O presente artigo sintetiza o entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca da possibilidade de pagamento da gratificação eventual, e aborda os requisitos para que o caráter de eventualidade, em sendo comprovado, fundamente a não incidência de Imposto de Renda, de Contribuição Previdenciária e de contribuição para o Fundo de Garantia sobre Tempo de Serviço (FGTS), sobre referida gratificação. Adicionalmente, trataremos aqui de recente entendimento jurisprudencial, abordando a possibilidade de extensão da gratificação eventual aos demais empregados em virtude do princípio da isonomia, conforme passamos a expor abaixo:
I - CONCEITO DE GRATIFICAÇÃO E ASPECTOS TRABALHISTAS
As gratificações, na sua origem, eram tidas como liberalidades do empregador, que pretendia contemplar o empregado por ocasião das festas de fim de ano.
Por sua etimologia, gratificação equivale à “demonstração de agradecimento, de reconhecimento”, sendo, portanto, um ato não obrigatório, e espontâneo.
Por influência dos usos e costumes, as gratificações tornaram-se uma tradição. Os empregadores repetiram o ato espontâneo, que passou, assim, a entrar nos quadros normais da relação de emprego. Essa reiteração criou, para o empregado, uma expectativa de contar com tal valor em seu orçamento particular. Desse modo, a gratificação transformou-se e o empregado passou a exigi-la, sempre que habitual.
A reiteração da gratificação, em períodos consecutivos, origina, segundo a apreciação comum, a razoável confiança de que a mesma há de seguir, sendo outorgada e se transforma em uma parte (complementar) que integra, regularmente, a remuneração do trabalhador.
A legislação trabalhista passou a considerar, o que era antes uma liberalidade, uma verdadeira obrigação do empregador. As gratificações habituais passaram a constituir uma modalidade de salário, ainda que haja controvérsias quanto á exata caracterização das gratificações salariais.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) considera salariais, em seu artigo 457 §1º, as gratificações ajustadas. Já a jurisprudência consolidada na Súmula 207 do Supremo Tribunal Federal dispõe que “as gratificações habituais, inclusive a de Natal (Décimo Terceiro Salário), consideram-se tacitamente convencionadas, integrando o salário”, e o Enunciado 152 do Tribunal Superior do Trabalho estabelece que “o fato de constar do recibo de pagamento de gratificação o caráter de liberalidade não basta, por si só, para excluir a existência de um ajuste tácito”.
Portanto, a conclusão a que se chega é a de que, havendo reiteração no pagamento, e/ou ajuste sobre a possibilidade de pagamento, as gratificações serão consideradas por decisão judicial, salariais. A habitualidade e/ou o prévio acordo a respeito do pagamento da gratificação são elementos fundamentais para sua caracterização como parte integrante da remuneração do trabalhador, portanto, com natureza salarial.
É um pouco vago o conceito de habitualidade. Para Luiz José Mesquita [1]:
“Habitualidade indica o que sucede por hábito, repetição de atos de uma mesma espécie, de modo regular e permanente. Eis as notas da habitualidade ou da gratificação habitual: ela existe:
a) em relação ao tempo, e temos, então a constância com que é concedida, excluindo a eventualidade de um ato discricionário do empregador;
b) em relação à extensão, e temos aqui a generalidade ou uniformidade com que é concedida ao conjunto de empregados ou a determinados colaboradores;
c) em relação à sua quantia, montante ou quantum, temos, finalmente, o elemento fixidez ou igualdade da taxa, que se define conforme com o uso”.
Na prática dos Tribunais, desde que a gratificação seja paga mais de uma vez, é considerada salarial.
Porém, se a gratificação for paga em uma única oportunidade, de forma eventual, não observando os critérios da habitualidade acima descritos, e desde que inexista ajuste prévio quanto a seu pagamento, o valor de tal benefício não integrará o salário para efeitos trabalhistas. De acordo com o artigo 457, §1º da CLT, apenas as gratificações ajustadas[2], ou seja, parcelas habituais e genericamente pagas a todos os empregados da empresa, integram o salário.
Por não constituírem salário, resta a dúvida da incidência ou não de IRRF, INSS e FGTS sobre as gratificações eventuais.
II– QUANTO À INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em 23 de julho de 2009, reconheceu a incidência do Imposto de Renda sobre a verba recebida a título de “gratificação eventual”, de acordo com o exposto abaixo:
“No caso em tela, no que tange ao pagamento da verba referente à “gratificação eventual” (indenização pela demissão), recebida pelo empregado, por força de rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, por mera liberalidade, revendo meu posicionamento para acompanhar a orientação adotada pelos demais integrantes desta Turma, bem como pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, verifico que a pretensão não merece acolhimento.
Neste sentido, registro julgado proferido pelo Superior Tribunal de Justiça:
“TRIBUTÁRIO – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – IMPOSTO DE RENDA – ART. 43 DO CTN – VERBAS: NATUREZA INDENIZATÓRIA X NATUREZA REMUNERATÓRIA.O fato gerador do imposto de renda é a aquisição de disponibilidade econômico ou jurídica decorrente de acréscimo patrimonial (art. 43 do CTN)A jurisprudência desta Corte, a partir da análise do art. 43 do CTN, firmou entendimento de que estão sujeitos à tributação do imposto de renda, por não possuírem natureza indenizatória, as seguintes verbas:“indenização especial” ou “gratificação” recebida pelo empregado quando da rescisão do contrato de trabalho por liberalidade do empregador;(...) Isto posto, DOU PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, BEM COMO À APELAÇÃO, a fim de determinar a incidência do Imposto de Renda sobre a verba recebida a título de “gratificação eventual” (indenização pela demissão), mantendo-se, no mais, a sentença recorrida, restando PREJUDICADO o agravo de instrumento.” (TRT 3ª Região, Apelação/Reexame Necessário n° 2005.61.00.004071-9/SP, Relatora Desembargadora Regina Costa, 23/07/2009)
Não obstante a decisão acima transcrita trate da gratificação eventual paga por ocasião do rompimento do vínculo empregatício, o conceito de tributação é o mesmo para todas as gratificações recebidas pelos empregados, razão pela qual, no nosso entendimento, representando a “gratificação eventual” uma receita do empregado, deverá ser submetida à tributação pelo imposto de renda, conforme tabela progressiva de alíquotas.
III – QUANTO À NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E FUNDO DE GARANTIA SOBRE TEMPO DE SERVIÇO (FGTS)
De acordo com o artigo 28, § 9ª, letra “e”, item 7 da Lei 8.212/91, alterada pelas Leis 9.528/97 e 9711/98, a qual dispõe sobre a organização da Seguridade Social e institui Plano de Custeio, não integram a base de cálculo da contribuição previdenciária as importâncias “recebidas à titulo de ganhos eventuais e os abonos expressamente desvinculados do salário”. Esta mesma disposição consta no artigo 214, § 9º, inciso V, do Decreto nº 3.048/99, que regulamentou a Lei 8.212/91.
Por outro lado, a Lei 8.036/90 que dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, define em seu artigo 15, § 6º que “não se incluem na remuneração, para os fins desta Lei, as parcelas elencadas no § 9º do artigo 28 da Lei 8.212/91”.
Assim, desde que caracterizado que se trata de fato de uma gratificação eventual, que não é paga com habitualidade e que não fora previamente ajustada, não haverá incidência da contribuição previdenciária (tanto da parcela devida pela empresa como pelo empregado), nem tampouco do FGTS, restando apenas a incidência do IRRF, conforme exposto no item II, acima.
É indispensável ter elementos para confirmar que o pagamento é realmente eventual, de forma que haja meios para restar comprovado pela Empresa, em eventual fiscalização ou reclamação trabalhista, que o empregado agraciado com a gratificação não tinha qualquer expectativa sobre seu recebimento. Também é preciso verificar se o(s) empregado(s) a serem agraciados com a “gratificação eventual” em algum momento, durante sua relação de trabalho com a Empresa, não receberam algum tipo de gratificação genérica, pois em caso afirmativo, restará comprovada a habitualidade, mesmo inexistindo regularidade nos pagamentos (em relação a periodicidade e/ou valor da gratificação).
Atendidos os pré-requisitos de eventualidade e ausência de prévio ajuste, localizamos como fruto de nossas pesquisas diversos entendimentos jurisprudenciais reconhecendo a não incidência de contribuição previdenciária sobre gratificação eventual, conforme passamos a expor abaixo.
III.A) JURISPRUDÊNCIA - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA
"GRATIFICAÇÃO NÃO EVENTUAL. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ART. 28, DA LEI N° 8212/91.1. Para definir o salário-de-contribuição, o art. 28, I, da Lei n° 8.212/91, utiliza a expressão "remuneração". Trata-se de termo técnico próprio do Direito do Trabalho. Portanto, devemos entendê-lo tal como formulado no campo desta ciência. E neste campo, remuneração é a soma das parcelas de natureza salarial com as gorjetas recebidas pelo empregado, conforme arts. 457 e 458 da CL T. Se a gratificação eventual paga pela empregadora aos seus empregados não é salário, também não é remuneração. Logo, não há incidência de contribuições previdenciárias.2. A expressão "a qualquer título", como esta no art. 28 da Lei 8.212/91, e sempre esteve nas leis de regência anteriores, significa apenas que, em se tratando de remuneração, pouco importa o título dado à prestação paga ao empregado.3. Apelo desprovido. Voto vencido."(TRF da 4a Região, Turma de Férias, AC proc. Nº 9504540686, Relator(a) JUÍZA TÂNIA TEREZINHA CARDOSO ESCOBAR, in DJ de 15.09.1999, pág. 670)
Neste mesmo sentido, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região decidiu:
“PREVIDENCIÁRIO. GRATIFICAÇÕES. AVISO PRÉVIO. SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. NÃO INCIDÊNCIA. AJUDA DE CUSTO. DESCARACTERIZAÇÃO. INTEGRAÇÃO AO SALÁRIO. AJUDA DE CUSTO. SEGURO ACIDENTE DE TRABALHO. ATIVIDADE DE RISCO GRAVE. CONSTRUÇÃO CIVIL. ACORDOS E SENTENÇAS JUDICIAIS.1. "Sobre as gratificações pagas pelo empregador, a título de liberalidade, aos empregados não incide contribuição previdenciária. Inexiste o requisito da habitualidade." (AC 95.01.19380-2/MG, Quarta Turma, Relator Juiz HILTON QUEIROZ, DJ 17/03/2000).2. O entendimento jurisprudencial é consolidado no sentido de que a ajuda de custo, quando paga habitualmente, pelo empregador aos seus empregados, sem cunho indenizatório, tem natureza salarial e integra o salário de contribuição.3. Correta a aplicação da taxa de 2,5% para o cálculo do SAT - Seguro de Acidente de Trabalho, porquanto nos termos do contrato social da empresa autuada, a construção civil é sua atividade preponderante.4. Com relação às notificações fiscais com base em acordos e sentenças judiciais, a Autora não demonstrou provas suficientes para afastar a presunção de veracidade e legitimidade da autuação fiscal, devendo prevalecer a notificação.5. Quanto aos honorários e custas processuais impostos ao INSS, a decisão deve ser mantida, pois a Autora decaiu em parte mínima.6. Apelações desprovidas. (TRF 1ª Região, AC 95.01.26251-0/MG; Apelação Civel, Relator Lindoval Marques de Brito, 12/04/2002)
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região reiterou este entendimento, de acordo com a decisão abaixo:
“TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA. DECADÊNCIA. AUXÍLIO-DOENÇA. PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AFASTAMENTO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SALÁRIO-MATERNIDADE. AUXÍLIO-CRECHE. ABONO DE FÉRIAS E AVISO-PRÉVIO INDENIZADO. ADICIONAIS E HORAS-EXTRAS. PRÊMIOS E GRATIFICAÇÕES EVENTUAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.1. O pagamento efetuado ao empregado, durante os primeiros quinze dias de afastamento, por motivo de doença, tem natureza salarial, uma vez que esta não se resume à prestação de serviços específica, mas ao conjunto das obrigações assumidas por força do vínculo contratual.2. A contribuição previdenciária a cargo do empregador não incide sobre as quantias pagas a título de auxílio-acidente.3. A CF/88, em seu art. 7º põe termo à discussão sobre a natureza remuneratória das horas-extras e dos adicionais por trabalho noturno, perigoso ou insalubre, ao equipará-los à remuneração.Configurada a natureza salarial das referidas verbas, forçoso concluir que sobre elas incidem a exação em comento.4. Do artigo 7° da CF/88, infere-se que salário e salário-maternidade são a mesma coisa, diferindo o nomen juris apenas por este ser percebido durante o afastamento motivado pela gravidez da segurada. Ademais, o art. 20, § 2º do art. 22 da Lei 8.212/91 considera tal benefício previdenciário como remuneração paga à segurada. Configurada a natureza salarial das referidas verbas, forçoso concluir que sobre elas incide a exação em comento.5. As verbas comprovadamente destinadas a ressarcir os empregados de despesas efetuadas, tais como o auxílio-creche e babá, não constituem fato gerador de contribuição previdenciária.6. Não está sujeito à incidência de contribuição previdenciária o abono de férias previsto nos arts. 143 e 144 da CLT, tendo em vista o disposto no art. 28, § 9º, "e", item 6, da Lei 8.212/91.7. Tratando-se de verba pagas quando da rescisão contrato laboral, não é devida contribuição previdenciária sobre as férias indenizadas, gratificação natalina e aviso-prévio. Precedentes do STJ. A própria legislação em vigor - Lei n.º 8.212/91, em seu art. 20, §9.º, inc. VII - exclui os prêmios e gratificações, pagos eventualmente, do salário-de-contribuição, uma vez que a legislação trabalhista exclui do conceito de salário as verbas pagas em caráter excepcional.8. Sem condenação em honorários advocatícios, consoante disposto nas Súmulas 105 do STJ e 512 do STF. (TRF 4ª Região, AMs - Apelação em Mandado de Segurança, Processo: 2004.72.05.006249-9, Relator Dirceu de Almeida Soares, 23/08/2005)
Neste sentido, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região fundamentou:
“A par dessa natureza indenizatória, na terminologia do art. 457 da CLT, somente aquelas parcelas habitualmente pagas ao empregado integram o salário, ao passo que o referido auxílio é eventual e apenas em período determinado, não podendo ser reputado por habitual, o que o exclui do conceito de remuneração e, por conseqüência, não se sujeita à incidência da contribuição referida.
Nesse sentido colaciono:
GRATIFICAÇÃO NÃO EVENTUAL. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ART. 28, DA LEI Nº 8212/91. 1. Para definir o salário-de-contribuição, o art. 28, I, da Lei nº 8.212/91, utiliza a expressão "remuneração". Trata-se de termo técnico próprio do Direito do Trabalho. Portanto, devemos entendê-lo tal como formulado no campo desta ciência. E neste campo, remuneração é a soma das parcelas de natureza salarial com as gorjetas recebidas pelo empregado, conforme arts. 457 e 458 da CLT. Se a gratificação eventual paga pela empregadora aos seus empregados não é salário, também não é remuneração. Logo, não há incidência de contribuições previdenciárias. 2. A expressão "a qualquer título", como está no art. 28 da Lei 8.212/91, e sempre esteve nas leis de regência anteriores, significa apenas que, em se tratando de remuneração, pouco importa o título dado à prestação paga ao empregado. 3. Apelo desprovido. Voto vencido." (AC 95.04.54068-6/PR, Relator JUIZA TANIA TEREZINHA CARDOSO ESCOBAR, DJU 15.09.1999, página 670)
III.B) JURISPRUDÊNCIA - FGTS
A jurisprudência assevera ainda que também não há incidência de FGTS sobre as gratificações eventuais, seguindo o mesmo conceito utilizado para a contribuição previdenciária, qual seja, o caráter de eventualidade e a natureza não salarial. Vide ementa do Acórdão abaixo transcrita:
“PREVIDENCIÁRIO. FGTS. BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO. GRATIFICAÇÃO NÃO AJUSTADA.O conceito de remuneração da lei especial, para os efeitos do cálculo da contribuição em favor do FGTS, exclui da base de cálculo as gratificações eventuais, pagas sem habitualidade, por mera liberalidade.Precedente do TRF/1ª Região.Apelação provida.” (TRF 1ª Região, Apelação Cível nº 89.01.23626-5/MG, Juíza Selene Maria de Almeida, 25/06/1999)
IV – QUANTO A POSSIBILIDADE DE PLEITO DE EXTENSÃO DA GRATIFICAÇÃO A OUTROS EMPREGADOS EM VIRTUDE DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA
O Tribunal Superior do Trabalho teve oportunidade de apreciar e se manifestar sobre pedido de empregado que não fora agraciado com o recebimento de gratificação eventual, requerendo o recebimento da gratificação em igualdade de condições com os demais empregados que ocupavam sua mesma função, com base no Princípio da Isonomia, que deve nortear as relações de trabalho.
Conforme poderá ser analisado na transcrição da decisão abaixo, o elemento essencial para configuração do tratamento anti-isonômico decorreu do fato de que não foi apresentada uma justificativa pela empresa para concessão da gratificação eventual a apenas alguns empregados, e não a todos. Vejamos:
“RECURSO DE REVISTA. GRATIFICAÇÃO EVENTUAL. LIBERALIDADE. CRITÉRIOS PARA PERCEPÇÃO. ÔNUS DA PROVA. O Regional considerou desigual o tratamento destinado ao Autor, que não recebeu gratificação percebida por outros empregados sujeitos às mesmas condições, reputando evidenciada discriminação não justificável pela alegação de que o pagamento da referida verba decorreu de liberalidade da Reclamada. Logo, o Recurso de Revista não alcança conhecimento, pois não restou demonstrada a existência de teses diversas na interpretação de um mesmo dispositivo legal, já que os arestos colacionados são inespecíficos, atraindo o óbice contido na súmula 296, I, do TST. Recurso de Revista não conhecido.” (TST, Processo RR 779588, Relator Márcio Eurico Vitral Amaro, 16/04/2008)
Neste sentido, o Tribunal Superior do Trabalho fundamentou:
“GRATIFICAÇÃO EVENTUAL. LIBERALIDADE. CRITÉRIOS PARA PERCEPÇÃO. ÔNUS DA PROVA . Nas razões do Recurso de Revista de fls. 341/353, a Reclamada sustenta que a gratificação objeto da condenação foi concedida aos empregados a título de liberalidade da empresa, não podendo, por isso, ser compelida ao pagamento dessa parcela, sobretudo porquanto não existe qualquer norma interna escrita prevendo a concessão da gratificação. Alega, ainda, que em razão da inexistência de previsão normativa e de comprovação de que todos os empregados tenham recebido a gratificação, exceto o Reclamante, referida parcela não pode ser integrada ao contrato de trabalho, sob pena de interpretação extensiva à mera liberalidade e de violação ao princípio da legalidade. Colaciona arestos para o cotejo de teses.
(...) Todavia, a fim de se evitar alegação de nulidade, impõe-se esclarecer que o disposto no art. 5º, inc. II, da CF não exclui a responsabilidade da Reclamada em conceder a gratificação em tela, posto que funcionários foram beneficiados com esta, não restando provado a existência de critérios para a sua obtenção e nem mesmo o não preenchimento destes pelo obreiro.
E, como frisado às fls. 318, a concessão de vantagem sem qualquer critério a alguns funcionários em detrimento de outros que se encontram nas mesmas condições constitui procedimento discriminatório, vedado em nosso ordenamento jurídico.” (fls. 329/330)
O Regional manteve a sentença de origem que deferiu o pagamento da gratificação ao Reclamante, ao fundamento de que não estendê-la ao Autor acarretaria necessariamente violação ao princípio da isonomia, pois estar-se-ia destinando tratamento desigual a empregados sujeitos às mesmas condições.
Consignou, ainda, que a Reclamada efetuou o pagamento da referida gratificação a outros empregados, e não provou a existência de critérios específicos para sua concessão (produtividade, perfeição técnica, assiduidade e dedicação) nem a satisfação desses requisitos pelo Autor, fatos impeditivos ao direito postulado pelo Reclamante que acarretaram a inversão do ônus da prova, do qual a Recorrente não se desincumbiu.
(...) Do mesmo modo, o paradigma de fls. 352, oriundo da SBDI-1 do TST, não guarda identidade com as premissas postas no acórdão recorrido, pois adota o entendimento de que não há ofensa ao princípio da isonomia quando a percepção da indenização por antigüidade decorre de implantação, pela empresa, de programa de demissão voluntária que não alcança o reclamante.
Patente, portanto, que a discussão promovida neste julgado diz respeito a empregado que não atende às diretrizes traçadas em programa de demissão voluntária. Ora, o Regional asseverou, repita-se, que a Reclamada não tratou de comprovar os critérios determinados para a aferição de quais empregados receberiam o pagamento de gratificação, tampouco se Autor não atendeu a tais requisitos. Não demonstrada, pois, divergência específica nos termos da Súmula 296, I, do TST.
Portanto, é essencial que haja um critério objetivo para a escolha dos empregados que serão agraciados com a gratificação eventual, não bastando simplesmente pagar para uns, em não para outros.
Adicionalmente, quando menor o percentual de empregados agraciados, maior justificativa terá a empresa para demonstrar que somente os que contribuíram excepcionalmente foram premiados através da gratificação eventual.
V – CONCLUSÃO
Diante dos comentários ora apresentados, entendemos que a Empresa poderá realizar a gratificação eventual de alguns empregados seus, através de pagamento em folha sob a rúbrica “gratificação eventual”, não compondo tal parcela a base de recolhimento do INSS e do FGTS, devendo, contudo, ser submetida à tributação pelo Imposto de Renda.
Para tanto, deverão ser observadas cumulativamente as seguintes condições:
(i) que a Empresa tenha meios para comprovar a ausência de prévio ajuste ou habitualidade através dos comprovantes de pagamentos aos empregados (demonstrando que nunca antes receberam gratificações), ou seja, deve existir prova inequívoca que inexistia um pré-acordo para pagamento da gratificação, por mais que o valor estivesse sujeito a risco futuro (por exemplo, o atingimento de uma meta específica);
(ii) não pode existir registro de provisão para pagamento de bônus/prêmio a empregados em balancetes gerenciais, informativos periódicos, etc; caso contrário, haverá prova de ajuste prévio, o que descaracteriza a liberalidade no pagamento da gratificação;
(iii) é necessário que o lançamento da gratificação seja feito em separado na folha de pagamento e no holerite, sob a rubrica “gratificação eventual”, para que a fiscalização entenda que tal benefício não faz parte do salário;
(iv) o pagamento poderá ser realizado apenas aos empregados que se destacaram no desempenho de suas atribuições, o que reforça o caráter excepcional e não contratual da gratificação, e afasta o risco de questionamento de outros empregados com base na afronta ao princípio da isonomia.
[1] “Das Gratificações no Direito do Trabalho”, LTr Edit., 1973, 2ª ed., p. 177
[2] “A parcela habitual e genericamente paga a todos os empregados da empresa, durante mais de 10 anos, constitui, nos termos do artigo 457, § 1º da CLT, gratificação ajustada para fins de integração ao salário. Sua redução de forma unilateral vulnera o principio protetor que se expressa na vedação à alteração do contrato de trabalho em prejuízo do empregado.” (RR 195.479/95.5, 1ª.T. – TST)