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O direito de propriedade e o Código de Trânsito Brasileiro

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01/06/2003 às 00:00

Resumo:


  • O direito de propriedade de veículos no Brasil, conforme o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), está sujeito a limitações, como a exigência de quitação de tributos, encargos e multas para o licenciamento anual e a liberação em caso de apreensão.

  • O CTB impõe a apreensão de veículos como penalidade por infrações de trânsito, e a restituição do veículo apreendido depende do pagamento de multas e outras despesas, o que é considerado por muitos como uma prática inconstitucional que viola garantias fundamentais.

  • O artigo 328 do CTB estabelece um procedimento de leilão para veículos não reclamados após 90 dias de apreensão, mas este procedimento tem sido criticado por resultar na perda de propriedade sem o devido processo legal, contrariando princípios constitucionais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5 O PRINCÍPIO ADMINISTRATIVO DA AUTO-EXECUTORIEDADE E OS ATOS PRATICADOS PELOS ÓRGÃOS DE TRANSITO NO CUMPRIMENTO AO ESTABELECIDO NO CTB

De acordo com a melhor doutrina do Direito Administrativo, o princípio da auto-executoriedade, como princípio informativo do Direito Administrativo, é aquele pelo qual a Administração executa seus próprios atos, assim que editados, dispensando o prévio título executório.

Este princípio aplica-se, por exemplo, no caso do decreto expropriatório, que ao ser editado, dá às autoridades administrativas o direito de penetração no imóvel, respondendo ela, apenas, pelos abusos cometidos.

Essa posição privilegiada da Administração, perante o administrado, que lhe confere a faculdade excepcional de pôr em execução com os próprios meios de que dispõe, inclusive manu militare, os atos administrativos editados, sem o cuidado prévio de submeter tais decisões à apreciação da autoridade judiciária, resulta daquilo que os autores franceses denominam de privilégio "du préalable" e da ação de ofício, prerrogativas só derrogadas, excepcionalmente quando se acha em jogo a liberdade individual ou a propriedade confiscada, sem o respectivo processo expropriatório (CRETELLA JÚNIOR, 1995, p. 210).

A expropriação é um dos institutos de maior gravame imposta pela Constituição aos proprietários de imóveis. Ela ocorre sempre que for localizado o cultivo ilegal de plantas psicotrópicas em glebas de qualquer região do País (art. 243, CF).

José Cretella Júnior (1995) é claro ao afirmar que as decisões administrativas que trazem, em si, força executória, entrando em ação e produzindo imediatos efeitos, unilateralmente, são prerrogativas só derrogadas à Administração no caso de prisão em flagrante delito e de expropriação.

Em outras palavras, o princípio da auto-executoriedade é limitado. A Administração não possui a faculdade de se utilizar dele a seu bel prazer.

... A executoriedade, compatível com o regime de direito, encontra barreira intransponível na lei, sem o que estariam ameaçadas as liberdades públicas, fundamento dos Estados em que se repele o antijurídico (op. cit., p. 212).

Assim o é com relação ao Código de Trânsito Brasileiro. O que os órgãos de trânsito têm feito ao exigir o pagamento de tributos, multas e encargos relativos ao mesmo para licenciá-los ou para liberá-los, no caso de aplicação da penalidade de apreensão, é verdadeira auto-execução.

Neste sentido, também entendeu o egrégio Ministério Público do Estado de Minas Gerais, conforme se verifica no brilhante parecer exarado nos autos do processo de n.º 024.01.033.159-3, ainda em trâmite perante a 3ª vara da Fazenda Pública Estadual e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte.

A fim de dar maior sustentação ao alegado até o momento no presente trabalho, pede-se licença para a inserção, sob a forma de transcrição do aludido parecer. Ressalve-se apenas que a terminologia utilizada e as citações feitas são de exclusiva responsabilidade do Ilustríssimo Promotor de Justiça que o redigiu.

A multa administrativa decorrente de infração à norma de trânsito é impositiva e deve ser paga pelo infrator.

Ocorre que, na espécie, o ato administrativo da Administração Pública não goza do atributo da auto-executoriedade.

A auto-executoriedade consiste no poder que detém a Administração de executar seus atos administrativos, sem a necessidade da intervenção do Poder Judiciário. Somente são auto-executórios os atos dotados de imperatividade; todavia nem todo ato administrativo goza da auto-executoriedade.

Não basta que o ato administrativo contenha o atributo da imperatividade, é preciso que seja um ato próprio da Administração. Traga-se a lume a lição do Prof. Hely Lopes: "O que se faz necessário – como bem adverte Bielsa – é distinguir os atos próprios do poder administrativo, na execução dos quais é irrecusável a auto-executoriedade, dos que lhe são impróprios, e, por isso mesmo, dependentes da intervenção de outro poder, como ocorre com a cobrança contenciosa de uma multa, que, em hipótese alguma poderia ficar a cargo exclusivo dos Órgãos administrativos".

Na mesma linha está Odete Medauar: "Evidente que nem todas as medidas recebem execução direta pela própria Administração; assim, por exemplo, a cobrança de multa aplicada e de tributos se efetua pela via judicial, fugindo à competência da Administração a decretação das medidas coativas sobre o patrimônio dos devedores para o cumprimento dos débitos".

Cite-se ainda o Prof. Edimur Ferreira de Faria: "A cobrança de multas ou de outras vantagens pecuniárias não se opera diretamente pela Administração. Nesses casos, não comporta a auto-executoriedade. É indispensável a audiência do Poder Judiciário. Não havendo concordância do devedor em pagar, amigavelmente, o recurso à Justiça é condição indispensável para impor-lhe o dever de cumprir a obrigação".

Com razão os ilustres administrativistas. É imperativo o ato que impõe ao administrado a obrigação de pagamento de uma multa ou de um tributo. No entanto, a cobrança de referidos créditos não é ato próprio da Administração e, portanto, o ato é despido do atributo da auto-executoriedade. Aliás, para tal propósito, o Legislador colocou à disposição da Administração a L. 6.830, que regulamenta o executivo fiscal, para a cobrança da dívida ativa tributária e não-tributária (art. 2.º, § 2.º): " O meio próprio para a cobrança de multas é o executivo fiscal que não pode ser substituído por imposição de índole administrativa (JTJSC, 1971, 1.º vol., p. 86, Rel. May Filho).

Assim sendo, afigura-se inconstitucional, por exemplo, a norma do Código de Trânsito que condiciona o licenciamento de veículo ao pagamento de multas, bem como a norma municipal que condiciona a expedição de alvará de construção ao pagamento do IPTU ou a norma tributária que, para autorizar a impressão de documento fiscal, exige a apresentação de certidão negativa de débito fiscal. É que, por vias travessas, tais dispositivos dão à Administração a auto-executoriedade que ela não pode possuir, por se tratar, como se frisou, de ato administrativo impróprio (cobrança). Assim fazendo, a norma finca por ferir o disposto no art. 2º da Constituição, porque viola o princípio da separação dos poderes, visto que ao Poder Judiciário é dado mister da composição dos litígios com o emprego da coação.

A propósito de análogo tema, tenha-se a lição do ilustre tributarista Ruy Barbosa Nogueira: "O devedor em mora está sujeito à execução forçada judicial dentro do due process of law, com as garantias constitucionais do contraditório e jamais pode ser entregue à execução nas mãos do próprio credor. Essas sanções políticas são resquícios do ancién régime anterior à Revolução Francesa. Não têm cabimento dentro do atual Sistema Tributário Nacional. Essa forma manu militare de cobrança administrativa é, pois, absolutamente ilegítima e não deve ser mais tentada pelo fisco federal, porque já foi excluída da ordem jurídico-tributária, por torrente uniforme de julgados e pelo CTN que a não acolheu".

Por derradeiro, não outro o entendimento jurisprudencial: "Condicionamento da vistoria ao pagamento da multa é dar auto-executoriedade e um poder que a administração não tem" (TJRJ, 11.ª Câm. Civ., Rel. Des. Edson Scisino, em 27.05.99, proc. N.º 1999.009.89). "É ilegal e abusivo, ato do diretor do Detran, que impede o licenciamento de veículo, por ter o seu proprietário recolhido o IPVA, relativo ao exercício de 1993, a menor. A dívida pendente (IPVA) deverá ser exigida, mediante o devido processo legal, independentemente da quitação do imposto, relativo ao licenciamento correspondente ao ano de 1996" (TJPR, 6.ª Câm. Civ., Rel. Accacio Cambi, em 24.09.97, proc. N.º 53125900). "Lançamento e cobrança do IPVA do exercício de 1996, condicionada ao pagamento do tributo relativo a exercícios anteriores. Ilegalidade do procedimento" (TJPR, 1.º Gr. Câm. Civ., Rel. Des. Ivan Bortoleto, em 03.04.98, MS n.º 60020700). "Dispondo a Administração de meios para cobrar os valores correspondentes às multas impostas por infração às leis de trânsito é ilegal a exigência de sua prévia quitação, como condição para o licenciamento do veículo" (TJSC, 3.ª Câm. Civ., Rel. Des. Eder Graf, MS n.º 3.306, p. DIESC em 20.05.91).

Com efeito, diante de flagrante inconstitucionalidade, a Administração Pública deve deixar de cumprir lei infraconstitucional, sem que com isto esteja exercendo controle da constitucionalidade, mas, sim, apenas exercendo o autocontrole de legalidade de seus atos, pois, se é certo que a Administração Pública deve cumprir a lei, não será menor verdadeiro afirmar que, no entrechoque de preceitos, a melhor forma de realizar o princípio da legalidade será dando fiel cumprimento à Constituição, a Lei Maior. À guisa de exemplificação, seria inconcebível aceitar que o agente público, a pretexto de observância ao princípio da legalidade, fosse obrigado a cumprir uma lei manifestamente inconstitucional, apenas que ainda não assim declarada pelo Judiciário, praticando abuso de autoridade e se colocando conscientemente na condição de autoridade coatora. Daí o porquê de já se haver decidido que "O Poder Executivo não é obrigado a cumprir leis que considere inconstitucionais".

E só para dar maior ênfase a tudo o que alegou o ilustre Promotor em seu brilhante parecer, nada como citar J. J. Canotilho (1999, p. 682):

Um acto administrativo, a recusa de um acto, um silêncio das entidades públicas podem ultrapassar os limites legais do exercício do poder discricionário (excesso de poder). Por outro lado, o exercício do poder pode não se destinar aos fins visados pela lei (desvio do poder discricionário ou utilização viciada). Num caso e noutro, o Estado de direito impõe a sua proibição e a possibilidade de controlo do exercício da discricionariedade. Caso contrário, o exercício deste poder transformar-se-ia no <cavalo de Tróia do direito administrativo do Estado de direito>.

Não resta dúvida, então, que os órgãos de trânsito não dispõem da auto-executoriedade, ainda que o legislador, ao editar a Lei n.º 9.503, de 23 de setembro de 1997, tenha, de certa forma, induzido-os a agirem assim. De qualquer forma, os §§ 2º dos arts. 131 e 262 não deveriam estar sendo cumpridos pelo Poder Público, ante a flagrante inconstitucionalidade da qual estão eivados.

Infelizmente, as ações que tentaram obter a declaração da inconstitucionalidade de tais dispositivos não obtiveram êxito junto ao Supremo Tribunal Federal. Entretanto, o Poder Judiciário não tem deixado de se imiscuir e, nos casos concretos, decidir conforme determina a Constituição e em consonância com os princípios atinentes a um Estado Democrático de Direito.

E Miguel Reale (1984, p. 257-258), ao fazer uma crítica à Teoria da Autolimitação de Jhering, acredita neste papel fundamental do Poder Judiciário:

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Se se aceitasse o princípio da plenitude lógica da legislação positiva (note-se que dizemos: legislação positiva), então os limites da atividade estatal já estariam contidos na lei, e o processo político todo ficaria convertido em processo jurídico: em lugar de decisões políticas, só haveria deliberações jurídicas. Esse ideal do Estado reduzido ao Direito, e do Direito reduzido à lei, do poder todo tornado poder jurídico tanto pela matéria como pela forma, não nos parece realizável. A legislação não pode deixar de ter lacunas e, por mais que se aprimorem os métodos de interpretação, será sempre necessária uma margem de discrição para que o intérprete possa colocar o Direito formulado em consonância com as novas situações que o legislador não pôde ou não quis prever.


6 O ART. 328 DO CTB E A EXECUÇÃO FISCAL

Diante de tudo o que já foi dito até se chegar a este capítulo, pode-se dizer que o Código de Trânsito Brasileiro (Lei n.º 9.503, de 23 de setembro de 1997) determinou uma seqüência de atos que, se completados, levarão, inquestionavelmente, à perda de todos os veículos dos proprietários insolventes.

Primeiro exige-se o pagamento de todos os tributos, multas e encargos relativos aos veículos para que os mesmos possam obter anualmente o documento de licenciamento. Em seguida, não havendo o licenciamento e permanecendo o veículo em circulação, incorrerá o mesmo na infração prevista no art. 230, inciso V, que consiste em "conduzir veículo que não esteja registrado e devidamente licenciado", que tem como penalidades previstas multa gravíssima (180 UFIR) e apreensão do veículo. Apreendido o veículo, o mesmo só será liberado "(...) mediante o pagamento das multas impostas, taxas e despesas com remoção e estada, além de outros encargos previstos na legislação específica" (art. 262, § 2º).

Não satisfeito com esta seqüência de arbitrariedades, o legislador ainda instituiu outra aberração jurídica: criou uma nova "Execução Fiscal", no entanto, sem observar os requisitos previstos na Lei n.º 6830, de 20 de setembro de 1980, que trata do assunto, e, sobretudo, sem acionar o Poder Judiciário. Esta nova figura, criada pelo CTB, ignora brutalmente os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Abaixo, a transcrição do art. 328, da Lei n.º 9.503/97, criador deste "Leviatã":

Os veículos apreendidos ou removidos a qualquer título e os animais não reclamados por seus proprietários, dentro do prazo de noventa dias, serão levados à hasta pública, deduzindo-se do valor arrecadado, o montante da dívida relativa a multas, tributos e encargos legais, e o restante, se houver, depositado à conta do ex-proprietário, na forma da lei.

Antes de se partir para o ataque ao dispositivo, oportuno fazer a defesa da Administração Pública. Como afirmado em outro capítulo, a previsão da penalidade de apreensão de veículos é relevante, sobretudo no aspecto da segurança. O CTB fixa a penalidade máxima em 30 dias (art. 262, caput). Cumprida a penalidade e analisando-se o art. 328 sem vinculá-lo ao § 2º do art. 262 (o que, todavia, não é possível), entender-se-ia a intenção do legislador. Ou seja, cumprida a penalidade, após transcorrer 90 (noventa) dias, aqueles veículos que não fossem reclamados, seriam levados à hasta pública. Obviamente, a Administração não deve ter para si o ônus de ser depositária eterna de um bem que não lhe pertence. Ademais, este ônus gera outros, com os quais o Poder Público não é obrigado a arcar.

Acontece que, e esta é a crítica que se faz, o § 2º do art. 262 continua a viger e os órgãos de trânsito têm-no cumprido cabalmente. Aí surge uma grave questão: ao ver seu veículo apreendido, o proprietário, muitas vezes, acaba por não reclamá-lo, uma vez que não dispõe dos meios para quitar as multas, taxas e despesas com remoção e estada, além de outros encargos previstos.

Em outras palavras, a lei condicionou a liberação dos veículos. E ao passo que condiciona, ela pretende, na verdade (e basta, para isso, ler nas entrelinhas do art. 328), executar o proprietário e receber dele todas as dívidas relativas ao seu veículo. E isto vem acontecendo sistematicamente, contudo sem a audiência do Poder Judiciário.

A lei a que se refere o art. 328 é a Lei n. º 6.575, de 30 de setembro de 1978, que, como já afirmado, foi editada em pleno regime ditatorial. Esta lei estabelece os atos a que obedecerá a alienação. Atos são procedimentos. E procedimento não é processo. Desta forma, e o próprio artigo diz isso claramente quando já chama o proprietário de ex-proprietário, ocorre uma expropriação, com o único fim claramente visível que é o de usar do valor do bem para quitar suas dívidas para com o Poder Público, seja ele na esfera federal, estadual ou municipal. Isso é Execução Fiscal e, sem sombra de dúvida, só poderia ser feita respeitado o disposto na Lei 6.830/80.

Inobstante ter à sua disposição todos estes meios ardilosos para "executar" o contribuinte, a Administração Pública deparou-se com um "sério" problema: o montante arrecadado nos leilões, na maioria dos casos, não estava sendo suficiente para cobrir sequer as despesas que teve o órgão que aplicou a penalidade, muito menos então quitar todos os tributos, multas e encargos vinculados ao veículo.

A Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, num profundo exercício de "ginástica cerebral" aprovou a Lei n.º 14.135, sancionada pelo Governador Itamar Franco em 28 de dezembro de 2001, e encontrou resposta para esta questão.

Dispõe o art. 11 da aludida lei estadual:

Art. 11 – Serão cancelados os processos referentes a créditos de IPVA e de multas de trânsito dos veículos vendidos em leilão promovido, na forma do art. 328 do Código de Trânsito Brasileiro, por órgão ou entidade da administração pública estadual, direta e indireta.

§ 1º - Os créditos arrecadados em decorrência de multas federais, municipais ou de outros Estados serão mantidos à disposição do órgão autuador em banco de dados, de forma apartada e individualizada, liberando-se o veículo para o arrematante.

§ 2º - O IPVA não incidirá sobre a propriedade de veículo apreendido e mantido em depósito do Estado no período compreendido entre a decisão judicial ou administrativa que determine a apreensão e a realização do leilão.

É impressionante o ponto a que chegou a imaginação dos Deputados Estaduais mineiros. Vejam só: a fim de se evitar o incômodo de leiloar os veículos e ter que reverter o montante arrecadado para o pagamento de tributos e multas, por exemplo, que na ordem hierárquica dos créditos tributários teriam preferência, o Estado de Minas Gerais optou por cancelar os créditos de IPVA e as multas de competência estadual, indo além, determinando também que os créditos federais, municipais ou de outros Estados sejam por eles cobrados do ex-proprietário, podendo assim o arrematante adquirir o veículo livre de quaisquer ônus.

Ou seja, com o leilão, o montante arrecadado é todo revertido aos cofres públicos estaduais sob a alegação de quitar as despesas com remoção e estada. Os outros órgãos "que se virem" para cobrar seus créditos. No mínimo engenhosa a saída encontrada pelo Governo mineiro.

A pergunta que se faz, e esta certamente os parlamentares mineiros não vão querer responder, é por que os benefícios da anistia do IPVA e das multas e do apartamento dos outros débitos não podem ser concedidos ao já proprietário do veículo para que o mesmo possa reavê-lo? Porém, a resposta é simples: porque assim o Estado não receberia nada e não lucraria com as apreensões; ele e as empresas terceirizadas que prestam o serviço de depositário.

Mas, em contrapartida, esta solução não seria juridicamente descabida, se não fossem tão abusivas as taxas cobradas pela remoção dos veículos e as diárias nos pátios de recolhimento. O Estado de Minas Gerais poderia promover a anistia e também apartar os outros débitos, ficando o proprietário apenas na obrigação de quitar as despesas da remoção e da estada do veículo, cabendo ao próprio Estado e aos outros entes federativos cobrarem seus créditos por meio da Execução Fiscal.

Ocorre que isto não é financeiramente viável, sob a ótica dos governantes. Assim como não é financeiramente interessante que todas as dívidas relativas ao veículo fossem cobradas por cada órgão credor, por meio da Execução Fiscal.

Se assim o fosse, ficaria a liberação do veículo condicionada apenas ao pagamento dos encargos de remoção e estada e à aprovação em inspeção veicular, até porque "’qualquer valor’, cuja cobrança seja atribuída por lei à Fazenda Pública Federal, Estadual ou Municipal ‘será considerada Dívida Ativa’" (THEODOR JÚNIOR, 1998, p. 130), para fins de execução da dívida ativa fiscal.

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Sobre o autor
Mário Rocha Castro Júnior

advogado, pós-graduando em Direito Público, diretor de operações de transporte público da Secretaria Municipal de Trânsito e Infra-Estrutura do Município de Contagem (MG)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTRO JÚNIOR, Mário Rocha. O direito de propriedade e o Código de Trânsito Brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 66, 1 jun. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4131. Acesso em: 6 dez. 2025.

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