Tragédia anunciada, previsível e evitável é tragédia?

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Neste último domingo, dia 06 de setembro, o Brasil ficou chocado com a tragédia acontecida na linda cidade de Paraty, princesa da Costa Verde, localizada no sul do estado do Rio de Janeiro. Um ônibus urbano, com quase 90 passageiros, tombou quando fazia..

Neste último domingo, dia 06 de setembro, o Brasil ficou chocado com a tragédia acontecida na linda cidade de Paraty, princesa da Costa Verde, localizada no sul do estado do Rio de Janeiro. Um ônibus urbano, com quase 90 passageiros, tombou quando fazia uma curva, deixando um lastimável saldo de 15 mortos e dezenas de feridos, alguns em estado gravíssimo. Existe ainda notícia a ser apurada que há 8 meses já não mais haveria nenhum contrato de concessão com o município, o que se for verdade, aumentará sobremaneira as responsabilidades do poder concedente e terá que responder perguntas do tipo: Por quê, sabendo que se aproximava o término da concessão, não foi providenciada nova licitação? Perguntas óbvias e respostas evasivas à parte, o que já se sabe é que não havia autorização para utilização daquela rota.

É notório que o coletivo estava com os pneus carecas; há relatos dos sobreviventes de que o motorista teria dito que havia perdido o freio, sem falar que, visualmente, o estado do veículo é lastimável. A administração municipal diz que irá apurar com rigor todo o ocorrido e o dono da empresa de ônibus foi à televisão pedir desculpas às vitimas e familiares(...)

Infelizmente, a maioria das pessoas não sabe que o transporte urbano é um Serviço Público delegado do Município ao particular, e é obrigação do empresário prestar o serviço de forma eficiente e adequada, ao passo que cabe ao Poder Público o dever de fiscalização e de intervenção para que este serviço seja prestado com qualidade e excelência.

O inciso V do artigo 30 da Constituição da República Federativa do Brasil diz:

Art. 30. Compete aos Municípios:

V – organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial."

Empresa de ônibus X passageiro. Vamos desmistificar essa relação. Primeiro; onde se lê empresa de ônibus, leia-se, na verdade, Prestador de serviço delegado pela Administração Pública. Onde se lê, Passageiro, leia-se, Consumidor amparado pelo Código de Defesa do Consumidor. Conclui-se que, consumidor é aquele que utiliza serviço e fornecedor aquele que comercializa a prestação de serviços, então é óbvio que a relação empresa/passageiro é uma relação de consumo, devendo ser regida pela Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), onde a responsabilidade do prestador de serviços é objetiva, não sendo razoável para fugir da responsabilidade civil a alegação de força maior e/ou o caso fortuito.

Quando você faz sinal para um ônibus parar, está propondo um contrato de prestação de serviço. Quando o ônibus para e você embarca, a empresa Concessionária de serviço público está aceitando, mediante pagamento da passagem, levar o consumidor, incólume, ou seja, são e salvo, até o destino.

A Lei 8.987 de 13 de fevereiro de 1995, dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no artigo 175 da Constituição Federal, inclusive, tratando de forma inequívoca sobre os Direitos dos Usuários e obrigações do Concessionário e do Poder Concedente. A título de exemplo, somente alguns direitos dos usuários previstos no artigo 7º, Sem prejuízo do disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor) , Receber serviço adequado; Receber do poder concedente e da concessionária informações para a defesa de interesses individuais ou coletivos; Obter e utilizar o serviço, com liberdade de escolha entre vários prestadores de serviços; Levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as irregularidades de que tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado; Comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos praticados pela concessionária na prestação do serviço.

As obrigações do Concessionário e do Poder Concedente (no caso em questão, o Município) também estão descritas de forma indubitável na Lei, senão vejamos: Artigo 29- Incumbe ao poder concedente: Regulamentar o serviço concedido e fiscalizar permanentemente a sua prestação; Aplicar as penalidades regulamentares e contratuais; Intervir na prestação do serviço, nos casos e condições previstos em lei; Extinguir a concessão, nos casos previstos nesta Lei e na forma prevista no contrato; Zelar pela boa qualidade do serviço, receber, apurar e solucionar queixas e reclamações dos usuários, que serão cientificados, em até trinta dias, das providências tomadas; Incentivar a competitividade;

Ao passo que no artigo 31, estão as incumbências da concessionária: Prestar serviço adequado, na forma prevista nesta Lei, nas normas técnicas aplicáveis e no contrato; Prestar contas da gestão do serviço ao poder concedente e aos usuários, nos termos definidos no contrato; Permitir aos encarregados da fiscalização livre acesso, em qualquer época, às obras, aos equipamentos e às instalações integrantes do serviço, bem como a seus registros contábeis; Zelar pela integridade dos bens vinculados à prestação do serviço, bem como segurá-los adequadamente.

É evidente que um não fez porque o outro na fiscalizou. Importante que todos saibam que os danos que foram sofridos, as vidas que foram perdidas, as dores insuportáveis de quem chora por um ente que se foi, foram causados por quem agia em nome do poder concedente, e só puderam ocorrer, exatamente, pelo fato de estar o concessionário no exercício de atividade e poderes primários do concedente. O artigo 175 da Constituição da República, diz de maneira clara que "tem-se que a prestação do serviço público incumbe ao Poder Público, considerado como gestor permanente do serviço público". O Concessionário é agente do serviço público, por conta disto, em caso dos danos causados ao cidadão, se ela não tiver condições para fazer frente aos prejuízos, pode/deve ele ingressar em juízo para cobrar do poder público concedente, porque a responsabilidade deste será sempre, no mínimo, subsidiária.
O nosso inconformismo deve durar o tempo que for necessário à mudança. Nossa luta, constante… até que cordeiros virem leões, porque tragédia anunciada, previsível e evitável, não é tragédia, é incompetência institucionalizada.

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Sobre o autor
Antonio Marcos de Oliveira Lima

Doutorando em Direitos Humanos pela Universidade Nacional de Lomas de Zamora, Argentina. Professor de direito Administrativo em graduacao e cursos preparatórios , Diretor-Geral do IBPC (instituto brasileiro de proteção ao consumidor), Coordenador do Núcleo de Pesquisa e Estudo dos Direitos da Mulher, Advogado militante com atuação profissional Brasil X Portugal em Direito Civil, Direito do Consumidor , Direito Empresarial, Terceiro Setor, Direito Administrativo, Direito Tributário, Direito Intrrnacional, Sócio de Fernandes e Oliveira Lima advocacia e consultoria jurídica. Autor de "União estável e União Homoafetiva, os paralelos e as suas similitudes"; Ed. Pasquin Jus, 2006; "Retalhos Jurídicos do Cotidiano"; 2015, Ed. Lumen Juris.

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