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A impossibilidade de transferência para o contribuinte da penalidade por infração praticada pelo responsável tributário

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O texto realiza uma análise sobre a transferência da penalidade de infração praticada pelo responsável tributário para o contribuinte. Especialmente, o texto observa o caso do IRPF, quando retido na fonte e não recolhido.

Em 2015 um cliente bateu as portas da nossa banca informando que foi autuado pela Receita Federal sobre Imposto de Renda Pessoa Física - IRPF que deveria ter sido recolhido pela fonte pagadora, seu então empregador no ano de 2001.

Deveras, o cliente realizou a declaração dos valores recebidos, contudo o seu empregador, apesar de ter retido, não repassou os valores a título de IRPF para a Secretaria da Receita Federal e, por isso, foi realizada a autuação contra o cliente no ano de 2006, incluindo a cobrança do valor principal acrescido de multa moratória e juros moratório.

Pois bem, a questão a ser solucionada é: se o empregador realizou a retenção e não repassou os valores de IRPF, é devido o pagamento do valor principal para a Receita, contudo, se a infração foi cometida pelo empregador poderá a penalidade ser aplicada ao meu cliente?

Na realidade, amigos, a pergunta é mais simples ainda, e baseia-se em uma questão de Teoria Geral do Direito: a pena poderá descolar-se da pessoa do infrator para um terceiro?

Tratando-se de responsabilidade tributária, o CTN informa no seu art. 128 que "a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação".

Ou seja, a lei poderá atribuir a responsabilidade pelo recolhimento do tributo a terceira pessoa, que esteja próxima ao fato gerador, mas ainda assim, se o terceiro responsável não pagar a responsabilidade do contribuinte pelo pagamento subsistirá, se a lei assim determinar.

É o que acontecer com o IRPF. A lei determina que a fonte pagadora da receita que gera renda realize a retenção dos valores na fonte e repasse ao Fisco diretamente. Ou seja, o empregador paga salário ao seu empregado, então a lei determina que o obreiro, ao pagar a quantia, já realize a retenção dos valores a título de IRPF e os recolha ao Fisco.

Nesse sentido, o art. 7º da Lei nº 7.713/1988, lei que disciplina o IRPF, informa que "ficam sujeito à incidência do imposto de renda na fonte (I) os rendimentos do trabalho assalariado, pagos ou creditados por pessoas físicas ou jurídicas". Ademais, o parágrafo primeiro do mesmo dispositivo informa que "o imposto a que se refere este artigo será retido por ocasião de cada pagamento ou crédito e, se houver mais de um pagamento ou crédito, pela mesma fonte pagadora, aplicar-se-á a alíquota correspondente à soma dos rendimentos pagos ou creditados à pessoa física no mês, a qualquer título". Ainda, de acordo com o art. 722 do Decreto nº 3.000/1999, "a fonte pagadora fica obrigada ao recolhimento do imposto, ainda que não o tenha retido (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 103)".

Ora, no caso em tela o contribuinte era o meu cliente, mas o responsável tributário pelo recolhimento do tributo era o seu empregador (fonte pagadora).       Sendo o empregador a fonte pagadora do empregado, nada mais fácil do que a lei atribuir a ele a responsabilidade pela retenção do IRPF na fonte, bem como o recolhimento para o Fisco.

Pois bem, se o responsável tributário não recolheu a quantia devida aos cofres públicos, a responsabilidade pelo recolhimento do tributo poderá recair sobre o contribuinte, conforme o já visto art. 128 do CTN. Ainda, o "Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que cabe à fonte pagadora o recolhimento do tributo devido. Porém, a omissão da fonte pagadora não exclui a responsabilidade do contribuinte pelo pagamento do imposto, o qual fica obrigado a declarar o valor recebido em sua declaração de ajuste anual" (STJ - REsp: 704845 PR 2004/0165417-3, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 19/08/2008, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 16.09.2008).

Entretanto, se o responsável pelo recolhimento cometeu a infração poderá então a penalidade pelo ato ilegal cometido ser atribuído ao contribuinte?

Inicialmente vamos à Constituição Federal de 1988.

De acordo com a CF/88, no seu art. 5º, que trata dos direitos e garantias fundamentais, informa no inciso XLV que "nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido".

Ora, se a fonte pagadora não recolheu o tributo aos cofres do Fisco, então foi ela quem cometeu a infração e não o meu cliente! Sendo assim, meu cliente deverá ficar obrigado ao pagamento das penalidades sobre a infração do empregador (fonte pagadora)?

Resta evidente que o cliente foi induzido em erro, agindo de boa-fé ao inserir o rendimento em sua DIRF, acreditando que o Obreiro iria recolher o tributo. Sendo assim, em virtude do erro, não é devida a multa de mora, nem os juros de mora, sobre o valor principal.

Decerto, o cliente não tentou fraudar o Fisco, nem agiu com ardil. Tendo agido com boa-fé, declarando os rendimentos recebidos, foi induzido em erro pela fonte pagadora, que se comprometeu pelo recolhimento tributário sobre tais valores.

  Ora, o valor tributário principal é devido, sem dúvida, contudo, imputar ao cliente multa de mora e juros moratórios sobre o valor é penalizá-lo indevidamente, amargando prejuízo que não deu causa, ferindo os princípios da razoabilidade e proporcionalidade que são inerentes a atividade administrativa, inclusive à atividade do Fisco.

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Deveras, se a responsabilidade pelo recolhimento era da Fonte Pagadora, responsabilizar o cliente seria penalizá-lo por ato de terceiro, e, por isso, tanto a pena quanto os juros de mora devem ser excluídos. Para o professor Leandro Paulsen[1] "a responsabilidade, normalmente , será apenas pelos tributos e não pela totalidade dos créditos (tributos e multas). Isso porque o CTN, atentando para a pessoalidade da pena (garantia fundamental com assento constitucional), busca preservar a pessoalidade da sanção tributária. Assim é que, na maioria das hipóteses de responsabilidade, refere-se à responsabilidade pelos tributos tão-somente, de modo que a responsabilidade pelas infrações (obrigação de pagar penalidades) não se transfere ao sucessor ou a outro terceiro".

Ademais, cumpre lembrar que o CTN é claro em afirmar, no seu art. 137, inciso II, que "a responsabilidade é pessoal ao agente (II) quanto às infrações em cuja definição o dolo específico do agente seja elementar".

Ora, se foi o empregador quem realizou a retenção do IRPF do cliente e não o repassou para o Fisco, a infração foi cometida por ele, sendo a sua responsabilidade pessoal, na forma do dispositivo do CTN acima transcrito. Sendo assim, a cobrança de multa moratória e juros moratórios sobre o crédito tributário de IRPF constituído em face ao cliente é ilegal!

Ademais, cumpre observar que sobre o tema, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que "é indevida a imposição de multa ao contribuinte quando, induzido a erro pela fonte pagadora, inclui em sua declaração de ajuste os rendimentos como isentos e não tributáveis. Situação em que a responsabilidade pelo recolhimento da penalidade (multa) e juros de mora deve ser atribuída à fonte pagadora, a teor do art. 722, parágrafo único, do RIR/99 (Decreto n. 3.000/99)" (STJ - REsp: 1218222 RS 2010/0195658-2, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 04/09/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/09/2014).

Em outro julgado, o E. STJ foi claro ao afirmar que "o responsável tributário é aquele que, sem ter relação direta com o fato gerador, deve efetuar o pagamento do tributo por atribuição legal nos termos do artigo 121, parágrafo único, II, c/c 45, parágrafo único , do Código Tributário Nacional. (Precedentes 1ª e 2ª Turmas). [...] O contribuinte não pode responder pelo erro se o tributo não foi retido na fonte, posto que o responsável principal é o substituto legal tributário que, à luz da lei, deveria ter recolhido o imposto de renda, ressalvado eventual regresso, in casu, inexistente" (STJ - REsp: 502739 PE 2003/0019197-4, Relator: Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 21/10/2003, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 17.11.2003 p. 212).

Desta forma, visto o caso concreto, resta ao cliente a responsabilidade pelo pagamento da obrigação tributária principal, mas, como não foi ele que cometeu a infração, não podem ser a ele atribuída a responsabilidade pelo pagamento de multa moratória e pelos juros moratórios. Resta evidente, então, a ilegalidade da cobrança de multa moratória, bem como dos juros de mora lançados contra o cliente acima referido, merecendo a anulação da mesma.                


Nota

[1] Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 13ª ed. - Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 984.

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Sobre o autor
Ricardo Simões Xavier dos Santos

Advogado. Fundador do escritório Ricardo Xavier Advogados Associados. Graduado em Direito pela Universidade Católica do Salvador - UCSal; Mestre e Doutorando em Políticas Sociais e Cidadania pela Universidade Católica do Salvador - UCSal; Especialista em Direito do Estado pelo Jus Podivm/Unnyahna e em Direito Tributário pelo IBET. Professor da Universidade do Estado da Bahia - UNEB , da Universidade Católica do Salvador - UCSal e da Escola Superior da Advocacia - ESA - Seccional da OAB/BA; Coordenador Curso de Pós-graduação em Direito Empresarial da Universidade Católica do Salvador - UCSal. Pesquisador do Núcleo de Estudos em Tributação e Finanças Públicas - NEF da Universidade Católica do Salvador - UCSal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

XAVIER, Ricardo Simões Santos. A impossibilidade de transferência para o contribuinte da penalidade por infração praticada pelo responsável tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5235, 31 out. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/43636. Acesso em: 22 dez. 2024.

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