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Reforma do Poder Judiciário, fatos históricos e alguns aspectos polêmicos

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06/10/2003 às 00:00
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5. ATUAL SITUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO

5.1. As verdadeiras razões do caos no Judiciário

Diversas são as razões relacionadas à sobrecarga existente dentro do Poder Judiciário, sendo assim elencadas:

excesso na quantidade de processos;

excesso de recursos e

abusos protelatórios.

A Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1988, diz no seu artigo 5º., inciso XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, garantindo a todos, peremptoriamente no dia-a-dia da prática forense, o direito à apreciação pelo Poder Judiciário de qualquer que seja a demanda, prevalecendo o princípio do direito subjetivo do cidadão. Conforme alguns renomados juristas quando declinam suas opiniões sobre os grandes problemas no Poder Judiciário, afirmam ser esta uma das maiores razões da sobrecarga da nossa justiça.

Por outro lado, nunca se levou em consideração que outros fatores transformaram e levaram o Judiciário Brasileiro a esta situação caótica, como a falta de infra-estrutura, tanto do ponto de vista físico-pessoal e logístico, quanto a quantidade absurda de demandas nos Tribunais Superiores. Este problema, por sua vez, é provocado em grande parte pelo próprio Poder Publico, pela objeção e resistência muitas vezes infundadas e nem sempre justificadas às pretensões legítimas manifestadas pelos cidadãos de boa-fé, que se vêem compelidos em face ao comportamento inaceitável, arbitrário e protelatório dos Entes Públicos, os quais se utilizam inclusive de instrumentos de ordem "constitucional" criados para outras finalidades, a buscar a interferência do Poder Judiciário. Tal é o caso de algumas Medidas Provisórias exaradas pelo Poder Executivo, as quais praticamente obrigam os cidadãos ingressarem em juízo, a fim de ver o seu direito subjetivo assegurado, gerando, desse modo, uma desnecessária multiplicação de processos contra o Governo.

Claro está que alguns pontos mais delicados e urgentes devem ser resolvidos para que efetivamente haja um aumento na produtividade e conseqüentemente uma assistência jurisdicional mais adequada. Como exemplo, pode ser citada a criação de um mecanismo jurídico/processual que evite procedimentos meramente protelatórios e que impeçam a utilização de dispositivos e preceitos constitucionais para os fins que não sejam os amparados pela Carta Magna.

Com efeito, verifica-se que muitos advogados, inclusive os que labutam para o Poder Público, invocam e justificam de maneira antiética tais dispositivos e preceitos a seu serviço, como por exemplo, o princípio do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, de forma inescrupulosa, inconseqüente e irresponsável, com a única intenção de ganhar tempo, esquecendo-se que tais atitudes promovem prejuízos incalculáveis tanto para o Estado, bem como para grande parte da sociedade que não mais acredita na instituição: Poder Judiciário.

Tal fato foi comprovado com a matéria publicada [7] pelo Jornal do Estado de Minas que revelou o conceito do Judiciário junto a população, cuja pontuação foi considerada péssima. Em pesquisa, realizada pela Salles Inter-Americana de Publicidade, foi solicitada pela Escola de Magistratura de São Paulo. A população considerou a justiça como "antiquada", "acomodada", "lenta", "elitista", "sombria" e "ineficiente".

Portanto, essas situações provocam e contribuem em muito para a institucionalização tanto da impunidade, como da pseudo-injustiça.

Para solucionar tais fatos são necessárias medidas de cunho inibidor, que possam evitar definitivamente atitudes de comprovada má-fé, de argumentos infundados e descabidos, num "ping-pong" infernal, sem prejuízo das penalidades legais a serem aplicadas a quem as pratica.

Com a imposição de tais providências legais, certamente haveria uma atuação jurisdicional mais pronta e mais econômica para todas as partes envolvidas, inclusive para o próprio Estado.

O outro ponto fundamental para a solução da morosidade no Judiciário Brasileiro consiste em uma análise mais profunda nos dados levantados [8], os quais informam a principal esfera dos recorrentes. Vê-se que quase 61% dos recursos em tramitação no Supremo partem da União, seguido pelo INSS com 21,94% e pelo Estado de São Paulo com 11,59%. Realizada a soma, verifica-se que aproximadamente 95% de todas as demandas no STF e outros Tribunais Superiores são, de fato, oriundas do Poder Público. Outra questão a ser abordada diz respeito as ações e matérias já decididas anteriormente, inclusive sumuladas pelos Tribunais Superiores, que correspondem há aproximadamente a 80% das ações em trâmite nestas instâncias. O Poder Público insiste no inconformismo irracional e inútil, não se submetendo á jurisprudência dominante das Altas Cortes, provocando assim um delongar, prejudicial e desgastante dos feitos, procrastinando ao máximo a sua inevitável e tardia derrota, utilizando a tática de quem não tem o bom direito.

Não há como se contestar os dados aqui expostos. Estes procedimentos deploráveis se verificam na União, nos Estados e nos municípios. A justificativa alegada é da carência de recursos, o que, por sinal, já se tornou uma característica de governantes incompetentes e maus aplicadores de suas arrecadações tributárias.

Por tudo já exposto, não obstante o problema da morosidade e da quantidade de recursos, há de ser mencionada a questão estrutural, nascida com o advento da Constituição de 1988, cuja contribuição foi das mais significativas para este processo de desgaste.

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Criou-se na Constituição Federal de 1988 uma nova abertura para que os cidadãos buscassem os seus direitos, sem no entanto preparar o Poder Judiciário, com estrutura apropriada, para suportar a demanda de processos que estariam por vir.

De maneira comparativa, pode-se afirmar que a Constituição de 1988 foi para o Brasil, no que diz respeito ao Poder Judiciário, como a construção de um moderno Shopping Center, sem vias de acesso e de infra-estrutura, adequadas, causando um grande congestionamento e confusão.

Com tal comparação, verifica-se que não houve por parte dos Constituintes a preocupação, ou mesmo a previsibilidade, quanto às questões estruturais como, a quantidades de juizes e varas, de tribunais, de uma reformulação nos Códigos Processuais, Civil e Penal, nas aquisições e modernizações das juntas, varas e tribunais de todas as instâncias.

Certamente estes foram os principais pontos que levaram o Poder Judiciário a essa situação de caos.

5.2. Dados Estatísticos

Os quadros abaixo se referem ao quantitativo dos magistrados na primeira e segunda instância de alguns países, o que permite fazer um balizamento comparativo, pois os mesmos se encontram distribuídos como o exposto.

5.2.1.Dados Mundiais

País

Advogados

Juízes

de

Carreira

Promotores,

Promotores da

República, Magistrados

Requerentes

ou fiscais

Formados

em

Direito

Custo do

Sistema

Jurídico

Oficial

População do País em

2001 / Milhões

Média

Judicial

Alemanha

60.00

16.000

4.000

--

7% Orçamento

83

5.187

Itália

90.000

5.000

3.000

--

--

58

11.600

Espanha

--

3.00

1.400

--

--

40

13.333

Inglaterra

77.000

1.800

--

--

--

50

27.777

França

36.000

6.500

1.600

--

3.2% Orçamento

60

9.230

Japão

--

2.850

1.500

--

--

127

44.561

Holanda

--

1.500

450

--

--

16

10.666

USA

750.000

32.000

--

--

0,3% PIB 1,2% Orçamento

279

8.178

Brasil

500.000

12.801

8.400

1 milhão

9% orçamento 2,1% PIB

166

12.967

Portugal

--

1.515

1.087

--

1,2% Orçamento

10

6.600

5.2.2. Dados no Brasil

Magistrados judiciais

1º Grau

2º Grau

Total

Federal

900

140

1.040

Trabalhista

2.100

350

2.450

Militar Estadual e Fed.

47 + 48

17 + 9

121

Estadual

8000

1.190 (TA e TJ)

9.190

Total

--

--

12.801

( [9] )

Conclui-se que comparando a quantidade de Juízes X População no Brasil temos 01(um) Juiz para cada 12.968 (doze mil novecentos e sessenta e oito) brasileiros o que vale 0,0078% da população, enquanto que em Portugal este mesmo índice é de 01(um) Juiz para 6.601( seis mil, seiscentos e um) portugueses o equivalente a 0,066%, ou seja, bem mais de 100% em relação ao Brasil.

Quando levado este comparativo para os Promotores a situação fica ainda mais gritante. No Brasil existe 01(um) Promotor para 8.400 ( oito mil e quatrocentos) brasileiros o que vale 0,0051% da população. Já em Portugal os valores são de 01 (um) Promotor para 1.087 (mil e oitenta e sete) portugueses, perfazendo um percentual de 0,011%.

Enquanto, temos 1(um) juiz para quase 13.000 (treze mil) habitantes, a média, na Europa, é de 1 para 3.000 (três mil) a 6.000 (seis mil) habitantes. Por sua vez, enquanto o Supremo Tribunal Federal julgou mais de 70.000(setenta mil) processos no ano de 2001, a Suprema Corte dos Estados Unidos julgou menos de 100(cem) causas em igual período e o Superior Tribunal de Justiça mais de 200.000(duzentos mil), números de longe sem similar no âmbito internacional, sem se falar que as instâncias ordinárias estão igualmente super congestionadas.

Dessa forma, conclui-se, sem muito esforço, que há uma clara disparidade entre o Judiciário que o povo brasileiro tem, daquele que deveria ter, ágil, moderno, democrático e transparente e que todos almejam. No entanto, não se pode negar que muitos juizes encontram-se descontentes com tal situação. Clamam por mudanças, principalmente no tocante a estrutura logística, reivindicando melhores condições de trabalho, redução das cargas de processos, aumento do número de juizes e de assessores, inclusive reformas dos Códigos de Processos, que deles se acham reféns.

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Sobre o autor
José Pericles Chaves

servidor da Procuradoria Jurídica da Universidade Estadual do Ceará

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHAVES, José Pericles. Reforma do Poder Judiciário, fatos históricos e alguns aspectos polêmicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 95, 6 out. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4212. Acesso em: 4 dez. 2024.

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