A controvérsia sobre a aplicação da Reserva do Possível pelo Estado objetivando legalizar sua omissão na implementação das políticas públicas utilizando o argumento da escassez de recursos como limite para reconhecer e tutelar os direitos humanos tem sido algo muito presente.
Para melhor entendimento acerca do conceito de direitos humanos, João Batista Herkenhoff preceitua que:
[...] direitos humanos ou direitos do homem são, na modernidade, entendidos como os direitos fundamentais que o ser humano possui pelo fato de ser homem ou mulher, por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e garantir. [1]
Já Paulo Henrique Figueiredo traz que:
[...] os direitos humanos, também chamados direitos fundamentais, são o conjunto de comandos legais que visam a garantir à pessoa humana, seu direito à vida, à liberdade, à igualdade, à dignidade, bem como ao pleno desenvolvimento de sua personalidade. Sendo naturais, universais, indivisíveis e independentes, conforme a opinião de Ricardo Lobo Torres, os direitos naturais são sinônimos de direitos humanos.[2]
Assim temos que direitos humanos são aqueles inerentes à pessoa, aqueles que buscam assegurar ao ser humano o seu mínimo existencial e o seu pleno desenvolvimento, são eles fundamentais por sua própria natureza.
Desse modo, infere-se que esses direitos não devem sofrer limitações pelo Estado na sua prestação, haja vista sua relevância à dignidade da pessoa humana.
Ocorre que, o Estado vem utilizando o argumento da escassez de recursos financeiros, como forma de não dar eficácia aos direitos humanos, através do que se intitula reserva do possível.
Consoante preleciona Canotilho, a efetivação dos direitos dentro de uma “reserva do possível” traz dependência dos recursos econômicos, de modo que a elevação do nível da sua realização estaria sempre condicionada pelo volume de recursos suscetível de ser mobilizado para esse efeito.[3]
Já José Afonso da Silva assevera que:
(...) a eficácia jurídica consiste na possibilidade de sua aplicação, no sentido da capacidade de serem atingidos os objetivos traduzidos na norma. Já a eficácia social ou efetividade refere-se à efetiva aplicação da norma no mundo dos fatos[4]
Ou seja, os direitos que exigem uma prestação de fazer estariam sujeitos à reserva do possível de modo que o individuo estaria sujeito às condições socioeconômicas e estruturais do Estado para poder ter seus direitos assegurados.
Note-se que tal fator, deixa por vezes e (quase sempre) a sociedade a mercê da inércia do Legislativo e da falta de fiscalização do Judiciário, sendo os cidadãos obrigados à suportar todo o ônus de ter seus direitos humanos completamente desrespeitados.
Consoante Dirley Cunha Junior:
(...) nem a reserva do possível, nem a reserva de competência orçamentária do legislador podem ser invocados como óbices, no direito brasileiro, ao reconhecimento e à efetivação de direitos sociais originários a prestações.[5]
Assim, resta claro que os direitos humanos devem ser protegidos e assegurados a todos os indivíduos, não cabendo ao Estado valer-se do Princípio da Reserva do Possível para não atendê-los, abstendo-se do seu dever constitucional de provedor das necessidades da sociedade, e se assim o fizer, estará utilizando o referido princípio como limitador à efetividade dos direitos humanos.
[1] Curso de Direitos Humanos – Gênese dos Direitos Humanos. V.1. São Paulo: Acadêmica, 1994. p. 30.
[2] Os Direitos Humanos e sua manifestação na transação tributária http://www.webartigos.com /articles/ 21561/1/Os-Direitos-Humanos-e-sua-Manifestacao-na-Transacao Tributaria/pagina1.html#ixzz1L3Tn yZkJ
[3] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2001.
[4] SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Malheiros, 1998.
[5] CUNHA JR, Dirley da. Curso de direito contitucional, 2008.