O dono da empreiteira UTC, Ricardo Pessoa, será ouvido pela Justiça Eleitoral para esclarecer se a campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff, no ano passado, foi beneficiada pelo esquema de corrupção e cartel na Petrobras.
Pessoa é um dos delatores da Operação Lava Jato e disse em depoimento à Procuradoria-Geral da República que repassou R$ 750 mil ao tesoureiro da campanha presidencial de Dilma Rousseff em 2010, José de Filippi, e outros R$ 2,9 milhões ao ex-tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto, que está preso preventivamente.
Ele entregou uma planilha intitulada "pagamentos ao PT por caixa dois" em que relaciona os dois petistas ao repasse de 3,6 milhões entre 2010 e 2014.
No depoimento, o empreiteiro listou como beneficiários de recursos a campanha da presidente Dilma Rousseff em 2014; a campanha do ex-presidente Lula em 2006; a campanha de Mercadante, ao governo de São Paulo em 2010; e mais cinco senadores e três deputados federais. O Ministério Público Federal e a PF agora vão investigar se as doações foram legais ou se houve irregularidades.
O empresário afirmou que doou oficialmente R$ 7,5 milhões à campanha de reeleição da presidente no ano passado por temer prejuízos em seus negócios na Petrobras caso não ajudasse o PT. Ele ainda disse ter feito repasses de maneira ilegal de R$ 15 milhões ao ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e R$ 750 mil ao ex-deputado federal José Filippi (PT-SP), que foi tesoureiro da campanha de Dilma em 2010 e hoje é secretário da administração do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), de acordo com a revista "Veja".
As campanhas do ex-presidente Lula e de Haddad teriam recebido R$ 2,4 milhões cada em contribuições clandestinas da UTC.
Pessoa afirmou aos procuradores que doou R$ 7,5 milhões à campanha à reeleição de Dilma no ano passado por temer obter prejuízos em seus negócios na Petrobras, caso não ajudasse o PT. Como a Folha revelou em maio, a doação foi feita legalmente e ele disse que tratou da contribuição diretamente com o tesoureiro da campanha de Dilma, o atual ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Edinho Silva.
A oitiva de Pessoa foi autorizada pelo corregedor-geral eleitoral João Otávio de Noronha, que é relator no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de uma ação de investigação judicial eleitoral da campanha à reeleição de Dilma em 2014. A ação foi protocolada no TSE em dezembro de 2014 a pedido da coligação pela qual o senador Aécio Neves disputou as eleições presidenciais, liderada pelo PSDB, e pede apuração de "abuso do poder econômico e político" e "obtenção de recursos de forma ilícita" da campanha petista.
A ação foi ajuizada pela Coligação Muda Brasil (PSDB, DEM, SDD, PTB, PTdoB, PMN, PEN, PTC e PTN) e os representados são a Presidente eleita, o Vice-Presidente da República, o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).
A ação de investigação judicial eleitoral tem seus efeitos previstos no artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar 64/90 e são eles: decretar a inelegibilidade, para essa eleição, do representado e tantos quantos tenham contribuído para a prática do ato; cominação de sanção de inelegibilidade; cassação de registro de candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico e de desvio ou abuso de poder de autoridade.
Abuso de poder político é o uso indevido de cargo ou função pública, com a finalidade de obter votos para determinado candidato.
Por outro lado, abuso de poder político pode ser visto como atuação ímproba do administrador, com a finalidade de influenciar no pleito eleitoral de modo ilícito, desequilibrando a disputa. Adriano Soares da Costa (Instituições de direito eleitoral, 5ª edição, pág. 530) já entendeu que “ a AIJE apenas pode ser proposta após o pedido de registro de candidatura e antes da diplomação dos eleitos”.
A ação (AIJE) pode ser exercitada depois do dia da eleição.
Segundo a redação que foi proposta ao artigo 23 da Lei Complementar 64/90 o juízo competente para julgá-la deverá formar a sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para as circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público da lisura eleitoral.
Deverá o juízo ficar adstrito ao pedido da parte.
Da leitura da ação se historiam as seguintes condutas: desvio de finalidade de convocação de rede nacional de emissoras de radiodifusão; manipulação na divulgação de indicadores socioeconômicos; uso indevido de prêmios e equipamentos públicos para a realização de atos próprios de campanha; veiculação de publicidade institucional em período vedado; realização de gastos de campanha em valor que extrapola o limite informado; financiamento de campanha mediante doações oficiais de empreiteiras contratadas pela Petrobras como parte de distribuição de propinas; massiva propaganda eleitoral levada a efeito por meio de recursos gerados por entidades sindicais; transporte de eleitores por meio de organização supostamente não governamental que recebe verba pública para participação em comício na cidade de Petrolina/PE; uso indevido de meio de comunicação social, consistente na utilização do horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão para veicular mentiras.
Nesse último elenco de fatos foi lembrado que a propaganda encetada pelos representados “procurou desqualificar as propostas dos candidatos das requerentes, aludindo ao fato de que o regime de austeridade fiscal por ele proposto seria seguir a receita de “plantar juros para colher recessão”. Mas passada a eleição, despudoradamente, a Presidente da República cuidou afanosamente de adotar as medidas recriminadas, evidenciando o caráter falso de suas críticas”, o que caracteriza abuso de poder político.
Da mesma sorte, a gravíssima acusação de financiamento de campanha mediante doações oficiais de empreiteiras contratadas pela Petrobras como parte de distribuição de propinas, se caracteriza em abuso de poder econômico, que seria conduta gravíssima.
Discute-se se há necessidade de prova da tentacularidade dos fatos para exigir a cassação do registro dos candidatos ou ainda se basta a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.
Ora, pela redação que foi dada pela Lei Complementar 135/2010 ao artigo 22, inciso XVI, da Lei Complementar 64/90, entende-se que, para configuração do fato abusivo, não será considerada a potencialidade do fato a alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.
A comprovação de existência de caixa 2 é fato grave que pode levar à cassação.
O “caixa-dois” é o ato de fraudar a legislação eleitoral, inserindo elementos falsos ou omitindo informações, com o fim de ocultar a origem, o destino, ou a aplicação de bens da prestação de contas de partido político ou de campanha eleitoral.
O crime, no âmbito dos delitos cometidos contra instituição financeira, é previsto na Lei 7.492/86, quando se diz que é crime “manter ou movimentar recurso ou valor paralelamente à contabilidade exigida pela legislação”. A pena é de 1 (um) a 5 (cinco) anos e multa. Trata-se de crime próprio (o sujeito ativo é qualquer das pessoas mencionadas no artigo 25 da Lei de Crimes do Colarinho Branco). O elemento subjetivo é o dolo genérico.
O chamado “caixa dois” é ainda visto da leitura do artigo 1º da Lei 8.137, de 1990, para as relações tributárias. Isso quando não houver ainda a caracterização de crimes de organização criminosa e lavagem de dinheiro.
O crime é permanente, o que implica que o agente passe a manter recurso no “caixa dois”. Assim, perdura o crime enquanto o agente mantiver o sistema de “caixa dois” ilícito e indevido. Há um momento consumativo inicial, um momento consumativo final e um período consumativo duradouro, que se interpõe entre aqueles dois momentos. A consumação dá-se no momento consumativo inicial que é aquele em que o agente passa a manter o recurso no “caixa dois”.
A matéria já é objeto da proposta com relação ao novo Código Penal.
Veja-se que a SF PLS 282/2013, de 9 de julho de 2013, inclui o artigo 22 – B da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, para tipificar “o crime de caixa dois” eleitoral. Seu autor foi o Senador Jorge Viana.
Registre-se que o ato de criminalizar o chamado “caixa dois” vem sendo discutido no âmbito do artigo 350 do Código Eleitoral, cujas penas podem chegar até a cinco anos, se o documento for público. Ali se diz que é crime: omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa de que devia ser escrita, para fins eleitorais. É prevista, ainda, uma pena de pagamento de 3 (três) a 15 (quinze) dias-multa se o documento é particular.
Os fatos relatados, alguns de gravíssima repercussão para a ordem democrática, deverão ser investigados, em todas as suas circunstâncias, podendo os representados ser declarados inelegíveis, cassando-se o registro dos candidatos beneficiados com os atos de abuso de poder.
O país vive a sua maior crise institucional desde 1964, passando pelo impeachment de um presidente da república, em 1992. Algo apenas similar aconteceu em 1954, quando do suicídio de Vargas.
Está nas mãos do Tribunal Superior Eleitoral o futuro do país, lembrando que a eleição em discussão está contaminada por verba adquirida por corrupção.
Caso procedentes as acusações, caberá à Justiça Eleitoral fixar novas eleições em 90 (noventa) dias, depois de aberta a última vaga, artigo 81 da Constituição Federal. A eleição será direta (artigo 81, parágrafo único).
Aguardemos o desenrolar do processo.