A AGU (Advocacia-Geral da União) entrou na Justiça Federal com a primeira ação para cobrar o ressarcimento de danos aos cofres públicos a empreiteiras acusadas de corrupção na Petrobras.
Esse processo vai tramitar junto com uma ação de improbidade movida pelo Ministério Público Federal contra empreiteiras, mas o pedido da AGU é mais duro que o dos procuradores.
Os focos dessa primeira ação são seis contratos da Mendes Junior com a Petrobras, mas outras empresas também são alvo, porque participaram dos consórcios.
São elas: Andrade Gutierrez, Odebrecht, Setal, UTC, MPE Montagens e KTY Engenharia. Executivos da Mendes Junior e o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa também são alvos.
A AGU faz três pedidos: ressarcimento dos lucros obtidos com os serviços prestados à Petrobras, devolução de 3% do valor desses contratos –referentes ao pagamento de propina– e multa de até três vezes esses valores.
O órgão não estipulou o valor a ser devolvido. Só os 3% dos contratos representam R$ 187 milhões.
Foi dito nos autos: “É preciso observar que se está diante de escândalo de corrupção de enorme magnitude. Seus efeitos alcançaram diversas áreas de interesse do Estado e da sociedade brasileira, inclusive com gravíssimas repercussões no cenário internacional e com severas consequências econômicas, jurídicas, sociais e até mesmo morais para a vida do país”.
A AGU pede, ainda, que, caso não informem seus lucros à Justiça, as empresas sejam condenadas a pagar o valor total dos contratos –R$ 6,2 bilhões–, além de multa.
Por certo pode-se discutir se há relação de continente para conteúdo com a ação civil de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal quanto à matéria.
Surge a questão do ato ilícito e suas consequências.
Do conceito de ato ilícito, que é fundamento da reparação do dano, tal como já enunciava o artigo 159 do Código Civil revogado, tem-se que a obrigação de reparar o dano, imposta a todo aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar dano a outrem.
Há uma obrigação de reparar o dano causado por culpa do agente.
Reportando-se ao ato ilícito, Henoch D. Aguiar (Hechos y actos jurídicos, vol. II, n. 15, p.83), sintetiza os seus pressupostos: a) um dano consumado ou potencial; não é indispensável que o dano já esteja presente ou que venha a ser produzido; b) uma relação de causa e efeito entre o fato e o dano, de tal maneira que este seja ou possa ser consequência daquele; c) que o dano seja efetivo e imputável ao autor do ato voluntário.
Assim tem-se como elementos da responsabilidade civil: um dano; a culpa do agente; o nexo de causalidade entre o dano e a culpa.
Estudando o artigo 37 da Constituição Federal, Uadi Lammêgo Bulos (Constituição Federal Anotada, 7ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 680), disse que esse dispositivo prevê duas situações distintas: uma relativa à sanção pelo ato ilícito, outra relacionada à reparação do prejuízo. No primeiro aspecto, fica a lei ordinária encarregada de fixar os prazos prescricionais; no segundo, garantiu-se a imprescritibilidade das ações.
É lição de Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de Direito Administrativo, 23ª edição, São Paulo, Malheiros, 2008, pág. 312) que a ação civil por responsabilidade do servidor, em razão de danos causados ao erário em conseqüência do comportamento ilícito, é imprescritível, a teor do artigo 37, § 5º, da Constituição Federal.
Trago aliás à colação:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESSARCIMENTO DE DANOS AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. IMPRESCRITIBILIDADE.
1. A ação de ressarcimento de danos ao erário não se submete a qualquer prazo prescricional, sendo, portanto imprescritível (REsp 810785/SP, Relator Ministro Francisco Falcão, DJ de 25.05.2006, pág. 184).
2. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido (REsp 705715, Relator Ministro Francisco Falcão, DJe de 14/05/2008).
Distingue-se a sanção e a reparação.
Na sanção é preciso que se instaure o devido processo legal para que se possa impor a penalidade. Na reparação de um prejuízo é preciso que se tenha a apuração de ocorrência, após o devido processo legal, ou derive a reparação de uma obrigação estabelecida.
O ressarcimento ao erário é imprescritível e para isso foi instaurada apuração da ocorrência, dentro do devido processo legal, derivando a reparação de uma obrigação estabelecida.
Realmente, do que foi apurado na chamada operação Lava-Jato, a percepção do lucro a partir de negócios fraudados, sem dúvida, representa enriquecimento ilícito.
De toda sorte, é louvável a conclusão da União Federal, em sede judicial, de haver o reconhecimento de que as empresas envolvidas se cartelizaram para obter obras na Petrobras mediante o pagamento de propina.