Reprodução Humana Assistida Homóloga e Heteróloga, Monoparentalidade Programada e Coparentalidade.

A ciência como instrumento de felicidade da família

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22/07/2015 às 16:18
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[1] Não pode o paciente de reprodução assistida escolher o material genético de acordo com as características dos doadores (TARTUCE, Flávio. Direito Civil. Direito de Família. 9ª ed. Método). A resolução, no art. IV, inciso 7, estabelece que a escolha da doadora do material genético é de responsabilidade do médico assistente. Todavia, dentro do possível, deverá garantir que a doadora tenha a maior semelhança fenotípica com a receptora. Embora não expresso, por identidade de razões, isso se aplica também à escolha do material genético do doador, garantindo-se, na medida do possível, a maior semelhança fenotípica com o paciente de reprodução assistida. 

[2] Aqui reside a discussão acerca da técnica conhecida como “doação de mitocôndrias”, aprovada recentemente pela Câmara Baixa (Câmara dos Comuns) do Parlamento do Reino Unido. A técnica consiste em retirar o núcleo de um óvulo da mãe portadora de mutações no DNA mitocondrial e transferi-lo para o óvulo de uma doadora com mitocôndrias “sadias”, cujo núcleo foi previamente removido. Assim, o resultado da fertilização in vitro seria um embrião com material genético de três pessoas: o DNA do núcleo do espermatozoide do pai, o DNA do núcleo do óvulo da mãe, e o DNA das mitocôndrias do óvulo da doadora. Seus defensores entendem que a técnica pode ser usada para permitir que mulheres - portadoras de mutações conhecidas no DNA mitocondrial  - tenham filhos saudáveis, evitando a transmissão dessas mutações de mãe para filho, sendo certo que a contribuição do DNA mitocondrial para o genoma completo da pessoa é muito pequena. Para aqueles que repudiam tal técnica, seus resultados podem ser classificados como um embrião humano geneticamente modificado (bebês customizados), contrariando, assim, um consenso internacional de longa data contra a concepção de humanos geneticamente modificados, bem como o Código de Ética Médica (art. 15 § 2º I) e a Lei da Biossegurança (Lei 11105/2005 – art. 6º III e IV).

[3] Como exemplo temos a resolução 2168/17 CFM, que no art. I, inciso 7, estabelece o número máximo de embriões a serem transferidos à paciente de reprodução assistida. Todavia, a jurisprudência já excepcionou esse número, diante do caso concreto: Manifesto que a Resolução n. 1.957/2010 estabeleceu, de modo genérico, números mínimo e máximo de embriões a serem utilizados em pacientes durante o Procedimento de Reprodução Assistida (RA), sem atentar às especificidades de quadros médicos como o presente. Como restou demonstrado, a parte impetrante, mulher de trinta e dois anos (à época da impetração), possui amplo histórico de sujeição a técnicas de reprodução assistida, tendo realizado diversos procedimentos médicos, como indução de ovulação e diversas tentativas de fertilização "in vitro". Comprovou a parte impetrante, ainda, antecedente de laparoscopia cirúrgica para ressecção de endometriose profunda em abril de 2010, tendo realizado novo tratamento de fertilização "in vitro", também sem sucesso. O caso dos autos, portanto, como bem ponderado pelo Parquet (fls.293), ilustra situação atípica, posto que a parte impetrante, conquanto tenha menos de quarenta anos, possui maior risco de falência ovariana prematura, fls. 04 e 12/13, o que, consequentemente, pode resultar em menopausa, encerrando-se as possibilidades de gravidez da impetrante. A regra em cume, como visto, terminou por generalizar diversas situações, excluindo as particularidades vivenciadas por cada uma das pacientes, na busca pela concretização do sonho de ser Mãe. Inadmissível, pois, aplicar-se à parte demandante a norma em cume, que a limitar a dois o número de embriões passíveis de utilização no Procedimento de Reprodução Assistida (RA), quando tal circunstância diminui suas (já reduzidas) chances de gerar um filho. Relembre-se, por fundamental, que a parte impetrante é acompanhada por extensa equipe médica especializada (fls. 12/41), cuja principal função é obter o melhor resultado no procedimento reprodutivo em foco, sem prejuízo à saúde da postulante. Impositiva, portanto, a concessão da segurança (AMS 00036161120114036100, JUIZ CONVOCADO SILVA NETO, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/01/2015).

[4] Assim a jurisprudência: Se nosso ordenamento jurídico, notadamente o próprio texto constitucional (art. 226, §3º), admite a união estável e reconhece nela a existência de entidade familiar, nada mais razoável de se conferir interpretação sistemática ao art. 1.597, II, do Código Civil, para que passe a contemplar, também, a presunção de concepção dos filhos na constância de união estável. (STJ. REsp 1194059/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/11/2012, DJe 14/11/2012)

[5] Pode-se admitir o consentimento, utilizando-se de outras provas, nos casos em que o paciente de reprodução assistida, venha a ser acometido de uma grave doença que o impeça atualmente de manifestar sua vontade, sendo possível que outras provas demonstrem (ante a clara constatação da interrupção do planejamento familiar e do projeto de ser pai biológico) que essa era a real e inequívoca vontade do paciente, caso ele pudesse se manifestar atualmente. Todavia, necessária, nesse caso, autorização judicial, onde se avaliará a certeza dessas provas.

[6] Todavia, admite-se a possibilidade de indenização pelo uso do material genético ou embrião de forma ilícita e abusiva.

[7] Assim ocorre no direito argentino: CARLUCCI, Aída Kemelmajer de; HERRERA, Marisa; LLOVERAS, Nora. Tratado de Derecho de familia. Tomo II. Rubinzal-Culzoni Editores, p. 696.

[8] Conforme a resolução 2168/17 do CFM (art. VII) é possível a gestação de substituição quando exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética, em caso de união homoafetiva ou pessoa solteira. Embora não fale a Resolução expressamente da gestação de substituição na reprodução assistida post mortem, a própria Resolução (art. VIII) admite a técnica de reprodução assistida post mortem, e sendo falecida a mulher, nesse caso a gestação em substituição deverá ser permitida. Assim a resolução 633 do CJF: é possível ao viúvo ou ao companheiro sobrevivente, o acesso à técnica de reprodução assistida póstuma – por meio da maternidade de substituição, desde que haja expresso consentimento manifestado em vida pela sua esposa ou companheira.

[9] Pode-se admitir o chamado testamento biológico ou genético para tal fim, que não segue o regramento formal dos testamentos, previsto no CC.

[10] Pode-se admitir o consentimento do marido para a utilização post mortem do material genético ou do embrião criopreservado, utilizando-se de outras provas, a demonstrar que essa era a real e inequívoca vontade do de cujus, que teve seu planejamento familiar e seu projeto de ser pai biológico interrompido pela morte. Todavia, necessária, nesse caso, autorização judicial, onde se avaliará a certeza dessas provas.

[11] No caso de reprodução assistida homóloga post mortem, não deve a mulher possuir outro relacionamento conjugal, eis que o filho gerado por inseminação homóloga poderá ser presumidamente, à luz do CC, fruto do novo relacionamento (art. 1597 I c/c art. 1598 do CC). Assim o enunciado 106 do CJF: Para que seja presumida a paternidade do marido falecido, será obrigatório que a mulher, ao se submeter a uma das técnicas de reprodução assistida com o material genético do falecido, esteja na condição de viúva, sendo obrigatória, ainda, a autorização escrita do marido para que se utilize seu material genético após sua morte. Todavia, basta nesse caso, comprovar pericialmente que o filho gerado não é fruto biológico no novo relacionamento, mas sim decorrente de anterior reprodução assistida homóloga, com material biológico do falecido.

[12] Todavia, admite-se a possibilidade de indenização pelo uso do material genético ou embrião de forma ilícita e abusiva.

[13] Assim ocorre no direito argentino: CARLUCCI, Aída Kemelmajer de; HERRERA, Marisa; LLOVERAS, Nora. Tratado de Derecho de familia. Tomo II. Rubinzal-Culzoni Editores, p. 696.

[14] No caso de reprodução assistida homóloga realizada após a separação de fato ou divórcio (ou fim da união estável), não deve a mulher possuir outro relacionamento conjugal, eis que o filho gerado por inseminação homóloga poderá ser presumidamente, à luz do CC, fruto do novo relacionamento (art. 1597 I c/c art. 1598 do CC). Todavia, basta nesse caso, comprovar pericialmente que o filho gerado não é fruto biológico no novo relacionamento, mas sim decorrente de anterior reprodução assistida homóloga, com material biológico do ex-marido ou ex-companheiro.

[15] Enunciado 107 do CJF: Finda a sociedade conjugal, na forma do art. 1.571, a regra do inc. IV somente poderá ser aplicada se houver autorização prévia, por escrito, dos ex-cônjuges para a utilização dos embriões excedentários, só podendo ser revogada até o início do procedimento de implantação desses embriões.

[16] Todavia, admite-se a possibilidade de indenização pelo uso do material genético ou embrião de forma ilícita e abusiva.

[17] Assim ocorre no direito argentino: CARLUCCI, Aída Kemelmajer de; HERRERA, Marisa; LLOVERAS, Nora. Tratado de Derecho de familia. Tomo II. Rubinzal-Culzoni Editores, p. 696.

[18] A reprodução humana heteróloga também pode ocorrer na hipótese conhecida como “mix de espermatozoides” ou “mix de óvulos”, desde que devidamente consentido por todos os envolvidos. É o caso em que o paciente (ou a paciente) de reprodução assistida não possui material biológico de qualidade e quantidade suficientes, tendo chances pequenas de sucesso na reprodução assistida homóloga. Assim, consente na utilização de material biológico de terceiro doador anônimo (ou terceira doadora anônima), para fins de mistura com seu próprio material biológico, mas não deseja saber se o seu material biológico foi quem efetivamente gerou seu filho. Nesse caso, apenas um material biológico terá o condão de gerar a criança, que será, portanto, fruto de reprodução homóloga (quando o seu material biológico gerou a criança) ou heteróloga (quando a fecundação se deu com o material biológico doado de forma anônima). Na Consulta nº 26.126/14, o CREMESP entendeu que o chamado "mix de espermatozoides" não possui proibição de natureza normativa, seja legal ou ética, sendo que em alguns casos é até indicado em razão do importante efeito psicológico produzido nos partícipes do procedimento, no sentido da constituição de sua família.

[19] Enunciado 103 do CJF: O Código Civil reconhece, no art. 1.593, outras espécies de parentesco civil além daquele decorrente da adoção, acolhendo, assim, a noção de que há também parentesco civil no vínculo parental proveniente quer das técnicas de reprodução assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não contribuiu com seu material fecundante, quer da paternidade socioafetiva, fundada na posse do estado de filho. Enunciado 39 do CNJ (Jornadas de Direito da Saúde): O estado de filiação não decorre apenas do vínculo genético, incluindo a reprodução assistida com material genético de terceiro, derivando da manifestação inequívoca de vontade da parte.

[20] O CRMPR já autorizou, no parecer 2523/2016, a doação anônima de óvulos pela filha de uma paciente de reprodução assistida, a outra mulher desconhecida paciente de reprodução assistida, em troca da doação anônima de óvulos de uma paciente à genitora da primeira doadora. Embora não se trate especificamente da doação compartilhada, muito se aproxima, sendo certo o que o caso preserva o anonimato e a gratuidade. 

[21] O provimento 63/2017 do CNJ dispõe sobre o registro de nascimento de filhos havidos de reprodução assistida, independente de ordem judicial (art. 16), mesmo que oriundo de reprodução heteróloga (art. 17 II), bastando, para tanto, declaração do diretor técnico da clínica, indicando que a criança foi gerada por reprodução heteróloga, e informando apenas os nomes dos pacientes beneficiários da técnica. Lado outro, estabelece no art. 8º: O oficial de registro civil das pessoas naturais não poderá exigir a identificação do doador de material genético como condição para a lavratura do registro de nascimento de criança gerada mediante técnica de reprodução assistida.  

[22]A jurisprudência já permitiu a doação de óvulos pela irmã da paciente de reprodução assistida, afastando assim o princípio do anonimato, por entender que não se trata de uma regra absoluta: A adoção dos procedimentos e técnicas de reprodução assistida encontra guarida nos direitos constitucionais ao planejamento familiar (art. 226, § 7º, CF/88) e à saúde (art. 196, CF/88), bem como no princípio da autonomia privada. Em harmonia com a Constituição, o Código Civil reconhece, no artigo § 2º do art. 1.565, a importância do planejamento familiar, direito cujo exercício deve contar com apoio educacional e financeiro do Estado. Nesse cenário de tutela da aspiração reprodutiva como consequência do direito fundamental à saúde e ao planejamento familiar e, consequentemente, de autorização e facilitação de acesso às técnicas de procriação medicamente assistida, eventuais restrições, para se legitimarem, devem encontrar suporte lógico, científico e jurídico. O direito à reprodução por técnicas de fecundação artificial não possui, por óbvio, caráter absoluto. Contudo, eventuais medidas restritivas de acesso às técnicas de reprodução assistida, ínsito ao exercício de direitos fundamentais de alta envergadura, consoante demonstrado, só se justificam diante do risco de dano efetivo a um bem relevante, análise a ser perpetrada, não raro, em face do caso concreto. No caso dos autos, objetivam os autores autorização para a realização de procedimento de fertilização in vitro mediante utilização de óvulos de doadora conhecida (irmã da autora), afastando-se a proibição do item 2, IV, da Resolução nº 2121/2015, emanada do Conselho Federal de Medicina, que revogou a anterior Resolução/CFM nº 2013/2013, embora mantenha disposição no mesmo sentido. A razão maior da proibição inscrita na Resolução/CFM nº 2121/2015, ao resguardar a identidade de doador(a) e receptor(a), encontra fundamento ético nos riscos de questionamento da filiação biológica da futura criança, desestabilizando as relações familiares e pondo em cheque o bem estar emocional de todos os envolvidos. Os laços consanguíneos existentes entre as irmãs e o fato da possível doadora haver constituído família tornam remota a chance de qualquer disputa em torno da maternidade, caindo por terra, então, diante da análise da situação concreta, a proibição inserta na norma questionada e a cautela representada pela preocupação que moveu o Conselho Federal de Medicina ao erigi-la. Por outro lado, se o sigilo é importante para garantir aos doadores de gametas isenção de responsabilidade em face dos deveres inerentes às relações de filiação, sob esse aspecto também não se mostra consentâneo com o caso concreto, no qual a relação de parentesco verificada entre doadora, casal e futura criança caracteriza vínculo do qual decorrem obrigações preexistentes de cuidado e assistência mútua. A questão posta não se coloca em face da inidoneidade do texto normativo emanado do Conselho Federal de Medicina, mas de sua inaplicabilidade ao caso sub judice, considerando a razão maior de sua existência. Outrossim, as normas que minudenciam regras aplicáveis aos procedimentos marcados pela intervenção humana na procriação artificial, emanadas desse Conselho, ostentam natureza infralegal, veiculando preceitos eminentemente éticos, portanto, desprovidos de caráter sancionatório (exceto o disciplinar), que, em nosso ordenamento jurídico, é inerente às manifestações do Poder Legislativo.Reconhecido o direito à efetivação do procedimento de fertilização in vitro a partir de óvulos doados pela irmã da autora, abstendo-se a autarquia ré de adotar quaisquer medidas ético-disciplinares contra os profissionais envolvidos nessa intervenção, aos quais se reserva o direito de aferir a viabilidade do procedimento mediante oportuna realização dos exames necessários. (TRF 3, Apelação Cível 0007052-98.2013.4.03.6102/SP, Relator: Mairan Maia, julgamento em: 19/11/2015).

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[23] Pode-se admitir o consentimento, utilizando-se de outras provas, nos casos em que o paciente de reprodução assistida, venha a ser acometido de uma grave doença que o impeça atualmente de manifestar sua vontade, sendo possível que outras provas demonstrem (ante a clara constatação da interrupção do planejamento familiar e do projeto de ser pai socioafetivo) que essa era a real e inequívoca vontade do paciente, caso ele pudesse se manifestar atualmente. Todavia, necessária, nesse caso, autorização judicial, onde se avaliará a certeza dessas provas, com redobrado cuidado e cautela, por se tratar de material biológico de outrem.

[24]Não se confunde, contudo, a fertilização assistida heteróloga com uma adoção. Conforme enunciado 111 do CJF: A adoção e a reprodução assistida heteróloga atribuem a condição de filho ao adotado e à criança resultante de técnica conceptiva heteróloga; porém, enquanto na adoção haverá o desligamento dos vínculos entre o adotado e seus parentes consangüíneos, na reprodução assistida heteróloga sequer será estabelecido o vínculo de parentesco entre a criança e o doador do material fecundante.

[25] Enunciado 258 do CJF: Não cabe a ação prevista no art. 1.601 do Código Civil se a filiação tiver origem em procriação assistida heteróloga, autorizada pelo marido nos termos do inc. V do art. 1.597, cuja paternidade configura presunção absoluta.

[26] Admite-se a possibilidade de indenização pelo uso do material genético ou embrião de forma ilícita e abusiva.

[27]No direito espanhol, admite-se a possibilidade da inseminação post mortem heteróloga: ¿No se puede admitir una fecundación heteróloga post mortem, ante esterilidad inicial del marido, si este había consentido expresamente? Si respondemos negativamente, habrá entonces que responder a la siguiente pregunta ¿Por qué se admite en vida esta práctica y se niega post mortem? ¿El hijo nacido por fecundación post mortem es que tiene que ser biologicamente del marido? Conviene en este momento recordar que con la fecundación post mortem no se trata tanto de que sea el medio para tener um hijo del marido, cuanto la solución para completar um proyecto de paternidade en común iniciado y que la muerte del marido había suspendido. En conclusión, debemos admitir la fecundación post mortem heteróloga cuando el varón había autorizado expresamente esta técnica antes del fallecimiento (AGUADO, Ricardo Emilio Cañizares. Fecundación post mortem y determinación de la paternidad. http://www.abogadofamilia.es/detalle-novedades-legislativas.php?news_id=21).

[28] Conforme a resolução 2168/17 do CFM (art. VII) é possível a gestação de substituição quando exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética, em caso de união homoafetiva ou pessoa solteira. Embora não fale a Resolução expressamente da gestação de substituição na reprodução assistida post mortem, essa técnica é permitida pela Resolução (art. VIII), e, sendo falecida a mulher, nesse caso a gestação em substituição deverá se permitida. Assim a resolução 633 do CJF: é possível ao viúvo ou ao companheiro sobrevivente, o acesso à técnica de reprodução assistida póstuma – por meio da maternidade de substituição, desde que haja expresso consentimento manifestado em vida pela sua esposa ou companheira.

[29] Pode-se admitir o chamado testamento biológico ou genético para tal fim, que não segue o regramento formal dos testamentos, previsto no CC.

[30]Pode-se admitir o consentimento do marido para a utilização da reprodução assistida heteróloga post mortem, utilizando-se de outras provas, a demonstrar que essa era a real e inequívoca vontade do de cujus, que teve seu planejamento familiar e seu projeto de ser pai socioafetivo interrompido pela morte. Todavia, necessária, nesse caso, autorização judicial onde se avaliará a certeza dessas provas, com redobrado cuidado e cautela, por se tratar de material biológico de outrem.

[31] No caso de reprodução assistida heteróloga post mortem, não deve a mulher possuir outro relacionamento conjugal, eis que o filho gerado por inseminação heteróloga poderá ser presumidamente, à luz do CC, fruto do novo relacionamento (art. 1597 I c/c art. 1598 do CC). Todavia, basta nesse caso, comprovar pericialmente que o filho gerado é fruto de reprodução heteróloga, e não fruto biológico no novo relacionamento, para a afirmação da presunção absoluta de paternidade socioafetiva da reprodução heteróloga.

[32] Admite-se a possibilidade de indenização pelo uso do material genético ou embrião de forma ilícita e abusiva.

[33] No caso de reprodução assistida heteróloga realizada após a separação de fato ou divórcio (ou fim da união estável), não deve a mulher possuir outro relacionamento conjugal, eis que o filho gerado por inseminação heteróloga poderá ser presumidamente, à luz do CC, fruto do novo relacionamento (art. 1597 I c/c art. 1598 do CC). Todavia, basta nesse caso, comprovar pericialmente que o filho gerado é fruto de reprodução heteróloga, e não fruto biológico no novo relacionamento, para a afirmação da presunção absoluta de paternidade socioafetiva da reprodução heteróloga.

[34] Admite-se a possibilidade de indenização pelo uso do material genético ou embrião de forma ilícita e abusiva.

[35] O CREMESP, na Consulta nº 26.126/14, autorizou a técnica conhecida como “mix de espermatozóides”, desde que devidamente consentido por todos os envolvidos, em que os dois homens que formam um casal homoafetivo doam seu material biológico, que serão misturados, embora apenas o material biológico de um dos homens fecundará o óvulo doado por terceira anônima. Entendeu o CREMESP pela ausência de proibição e pela possibilidade jurídica e ética, sendo que em alguns casos é até indicado em razão do importante efeito psicológico produzido nos partícipes do procedimento, no sentido da constituição de sua família. No caso de casal homoafetivo formado por duas mulheres, é permitida a gestação compartilhada em que não exista infertilidade. Nesse caso, uma das mulheres será a gestante e outra a doadora do material biológico (art. II, inciso 3 da Resolução CFM). Embora não expresso, a gestação compartilhada ocorre nas hipóteses em que uma das mulheres será a gestante (salvo quando haja um problema médico) com a fecundação assistida realizada com seu próprio material biológico ou com o material biológico da parceira, havendo a doação do material biológico (espermatozoide) por terceiro anônimo. Pelas mesmas razões acima, também possível o chamado “mix de óvulos”, desde que devidamente consentido por todos os envolvidos, em que duas mulheres que formam um casal homoafetivo doam seu material biológico, que serão misturados, embora apenas o material biológico de uma das mulheres gerará a criança, juntamente com o material biológico (espermatozoide) de terceiro anônimo.

[36] O CNJ no provimento 63/17 permite o registro de nascimento de filhos de casais homoafetivos, oriundos de reprodução assistida (art. 16 § 2º), independente de ordem judicial.

[37] A monoparentalidade programada pode ser unilateralmente heteróloga (quando se utiliza de material biológico somente de um doador ou doadora, anônimos, mas também se utiliza do material biológico do paciente – solteiro - de reprodução assistida)  ou bilateralmente heteróloga (quando se utiliza de material biológico de doador e doadora, ou doação de embrião, sempre de forma anônima, sem a utilização de material biológico do paciente – solteiro - de reprodução assistida ).

[38] Adota-se aqui interpretação extensiva, pois a Resolução se limita à mãe/filha, avó/irmã, tia/sobrinha e prima.

[39] O CRM pode autorizar a gestação de substituição quando não houver parentes consanguíneos aptos a doar temporariamente o útero, como por exemplo parentes por afinidade ou mesmo outras pessoas, mas sempre de forma gratuita. Assim, o CREMEGO, no parecer/consulta 13/2014, estabeleceu que a autorização para a utilização de procedimento de útero de substituição, em que a doadora temporária do útero não faz parte da família dos solicitantes até quarto grau, é possível desde que não haja vínculo comercial entre os solicitantes e a doadora do útero ou qualquer outra vantagem decorrente desta relação.

[40] Assim também o enunciado 45 do CNJ (Jornadas de Direito da Saúde): Nas hipóteses de reprodução humana assistida, nos casos de gestação de substituição, a determinação do vínculo de filiação deve contemplar os autores do projeto parental, que promoveram o procedimento.

[41] Quando utilizada a técnica de reprodução heteróloga, em razão do princípio do anonimato, a doadora do útero (gestatrix) não pode ser também a doadora do material genético (genitrix). Todavia, entendeu o STJ (REsp 1608005/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/05/2019, DJe 21/05/2019) que o anonimato não se trata de uma regra absoluta, podendo ser dispensado, como no caso de uma doadora do material biológico que foi também a doadora do útero, reconhecendo a Justiça como pais apenas o casal homoafetivo (sendo um deles o doador do sêmen e o outro irmão da doadora dos óvulos e do útero) que idealizou o projeto parental, se valendo, para tanto, da reprodução assistida.

[42] Enunciado 258 do CJF: Não cabe a ação prevista no art. 1.601 do Código Civil se a filiação tiver origem em procriação assistida heteróloga, autorizada pelo marido nos termos do inc. V do art. 1.597, cuja paternidade configura presunção absoluta.

[43] Enunciado 267 do CJF: A regra do art. 1.798 do Código Civil deve ser estendida aos embriões formados mediante o uso de técnicas de reprodução assistida, abrangendo, assim, a vocação hereditária da pessoa humana a nascer cujos efeitos patrimoniais se submetem às regras previstas para a petição da herança.

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Sobre o autor
Cleber Couto

Promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais. Coordenador Regional das Promotorias de Justiça da Educação, Infância e Juventude. Coordenador Regional do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado. Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família. Bacharel em Direito pela Unifenas. Pós-Graduado em Direito Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Doutorando em Direito Civil pela Universidad de Buenos Aires, Argentina.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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