A desaceleração econômica vivenciada pelo Brasil tem impactado o mercado imobiliário que, além de registrar queda no número de vendas de imóveis, tem se preocupado com o crescimento da inadimplência dos consumidores.
Historicamente, sempre houve certa dificuldade em rescindir extrajudicialmente os contratos de promessa de compra e venda de imóvel por parte das construtoras e incorporadoras, ainda que com a presença de cláusula resolutória que previsse a rescisão em caso de inadimplemento contratual.
Esse impedimento se dava em razão da imprecisão na redação original do art. 1º do Decreto-Lei nº745/1969 que, apesar de indicar a necessidade de prévia notificação do devedor inadimplente e concessão de novo prazo para pagamento da dívida, não determinava as consequências oriundas do não pagamento do saldo devedor quando decorrido o prazo apontado na notificação.
Em razão disso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça havia se firmado no sentido de que, mesmo diante da inadimplência do consumidor, era imprescindível que a construtora ou incorporadora acionasse o judiciário para obter a resolução do contrato, ainda que este contasse com cláusula resolutória expressa. Sem a manifestação judicial, o promitente vendedor era impedido de recolocar o imóvel à venda, sob pena de posse injusta e esbulho possessório.
A título de exemplificação, por ocasião do julgamento do AgRg em REsp 1337902/BA, de relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, consignou-se que “É firme a jurisprudência do STJ no sentido de ser imprescindível a prévia manifestação judicial na hipótese de rescisão de compromisso de compra e venda de imóvel para que seja consumada a resolução do contrato, ainda que existente cláusula resolutória expressa, diante da necessidade de observância do princípio da boa-fé objetiva a nortear os contratos. (...) Por conseguinte, não há falar-se em antecipação de tutela reintegratória de posse antes de resolvido o contrato de compromisso de compra e venda, pois somente após a resolução é que poderá haver posse injusta e será avaliado o alegado esbulho possessório".
Em outras palavras, caso o promitente vendedor optasse por rescindir extrajudicialmente um contrato cujo promissário comprador estivesse inadimplente, corria-se o risco de ser surpreendido com decisão judicial desfavorável, atestando que a rescisão havia se dado de forma indevida.
Esse entendimento deixava o setor imobiliário muito vulnerável pois, por um lado, sofria prejuízos decorrentes do inadimplemento dos consumidores e, por outro, só poderia retomar os imóveis por meio de ação judicial, o que poderia durar anos, majorando ainda mais o prejuízo.
A mudança veio a partir de fevereiro de 2015, com a vigência da Lei Federal nº13.097/2015 que alterou o texto do art. 1º do Decreto-lei nº745/1969. A nova redação determina expressamente que um contrato de promessa de compra e venda pode ser rescindido extrajudicialmente quando presente a cláusula resolutiva expressa.[1]
Além da cláusula resolutiva, são necessários dois requisitos para consumação da rescisão: i) que o consumidor esteja inadimplente há, no mínimo, três meses do vencimento de qualquer obrigação contratual; ii) a notificação do consumidor, através de cartório de títulos e documentos ou judicialmente, com concessão do prazo de 15 dias para pagamento do débito[2].
Decorrido o prazo de 15 dias previsto na notificação, sem pagamento pelo consumidor, estará configurado o inadimplemento absoluto deste, considerando-se rescindido de pleno direito o contrato de promessa de compra e venda.
Por fim, vale ressaltar que a modificação do texto legal trazida pela Lei nº13.097/2015 não poderia ter vindo em melhor hora, quando o setor imobiliário sofre significativa redução em suas vendas e aumento na inadimplência. A possibilidade de rescindir os contratos inadimplidos de forma extrajudicial, com a rápida recolocação do imóvel à venda, consiste em importante instrumento para reduzir os impactos da crise ao setor.
[1] Lei 13.097/15- Art. 1º (...) Parágrafo único. Nos contratos nos quais conste cláusula resolutiva expressa, a resolução por inadimplemento do promissário comprador se operará de pleno direito (art. 474 do Código Civil), desde que decorrido o prazo previsto na interpelação referida no caput, sem purga da mora
[2] Lei 13.097/15- Art. 1º Nos contratos a que se refere o art. 22 do Decreto-Lei no 58, de 10 de dezembro de 1937, ainda que não tenham sido registrados junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente, o inadimplemento absoluto do promissário comprador só se caracterizará se, interpelado por via judicial ou por intermédio de cartório de Registro de Títulos e Documentos, deixar de purgar a mora, no prazo de 15 (quinze) dias contados do recebimento da interpelação.