Fazenda Pública é uma expressão relacionada a finanças estatais, identificadora de órgão da Administração Pública que trata da gestão das finanças e políticas econômicas. A expressão está intimamente relacionada a Erário, representando o aspecto financeiro do Ente.
A exemplo dessa expressão, tem-se o Ministério da Fazenda, no âmbito da União, e as Secretarias da Fazenda, nos Estados e Municípios, órgãos responsáveis pela gestão financeira e política econômica do respectivo Ente.
Pela sua frequente utilização no meio jurídico com o objetivo de representar o Estado em juízo, a expressão Fazenda Pública se tornou sinônimo de pessoas jurídicas de direito público em juízo.
E isso se deu pelo fato da expressão Fazenda Pública estar relacionada à ideia de erário e ser justamente o erário que suporta os encargos patrimoniais da demanda. Por essa razão é que se convencionou chamar de Fazenda Pública, o Estado em juízo.
A corroborar com essa ideia, oportuna a lição do Ilustre Doutrinador Hely Lopes Meirelles. In verbis:
A Administração Pública, quando ingressa em juízo por qualquer de suas entidades estatais, por suas autarquias, por suas fundações públicas ou por seus órgãos que tenham capacidade processual, recebe a designação tradicional de Fazenda Pública, porque seu erário é que suporta os encargos patrimoniais da demanda.
(Direito Administrativo Brasileiro. 23ª edição, 1998, p. 590)
Já a revelia, por sua vez, na definição extraída do artigo 319, do Código de Processo Civil, será declarada sempre que observada a ausência jurídica de contestação nos autos. Ou seja, sempre que o réu, devidamente citado, deixar de apresentar contestação ou, em apresentando, o fizer de maneira intempestiva ou endereçada a juízo equivocado, pois que em nenhuma dessas hipóteses a contestação juridicamente existiu.
Art. 319. Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.
Esse, aliás, também é o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, como se pode observar dos Recursos Especiais nº 669.954/RJ e nº 847.893/SP.
PROCESSO CIVIL - ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA CITAÇÃO - COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO - CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA RECORRENTE - APLICAÇÃO DO ARTIGO 214, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - REVELIA - CONTESTAÇÃO INTEMPESTIVA - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - ANÁLISE EM SEDE MONOCRÁTICA - SÚMULA 7/STJ.
1 - Suprida a falta de citação pelo comparecimento espontâneo da recorrente, nos termos do art. 214, § 1º, do CPC. Ciência inequívoca dos termos da demanda, pela juntada aos autos de substabelecimento para apresentação de defesa.
2 - Decreto de revelia mantido, pela intempestividade da contestação, eis que apresentada após 3 meses de retenção dos autos pelo procurador da recorrente.
3 - A eventual litigância de má-fé deverá ser aferida em sede de Juízo monocrático, com análise do conjunto fático-probatório, inviável nesta via especial, conforme Súmula 7 deste Colendo Tribunal.
4 - Recurso não conhecido.
(STJ, REsp 669.954/RJ, 4ª Turma, ReI. Min. Jorge Scartezzini, j. 21.09.2006) (grifos nossos)
APELAÇÃO. INTEMPESTIVIDADE. TERMO INICIAL CONTADO DA PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA. RÉ REVEL. Art. 322 DO CPC. CONTESTAÇÃO PROTOCOLADA EM VARA DE COMARCA DIVERSA DAQUELA EM QUE TRAMITA O PROCESSO. ERRO GROSSEIRO.
1. O endereçamento e protocolo de contestação em vara de comarca diversa da que tramita o processo, ainda que protocolada no prazo legal, acarreta a revelia do réu, por tratar-se de erro grosseiro, mormente quando não há nenhuma justificativa razoável para a confusão entre as Comarcas, sem nenhuma similitude onomástica ou regional – muito distantes, aliás (endereçamento à 39ª Vara Cível do foro Central da Comarca da Capital do Estado de São Paulo em vez de 3ª Cível da Comarca de Jales).
2. O precedente de aceitação da tempestividade em caso como o presente teria conseqüências terríveis na criação de confusões judiciárias, redundando em caminho para a chicana processual sob o argumento da boa-fé – pois o encaminhamento de petições processualmente relevantes, como a contestação, a Juízo diverso tiraria o caso do controle da unidade judiciária pertinente para passar a depender do que pudesse ocorrer em toda as demais unidades judiciárias do Estado, na busca de encaminhamento de petições indevidamente a alguma deles endereçadas.
3. Na hipótese de revelia, o termo inicial para a contagem do prazo para o recurso de apelação dar-se-á da data da publicação da sentença, sem necessidade de intimação, evidentemente, de advogado que ainda não se encontrava nos autos, pois a contestação por ele oferecida havia sido endereçada a Vara de Comarca distante, em que permaneceu sem diligência da parte no sentido do recobro e alerta ao juízo para ela, só tendo sido remetida à Comarca correta muito tempo depois.
4. Recurso especial improvido.
(STJ, REsp 847.893/SP, 3ª Turma, reI. Min. Sidnei Beneti, j. 02.03.2010) (grifos nossos)
Declarada a revelia, alguns efeitos poderão ser produzidos, como: a) os fatos alegados pelo Autor ser reputados verdadeiros (art. 319, do CPC); b) a intimação do réu se tornar desnecessária, correndo os prazos independentemente de sua intimação (art. 322, do CPC); e c) o juiz conhecer diretamente do pedido, proferindo sentença (art. 330, lI, do CPC).
Esses são os efeitos possíveis da revelia.
No entanto, em sendo ré a Fazenda Pública e deixando ela de apresentar contestação, poderá o juiz declarar a sua revelia? Se sim, quais efeitos poderão ser produzidos?
E a resposta é que, em sendo ré a Fazenda Pública e deixando ela de apresentar contestação, haverá sim a declaração de revelia. Porém, os efeitos dessa não serão os mesmos mencionados acima.
Isso porque a Administração Pública está submetida a um regime jurídico especial, bastante específico, que a difere das demais pessoas que figuram como rés em processos judiciais, defendendo interesses indisponíveis, que prevalecem sobre o interesse particular. Além disso, os atos praticados pela Administração Pública são dotados de presunção de legitimidade e veracidade, recaindo à parte autora o dever de provar o contrário.
Por essas razões, alguns efeitos não poderão ser produzidos, como, por exemplo, ser considerados verdadeiros os fatos alegados pelo Autor (art. 319, do CPC) ou o juiz conhecer diretamente do pedido, proferindo sentença (art. 330, lI, do CPC), já que a revelia só ocasiona o julgamento antecipado da lide quando presente a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo Autor, que os tornam incontroversos. Em sendo ré a Fazenda Pública, não há falar em presunção de veracidade dos fatos alegados pelo Autor, e, logo, em fatos incontroversos, já que a presunção de legitimidade e veracidade dos atos demanda prova em contrário.
Ademais, o artigo 320, inciso II, do Código de Processo Civil é claro ao dispor que a revelia não induz o efeito mencionado no artigo 319, se o litígio versar sobre direitos indisponíveis:
Art. 320. A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente:
I - se, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação;
II - se o litígio versar sobre direitos indisponíveis;
Essa, aliás, também é a lição do Ilustre Doutrinador Daniel Amorim Assumpção Neves:
Diz o art. 320, lI, do CPC que não se reputam os fatos verdadeiros na revelia se o litígio versar sobre direitos indisponíveis. Em razão da natureza não patrimonial de alguns direitos, não se permite ao juiz dispensar o autor do ônus probatório ainda que o réu seja revel. A indisponibilidade do direito é a justificativa para impedir o juiz que repute como verdadeiros os fatos diante da revelia da Fazenda Pública, aplicando-se ao caso concreto o princípio da prevalência do interesse coletivo perante o direito individual e a indisponibilidade do interesse público.
(Manual de Processo Civil. 7ª Edição, 2015, p. 457)
Já o efeito relativo à dispensa de intimação do réu para os atos do processo somente ocorrerá quando a Fazenda Pública, além de não ter apresentado contestação, também não tiver ingressado no feito, pois, caso contrário, ainda que não tenha apresentado contestação, tendo ingressado no processo, deverá ela ser normalmente intimada.
É porque não parece razoável que, embora esgotado o prazo para contestação, ingressando no feito ou já estando nele, a Fazenda Pública seja privada da ciência dos atos do processo.
Nesse sentido, aliás, é o que dispõe o artigo 322, do Código Processo Civil, ao descrever que correrão os prazos independentemente de intimação contra o revel que não tenha patrono nos autos, in verbis:
Art. 322. Contra o revel que não tenha patrono nos autos, correrão os prazos independentemente de intimação, a partir da publicação de cada ato decisório.
Assim, em sendo ré a Fazenda Pública, e deixando ela de apresentar juridicamente a contestação, deverá ser declarada revel, nos moldes do artigo 319, do Código de Processo Civil, e, o único efeito decorrente dessa declaração, será o de não ser intimada para os atos do processo, nos termos do artigo 322, do mesmo diploma legal, caso ausente dos autos.
Já em relação aos demais efeitos, não será cabível a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo Autor e, consequentemente, o julgamento antecipado da lide, já que seus atos são revestidos de presunção de legitimidade e veracidade, e o interesse que defende em juízo, indisponível.
Referências:
Neves, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 7ª ed. rev., atual. e ampl. - MÉTODO, 2015.
Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 23ª edição, MALHEIROS, 1998.
Da Cunha, Leonardo Carneiro. A Fazenda Pública em Juízo. 12ª ed. rev., atual. - DIALÉTICA, 2014.
BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm