ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.

Impostos sobre impostos, uma triste realidade brasileira

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O presente trabalho tem objetivo de apresentar a discussão acalorada na jurisprudência atual a respeito da inserção do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.

O presente trabalho tem objetivo de apresentar a discussão acalorada na jurisprudência atual a respeito da inserção do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.

Neste sentido verificaremos o que se entende por fato gerador do presente tributos, base de cálculo e o conceito fundamental de receita. Por fim falaremos do Rateio de Despesas e a Incidência do PIS e da COFINS e discorreremos sobre o julgado no STF, que insiste, ao contrário do entendimento do STJ em afastar o acumulo de tributos de fatos geradores diferentes que se acumulam no nosso sistema.

1. Fato Gerador e Base de Cálculo da Contribuição para o PIS e da COFINS

            A contribuição para o PIS e a COFINS, com a incidência não cumulativa, têm como fato gerador e como base de cálculo “o faturamento mensal da pessoa jurídica, assim entendido o total das receitas auferidas, independentemente de sua denominação ou classificação contábil[1]”.

            O total das receitas, por sua vez, “compreende a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica[2]”.

            Assim, sempre que uma pessoa jurídica auferir receita estará sujeita ao pagamento do PIS e da COFINS, pelo que é de fundamental importância a delimitação do conceito de receita para determinação do campo de incidência dessas contribuições.

I - Conceitos: a tecnica necessária

I.a) - Conceito de Receita 

            De acordo com o Pronunciamento Conceitual Básico “Estrutura Conceitual para Elaboração e Apresentação das Demonstrações Contábeis”, emitido pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), item 70 (a), a receita é definida como “aumentos nos benefícios econômicos durante o período contábil sob a forma de entrada de recursos ou aumento de ativos ou diminuição de passivos que resultam em aumentos do patrimônio líquido e que não sejam provenientes de aporte dos proprietários da entidade”.  

            Ou seja, receita é algo que afeta os resultados da pessoa jurídica. A receita deve ser entendida, portanto, como os aumentos efetivos do patrimônio da pessoa jurídica.

            Ricardo Mariz de Oliveira realizou um vasto estudo sobre o conceito de receitas, analisando a doutrina de consagrados juristas para, ao final, concluir:

“- Receita é um tipo de entrada ou ingresso no patrimônio da pessoa jurídica, sendo certo que nem todo ingresso ou entrada é receita;

- Receita é o tipo de entrada ou ingresso que se integra ao patrimônio sem reserva, condição ou compromisso no passivo, acrescendo-o como elemento novo e positivo;

- A receita passa a pertencer à entidade com sentido de permanência;

- A receita remunera a entidade, correspondendo ao benefício efetivamente resultante de atividades suas;

- A receita provém de outro patrimônio, e se constitui em propriedade da empresa pelo exercício das atividades que constituem as fontes do seu resultado;

- A receita exprime a capacidade contributiva da entidade;

- A receita modifica o patrimônio, incrementando-o.”[3]

            Note-se que “ingresso” é gênero que comporta a espécie “receita”, isto é, toda receita representa um ingresso, mas o contrário nem sempre é válido. Há ingressos que não possuem o principal predicado do conceito de receita, que é a repercussão positiva no resultado patrimonial da pessoa jurídica. Sem este predicado, os ingressos são considerados meros movimentos financeiros, os quais não incrementam o patrimônio da entidade.

            Sobre o assunto, relevantes considerações foram feitas pelo ilustre jurista Aliomar Baleeiro que, ao tratar do tema “receitas públicas”, distinguiu o conceito de “entradas ou ingressos” do conceito de “receita”. Vejamos:

“3 – ENTRADAS OU INGRESSOS

As quantias recebidas pelos cofres públicos são genericamente designadas como ‘entradas’ ou ‘ingressos’. Nem todos os ingressos, porém, constituem receitas públicas, pois alguns deles não passam de ‘movimentos de fundo’, sem qualquer incremento do patrimônio governamental, desde que estão condicionados à restituição posterior ou representam mera recuperação de valores emprestados ou cedidos pelo governo.

(...)

4 – RECEITA: CONCEITO

Receita pública é a entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo.”[4] (g.n.)

            Do trecho acima, é possível inferir que quando as entradas ou ingressos apenas representarem a restituição de valores que foram outrora suportados por determinada sociedade em nome de terceiros, não estamos diante de grandeza que se alinhe ao conceito de receita.

            Nesta linha de raciocínio, os ingressos relacionados ao reembolso de valores não podem ser considerados receitas, vez que não representam acréscimo ao patrimônio da pessoa jurídica que os recebe. Prestam-se exclusivamente à recomposição deste ao status anterior.

I. b) - Rateio de Despesas e a Incidência do PIS e da COFINS

Diante da inexistência de previsão legal no sentido de que os rateios de despesas não integram a base de cálculo das contribuições para o PIS/COFINS, algumas Regiões Fiscais da Receita Federal já têm se manifestado no sentido de que quaisquer ingressos de recursos devem ser oferecidos à tributação por tais contribuições.

“EMENTA: COFINS. GRUPO ECONÔMICO. RATEIO DE DESPESAS. ESCRITURAÇÃO DE RECEITAS. Os valores recebidos em virtude do uso compartilhado de serviços administrativos, referentes à contabilidade, recursos humanos, dentre outros, representam receitas de serviços da empresa líder (centro de custos) e integram a base de cálculo da COFINS.”[5]

“EMENTA: COFINS. BASE DE CÁLCULO. RECEITAS PARA COBRIR DISPÊNDIOS COMUNS. INCIDÊNCIA. Os valores arrecadados pelas centrais de abastecimento dos permissionários de uso de boxes para comercialização de produtos, mediante rateio mensal, para cobrir dispêndios decorrentes da utilização de áreas de uso comum, tais como de energia elétrica, água e esgoto, limpeza, higienização, desratização, manutenção e conservação, portaria, vigilância, serviços de informação, instalação e operação de sistema de sonorização e telefonia, seguro contra incêndio e vendaval e outras de igual natureza, constituem receita e integram a base de cálculo da Cofins das referidas centrais.[6]

A nosso ver, referido raciocínio carece de fundamento jurídico. Explicamos.

Conforme discorrido linhas atrás, a base de cálculo da contribuição para o PIS e da COFINS é a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica no mês.

Fica evidente, portanto, que o PIS/COFINS não pode incidir sobre toda e qualquer entrada de recurso, mas tão somente sobre aquelas que resultarem no acréscimo do patrimônio da sociedade que os recebeu.

Neste sentido, são as palavras de Marco Aurélio Greco:

“(...) Portanto, nem todo “dinheiro” que “entra” no universo da disponibilidade da pessoa jurídica integra a base de cálculo da COFINS. Não basta ser uma “entrada” (mera movimentação financeira) é preciso que se configure como “ingresso”, no sentido de entrada com sentido de permanência e que resulte da exploração da atividade que corresponda ao seu objeto social (ou dele decorrente). Mera entrada de dinheiro não é receita para fins da base de cálculo do PIS e COFINS![7] (g.n.)

Com efeito, não é a mera entrada de dinheiro que configura o auferimento de receita. Receita é a entrada de dinheiro que repercute positivamente nos números do resultado da pessoa jurídica.

Nesse contexto, verifica-se que o rateio de despesas é uma movimentação financeira que se presta tão somente a restabelecer o patrimônio da pessoa jurídica que assumiu inicialmente os dispêndios e equiparar à condição que seria verificada caso as despesas rateadas fossem suportadas individualmente por cada sociedade do grupo empresarial.

Nesse exato sentido posiciona-se a melhor doutrina. Vejamos:

“Em sendo assim, parece-nos evidente que os ingressos financeiros decorrentes do reembolso de custos ou despesas incorridos pela pessoa jurídica administradora não devem compor a base para incidência das contribuições COFINS e PIS/PASEP enquanto incidentes apenas sobre o “faturamento” (receita bruta da venda de mercadorias e/ou da prestação de serviços).

Acreditamos, inclusive, que, como regra, tais ingressos não devem ser entendidos nem mesmo como “receita efetiva” da pessoa jurídica centralizadora dos custos ou das despesas.”[8]

O rateio de despesa apenas recompõe o patrimônio da pessoa jurídica, pelo que a empresa que concentra as despesas deve receber a restituição desta na exata medida dos gastos incorridos e dos benefícios auferidos por cada uma das demais empresas.

Significa dizer que não há, no rateio de despesas, agregação de margem de lucratividade ou qualquer majoração do valor das despesas, mas apenas a alocação dos efetivos gastos.

Esse entendimento já foi manifestado pelo CARF, à época Conselho de Contribuintes, em diversas oportunidades, conforme se infere do exemplo colacionado abaixo:

“IRPJ — RESSARCIMENTO — RATEIO DE DESPESAS — EMPRESAS DO MESMO GRUPO — NÃO CONFIGURAÇÃO DE RECEITA — LUCRO DA EXPLORAÇÃO — O ressarcimento da parcela da despesa rateada, por outra empresa do mesmo grupo empresarial, não representa receita para a empresa que suportou inicialmente todo o custeio, mas mero estorno daquele custo. Esse entendimento, no cálculo do lucro da exploração, não permite reconhecer o ressarcimento pela empresa industrial, relativo à alimentação de funcionários, como receita de atividade não operacional.”[9]

Nesta ocasião, os Conselheiros se posicionaram no sentido de que se a despesa rateada não é integralmente da empresa que concentrou a contratação dos serviços, então os reembolsos também não são receitas. Nesse contexto, apenas os valores recebidos pelos prestadores de serviços são classificados como receitas, mesmo porque decorrem de sua atividade operacional e representam acréscimo patrimonial.

Além disso, as despesas rateadas não são (ao menos integralmente) incorridas pela pessoa jurídica que concentrou a contratação dos serviços. Dessa maneira, a recuperação das despesas visa apenas restabelecer seu patrimônio e não incrementá-lo. Isso faz com que o conceito de ressarcimento/reembolso se afaste do conceito de receita.

Vejamos mais um exemplo que corrobora esse entendimento:

“PIS/COFINS — RECEBIMENTO DE VALORES A TITULO DE RATEIO DE DESPESAS — NATUREZA DE RECUPERAÇÃO DE CUSTOS/DESPESAS — INAPLICABILIDADE DO CONCEITO DE RECEITA — O pressuposto de incidência do PIS e da COFINS é o auferimento de receitas, não podendo haver a incidência das contribuições, pois, no mero ingresso de recursos em que a entidade empresarial esta, tão somente, recebendo de terceiros valores a ele imputável um função do rateio de custos/despesas entre as partes estipulado.”[10]

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Nesta oportunidade, o Conselheiro Relator foi bastante claro ao mencionar que as receitas são ingressos de recursos decorrentes do exercício das atividades da pessoa jurídica que, ao final, são incorporados ao seu patrimônio, sem que uma contraprestação seja ao mesmo tempo imputada a seu titular.

Seguindo essa linha argumentativa, o 1º Conselho de Contribuintes julgou pela não incidência do PIS e da COFINS sobre o rateio de despesas.

       Certamente que a ocorrência das despesas rateadas, sua origem e o montante a ser rateado por cada empresa do grupo devem ser passíveis de demonstração e comprovação.

Natanael Martins fez interessantes ponderações sobre o assunto:

“Em primeiro lugar, deve-se ter presente que o parâmetro do contrato deve ser o montante dos gastos relativos aos recursos humanos e materiais compartilhados, que devem estar suportados em documentos hábeis e idôneos, devendo a empresa partilhadora demonstrar, em mapas ou planilhas, sua origem e valor, discriminando o montante imputado a cada partícipe, fornecendo a todos, ainda, se exigido pela fiscalização, cópia de todos os documentos que presidiram o rateio.[11]

Repare que os gastos compartilhados devem possuir suporte documental hábil para comprovar a existência das despesas, bem como sua origem. Ademais, a empresa centralizadora dos pagamentos deve manter relatórios gerenciais capazes de demonstrar que os critérios do rateio foram observados em relação a cada um dos itens envolvidos e que cada empresa foi onerada com base em critérios de proporcionalidade e razoabilidade.”

Também o CARF já se posicionou no mesmo sentido, conforme os exemplos colacionados abaixo:

“IRPJ – RATEIO DE CUSTOS – DESPESAS COMUNS A EMPRESAS DE UM MESMO GRUPO ECONÔMICO – As despesas comuns a diversas empresas de um mesmo grupo econômico, lançadas na contabilidade da empresa controladora, podem ser rateadas para efeito de apropriação aos resultados de cada uma delas, com base no “Convênio de Rateio de Custos Comuns”, desde que fique justificado e comprovado o critério do rateio.”[12] 

 “PRELIMINAR DE NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO – Tendo o lançamento sido efetuado com observância dos pressupostos legais, incabível cogitar-se de nulidade do Auto de Infração. IRPJ – RATEIO DE CUSTOS – DESPESAS COMUNS A EMPRESAS DE UM MESMO GRUPO ECONÔMICO – As despesas comuns a diversas empresas de um mesmo grupo econômico, lançadas na contabilidade da empresa controladora, podem ser rateadas para efeito de apropriação aos resultados de cada uma delas, com base no “Convênio de Rateio de Custos Comuns”, desde que fique justificado e comprovado o critério de rateio.”[13]

“IRPJ – RATEIO DE CUSTOS – DESPESAS COMUNS A EMPRESAS DE UM

MESMO GRUPO ECONÔMICO – As despesas comuns a diversas empresas de um mesmo grupo econômico, lançadas na contabilidade da empresa controladora, podem ser rateadas para efeito de apropriação aos resultados de cada uma delas, com base no “Convênio de Rateio de Custos Comuns”, desde que fique justificado e comprovado o critério de rateio.”[14]

É importante registrar que as despesas rateadas não podem corresponder à atividade fim da pessoa jurídica que recebe os reembolsos. Dessa forma, o rateio deverá abranger tão somente despesas relacionadas às atividades meio (também denominadas atividades de apoio) da pessoa jurídica.

Sobre o assunto, existe importante precedente do CARF nos seguintes termos:

“(...) RESSARCIMENTO. RATEIO DE DESPESAS. EMPRESAS DO MESMO GRRUPO. CONFIGURAÇÃO DE RECEITA. O critério utilizado para se realizar o rateio de despesas deve encontrar respaldo em razões econômicas, preservando a proporcionalidade dos valores pagos pelas empresas envolvidas; a empresa que assumiu a despesa relativa a terceiros não pode ter como objeto social o exercício da atividade causadora do dispêndio. Não se insere dentre as características da sociedade anônima o intuito não lucrativo, razão pela qual a atividade fim é sempre onerosa, ao contrário da atividade meio, onde o traço marcante é a "cooperação", em havendo interesse do grupo de sociedades, centralizada em uma empresa. Recurso negado.”[15] (g.n.)

Caso eventualmente ocorra o rateio de custos diretamente vinculados às atividades da empresa concentradora dos pagamentos, os argumentos jurídicos para sustentar a não incidência do PIS/COFINS sobre os dispêndios ficam fragilizados.

No âmbito judicial, cite-se a decisão proferida no Agravo de Instrumento (AI), nº 86812-CE, de 16/06/2008, interposto pela Fazenda Nacional, em face da decisão de 1º instância que deferiu a liminar requerida pela Grendene S/A, suspendendo à incidência do PIS e COFINS sobre o rateio de despesas, uma vez que não se trata de receita decorrente de prestação de serviço.

A decisão negou provimento ao AI e julgou prejudicado o agravo regimental, nos termos do voto da Relatora Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, do qual transcrevemos os seguintes trechos:

“(...)

É evidente que o fisco pretende dar, neste caso, uma interpretação máxima à idéia de receita, tentando caracterizar toda e qualquer entrada de recursos como um acréscimo. Ocorre que a empresa agravada é uma sociedade anônima que atua dentro de um grupo econômico. Nessa organização, típica da atividade empresarial de larga escala, várias unidades atuam no regime de colaboração com transferências recíprocas de capital ou serviços, o que é detalhadamente regulado pela Lei nº 6.404/76 (Lei da S/A) quando fala em empresas controladas, coligadas e subsidiárias, com distinções entre essas modalidades.

No caso concreto, o exame dos contratos de fls. 105/120, denominados especialmente como ‘convenções empresariais’, revelam que a Grendene S/A atua como controladora, e diversas outras pessoas jurídicas sobre a forma de sociedade anônima (Grendene Sobral S/A, Grendene do Nordeste S/A) ou de cotas por responsabilidade limitada (Indústria de Calçados Grendene LTDA., Vulcabrás do Nordeste LTDA.) figuram como empresas controladas (as S/A) ou apenas supridas pela primeira. Nesses acordos, as empresas do grupo tratam basicamente de transferências internas: enquanto a controladora Grendene S/A tem responsabilidades com o fornecimento do que chamou de “necessidades do empreendimento”, as controladas/supridas devem ressarci-la desses gastos.

Essa transferência interna ao grupo econômico é exatamente o que a Receita Federal entendeu como receita: contudo, na minha leitura até o momento, essa conclusão não é verossímil. Ao que parece, a empresa tributada (Grendene S/A) adotou um regime contábil confuso e não soube precisar bem sua relação com as outras componentes, mas esse erro não pode ser usado para que, desconsiderando a realidade econômica, incida a cobrança de PIS e COFINS sobre o que não é receita, e sim ressarcimento por saídas anteriores.”[16] (g.n.)

Diante do exposto, desde que observados parâmetros consistentes para determinação da parcela das despesas a ser alocada em cada empresa do Grupo e, portanto, reembolsada à CBD, entendemos que o valor correspondente ao reembolso não corresponde a uma receita e, portanto, não está sujeito à tributação pelo PIS e COFINS.

Vale destacar que entre os argumentos da julgadora singular que concebe faturamento, citando Eleomar Baleeiro e à luz do art. 110 do CTN, nos seguintes termos:

“O conceito de faturamento que emerge do Direito Comercial (direito privado) nada mais é do que a contrapartida econômica obtida pelas empresas no exercício de suas atividades típicas.

(...)

Assim, para efeito de incidência das contribuições sociais, o que se entende por faturamento não pode extravasar o valor do negócio jurídico, para alcançar valores desembolsados a título de tributo, como bem pontuado no voto do relator, Min. Marco Aurélio.”

            Para julgar essa questão é importante resolver questões técnicas, que, apesar de serem técnicas e passiveis de solvência apenas pela utilização do raciocínio lógico, por estarem mergulhadas no oceano de seres humanos imperfeitos, ganham sempre denotações diversas do que sua natureza.

            Questões como a noção de Estado e seu entendimento para o do povo, também é fundamental. O brasileiro que produz, que comercializa e que brinca cotidianamente com o “leão” e com os fiscos estaduais está à deriva no mar de incerteza que questão produz e deseja, com toda sua força, o que o Estado o respeite enquanto cidadãos.

          II - A vida pelos olhos de quem julga - Decisão do STF no RE 240.785/MG

               Pergunte a um qualquer se o Estado Brasileiro dignifica s brasileiros? Passamos por um tempo em que o jeitinho brasileiro está contra a parede. Fortemente questionado, pois não se admite mais, um troco para o guarda, um jeitinho para passar na frente. Ainda mais se pudéssemos ir a uma instituição pública, com orgulho do serviço prestado, e com certeza de que a informação é certa e precisa, e que aquele que atende, apenas observa o bem estar comum.

               Para corroborar com esse sentido, devemos ter instituições transparentes, e precisar que imponham respeito e sejam respeitadas. A democracia apenas é plena se os direitos forem respeitados. Não se pode admitir que subterfúgios obscurem a límpida letra da lei.

               A subsunção do ICMS para aplicação de cálculo de PIS e COFINS é artimanha inaceitável. Um Estado que respeita seus contribuintes jamais promoveria tal aberração jurídica. Deve-se respeito aos princípios de não bi-tributação, da legalidade, do não confisco. Um Estado que não semeia a idoneidade, não colherá a cidadania.

               Neste sentido, o Ministro CELSO DE MELLO, em seu voto no RE 240.785/MG, assim verifica tal comportamento da máquina pública:

 “Tenho salientado, em diversas decisões que proferi no Supremo Tribunal Federal (RTJ 144/435-436, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RE 428.354/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), que os desvios inconstitucionais do Estado, no exercício do seu poder de tributar, geram, na ilegitimidade desse comportamento do aparelho governamental, efeitos perversos, que, projetando-se nas relações jurídico-fiscais mantidas com os contribuintes, deformam os princípios que estruturam a ordem jurídica, subvertem as finalidades do sistema normativo e comprometem a integridade e a supremacia da própria Constituição da República.” (CELSO DE MELLO, RE 240.785/MG)

               Tal ilegitimidade é oriunda da dúbia interpretação de um termo absolutamente técnico, que tem na sua distorção a possibilidade de apenas de auferir maiores arrecadações ao Estado em uma verdadeiro fetichismo por renda.

               Vejam, que em diversos votos, há a preocupação por definir faturamento. Conceito crucial, pois trata-se do fato gerador príncipe da hipótese de incidência do PIS e COFINS:

“Aliás, o eminente professor (Antonio Roque CARRAZZA) - cuja sustentação, para mim, foi extremamente didática, como sempre - se referiu muito bem: trata-se de um trânsito puramente contábil, significando que isso, de modo algum, compõe o produto do exercício das atividades correspondentes aos objetivos sociais da empresa, que é o conceito de faturamento. Peço vênia à fervorosa dissidência para acompanhar o voto do eminente Relator.” CEZAR PELUSO.

“Nesse contexto, é importante reiterar que, consoante a jurisprudência desta Corte, a hipótese de incidência e a base de cálculo da COFINS circunscrevem realidade econômica bruta, qual seja: o faturamento, entendido como receita bruta do contribuinte, isto é, o “produto da venda de mercadorias e da prestação de serviços” (RE 150.755/PE, Red. p/ o acórdão Min. Sepúlveda Pertence, DJ 20.8.1993 e n. 1/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 16.6.1995).” GILMAR MENDES

               Embasamento doutrinário é fundamental para compreensão da lide. Assim, o Ministro CELSO de MELLO, em seu voto, designou vasta coleção doutrinária para fundamentar seu voto:

“Óptica diversa não pode ser emprestada ao preceito constitucional, revelador da incidência sobre o faturamento. Este decorre, em si, de um negócio jurídico, de uma operação, importando, por tal motivo, o que percebido por aquele que a realiza, considerada a venda de mercadoria ou mesmo a prestação de serviços.

(...)

Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerado, isso sim, um desembolso.”

“É importante ressaltar, neste ponto, que a orientação que venho de mencionar encontra apoio em autorizado magistério doutrinário (JOSÉ ALFREDO FERRARI SABINO, “Da Não-Inclusão dos Reembolsos, pelos Distribuidores, do ICMS Retido pela Indústria na Base de Cálculo do PIS e da Cofins”, “in” Revista Dialética de Direito Tributário nº 42, p. 59, item n. 4, 1999; HUGO DE BRITO MACHADO, “Cofins: Ampliação da Base de Cálculo e Compensação do Aumento de Alíquota”, “in” “Contribuições Sociais: Problemas Jurídicos: COFINS, PIS, CSLL e CPMF”, p. 95/113, 1ª ed., 1999, Dialética; DIEGO DINIZ RIBEIRO, “PIS e COFINS na Importação: Base de Cálculo e Questões Controvertidas”, “in” Repertório de Jurisprudência – IOB nº 11, vol. I/425, item n. 3, 2005; CARLOS ALEXANDRE DE AZEVEDO CAMPOS, “Exclusão do ICMS da Base de Cálculo de Tributos Federais”, “in” Revista Dialética de Direito Tributário nº 145, p. 22, out/07; ALLAN MORAES, “ICMS na Base de Cálculo do PIS e da Cofins não Cumulativos”, “in” Revista Dialética de Direito Tributário nº 141, p. 30/32, jun/07; SOLON SEHN, “PIS – COFINS – Não Cumulatividade e Regimes de Incidência”, p. 240/243, item n. 4.3.4, 2011, Quartier Latin, v.g.), cabendo ressaltar, no ponto, a precisa lição do ilustre jurista e tributarista ROQUE ANTONIO CARRAZZA, de quem tive a honra de haver sido colega no Ministério Público paulista, exposta em conhecida monografia que escreveu como doutrinador eminente (...)” (CELSO DE MELLO)

           

            Atualmente, pretende-se discutir a abrangência do Recurso Extraordinário em seu caráter inter parts ou erga omnes e que o julgamento futuro, talvez tenha desfecho diverso.

            Está errado entendimento. Além da questão ter sido decidia com apenas 2 votos em contrário, o entendimento quanto aos limites de incidência de tributos não é novidade na cada julgadora, pois já é consolidada essa matéria quanto a incidência de COFINS no valor devido a título de IPI.

No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o que decidido, a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI. Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir à incidência da Cofins (...) (MARCO AURÉLIO - Relator)

Por fim, cumpre-nos destacar o sentido do legislador ao positivar o termo faturamento para fins legais, pois nunca houve a intenção de utiliza-lo como montante pago pelo adquirente de mercadorias, e sim como a efetiva entrada de recursos na atividade empresarial. (...) Neste caso, entendo que o legislador, como foi dito da tribuna e, também, pelo eminente Relator, não pode inovar com relação a termos técnicos consagrados, seja na doutrina, seja na própria prática do dia-a-dia, do cotidiano, em cada atividade especializada. (MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI)

“Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional mostra-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina e pela jurisprudência.” (MINISTRO MARCO AURÉLIO)

III - Síntese Conclusiva

Ante o exposto, conclui-se:

O artigo 1º, parágrafo 2º das Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03 determina que a base de cálculo da contribuição para o PIS e da COFINS corresponde ao faturamento mensal da pessoa jurídica, assim entendido o total das receitas auferidas independente de sua classificação ou denominação contábil.

Receita é a entrada ou ingresso de recurso que importa em um acréscimo patrimonial da pessoa jurídica que a aufere. Dessa forma, qualquer movimentação financeira que não repercuta positivamente no resultado patrimonial da pessoa jurídica não pode ser definida como receita.

Assim, é dever do judiciário frear o âmbito arrecadatório de um Estado que impõe impostos que são cobrados com bases de cálculo de outros impostos. Além do fato de ser um Estado que está em um contexto de que a arrecadação bruta de impostos, está longe de ser um problema, ao contrário do que acontece quanto a aplicação das suas verbas e de sua organização para implementação de políticas públicas.

Bibliografia:

  • OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 102
  • BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, p.130. In: OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 98
  • PETRY, Rodrigo Carmori. Contribuições PIS/PASEP e COFINS – Limites Constitucionais da Tributação sobre o “Faturamento”, a “Receita” e a “Receita Operacional” das empresas e outras entidades no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 559
  • Acórdão nº 108-06.604, 1º Conselho de Contribuintes, 8ª Câmara; julgamento em 26/06/2001.
  • Acórdão nº 107-08.710, 1º Conselho de Contribuintes, 7ª Câmara; julgamento em 17/08/2006.
  • MARTINS, Natanael. Planejamento Fiscal Teoria e Prática. São Paulo: Dialética. 1995, p. 155
  • Acórdão nº 101-96.600, 1º Conselho de Contribuintes, 1ª Câmara; julgamento em 06/03/2008.
  • Acórdão nº 101-96.525, 1º Conselho de Contribuintes, 1ª Câmara; julgamento em 25/01/2008.
  • Acórdão nº 101-96.357, 1º Conselho de Contribuintes, 1ª Câmara; julgamento em 17/10/2007
  • AG 86812/CE, TRF 5ª Região, Relatora Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, julgamento em 27/05/2008.
  • Artigo 1º das Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03.
  • Artigo 1º, § 1º, das Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03


[1] Artigo 1º das Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03.

[2] Artigo 1º, § 1º, das Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03.

[3] OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 102.

[4] BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, p.130. In: OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 98.

[5] Solução de Consulta nº 84, de 30 de Agosto de 2011, da 6ª Região Fiscal.

[6] Solução de Consulta nº 59 de 14 de Setembro de 2009, expedida pela 10ª Região Fiscal.

[7] GRECO, Marco Aurélio. Cofins na Lei nº 9.718...”. In: Revista Dialética de Direito Tributário, nº 50. São Paulo: Dialética, p. 129.

[8] PETRY, Rodrigo Carmori. Contribuições PIS/PASEP e COFINS – Limites Constitucionais da Tributação sobre o “Faturamento”, a “Receita” e a “Receita Operacional” das empresas e outras entidades no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 559.

[9] Acórdão nº 108-06.604, 1º Conselho de Contribuintes, 8ª Câmara; julgamento em 26/06/2001.

[10] Acórdão nº 107-08.710, 1º Conselho de Contribuintes, 7ª Câmara; julgamento em 17/08/2006.

[11] MARTINS, Natanael. Planejamento Fiscal Teoria e Prática. São Paulo: Dialética. 1995, p. 155.

[12] Acórdão nº 101-96.600, 1º Conselho de Contribuintes, 1ª Câmara; julgamento em 06/03/2008.

[13] Acórdão nº 101-96.525, 1º Conselho de Contribuintes, 1ª Câmara; julgamento em 25/01/2008.

[14] Acórdão nº 101-96.357, 1º Conselho de Contribuintes, 1ª Câmara; julgamento em 17/10/2007.

[15] Acórdão nº 203-09.674, 2º Conselho de Contribuintes, 3ª Câmara, julgamento em 07/07/2004.

[16] AG 86812/CE, TRF 5ª Região, Relatora Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, julgamento em 27/05/2008.

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Sobre os autores
Leandro Romeo Peccequillo Freire

Bacharel em Ciências Sociais pela USP (2008), Bacharelando em Direito pelo Mackenzie (formatura em 12/2015), Estagiário na Dessimoni & Blanco Advogados

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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