabilitação; para os cofres públicos, mediante a poupança de recursos pelos juízes e acusadores; e para a sociedade, protegida do “risco que representam as pessoas submetidas a processos criminais”.

A plea bargaining é uma forma consensual de solução do conflito estabelecido com a prática do delito, de qualquer natureza ou espécie. Por intermédio de ilimitada negociação, estabelecem as partes a abreviação do processo, convencionando a eliminação da fase de colheita de prova e supressão dos debates, em razão da admissão de culpa pelo acusado.

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Inicia-se o procedimento com a transmissão da acusação ao acusado e solicitação de seu pronunciamento sobre a culpabilidade (pleading). Declarando-se culpado (pleads guilty), ocorre a confissão do crime e conclui-se a resposta da defesa (plea), seguindo-se a designação de data, pelo juiz, para prolação da sentença (sentencing). A pena será aplicada de forma reduzida, de acordo com o estabelecidos entre as partes, dispensando-se o processo (trial) e o veredito (veredict).

A plea guilty, por sua vez, não assuma uma característica consensual. Representa a submissão do acusado à pena requerida pelo acusador, que é aplicada pelo juiz, sem qualquer negociação ou barganha, servindo a confissão do acusado como forma de abreviar as fases probatórias e de debates.

E é tanto deste sistema, quanto do italiano, comentado no início desta tese, que decorre a base principiológica e fundamentos da Colaboração Premiada da Lei 12.850 de 2013. 


Referências:

NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas.7 ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 550

DIAS, Jorge de Figueiredo e Manuel da Costa Andrade. Criminologia: o homem delinquente e a sociedade criminógena. 2. Reimpr. Coimbra: Coimbra. ed. 1997. p. 487

Site do Supremo Tribunal Federal - http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=292517

Site do autor - www.andreygarbin.com

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Sobre o autor
Andrey Garbin

Pós-Graduado em Direito Constitucional pela Fundação Escola do Ministério Público, atuante nas comarcas de Curitiba, Campina Grande do Sul, Quatro Barras e Piraquara presta serviços de mediação, advocacia consultiva, litigiosa e correspondente jurídico.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Artigo elaborado durante a graduação em Direito.

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