É de conhecimento elementar que o crédito tributário é constituído pelo lançamento, sendo de competência privativa da autoridade administrativa a sua lavratura. Através dele dá-se início ao procedimento administrativo, que tem por finalidade verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Esta é a inteligência do art. 142 do Código Tributário Nacional.
O contribuinte autuado tem o direito de insurgir-se contra o lançamento, apresentando, para tanto, sua defesa perante o órgão competente que, em algumas esferas de governo, pode ser um Tribunal especializado, sem jurisdição, ou um Conselho de Contribuintes.
Diante da quantidade de tributos existentes no Brasil, dá para se ter uma idéia de quantos conflitos de interesses podem surgir no dia-a-dia da relação jurídica das pessoas físicas e jurídicas privadas e a Fazenda Pública. Algumas dessas recorrem-se do processo administrativo, seja na esperança de reverem o lançamento, por ser claramente ilegal e obterem, de logo, o reconhecimento; seja para procrastinar a exação, considerando que ainda poderá discuti-la na Justiça; outras, preferem impugnar o crédito tributário diretamente em Juízo.
O sistema dualista adotado no Brasil, onde os órgãos julgadores não dispõem de jurisdição, portanto, não encerram o conflito, e por não haver total independência ao julgar, pois normalmente estão obrigados a cumprirem atos normativos expedidos pelo próprio ente, muitas vezes de legalidade e constitucionalidade contestável, o processo administrativo deixa de atingir o seu objetivo.
Essa consciência é oriunda do exercício da função de Procurador de Estado, em que hodiernamente nos deparamos com processos judiciais discutindo crédito tributário, cujo fato gerador dista de anos, que já foi, inclusive, apreciado pelo Tribunal Administrativo Tributário do Estado, e que encontra supedâneo na jurisprudência dos Tribunais mas, que continua sendo impugnado, com o único objetivo de protelar o pagamento do tributo, porquanto o contribuinte tem conhecimento de que pode adiá-lo por, no mínimo, mais cinco anos, face a morosidade da Justiça, que somados a outros que passou tramitando na esfera administrativa, totalizará aproximadamente dez anos.
Isto, sem dúvida, gera prejuízos enormes para o Estado que, muitas vezes, considerando o decurso de tempo, sequer chega a receber seu crédito, ora porque o contribuinte fechou as portas e não deixou endereço, ora porque não há patrimônio que possa responder pela dívida.
A escolha do tema surgiu exatamente dessa consciência e insatisfação com o sistema adotado no Brasil e pela possibilidade de conhecer sistemas jurídicos de outros países, e, sem querer ser pretensiosos, sugerirmos mudanças na nossa legislação, para que não continuemos com um processo administrativo tributário que usualmente não alcança o fim colimado.
Procuramos fazer uma abordagem geral do processo administrativo tributário, passando pela sua origem, evolução, competência legislativa, os princípios constitucionais norteadores, os órgãos julgadores e, como paradigma às normas jurídicas pátrias, apresentamos aspetos do processo administrativo tributário em Portugal.
Capítulo I – PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO
1. Breve relato sobre a origem do processo administrativo
O processo administrativo, sem dúvida, nasceu com o estado de direito, onde as garantias individuais constituem direitos fundamentais. Possivelmente, nos estados totalitários, a vontade do Estado se sobrepõem aos direitos individuais e pratica-se a arbitrariedade, porquanto a vontade do Estado é a do seu governante.
Encontramos na doutrina informações que nos leva a crer que o processo administrativo teve sua origem no due pross of law, surgido na Grã-Bretanha, sendo que, inicialmente, era de cunho eminentemente processual penal.
ALBERTO NOGUEIRA [1] em sua obra intitulada "O devido Processo Legal Tributário", enfatiza quanto a origem, evolução e universalização do due process of law, asseverando que:
os inúmeros estudos publicados sobre a cláusula due pross of law, sob os mais variados enfoques, sem discrepância indicam que a mesma se constituiu, como princípio, inicialmente na Grã-Bretanha, como forma democratizadora da sociedade, a partir da fórmula primitiva law of land, inserida no art. 39 da Carta Magna de 1215 (Creat Charter).
A cláusula law of land, por seu turno, evoluída do campo estritamente processual, em matéria predominantemente penal, segundo a qual ninguém seria julgado por um juízo pré-constituído (juiz natural) e somente nos fatos previamente tipificado como crime (nullum crimen sine lege), para assegurar a própria regularidade da atividade jurisdicional.
As Emendas V e XIV à Constituição norte-americana de 1787, introduziram a cláusula due process of law (...) A Constituição brasileira de 1988 viria a consagrar de forma explícita e clara o princípio do devido processo legal (art. 5º, LIX), graças à contribuição de Carlos Roberto de Siqueira Castro, como assessor, na fase da elaboração do texto constitucional, por intermédio de proposta do Deputado Vivaldo Barbosa, segundo informa José Afonso da Silva.
No presente trabalho, procuramos analisar o impacto da cláusula due process of law no nosso sistema jurídico, especificamente no campo tributário.
Na América Latina, este mesmo autor faz referência aos antecedentes, evolução e tendência da cláusula due process of law, abordadas por José Afonso da Silva em prefácio do livro de Carlos Roberto de Siqueira, intitulado O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição:
Após o Projeto do Código de Procedimentos Civis de Couture, em 1945, começou na América Latina certa tendência reformista. Os princípios legais do ‘devido processo legal’ e da ‘defesa do juízo’ foram consagrados em vários convênios interamericanos, como o de São José da Costa Rica, em novembro de 1969: "Toda pessoa tem o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente pela lei, para sustentação de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para determinação de seus direitos e obrigações de ordem civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outro caráter’. [2]
No Brasil, na época do regime militar, algum progresso, considerando a época, pode ser registrado em relação ao contencioso tributário, como por exemplo a abolição da garantia da instância na esfera administrativa - Decreto-Lei nº 822, de 5 de setembro de 1969, baixado pelo AI 5, de 13.09.1968; a autorização para o Executivo regular processo administrativo de determinação e exigência de créditos tributários federais, penalidades, empréstimos compulsórios e o de consulta.
Vale salientar que, atualmente, várias legislações exigem como condição do recurso o depósito de parte do crédito tributário, como é o caso por exemplo, do Estado de Pernambuco – Lei nº 10. 654/91, alterada pela Lei nº 11.903/2000 - e da própria União, Decreto nº 70.235/72. O que reputamos como bastante eficaz, pois serve de obstáculo aos recursos meramente procrastinatórios e, por outro lado, já garante parte do crédito, posto que se converterá em renda com o trânsito em julgado da decisão administrativa.
Há, entretanto, quem afirme ser inconstitucional tal exigência, sob o argumento de que o depósito constitui cerceamento do direito de defesa, o que já foi rechaçado pelo Supremo Tribunal Federal [3]:
AG. REG. EM RECURSO EXTRAORDINARIO- AGRRE-287785 / RJ
Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA
Publicação: DJ DATA-24-08-01 PP-00058 EMENT VOL-02040-08 PP-01621
Julgamento: 22/05/2001 - Segunda Turma
Ementa
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEPÓSITO PRÉVIO. Processo administrativo. Imposição de multa. Exigência do depósito prévio como pressuposto de admissibilidade e garantia recursal. Legitimidade. Agravo regimental a que se nega provimento.
RECURSO EXTRAORDINARIO- RE-215979 / RS
Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA
Publicação: DJ DATA-04-05-01 PP-00036 EMENT VOL-02029-05 PP-01053
Julgamento: 28/11/1997 - Segunda Turma
Ementa
EMENTA: EXTRAORDINÁRIO. INFRAÇÃO ÀS NORMAS TRABALHISTAS. PROCESSO ADMINISTRATIVO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. PENALIDADE. NOTIFICAÇÃO. RECURSO PERANTE A DRT. EXIGÊNCIA DO DEPÓSITO PRÉVIO DA MULTA. PRESSUPOSTO DE ADMISSIBILIDADE E GARANTIA RECURSAL. AFRONTA AO ART. 5º, LV, CF. INEXISTÊNCIA. 1. Processo administrativo. Imposição de multa. Prevê a legislação especial que, verificada a infração às normas trabalhistas e lavrado o respectivo auto, o infrator dispõe de dez dias, contados do recebimento da notificação, para apresentar defesa no processo administrativo (art. 629, § 3º, CLT) e, sendo esta insubsistente, exsurge a aplicação da multa mediante decisão fundamentada (art. 635, CLT). Não observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa: alegação improcedente. 2. Recurso administrativo perante a DRT. Exigência de comprovação do depósito prévio. Pressuposto de admissibilidade e garantia recursal. 2.1. Ao infrator, uma vez notificado da sanção imposta em processo administrativo regular, é facultada a interposição de recurso no prazo de dez dias, instruído com a prova do depósito prévio da multa (art. 636, § 2º, CLT), exigência que se constitui em pressuposto de sua admissibilidade. 2.2. Violação ao art. 5º, LV, CF. Inexistência. Em processo administrativo regular, a legislação pertinente assegurou ao interessado o contraditório e a ampla defesa. A sua instrução com a prova do depósito prévio da multa não constitui óbice ao exercício do direito constitucional do art. 5º, LV, CF, por se tratar de pressuposto de admissibilidade e garantia recursal, dado que a responsabilidade do infrator, representada pelo auto de infração, restou aferida em decisão fundamentada. Recurso conhecido e provido.
RECURSO EXTRAORDINARIO- RE-253085 / MG
Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO
Rel. Acórdão
Min. MAURÍCIO CORRÊA
Publicação: DJ DATA-04-08-00 PP-00038 EMENT VOL-01998-11 PP-02236
Julgamento: 21/03/2000 - Segunda Turma
Ementa
EMENTA: EXTRAORDINÁRIO. INFRAÇÃO ÀS NORMAS TRABALHISTAS. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEPÓSITO PRÉVIO. Processo administrativo. Imposição de multa. Exigência do depósito prévio como pressuposto de admissibilidade e garantia recursais. Legitimidade. Recurso conhecido e provido.
2. Base legislativa do processo administrativo tributário no Brasil
O processo administrativo tributário encontra seu fundamento de validade no art. 5º, LV da Constituição Federal, no Código Tributário Nacional e na legislação específica de cada ente.
Sempre que houver uma obrigação tributária, seja ela principal ou acessória, que espontaneamente não tenha sido satisfeita pelo contribuinte, ou por aquelas pessoas a quem a lei transfere ou incumbe essas obrigações, pode ser exigido pelo Fisco o pagamento do tributo ou a penalidade pecuniária decorrente, mediante o seu lançamento, o que poderá dar ensejo a um conflito e nascimento do processo administrativo.
De acordo com o Código Tributário Nacional [4], artigo 113, a "obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente" (§ 1º).
Já a "obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos" (§ 2º). Pode, ainda, a obrigação acessória converter-se em principal, caso seja inobservada, em relação a penalidade pecuniária (§ 3º).
O lançamento, segundo definição do próprio Código Tributário Nacional, artigo 142, é procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor, a aplicação da penalidade cabível.
De salientar que "a atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional" (art. 142, Parágrafo único, do CTN).
Nesta fase do lançamento, não há que se falar em processo administrativo, mas sim em procedimento que, na lição de RUI BARBOSA NOGUEIRA [5]
é a forma administrativa de exame e apuração das possíveis obrigações e, como elas, igualmente regulado por lei e, por isso mesmo, a própria forma de proceder constitui um direito assegurado às partes. É o ‘devido processo legal’. Para que a solução não venha a ser errônea ou resulte em injustiça, a lei prevê um método, uma carta ordem. O procedimento fiscal é, pois, um ordenamento do modo de proceder para que tanto a imposição, como a arrecadação e a fiscalização sejam feitas na medida e na forma previstas na lei.
Estando o contribuinte de acordo com o lançamento, o que é difícil ocorrer, e efetuando o pagamento no prazo estabelecido, a obrigação se extingue. Mas, como soi acontecer, o contribuinte não acata a imposição e socorre-se do processo administrativo, muitas vezes, tendo ou não razão, seja para ganhar tempo, seja porque considera que é indevida, ilegal ou inconstitucional a exação ou a forma de proceder do fisco.
Na assertiva de JAMES MARINS [6]
a etapa contenciosa (processual) caracteriza-se pelo aparecimento formalizado do conflito de interesses, isto é, transmuda-se a atividade administrativa de procedimento para processo no momento em que o contribuinte registra seu inconformismo com o ato praticado pela administração, seja ato de lançamento de tributo ou qualquer outro ato que, no seu entender, lhe cause gravame, como a aplicação de multa por suposto incumprimento de dever instrumental. A mera bilateralidade do procedimento não é suficiente para caracterizá-lo como processo. Pode haver participação do contribuinte na atividade formalizadora do tributo e isso se dá, por exemplo, quando este junta documentos contábeis que lhe foram solicitados ou quando comparece ao procedimento para esclarecer esta ou aquela conduta ou procedimento fiscal que tenha adotado na sua atividade privada. Até esse ponto não se fala em litigiosidade ou em conflito de interesse, até porque o Estado ainda não formalizou sua pretensão tributária. Há mero procedimento que apenas se encaminha para a formalização de determinada obrigação tributária (ato de lançamento). Após essa etapa, que se pode mostrar mais ou menos complexa, praticado o ato de lançamento e portanto, formalizada a pretensão fiscal do Estado, abre-se ao contribuinte a oportunidade de insurgência, momento em que, no prazo legalmente fixado, pode manifestar seu inconformismo com o ato exacional oferecendo sua impugnação, que é o ato formal do contribuinte em que este resiste administrativamente à pretensão tributária do fisco. A partir daí instaura-se verdadeiro processo informado por seus peculiares princípios (que são desdobramentos do due process of law) e delimita-se o instante, o momento em que se dá a alomorfia procedimento processo modificando a natureza jurídica do atuar administrativo.
Este mesmo autor assevera que:
o processo administrativo tributário contempla o conjunto de normas que disciplinam o regime jurídico processual aplicável às lides tributárias deduzidas perante a administração pública (pretensões tributárias e punitivas do Estado impugnadas administrativamente pelo contribuinte). Integra, ao lado do Processo Judicial Tributário, o Direito Processual Tributário.
Há um conjunto de normas que integra o ordenamento jurídico tributário brasileiro, ao qual chamamos de sistema tributário, que rege o processo administrativo.
Estuda-se o processo administrativo tributário, não como um processo uniforme para todos os entes da federação, como é o processo civil e o penal, por exemplo, pois somente no âmbito judicial tem-se a nítida compreensão do processo e tanto a Constituição Federal tração normas específicas.
Observa-se pois que o processo administrativo tributário busca na Constituição Federal (art. 5º LV) e no Código Tributário Nacional (art. 145) as linhas mestras para sua constituição, cabendo aos entes da federação, obedecidos os ditames da Lei Maior, estipular as demais condições ou "ritos" procedimentais.
3. Finalidade: justiça administrativa
É assegurado ao contribuinte todo o direito de tentar desconstituir a exação, mediante a utilização do processo administrativo tributário, que é regido por uma legislação específica, ressaltando-se que, na sistemática brasileira, cada ente da federação adota a sua própria.
Partindo da premissa de que o lançamento tributário apresenta vícios formais ou materiais, ou que o fato gerador da obrigação lançada não se conforma às disposições expressas da lei ou se funda em disposição inconstitucional, sem embasamento legal, resta evidenciada a motivação para ensejar o processo administrativo. Mas, muitas vezes, o lançamento apresenta-se inquestionável e, ainda assim, o contribuinte lança mão do processo administrativo, impugnando-o perante o órgão competente, com o fito de adiar ou não pagar o que é devido a Fazenda Pública.
É indiscutível que o processo administrativo tributário é um instrumento valioso de solução de conflitos, de forma mais célere e menos dispendiosa, tanto para o contribuinte como para o próprio Fisco, e tem por escopo a justiça fiscal.
Entretanto, a justiça administrativa não vem sendo alcançada como se espera, seja porque falta independência funcional dos julgadores que, quer queira ou não, normalmente seguem uma orientação do ente tributante, que os impede de livre apreciar o conflito; quer seja pela morosidade no julgamento, em flagrante prejuízo à administração pública; quer seja, ainda, porque, considerando que o nosso sistema adota a teoria dualista, que implica em processos autônomos nas esferas administrativas e judicial, ao cabo do processo administrativo, permanecendo incólume o lançamento, o contribuinte se utilizará das vias judiciais, repetindo todo o processo.
Outro entrave a efetivação da justiça administrativa constitui na impossibilidade de reconhecimento da inconstitucionalidade [7] de normas tributárias, como se apresenta, por exemplo, a do Estado de Pernambuco, Lei nº 10.654/91 (art. 4º, § 10).
A Lei nº 10.654, de 27.11.1991, do Estado de Pernambuco, que dispõe sobre o processo administrativo-tributário, estabelece que:
Art. 2º O processo administrativo inicia-se:
I - de ofício, com a lavratura de:
a) Auto de Infração;
b) Auto de Apreensão.
II - Voluntariamente, por meio de :a)impugnação, quando indeferido o pedido de restituição na forma do § 1º, do artigo 47; (Lei nº 11.289/95);
b) consulta sobre a legislação tributária aplicável à situação concreta e de interesse do contribuinte, vedada a indagação sobre direito em tese;
c) contestação de reavaliação de bens sujeitos ao Imposto Sobre a Transmissão "Causa Mortis" e Doação de Quaisquer Bens e Direitos - ICD;
d) impugnação relativa a aplicação de multas regulamentares pela Diretoria de Administração Tributária - DAT.;
III - por meio de Notificação de Débito a ser emitida, de ofício, pela autoridade fazendária, competente, nas seguintes hipóteses:
a) não recolhimento do imposto lançado nos livros fiscais;
b) não recolhimento do imposto declarado:
1 - em documento de informação econômico-fiscal, nos termos do § 11, do artigo 64, a Lei nº 10.259, de 27 de janeiro de 1989;
2. em DMI - Desembaraço de Mercadorias Importadas, nos termos da legislação específica.
§ 1º Na hipótese do inciso III do "caput", será observado o seguinte:
I - a ciência da Notificação de Débito será dada ao sujeito passivo por meio de publicação de edital no Diário Oficial do Estado, quando ela for emitida pelo Departamento da Receita Tributária - DRT da Secretaria da Fazenda;
II - nos demais casos, a ciência do que trata o inciso anterior dar-se-á na forma prevista no artigo 19.
§ 2º O contribuinte terá o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data da ciência da Notificação de Débito para efetuar ou iniciar o recolhimento do crédito tributário objeto da medida.
§ 3º A inobservância do prazo previsto no parágrafo anterior implicará na inscrição do débito em dívida ativa, sem direito a impugnação.
Depreende-se desta lei que o processo administrativo, iniciado por meio de Notificação de Débito, não comporta impugnação, sendo o débito não pago, de logo inscrito na Dívida Ativa, tornando-se apto à sua execução.
Comando normativo este que abre uma exceção ao princípio do contraditório, perfeitamente legal, como reiteradamente vem entendendo o Superior Tribunal de Justiça.
No âmbito federal, encontra-se o processo administrativo fiscal disciplinado pelo Decreto nº 70.235/72, que prevê:
Art. 7º O procedimento fiscal tem início com:
I – o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificado o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu preposto;
II – a apreensão de mercadorias, documentos e livro;
III – o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada.
Art. 9º A exigência de crédito tributário, a retificação de prejuízo fiscal e a aplicação de penalidade isolada serão formalizadas em autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada imposto, contribuição ou penalidade, os quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito.
Analisando a lei estadual em foco, bem como a federal, tem-se por atendidos os princípios norteadores do processo administrativo, assegurando, principalmente, a ampla defesa ao contribuinte.
3. Competência Legislativa
A Constituição Federal, em seu artigo 22, I, estabelece que compete privativamente à União legislar sobre: direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo aeronáutico, espacial e do trabalho.
Pela inteligência do dispositivo constitucional tem-se a convicção de que a expressão "direito processual" está relacionada ao direito processual judicial e não a todo e qualquer processo.
Não se pode conceber que abranja o processo administrativo tributário, porquanto tem-se a convicção de que trata apenas do processo judicial que deve ser uniforme em todo o território nacional.
Ademais, se compete aos entes da federação legislar concorrentemente sobre direito tributário, artigo 24, da Constituição Federal, é difícil admitir que o processo administrativo tributário possa ser disciplinado através de uma lei nacional.
A prevalecer a exegese de que o processo administrativo tributário é de competência privativa da União, todas as leis, federal e estadual, que versam sobre o assunto seriam inconstitucionais pois não há uma Lei nacional, muito menos a Constituição Federal assegurou a competência legislativa plena aos demais entes, em caso de inexistência da lei de sua competência, como ocorre, quando esta é concorrente e suplementar.
JAMES MARINS [8], com a autoridade que dispõe para tratar da questão, a quem rendemos homenagem mas ousamos discordar, afirma, textualmente, que:
Compete, portanto, à União a disciplina do Sistema processual tributário nacional, estabelecendo por via de lei ordinária as garantias de processo que assistem ao cidadão contribuinte – em toda a federação – quando da solução administrativa de sua relação tributária litigiosa com o ente da tributante; deve ainda a União criar normas gerais de procedimento em matéria de processo, com o fito de uniformizar em toda a federação o modo de exercício (procedimento) das garantias constitucionais do processo;
Sequer vislumbramos a necessidade de uniformização da legislação do processo administrativo tributário para vigorar em todo o território nacional, pois a instituição, por cada ente, do seu processo não ensejará nenhum conflito, considerando que cada um deles tem sua competência tributária devidamente estabelecida na Constituição Federal e jamais haverá conflito entre eles, em relação a este aspecto, porquanto a sua jurisdição não ultrapassará as fronteiras de cada um.
Ademais, para observar os princípios constitucionais não se faz necessário que haja uma lei nacional, pois toda e qualquer legislação tem o dever, a obrigação, até para gozar de validade, de cumprir e respeitar estes primados.
Entendemos pois, que cada ente tem competência para editar Lei sobre o seu processo administrativo tributário aplicando-se o art. 22, I, da Constituição Federal apenas ao processo judicial.