A liberdade de expressão e de pensamento e os fundamentos dos Direitos Humanos

Leia nesta página:

Infelizmente, os Direitos Humanos, no Brasil, são interpretados como direitos dos bandidos. O artigo, de forma resumida, e sem esgotar em si, tentará desanuviar a concepção de bandido morto é bandido bom.

Pelos relatórios da CIDH, sobre liberdade de expressão e de pensamento, não podem as condenações por danos morais serem maiores do que no mundo não virtual. Quanto aos ataques aos políticos, a liberdade de expressão e de pensamento jamais podem sofrer censuras prévias e não pode o Código Penal, de cada Estado Parte, ser usado como "remédio" para censurar opiniões populares às quais denunciem atos dos governantes que violem o Estado Democrático de Direito em seus países e os próprios Tratados Internacionais de Direitos Humanos (TIDH). Ademais, não cabem responsabilidades objetivas aos donos de sites e blogs, desde que não manipulem as informações.

É incompatível com a liberdade de expressão e de pensamento:

"A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência".

Agora, caso seja, por exemplo, um estuprador — assegurado a legítima defesa e o contraditório, esgotado o devido processo legal, e sendo condenado posteriormente —, caberia aos cidadãos revoltados contra este ato cruel — detalhe, o estuprador, a que me refiro, é uma pessoa com distúrbios psíquicos, não o estuprador ciente de seu ato e não tendo comportamento compulsivo ou modificações cerebrais —, invocarem o linchamento, a pena de morte, ou mesmo falar impropérios?

Quanto ao linchamento e a pena de morte, não cabem. Quanto aos impropérios, admitem-se, até uma razoabilidade. Digamos que o cidadão revoltado chame o estuprador de "Filho da Puta!". Aqui cabe responsabilidade por injúria indireta à pobre mãe do estuprador. Contudo, aprofundando-se mais na questão, os Direitos Humanos tentam criar uma sociedade justa, solidária, fraterna. Tais qualidades devem se basear nos discernimentos sobre as causas que levaram o estuprador a se comportar como tal, afinal, nada acontece sem motivos pregressos.

A origem do mal

A infância é um bom começo para se investigar as origens dos atos perversos. Como os pais educaram as proles? Negligência, imprudência? Maus tratos? Aliás, o momento da concepção. Quando uma mulher faz uso de drogas, sejam elas lícitas ou não, todo o metabolismo de seu corpo muda. O uso de dessas drogas [substâncias], principalmente durante a gravidez, prejudica o próprio metabolismo do feto. Muitos já nascem dependentes dessas drogas. O primeiro contato com as drogas, seja quando criança ou adolescentes, pode levar a dependência química.

Do tipo de criação, valores religiosos e científicos, dada as proles, estas podem agir de forma consciente ou inconsciente à luz, ou à sombra, da sociedade. A doutrinação, por exemplo, ocorrida na Banalidade do Mal, como sintetizou Hannah Arendt (1906-1975), em sua obra Eichmann em Jerusalém, fez com que os alemães se comportassem, desumanamente, sem questionarem os atos praticados pelos alemães nazistas. O senso de moral fora reduzido, o que culminou nos genocídios de milhões de pessoas.

No livro O Erro de Descartes, o autor traz a lume uma questão intrigante que causa comoção aos indivíduos “normais” da sociedade: os sociopatas ou psicopatas. Phineas P. Gage, 25 anos de idade, capataz da construção civil. Era um jovem educado, carismático e prestativo. Um acidente mudou a sua vida e seu comportamento, após uma barra de ferro transpassar o seu crânio:

“ (...) Não é porém de fogo de artifício que se trata. É antes um ataque, e feroz. O ferro entra pela face esquerda de Gage, trespassa a base do crânio, atravessa a parte anterior do cérebro e sai a alta velocidade pelo topo da cabeça. Cai a mais de trinta metros de distância, envolto em sangue e cérebro”.

O médico-cirurgião descreve:

“O ferro que atravessou o crânio pesa cerca de seis quilos. Mede cerca de um metro de comprimento e tem aproximadamente três centímetros de diâmetro. A extremidade que penetrou primeiro é pontiaguda; o bico mede 21 centímetros de comprimento, tendo a sua ponta meio centímetro de diâmetro, são essas as circunstâncias às quais o doente deve provavelmente a sua vida. O ferro é único, tendo sido fabricado por um ferreiro da área para satisfazer as exigências do dono". [págs: 25 e 26]

O autor do livro, então, traça um “novo” Phineas:

“Phineas Gage será dado como são em menos de dois meses. No entanto, esses resultados espantosos passam para segundo plano quando são comparados com a extraordinária modificação que a personalidade de Gage está prestes a sofrer. Sua disposição, seus gostos e aversões, seus sonhos e aspirações, tudo isso se irá modificar. O corpo de Gage pode estar vivo e são, mas tem um novo espírito a animá-lo”. [pág. 26]

E o que dizer de James Fallon, professor de psiquiatria e comportamento humano da University of California, Irvine (UCI), que se descobriu psicopata? [1]

James cita o porquê de não externar o seu lado sombrio:

  • Não teve experiências de abandono, abuso ou traumas violentos na infância;
  • Teve uma mãe afetuosa.

Depreende-se, até aqui, que o “mal” pode ser fabricado, como ocorreu na doutrinação nazista, pode surgir por algum acontecimento, como no acidente de Phineas Gage e, ainda, pode ser fruto de “experiências de abandono, abuso ou traumas violentos na infância”.

Corroborando com este texto, as desigualdades sociais causam inúmeros problemas para a sociedade. No livro The Spirit Level, as desigualdades, por má distribuição de renda, causam:

  • Competição e, consequentemente, ansiedade, para se conseguir status;
  • Sentimentos de inferioridade;
  • Medo de ser desrespeitado;
  • Altos níveis de violência;
  • Maiores taxas de mortalidade infantil;
  • Doenças mentais;
  • Obesidade;
  • Aumento dos níveis de homicídios;
  • Aumento no número de pessoas presas;
  • Bullying;
  • Gravidez precoce;
  • Uso abusivo de drogas, lícitas ou não;
  • Aumento do narcisismo.

Por muito tempo, o “mal” foi considerado, em dados momentos histórico da humanidade, problema:

  1. Religioso — a pessoa ou era possuída por algum espírito maligno, ou já nascia má [espírito condenado por Deus];
  2. Social — o darwinismo social catalogava quem era de raça “superior” ou “inferior”, e como a raça inferior influenciava, negativamente, os comportamentos dos “superiores”;
  3. Genético — a pessoa já nascia geneticamente propensa ao mal [Teoria de Francis Galton, primo de Charles Darwin].

Os fundamentos dos Direitos Humanos

O Nazismo coadunou misticismo e cientificismo para justificar suas atrocidades. Eis os fundamentos dos Direitos Humanos: retirar a humanidade das superstições, dos dogmas e tabus religiosos, das ciências das “verdades” irrefutáveis. Ou seja, prisões que mantêm a humanidade em guerra. As guerras atuais têm muito a ver com domínios ideológicos seja pela economia ou/e religião. Se compararmos, contemporaneamente, a humanidade com os trogloditas, nada mais correto dizer que pouquíssimo evolui a humanidade em termos de Liberdade Igualdade e Fraternidade.

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O Coliseu moderno é perceptível: nas competições esportivas de socos e pontapés, onde o sangue jorra e a plateia vibra, histericamente; nas negociações fraudulentas entre lobistas e políticos; nas perseguições religiosas; no neoliberalismo, que destrói a flora e a fauna; nas discriminações e preconceitos quanto ao tipo de sexualidade; nos acionistas, que não querem saber como e de onde surge os créditos em sua contas.

Por estas razões, a humanidade, se nada mudar, estará condenada, possivelmente, à extinção. A extinção já começou pelos animais não humanos, que sempre foram considerados piores do que servos ao animal humano.

Conclusão

Quanto ao estuprador, qual seria, diante do que foi explanado neste singelo texto, o "correto" ou "justo" comportamento dos cidadãos que se sentem revoltados com a ação? Mesmo que o ato seja desumano, ainda assim, pela liberdade de expressão e de pensamento, poder-se-ia achincalhá-lo por "legítima defesa" ou "interesse público"? Não quero dizer com isto que se deva dizer "Ah! Sei que você sofreu muito quando criança e, por isso, o deixarei livre e perdoarei todos os ulteriores estupros!".

Claro que não! Não é a lógica dos Direitos Humanos. A lógica é forçar os Poderes dos Estados Partes a criarem mecanismos, eficientes, para combater as violações aos direitos humanos, que são:

  1. Desigualdades sociais, por má distribuição de renda;
  2. Corrupção na Administração Pública, principalmente cometidas pelos eleitos pelo povo;
  3. Precário investimento na educação [socialização] aos Direitos Humanos;
  4. Prisão, principalmente em regime fechado. Contudo, quando o indivíduo não tenha condições de viver em sociedade, esgotados todos os meios possíveis para a sua ressocialização. E, para tanto, a ressocialização deve proporcionar condições através de infraestrutura.

Para o sucesso dos Direitos humanos, os Três Poderes [o Legislativo, o Executivo e o Judiciário] devem ser harmônicos entre si, isto é, possuir diretrizes para a materialização destes Direitos. Todavia, se o Judiciário age em consonância com os Direitos, mas o Executivo, ou mesmo o Legislativo, age em dissonância, os Direitos serão violados. Não importa qual Poder está dissonante, o comprometimento dos Direitos Humanos serão sentidos pelo próprio povo:

  • Desigualdades sociais abissais;
  • Banalização da vida;
  • Corrupção;
  • Tráfico de pessoas;
  • Machismo;
  • Sexismo.

Referências:

DAMÁSIO, António R. O Erro de Descartes. Emoção, Razão e o Cérebro Humano. Ed. Companhia das Letras.

Wilkinson, Richard G. The Spirit Level: why greater equality makes societies stronger /Richard Wilkinson and Kate Pickett.— 1st American.

Nota:

_______________BBC Brasil. Pesquisador se descobre psicopata ao analisar o próprio cérebro. Acesso em 06 de janeiro de 2016. Disponível em:http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2013/12/131223_psychopath_inside_mv

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Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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