Breves considerações sobre a sucumbência parcial no novo Código de Processo Civil

03/07/2015 às 18:45
Leia nesta página:

A partir da vigência do Novo Código de Processo Civil superada estará a discussão acerca da compensação dos honorários em caso de sucumbência parcial (art. 21 do atual CPC) perdendo efeito o conteúdo da Sumula 306 do STJ.

Segundo autorizada doutrina, a regra da sucumbência foi acolhida pelo sistema processual vigente, mas não exaure a disciplina acerca da responsabilidade pelos encargos do processo, o que se revela a partir da “relação causal entre o dano e a atividade de uma pessoa.”[1]. Ou seja, a responsabilidade pelo custo do processo é revelada pela causalidade, impondo-se àquele que restar vencido (considerado como o responsável pela instauração do processo) suportar o pagamento das despesas e honorários advocatícios à parte contrária.

De decisões do STJ extraímos o firme posicionamento de que “a condenação em honorários advocatícios pauta-se pelo princípio da causalidade, ou seja, somente aquele que deu causa à demanda ou ao incidente processual é que deve arcar com as despesas deles decorrentes.” [2]

A parte sucumbente, portanto, é aquela que irá responder pelo ressarcimento das despesas e pelo pagamento dos honorários advocatícios já que deu causa ao processo, tornou-o necessário, independentemente de se aferir o elemento culpa já que a responsabilidade, no caso, é objetiva.

A afirmação da regra processual está contida no art. 20 do CPC que dispõe sobre a responsabilidade pelo custo do processo, merecendo o comentário de que aqueles honorários advocatícios não correspondem aos honorários convencionados entre as partes (previstos contratualmente para a hipótese de inadimplemento de obrigação) que integrarão a reparação dos danos [3]. Também não guardam relação com custo de contratação de advogado pela parte vencedora. A previsão do art. 20 do CPC diz respeito aos honorários de sucumbência, de caráter processual, cujo credor é o advogado, segundo expressamente dispõe o art. 23 da Lei nº 8.906/94 e também o art. 85 do novo CPC, cujo caput tem a seguinte redação: “A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”.

Assim, mantida pelo novo CPC a regra da sucumbência orientada pelo princípio da causalidade, com clareza quanto a titularidade do advogado sobre os honorários.

E o NCPC também veio pôr fim a discussões que dizem respeito à titularidade sobre os honorários decorrentes de sentença que atribua a causa do processo a ambas as partes, esclarecendo que:

Art. 85. [...]
[...]
§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.

Portanto, o  NCPC supera o embate que se trava entre os argumentos, de um lado, no sentido de serem distintos os credores e devedores das obrigações a serem compensadas (já que os honorários consistem em crédito dos advogados não havendo conexão subjetiva entre crédito e débito) e, de outro, que a compensação referida no art. 21 do CPC implica mútua condenação ao pagamento de honorários advocatícios uma vez que ambas deram causa ao processo. [4]

A discussão acima referida, gerada pela redação do art. 21 do atual CPC, levou à edição da Sumula 306 do STJ [5], Tribunal que também reconheceu, sob a sistemática dos recursos repetitivos, o cabimento da compensação dos honorários na hipótese de sucumbência recíproca, remanescendo ao advogado eventual saldo que reste do encontro entre as sucumbências, isto é, que ultrapasse a compensação. Neste sentido:

[...]
Configurada a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC) as custas e honorários advocatícios deverão ser suportados na proporção do decaimento das partes, devidamente compensados, apurados os valores em liquidação.” [6]

Certamente a avaliação há de levar em conta circunstâncias do caso concreto, como, por exemplo, a compensação entre honorários fixados na ação de conhecimento e aqueles fixados na execução. A Primeira Seção do STJ firmou posicionamento pela “inviabilidade de compensação de verba honorária fixada na ação de conhecimento com aquela decorrente da procedência de embargos à execução, porquanto além de as verbas em questão possuírem naturezas distintas, inexiste identidade entre credor e devedor, pois os honorários pertencem ao advogado, mas a responsabilidade pelo pagamento dessa verba é da parte sucumbente e não do causídico. Assim, em se tratando de ação de conhecimento e de execução, não há de se falar em sucumbência recíproca.”[7]

Há, por outro lado, decisão do STJ entendendo possível a compensação dos honorários advocatícios (decorrente da sucumbência recíproca) na fase de cumprimento de sentença “desde que tal possibilidade não tenha sido expressamente vedada pelo título judicial”. [8]

De qualquer forma, a orientação acerca do tema já está delimitada a partir da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil: os honorários advocatícios sucumbenciais têm natureza alimentar não comportando, portanto, compensação nos casos de sucumbência recíproca [9]. Oportuno o registro de que o NCPC utiliza a expressão “sucumbência parcial” para a situação de litigantes parcialmente vencedores e vencidos em suas pretensões, não havendo referência à reciprocidade como há na redação do art. 21. A respeito da terminologia utilizada pelo legislador do atual CPC, esclarece a doutrina que “[...] se, na prática, insiste-se no emprego da expressão sucumbência parcial, ela o é tão apenas no sentido de sucumbência parcial recíproca.” [10]

Candido Dinamarco pondera que “não conduz a resultado prático algum a discussão sobre se é mais correto dizer sucumbência parcial ou sucumbência recíproca. Ambas as locuções são inteligíveis e razoáveis e, portanto, fungíveis.” [11]

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Retornando ao NCPC, outro aspecto de destaque sobre o tema diz respeito ao tratamento diferenciado dos honorários advocatícios e das despesas, ao deixar expresso que “se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas” (art. 86), ao contrário da atual norma (art. 21) que aplica a regra de compensação tanto em relação às despesas como honorários.

Caso, todavia, algum litigante sucumba em parte mínima do pedido, o outro responderá por inteiro pelas despesas e pelos honorários. Esta é a orientação tanto no atual CPC (parágrafo único do art. 21) como no novo diploma legal (parágrafo único do art. 86). Importante observar que a aferição quanto ao mínimo capaz de determinar a responsabilidade pelos encargos do processo se faz casuisticamente, conforme orientação doutrinária e jurisprudencial. [12].

Em caso de litisconsorte, determina o art. 87 do NCPC a divisão proporcional pelas despesas e honorários entre os vencidos, mantendo a atual regra contida no art. 23 que, aduza-se, não pressupõe solidariedade. Nesta linha decisão do STJ: “os litisconsortes vencidos respondem pela condenação sucumbencial em proporção. A solidariedade só se admite quando expressa em sentença exequenda por força da coisa julgada.” [13]

CONCLUSÃO

O NCPC traz o alinhamento com o disposto no art. 23 da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) deixando clara a impossibilidade de compensação na hipótese de sucumbência parcial, isto é, na hipótese de autor e réu terminarem parcialmente vencedores e vencidos em suas pretensões postas em juízo. O STF já se manifestou no sentido de que “é de caráter alimentar a natureza jurídica dos honorários advocatícios originados do ônus da sucumbência” [14] que refletem a remuneração do trabalho profissional do advogado.

NOTAS

[1] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed., São Paulo: Editora RT, 2012, p. 42
[2] STJ, Segunda Turma, AgRg no REsp 1513068/SP, Relator Min. Mauro Campbell Marques, j. 28.04.2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 17.06.2015
[3] STJ, AgRg no REsp 1312613/MG, Terceira Turma, Relator Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 23.09.2014. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 17.06.2015
[4] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed., São Paulo: Editora RT, 2012, p. 480
[5] “Os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte.”
[6] STJ, Quarta Turma, AgRg no REsp 1302552/RS, Relator Min. Antonio Carlos Ferreira, j. 14.04.2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[7] STJ, Primeira Turma, AgRg no REsp 1521183/RS, Relator Min. Sérgio Kikino, j. 28.04.2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[8] STJ, Primeira Turma, AgRg no REsp 1321459/RS, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 18.12.2014. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[9] O conceito de sucumbência recíproca extraído de dicionário jurídico vem no sentido de que “haverá sucumbência recíproca se cada litigante for em parte vencedor e vencido, pelo que serão distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas (art. 21).” In: De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico Conciso. SLAIBI FILHO, Nagib; CARVALHO, Glaucia (Atual.), Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 679
[10] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed. São Paulo: Editora RT, 2012, p. 470
[11] Candido Rangel Dinamarco. Instituições de Direito Processual Civil, 5ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2005, v.II, p. 652
[12] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed. São Paulo: Editora RT, 2012, p. 483
[13] STJ, Terceira Turma, EDcl nos EDcl no REsp 1181250/SP, Relatora Min. Nancy Andrighi, j. 18.12.2012. Disponível em http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[14] STF, Primeira Turma, AI 849470 AgR/DF, Relator Min. Dias Toffoli, j. 25.09.2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br Acesso em: 18.06.2015

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Tania Bahia Carvalho Siqueira

professora universitária.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos