1 - Introdução
É sabida a crise por que atravessa o sistema judiciário pátrio. A disseminação de ações epidêmicas envolvendo o tema da inconstitucionalidade de atos normativos, seguida de recursos repetitivos e protelatórios, provoca grande acúmulo de processos junto aos órgãos julgadores, especialmente tribunais superiores.
Ao lado disso, o complexo sistema brasileiro de controle de constitucionalidade passa por contínuas modificações. O já peculiar modelo nacional vem incorporando novos institutos e dimensões de controle. E, desse aprimoramento sistemático, são exemplos as recentes Leis 9.756, de 17/12/98, 9.868, de 10/11/99 e 9.882, de 13/12/99.
Nada obstante, registra-se certa primazia das atenções do legislador em relação ao controle judicial de constitucionalidade do tipo abstrato (concentrado). O antes exclusivo modelo concreto (difuso) perde cada vez mais espaço no atual sistema misto de controle de constitucionalidade, dada a preocupação em se fazer chegar logo ao STF, pela via abstrata, a chance de uniformizar o entendimento constitucional de atos normativos do Poder Público. Nesse palmilhar, GILMAR FERREIRA MENDES fala do caráter obsoleto do sistema difuso em face do atual estágio de desenvolvimento do controle concentrado, mormente diante da necessidade da utilização de resolução do Senado Federal para fins de extensão da força do julgado do STF. [1]
Contudo, a via do controle concreto também pode ser útil à tarefa de estancar a propositura de grande número de ações. Trata-se da possibilidade de resolução de conflitos mediante a utilização, principalmente, das chamadas ações de cunho coletivo.
Este trabalho, fruto de atualização daquele apresentado no 1º semestre de 2000 durante o curso de Mestrado em "Direito e Estado", tem por escopo promover, portanto, maior integração entre os sistemas de controle abstrato e concreto de constitucionalidade, pretendendo assim ampliar os horizontes da utilização deste, sem prejuízo do crescente âmbito de atuação daquele.
Para isso, porém, não está entre os objetivos deste artigo a preocupação em remontar o histórico do controle de constitucionalidade no Brasil, tampouco conceituar fórmulas já conhecidas.
2 – Breves considerações sobre o controle concreto de constitucionalidade no Brasil
Controle concreto de constitucionalidade é o que permite a todo juiz ou tribunal, no exercício jurisdicional, fiscalizar a constitucionalidade de determinados atos em face de casos concretos. Por isso, é comum chamá-lo também de controle difuso, aberto, incidental, descentralizado ou por via de exceção, [2] em contraposição ao controle abstrato, realizado por órgão ou tribunal especialmente identificado pela Constituição para aferir a constitucionalidade em tese de atos normativos sem situá-los no campo da respectiva incidência fática. Como leciona BASTOS, o controle abstrato "tem por condão expelir do sistema a lei ou ato inconstitucionais. A via de defesa ou de exceção limita-se a subtrair alguém aos efeitos de uma lei ou ato com o mesmo vício." [3]
A origem do controle concreto, no Brasil, remonta o tempo do Decreto 848, de 1890, que consagrou fórmula segundo a qual, "na guarda e aplicação da Constituição e leis federais, a magistratura federal só intervirá em espécie e por provocação da parte." [4] Assim, uma vez incorporado o controle concreto no ordenamento jurídico nacional, vem sendo permitido a todo juiz ou tribunal fiscalizar a constitucionalidade dos atos normativos estatais, a menos que a resolução de controvérsia possa ser feita por outros fundamentos.
Nessa modalidade de controle, o juízo de compatibilidade da norma não é objeto da ação, mas mera questão prejudicial necessária ao julgamento do pedido principal. A apreciação judicial do tema constitucional é feita de modo incidental, nos fundamentos da decisão, e não no dispositivo.
Ao lado disso, não se admite controle concreto se a discussão envolve interpretação da lei em tese. O provimento judicial deve pôr fim a litígio concreto e individualizado, numa verdadeira fiscalização de constitucionalidade tendente a resolver conflito de interesses instaurado entre as partes. Não há lugar, portanto, para controvérsias calcadas em simples teses jurídicas (moot cases). [5]
A princípio, exigia-se obrigatoriamente uma postura passiva do lesado. Ele somente poderia suscitar a questão constitucional como estrita via de defesa, caso alguém tentasse submetê-lo à aplicação do ato inconstitucional. [6] Deveria, pois, aguardar passivamente a propositura de uma ação em seu desfavor, para só então se defender da incidência do ato normativo inconstitucional.
Contudo, conforme leciona BASTOS, "isso seria esquecer que o interessado pode assumir uma posição ativa, atacando o ato inquinado do vício da suprema ilegalidade por meio dos recursos judiciais colocados à sua disposição, entre os quais o mandado de segurança e o habeas corpus, sem com isso desfigurar a via de defesa ou exceção". [7] Daí, sob influência da injuction americana, [8] passou-se a admitir a discussão da inconstitucionalidade de normas mediante a instauração do processo pelo próprio interessado na não-aplicação delas (postura ativa), com a finalidade de evitar lesão a direito, inclusive de forma preventiva. [9] Para tanto, basta haver interesse processual na resolução da dúvida sobre a constitucionalidade de ato normativo que deva incidir numa relação jurídica submetida ao crivo do Judiciário.
Também no caso do controle concreto deflagrado pela postura ativa do interessado, a questão da inconstitucionalidade é apreciada de modo incidental, como causa de pedir da ação. [10] O objeto do processo deverá consistir, sempre, em providência judicial que busque dirimir o litígio concreto resultante da incidência dos efeitos pretendidos pela norma impugnada. [11]
Nos tribunais, em razão da chamada cláusula de reserva de plenário (atualmente reproduzida no art. 97 da CF/88), [12] o incidente de declaração de inconstitucionalidade encontra-se regulado nos artigos 480 a 482 do CPC. Argüida a questão constitucional, o relator deverá submetê-la à apreciação do órgão fracionário, após ouvir o Ministério Público. Se a turma ou câmara rejeitar a alegação, o julgamento terá normal prosseguimento. Acatada a argüição, lavra-se acórdão respectivo antes de se afetar a questão ao plenário ou órgão especial da corte. [13] Ressaltar que a Lei 9.868/99 acrescentou os §§1º a 3º ao art. 482 do CPC, prevendo assim a possibilidade de nova manifestação do Ministério Público – agora perante o órgão julgador do incidente –, bem como das pessoas jurídicas de direito público responsáveis pela edição do ato impugnado, ainda que não sejam partes no processo originário (§1º do art. 482). Ademais, o §2º do art. 482 permite o pronunciamento sobre a questão aos mesmos legitimados à propositura da ADIn (art. 103 da CF). Por último, o §3º do mesmo artigo faculta ao relator do incidente a admissão, por despacho irrecorrível, da manifestação de outros órgãos ou entidades, o que levou GILMAR FERREIRA MENDES a sustentar que o legislador incorporou a figura do amicus curiae no processo de controle concreto de constitucionalidade. [14] Então, decidida a argüição, o julgamento do feito é remetido novamente ao órgão fracionário, que fica vinculado ao decidido pelo órgão superior. [15]
O julgamento do incidente suscitado não se sujeita a recurso direto, pois a "decisão que enseja a interposição de recurso ordinário ou extraordinário não é a do plenário, que resolve o incidente de inconstitucionalidade, mas a do órgão (Câmaras, Grupos ou Turmas) que completa o julgamento do feito" (Súmula 513/STF). [16] Entretanto, por motivos de economia processual, quando a causa tiver por único fundamento a questão constitucional, já se entendeu desnecessária a devolução dos autos ao órgão suscitante, devendo o plenário ou o órgão especial do tribunal completar o julgamento do processo. [17]
Dessarte, reconhecida incidentalmente a inconstitucionalidade de ato normativo, não poderá ele incidir no âmbito do litígio. O órgão julgador decidirá a demanda sem considerar a vocação normativa do preceito inconstitucional. Mas a decisão acerca da questão prejudicial constitucional não faz coisa julgada (art. 469, III, do CPC) e só atinge as partes ou quem mais deva se submeter à autoridade da sentença, conforme limites contidos na legislação processual. Portanto, a validade do ato normativo não restará automaticamente afastada daí para frente, ainda que num novo processo a incidência da norma venha a ser questionada pelas mesmas partes.
Vale realçar aqui interessante posição de CARMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA, para quem, mediante a propositura de ação declaratória incidente no curso da demanda principal (art. 5º do CPC), caberia controle concreto de constitucionalidade tendo por objeto a própria declaração da incompatibilidade da norma. Nesses casos, considerando a formação de coisa julgada sobre a questão incidental, a sentença que julgasse procedente o pedido da ação declaratória incidental, por vias transversas, poderia surtir efeitos sobre "outros processos em que a pessoa pública, que tenha figurado na primeira demanda, pretenda agir ou esteja a agir nos mesmos moldes que em que o fazia e com fundamento no mesmo ato normativo." [18] Contudo, não parece que tal posicionamento deva vingar. É que o processamento da ação declaratória incidental igualmente não dispensa a presença de interesse processual (art. 3º do CPC), o qual está ligado à efetiva necessidade de contornar a regra geral estabelecida no inciso III do art. 469 do CPC, abrangendo assim a questão prejudicial pelos efeitos da coisa julgada da decisão final. Dessa forma, como essa abrangência não é requisito à consecução do controle concreto de constitucionalidade, não há interesse processual na propositura da declaratória incidental propugnada pela eminente autora. Além disso, é imprescindível que o pedido da demanda incidental possa também, em tese, ser objeto de ação declaratória autônoma. [19] No entanto, como o ordenamento jurídico proíbe ação autônoma, na via de controle concreto, cujo objeto seja a declaração de inconstitucionalidade de ato normativo, a proposta de ROCHA esbarra, ademais, na impossibilidade jurídica do pedido da declaratória incidental.
Não obstante, adotando o direito brasileiro o princípio geral da nulidade da norma inconstitucional, é retroativa (ex tunc) a eficácia da decisão judicial que reconhece incidentalmente a inconstitucionalidade. Isso porque "o processo comum é construído sempre e indispensavelmente sobre fatos históricos". [20] Portanto, o afastamento da aplicação da norma inconstitucional ocorre de forma necessariamente retrospectiva (fatos passados), [21] fulminando todos efeitos concretos do ato viciado.
Mas há exceções. A eficácia retroativa do reconhecimento da inconstitucionalidade em concreto não atinge as chamadas fórmulas de preclusão, [22] tampouco as situações fáticas irreversíveis. Essa a lição de GILMAR FERREIRA MENDES, citando acórdão do STF segundo o qual não são afetados pela declaração de inconstitucionalidade os atos que, embora praticados com base na lei inconstitucional, não mais se afigurem suscetíveis de revisão. [23] Porém, nesses casos de impossibilidade de reversão ao estado anterior, afigura-se cabível pedido de indenização, nos termos do art. 158 do Código Civil de 1916 e do art. 182 do Código Civil de 2001.
CLÈVE salienta outra exceção admitida pelo STF: por aplicação da teoria da aparência, a Corte "não invalida os atos praticados pelo funcionário público investido, por força de lei inconstitucional, em cargo público. Inexistindo prejuízo, protege-se a aparência de legalidade dos atos em favor da boa-fé de terceiros". [24] Vale ainda recordar o julgado no RE 122.202/MG, [25] oportunidade em que o STF, baseando-se em precedente, [26] entendeu que os vencimentos dos magistrados de Minas Gerais, mesmo percebidos de forma inconstitucional, não deveriam ser devolvidos, tendo em vista que a garantia da irredutibilidade prevista na Constituição Federal superava a própria eficácia ex tunc da declaração de inconstitucionalidade. [27]
Em último plano, por meio de reedições da Medida Provisória 1.984-17, de 04/05/2000 (atual MP 2.180-35, de 24/08/2001), acrescentou-se parágrafo único ao art. 741 do CPC, [28] criando a figura dos embargos à execução com fundamento na inexigibilidade do "título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal." Trata-se de tentativa voltada à superação indireta do prazo decadencial de ajuizamento de ação rescisória. [29] No entanto, afigura-se manifestamente inconstitucional. A uma, porque o veículo normativo escolhido não satisfaz o requisito da urgência objetivamente considerada, dada a índole da coisa julgada à qual se contrapõe, [30] vício que também contaminará eventual lei de conversão da medida provisória. A duas, pois consagra hipótese de absurda inversão do esquema de distribuição hierárquica de competências judiciais previsto na CF/88, autorizando que o juízo de primeiro grau possa, indiretamente, desconstituir decisões definitivas proferidas inclusive por tribunais que lhe sejam superiores. A tudo isso bastando haver decisão do STF – que não precisa dispor sequer de efeito vinculante – firmando entendimento constitucional contrário ao adotado no título executivo judicial. [31] A três, por abalar o princípio da segurança jurídica, permitindo eternizar as controvérsias constitucionais. [32]
De todo modo, ainda que assim não se entenda, a inovação contida na referida medida provisória não pode ser aplicada em relação às decisões transitadas em julgado anteriormente, por força do inciso XXXVI do art. 5º da CF/88.
3 - Controle concreto de constitucionalidade e tipos de ações: óbices em face da ação civil pública e da ação popular
O controle concreto da constitucionalidade atos normativos, via de regra, pode ser exercido em qualquer tipo de ação, mandado de segurança e habeas corpus, inclusive. Não há também quaisquer dúvidas quanto ao irrestrito cabimento do controle em face de atos normativos concretos (leis apenas no sentido formal).
Contudo, embora no controle concreto a formulação do pedido para declarar a inconstitucionalidade de ato normativo genérico não seja o objeto da ação mas simples causa de pedir, tendo em vista os efeitos erga omnes inerentes às sentenças finais das ações civis públicas [33] (art. 16 da Lei 7.437/85), existem restrições à utilização dessa modalidade de fiscalização, sob pena de se esvaziar a utilidade prática do controle abstrato.
Ressalte-se que grande parte das objeções que se fazem contra a utilização da ação civil pública (ACP) no controle concreto podem ser reproduzidas em relação às ações populares (APs), pois nestas também as sentenças possuem efeitos erga omnes (art. 18 da Lei 4.717/65).
Posto isso, NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY, diferenciando a declaração incidenter tantum, que serve de alvo da causa de pedir, do verdadeiro objeto da ação civil pública – consistente em uma obrigação de fazer ou de não fazer –, entendem equivocada a tese da impossibilidade do uso da ACP no controle difuso. [34] Defendem os autores, ainda, que os efeitos erga omnes da sentença dizem respeito aos limites subjetivos do provimento judicial, "dentro da especificidade do resultado da ação coletiva", [35] motivo por que tais efeitos não devem ser confundidos com a questão da jurisdição nem da competência do órgão prolator. [36]
Entretanto, contra a utilização da ação civil pública no controle de constitucionalidade de leis materiais, alinham-se doutrinadores de peso. [37] Infirmando a viabilidade do controle em sede de ação civil pública, costuma-se objetar que seu processo se assemelha ao processo objetivo típico do controle abstrato de constitucionalidade. Fala-se também que, "ainda que se pudesse acrescentar algum outro desiderato adicional a uma ação civil pública destinada a afastar a incidência de dada norma infraconstitucional, é certo que o seu objetivo precípuo haveria de ser a impugnação direta e frontal da legitimidade de ato normativo", razão pela qual, conferindo efeitos erga omnes à respectiva sentença, estar-se-ia diante de "eficácia semelhante à das ações diretas de inconstitucionalidade, isto é, eficácia geral e irrestrita". [38] Ademais, sustenta-se que:
Como a decisão da ação civil pública tem efeitos erga omnes, não pode ensejar o controle de constitucionalidade da lei por via disfarçada, com usurpação da competência do STF.
Essa impossibilidade decorre da inviabilidade das duas conseqüências alternativas:
a) ou a inconstitucionalidade é declarada localmente, tão-somente na área de competência do juiz, e, aplicando-se a regra erga omnes, cria-se um direito substantivo estadual diferente do nacional, violando a Constituição, que estabelece a unidade do Direito Substantivo, e haveria até a possibilidade de criar um Direito específico aplicável em determinada localidade, e não em todo o Estado, quando a área do Juiz federal é inferior à do Estado...;
b) ou a inconstitucionalidade é declarada pelo Magistrado de primeira instância para ter efeitos nacionais e há a usurpação da função do STF. [39]
E em apoio à vedação, há vários julgados do STJ. Veja-se, v.g.:
O controle difuso da constitucionalidade, não só é possível, como obrigatório, porque o juiz ou o Tribunal não podem aplicar lei inconstitucional. Na ação civil pública, todavia, esse controle incidenter tantum equivaleria, pelos seus efeitos, a verdadeira ação direta de inconstitucionalidade; ademais, o beneficiário não seria consumidor, e sim o contribuinte - categorias afins, mas distintas. [40]
Não obstante, em sentido inverso, já se pronunciou o mesmo STJ em outras oportunidades. [41]
4 - Da posição jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal
Num primeiro momento, quando da Reclamação 434/SP, o STF não admitiu, em ações civis públicas, a alegação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou federal em face da Constituição Federal, mesmo que isso fosse solicitado somente incidenter tantum. Para a Corte, aceitar a ACP em casos tais implicaria violação indireta de sua competência exclusiva. [42]
Porém, a partir do julgamento das Reclamações 597/SP, 602/SP e 600/SP, ocorrido em 03/09/97, [43] a Suprema Corte vem acenando pela possibilidade do controle de constitucionalidade, via incidental, em ações civis públicas. Para assim entender, estes foram os motivos dados pelo STF: (a) a pretensão da ACP diz respeito a bem jurídico concreto, individual e perfeitamente definido, daí por que inalcançável pela via do controle abstrato, não se podendo, então, falar em invasão da competência privativa do STF; e (b) como a decisão da ACP também se sujeita aos recursos em geral, especialmente o extraordinário, podem conviver harmonicamente os dois modelos de controle de constitucionalidade (abstrato e concentrado).
E essa diretriz também foi adotada no julgamento do RE 227.159/GO:
EMENTA: - Recurso extraordinário. Ação Civil Pública. Ministério Público. Legitimidade. 2. Acórdão que deu como inadequada a ação civil pública para declarar a inconstitucionalidade de ato normativo municipal. 3. Entendimento desta Corte no sentido de que "nas ações coletivas, não se nega, à evidência, também, a possibilidade de declaração de inconstitucionalidade, incidenter tantum, de lei ou ato normativo federal ou local." 4. Reconhecida a legitimidade do Ministério Público, em qualquer instância, de acordo com a respectiva jurisdição, a propor ação civil pública(CF, arts. 127 e 129, III). 5. Recurso extraordinário conhecido e provido para que se prossiga na ação civil pública movida pelo Ministério Público. [44]
A propósito, em decisão monocrática na Reclamação 1.017/SP, datada de 19/02/99, explica o Min. SEPULVEDA PERTENCE o critério que utiliza:
Certo, em nosso complexo sistema de convivência do sistema concentrado e direto com o sistema difuso e incidente de controle de normas, não se discute que, nesse último, a questão da inconstitucionalidade possa traduzir o fundamento principal, quiçá o único, de uma demanda, sem que, no entanto, essa se confunda por isso com a ação direta: basta que nela se veicule pretensão que, na via do controle abstrato, seria inadmissível. [45]
Idêntico raciocínio teve o Plenário do STF ao entender viável o controle concreto de ato normativo por meio de ação popular. Sustentou-se, exatamente, que o enfrentamento da questão constitucional se dava como fundamento do pedido, o que distinguiria a ação popular em face da ADIn. Confira-se:
...Tendo caráter normativo, não poderia ele (o ato normativo) ser impugnado em Ação Popular, mas, sim, em Ação Direta de Inconstitucionalidade, ou incidentalmente, na propositura da Ação Popular, como um dos fundamentos desta.
É o que ocorre, no caso, pois o autor não objetiva a declaração de nulidade ou de inconstitucionalidade do Ato nº 143/89, de 20.07.1989, da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado, mas, sim, a suspensão dos atos administrativos consistentes nos pagamentos dos valores correspondentes à vantagem reinstituída pelo ato normativo.
E isso por considerar inconstitucional e ilegal a reinstituição da gratificação pelo ato normativo referido. [46]
Enfim, afastando a hipótese de aplicação do precedente da Reclamação 434/SP, tem sido preocupação do Supremo verificar se a controvérsia, no controle de constitucionalidade feito em ação civil pública, tem por alvo a resolução de relação jurídica determinada (litígio concreto). Restou pacificado que a ACP tendo por objeto direitos individuais homogêneos não é substitutiva da ação direta de inconstitucionalidade, "mesmo porque a decisão proferida naquela ação civil pública não tem eficácia erga omnes, considerada esta eficácia no seu exato sentido." [47]
O mesmo fundamento serve para afastar casos de usurpação da competência do STF para o julgamento da ADIn por omissão, [48] ou para inviabilizar o controle concreto de leis ou atos normativos estaduais e municipais em face da Constituição Estadual (cujo controle abstrato cabe ao TJ).
Ocorre, todavia, que a tendência da jurisprudência do STF parece ser contrária ao controle concreto exercido em ações civis públicas fundadas em interesses coletivos ou difusos, "quando, então, a decisão teria os mesmos efeitos de u''a ação direta, pois alçaria todos, partes ou não, na relação processual estabelecida na ação civil". [49]