Cidadania, acesso à justiça e mediação de conflitos.

A experiência do Escritório de Práticas Jurídicas da Faculdade ASCES na implementação de projetos que promovem a inclusão social e os Direitos Humanos no Agreste de Pernambuco

Exibindo página 1 de 2
Leia nesta página:

A problemática do Estágio Supervisionado na graduação em Direito partindo da experiência que vem sendo desenvolvida pelo Escritório de Práticas Jurídicas da Faculdade ASCES, no interior de Pernambuco, como mecanismo de promoção da inclusão social.

Resumo

O presente artigo procura abordar a problemática do Estágio Supervisionado na graduação em Direito partindo da experiência que vem sendo desenvolvida pelo EPJ (Escritório de Práticas Jurídicas) da Faculdade ASCES, no interior de Pernambuco, como mecanismo de promoção de inclusão social e de proteção aos Direitos Humanos através do desenvolvimento de projetos em várias áreas do Direito que garantem acesso aos mecanismos de Justiça de forma eficiente, levando dignidade ao pobre na forma da lei, solucionando conflitos, muitos destes sem a provocação do Judiciário, garantindo paz social à comunidades e realizando justiça. É no EPJ que são desenvolvidas as atividades de estágio pelos discentes do curso de Direito do sétimo e oitavo períodos, e aqueles que estão cursando o nono e décimo período realizam suas atividades do Fórum Universitário da Faculdade ASCES, sendo a supervisão geral das cinco disciplinas de estágio coordenadas pelo EPJ. Através da realização da disciplina de estágio, o discente deve exercitar suas capacidades teóricas, até então vivenciadas na sala de aula, na realização de atividades práticas, em especial, na realização da prática jurídica. O diferencial do que vem sendo feito no EPJ da Faculdade ASCES é que através do firmamento de convênios com vários órgãos Públicos, através da atividade de estágio o aluno vivencia diferentes realidades e diferentes problemas comuns do cotidiano do mundo jurídico tornando-se um agente de transformação de realidades. São projetos que estão em pleno desenvolvimento pelo EPJ o COAC (Centro de Orientação e Atendimento ao Consumidor) que funciona desde o ano de 2010, através de convênio firmado entre a Faculdade ASCES e o PROCON, sendo que no ano de 2011 o COAC começou a atender nas instalações físicas do Fórum Universitário, mesmo espaço onde está instalado o Juizado Especial Criminal, facilitando aos cidadãos pobres na forma da lei atendimento jurídico efetivo nas demandas da área de Direito do Consumidor. Outro importante projeto do EPJ é o Projeto Escola Legal que atua nas escolas públicas da rede Estadual e Municipal, onde são formados comitês para a mediação de conflitos nas escolas, sendo compostos por gestores, professores das escolas, profissionais advogados do EPJ especialistas em Mediação de Conflitos, assistentes sociais do Curso de Serviço Social da Faculdade ASCES e por discentes do curso de Direito e de Serviço social. Além de mediar conflitos de naturezas diversas oriundos das rotinas destas escolas, os discentes são capacitados para promover palestras para os alunos, pais e professores, sendo facilitadores que esclarecem sobre a importância dos comitês e o papel da escola, da sociedade e do Judiciário para a promoção da paz no ambiente escolar. Esse projeto funciona através de convênio firmado no ano de 2011 entra a Faculdade ASCES e o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco. A Câmara de Mediação e Arbitragem do EPJ, também funciona através de convênio firmado com o Tribunal de Justiça do Estado, tendo sida instalada nas dependências do EPJ no ano de 2008. É uma rica experiência uma vez que as demandas são mediadas no próprio sistema integrado do Tribunal de Justiça, o acordo entre as partes tem força de sentença e o descumprimento do termo de mediação pode ser imediatamente executado. Muitas demandas que originariamente chegam ao EPJ como litígios que desaguariam no Judiciário são solucionados de forma pacífica através das técnicas de Mediação aplicadas pelos estagiários de Direito que são capacitados para realizar as atividades na câmara, com o auxílios dos profissionais orientadores. O Projeto EPJ nas Comunidades nas nasceu no ano de 2011 e inverte a lógica natural dos atendimentos jurídicos em escritórios modelos. Não é o cidadão que procura o advogado para solucionar seu conflito, mas é o EPJ que sai quinzenalmente com toda a equipe de advogados, estagiários e funcionários administrativos, para as comunidades carentes de Caruaru, atendendo a população da cidade e zona rural, levando consultoria jurídica, mas especialmente realizando o atendimento jurídico em áreas diversas como a área Cível, Criminal, Previdenciária e Consumidor. Esse projeto é fruto de convênio da Faculdade ASCES com a Câmara Municipal e com a Federação das Associações de Moradores de Caruaru, além de ser apoiado pelo Conselho Tutelas que disponibiliza o veículo para o deslocamento dos estagiários e advogados nos dias de atendimento nas comunidades.

Palavras - Chaves

Acesso à Justiça – Cidadania – Fraternidade Política

O Escritório de Práticas Jurídicas da ASCES: o estágio em Direito como mecanismo de promoção de inclusão social e de proteção aos Direitos Humanos

A formação dos bacharéis em Direito em todo Brasil, num passado não muito distante, tinha como critério apenas o conhecimento teórico das ciências jurídicas sem houvesse a obrigatoriedade do cumprimento de disciplinas práticas ou mesmo de estágio.  A previsão legal do ensino prático ocorreu somente no ano de 1972, com a Resolução nº 3, do Conselho Federal de Educação que definiu a prática forense como disciplina curricular. Mas a história das disciplinas de estágio nos cursos de Direito teria ainda uma longa estrada a percorrer para chegar ao formato do estágio que hoje é realizado nas boas escolas de ensino jurídico[1]. Mesmo com outras normas legais e regulamentações da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério da Educação, as disciplinas práticas eram na verdade cumpridas através de aulas teóricas onde professores de disciplinas do eixo profissionalizante do curso, como Direito Processual Civil, Penal e Trabalhista ensinavam aos estudantes a elaboração das peças processuais de cada área com seus requisitos e pressupostos. Neste modelo se reproduzia apenas o conhecimento teórico e mesmo assim, durante muitos anos, a aprovação nestas disciplinas possibilitava aos estudantes de Direito inscreverem-se na OAB e exercer a advocacia[2].  Só com o advento da Portaria 1.886 do MEC é que surge a figura dos Núcleos de Práticas jurídicas[3] introduzindo nos currículos dos cursos de Direito a atividade jurídica prática e simulada com supervisão pedagógica.

Ao ensino jurídico brasileiro foi imposta uma séria reforma com o advento da Portaria 1.886 de 30 de dezembro de 1994, do MEC. A princípio, tal instrumento normativo seria obrigatório para os egressos dos cursos de formação jurídica a partir do ano de 1996. Ocorre que, em razão da edição de outras duas portarias, a primeira, n. 3, e a segunda, n. 1.252, de 21 de janeiro de 2001, ambas do MEC, as instituições de ensino superior na área jurídica adquiriram a faculdade de seguir dos ditames da primeira, inicialmente em 1997, e, posteriormente, para os alunos matriculados a partir de 1998.[4]

A Criação de um ambiente próprio dentro das instituições de ensino jurídico para o exercício da prática jurídica enquanto disciplina curricular obrigatória não causou apenas uma mudança na percepção do estágio e uma melhoria na formação prática do discente. No caso da experiência da Faculdade ASCES, a criação do Núcleo de Práticas Jurídicas, hoje Escritório de Práticas Jurídicas (EPJ)[5], foi um divisor de águas na medida em que as atividades práticas não apenas agregaram para uma melhor formação técnica e profissionalizante dos estudantes mas principalmente colocou os mesmos diante das grandes desigualdades sociais e econômicas, da injustiça social, da morosidade do Judiciário, da dificuldade de acesso ao Sistema de Justiça, entre outros problemas que afetam os  cidadãos pobres na forma da Lei que são assistidos pelo EPJ. Assim, a prática jurídica realizada pelo curso de Direito da Faculdade ASCES através dos projetos implementados ao longo dos anos, tem possibilitado não apenas o cumprimento das disciplinas de Estágio Supervisionado ou mesmo a possibilidade de exercitar na prática conhecimentos teóricos aprendidos em sala de aula, o estágio em Direito se concretizou num importante mecanismo de promoção de inclusão social e de proteção aos Direitos Humanos. Assim, passamos a apresentar um pouco dos projetos desenvolvidos pelo EPJ da Faculdade ASCES como um caminho apto a propor uma reflexão sobre o papel da Instituições de Ensino no debate sobre fraternidade política.

Câmara de Mediação e Arbitragem e Projeto Escola Legal: a história da mediação de conflitos na Faculdade ASCES.

As formas extrajudiciais de solução de conflitos tiveram inicio no ano de 2002 na Faculdade ASCES, à época Faculdade de Direito de Caruaru, quando profissionais orientadores de estágio que atuavam no NPJ foram capacitados para exercer as práticas da Mediação ao participarem dos cursos da CEMAPE- Centro de Mediação e Arbitragem de Pernambuco. Esses mesmos profissionais participaram do II Seminário do Programa Formação de Multiplicadores em Arbitragem e Mediação, promovido pela confederação das Associações Comerciais do Brasil em parceria com o BID e com o SEBRAE realizado entre os dias 03 e 11 de maio de 2002. Com a mudança da dinâmica curricular da graduação em Direito no ano de 2002, a disciplina de Estágio Supervisionado I que tem como conteúdo a prática processual simulada[6] teve seu conteúdo alterado sendo inseridos os conteúdos pertinentes à prática da mediação bem como realizadas em sala de aula simulações de mediação de conflitos inserindo os estudantes nas formas extrajudiciais de solução conflitos que são: Negociação; Conciliação; Mediação e Arbitragem.

Diante da morosidade de muitos processos que eram de responsabilidade do NPJ comprometendo a eficácia da prestação jurisdicional, foi instalada naquele núcleo uma Câmara de Mediação e Arbitragem no ano de 2005, passando o NPJ a incluir entre suas ações o procedimento da mediação de conflitos, na esperança de soluções mais céleres para as demandas dos cidadãos carentes que buscavam o núcleo como meio resolução de seus conflitos.

O projeto de Mediação no EPJ, foi bem recebido pelos estudantes que logo começaram a participar do novo método de solução de conflitos com procedimentos e metodologia bem diferentes do processo contencioso estudado em sala de aula com conteúdos tradicionais. Para os estudantes, professores e partes era uma mudança na própria cultura em lidar com o litígio que gerava uma demanda imediatamente encaminhada para o Judiciário. Mas a principal mudança de paradigmas, sem dúvida, foi com os alunos, já que o curso, pelo próprio perfil do exercício da advocacia, prepara o profissional para o litígio e não para a composição. Procurar solucionar conflitos através do dialogo, promovendo a Paz social, para aqueles que estavam preparados para enfrentarem uma demanda judicial é antes de mais nada buscar amenizar as tenções que cercam a situação fazendo da mediação um importante mecanismo de pacificação de conflitos.

Ao contrário de processos heterocompositivos, como o processo judicial – que se voltam à análise dos fatos e de direitos estabelecendo-se assim culpa por tais fatos – os processos autocompositivos, como a mediação voltam-se a soluções que atendam plenamente os interesses reais das partes (lide sociológica).[7]

No ano de 2008 foi aprovado pelo Projeto PACIFICAR do MINISTERIO DA JUSTIÇA, projeto apresentado pela Defensoria Pública de Pernambuco em parceria com ASCES, trazendo vários benefícios para a Câmara de Mediação, inclusive possibilitando a aquisição de material permanente como móveis, computadores, data show, câmeras fotográficas e filmadoras, além de proporcionar bolsas de estágio para os alunos selecionados para o projeto beneficiando quarenta estudantes do curso de Direito. A finalidade do projeto era levar para as comunidades o conhecimento das formas extrajudiciais de solução de conflitos mais especificamente a mediação. Para cumprir essa tarefa os alunos juntamente com os professores passaram a trabalhar a mediação nas comunidades, proporcionando aos moradores daquelas localidades o contato com informações sobre a mediação de conflitos e seus benefícios. As palestras ocorriam nas associações de moradores e escolas dos Bairros, sendo contemplado com o projeto quatro bairros na cidade de Caruaru: São João da Escócia; Rendeiras; Vila Kennedy e Cidade Jardim.

No dia 02 de outubro de 2009, o Tribunal de Justiça de Pernambuco firmou convênio com a ASCES, para que as mediações realizadas na Câmara de Mediação e Arbitragem da ASCES fossem homologados por juiz togado, passando a ter força de sentença o acordo homologado na mediação transformando-se em titulo executivo judicial[8].

            Em um país como o Brasil de imensos contrastes sociais e imensa exclusão, o trabalho de espaços como o Escritório de Práticas Jurídicas da ASCES, contribui para ampliar o acesso a cidadania, inclusão social e a experiência da mediação possibilita relações de horizontalidade, onde as partes se sentem responsáveis pela solução dos conflitos, razão de sua aproximação com o tema da fraternidade.

Entendendo que a prática fraterna é aquela que na relação com o outro se dá numa perspectiva de reconhecimento e respeito a condição humana, articulada na práxis cidadã e de pertencimento. “O Núcleo de Práticas Jurídicas da ASCES realiza o encontro da teoria com a prática, daí a necessidade de conhecer o impacto nas escolhas que farão os estudantes a partir do contato com a realidade social[9]”.

A Mediação de Conflitos no Escritório de Prática Jurídica da ASCES

A cada dia a sociedade fica mais complexa e os litígios surgidos dos conflitos sociais ficam cada vez mais difíceis de serem solucionados mesmo na esfera judicial. Nota-se que o modelo adversarial que temos de justiça acaba por fomentar, em muitos casos, a violência e a solução do conflito está longe de terminar com a sentença.

Insta esclarecer, inicialmente, que a Mediação surgiu no Brasil como forma de tentar solucionar os obstáculos de acesso à justiça e, de certa forma, a falta de eficiência da prestação jurisdicional do sistema judiciário brasileiro.

A Constituição Imperial de 1824 já citava relações extra-judiciários nos artigos 160 e 161, tendo a Carta Magna de 1988 citado algumas soluções extra-judiciais como a Conciliação, no artigo 98, inciso I e II e o Código de Processo Civil reconhecido essa modalidade em seu artigo artigo 125.

Ademais, cumpre observar que a finalidade da mediação é alcançar a solução de um conflito através de um diálogo pacífico e franco, com o auxílio de um mediador, sendo este livre, tendo as partes o controle da situação e a decisão do conflito. Assim, o mediador nada mais é do que um facilitador.

Foi com esse objetivo que foram iniciados os trabalhos da Câmara de Mediação de Conflitos do EPJ da Faculdade ASCES, onde procurou-se identificar nas demandas que chegam diariamente àquele Escritório-Escola, a possibilidade da mediação do conflito antes da propositura da ação judicial.

Sendo assim, a partir da instituição da Câmara de mediação, aualquer natureza de conflito na área cível é encaminhada para a mediação após a parte passar por uma triagem onde será identificado a possibilidade de encaminhamento do conflito para ser mediado.

Não é demais afirmarmos que a Câmara de Conciliação Mediação e Arbitragem vem transformando mentalidades e ajudando as pessoas carentes da comunidade na solução de seus conflitos. Assim, temos observado mudanças tanto na sociedade como no meio acadêmico, evitando a violência e promovendo a paz social.

As demandas existem porque existe um fator principal o conflito, porém, não podemos afastar essa realidade do ser humano nem eliminar o conflito de nossas vidas, pois, eles existem de várias formas, principalmente na sociedade atual que vem passando por transformações em suas relações sociais. As informações sobre seus direitos estão mais em evidência e mais fácies de serem acessadas, a tecnologia contribui, mais  também torna o cidadão mais litigante por que tem mais informações sobre seus direitos, muitos desses indivíduos não sabem como lidar pacificamente com essas novas ferramentas o que ocasiona um aumento de conflito relacionais ou interpessoais.

A população carente que é atendida no EPJ da Faculdade ASCES é fruto da desigualdade socioespacial e em boa parte padecem de um grande desencanto com o sistema de justiça. Muitos acham impossível alcançar o judiciário que venha a lhe trazer um beneficio, são pessoas que o judiciário não tem tempo para ouvir suas questões, são pessoas que não podem pagar um advogado para impetrar com uma ação judicial e minimizar seus sofrimentos, não tem como procurar um psicólogo para aliviar sua dor psicológica são  condenados a conviver com o sentimento de injustiça. É essa população que encontra na Câmara de Mediação e Arbitragem da ASCES o verdadeiro sentido de acesso à Justiça.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

O estudo quantitativo no Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Direito de Caruaru ressaltou a existência de um projeto social e educativo, com indicadores qualitativos e quantitativos que justificam a sua existência como experiência que exemplifica a função social do direito, concretizada no atendimento aos mais carentes, garantindo o seu acesso a Justiça, sem abrir mão da formação técnica que deve cumprir[10]

O direito de acesso à justiça para essas pessoas são limitados e o Judiciário é oneroso, difícil de ser alcançado, pois exige o pagamento de custas e a presença de um advogado. A Defensoria Pública apresenta dificuldades no atendimento a uma grande demanda deixando as pessoas necessitadas desacreditadas na solução de seus conflitos o que poderá, no futuro, gerar violência.

Na mediação as pessoas envolvidas são orientadas para que cheguem  a solução dos seus conflitos pelo diálogo das partes, pois, essa é uma forma educativa, todos somos capazes escolher o que é melhor para nossas vidas, observando-se ainda, que o cumprimento de uma decisão tomada pelas partes envolvidas em um conflito, são mais respeitadas e cumpridas do que a decisão imposta pelo juiz. A cultura que foi incutida em nossa vida social foi de que o Estado através do juiz existe para solucionar os conflitos, para dizer quem está certo ou errado. Essa ideia dual encontra-se há séculos sendo reproduzida pela sociedade e hoje necessitamos transformar essa mentalidade adversárial, presente em todas as classes sociais, a cultura do inimigo, que se antagoniza com uma perspectiva fraterna. A mediação celebra a paz entre as partes que substituem a guerra e a violência pela pacificação do conflito, se chega a um acordo elaborado pelas partes, onde não há vencedor e derrotado, a sensação AP final é de que todos ganharam e é educativo para os estudantes que passam a enxergar o direito como instrumento de construção de relações amistosas, o poder das partes, o bom senso, são juízes da causa.

As pessoas envolvidas em um conflito recorrem ao judiciário pois se sentem  incapazes de resolver sozinhas suas demandas, em meio ao conflito, s condições psicológicas são afetadas e os conflitantes perdem a razão, não conseguem manter um diálogo de forma pacífica e amigável. Esta situação se evidencia principalmente quando se trata de direito de família: Divorcio; Guarda de filhos; Pensão alimentícia; Partilha de bens; Reconhecimento de União Estável; Investigação de paternidade, dentre outros.

Os estudantes do curso de direito da Faculdade ASCES que cumprem uma parte de seu estágio curricular obrigatório na Câmara de Mediação e Arbitragem aprendem a conduzir a mediação e terminam sendo agentes de transformação de realidades disseminando uma cultura de paz e de harmonia proporcionadas pela solução do conflito sem a intervenção do judiciário. A cada semestre letivo existe um crescente número de alunos que procuram as capacitações da Câmara ingressando no projeto de Mediação de Conflitos e através do estágio nesta área adquirem uma visão mais ampla sobre soluções de conflitos de forma pacífica procurando identificar o núcleo do conflito e trabalhar de forma harmônica utilizando as técnicas da mediação como mecanismo de transformação de realidades.

Esta experiência leva o estudante a entrar em contato com as populações de baixa renda, compreender os desafios da exclusão social e se sensibilizar numa perspectiva cidadã com o direito em uma perspectiva de inclusão social, pois é necessário se colocar no lugar do outro para construir com as partes a melhor solução. Educar numa perspectiva fraterna é difundir a responsabilidade pessoal e coletiva do ser no mundo, o que legitima a preocupação com um mundo fraterno.

Uma ética da fraternidade também reconhece o sujeito como portador de responsabilidades pessoais e sociais. Um princípio ético é uma norma superior de ação, do qual decorrem normas universais de comportamento que representam a expressão de determinados valores (o da dignidade humana, por exemplo) e tem por objetivo preservá-los[11].

O Centro de Orientação e Atendimento ao Consumidor Como Forma de Facilitação ao Acesso à Justiça

O Escritório de Práticas Jurídicas da ASCES, visando ampliar a perspectiva de estágio para seus discentes, firmou também parceria com o PROCON do Estado de Pernambuco, onde foi criado em 10 de agosto de 2011 o Centro de Orientação e Atendimento ao Consumidor, que visa, dentre outros objetivo, possibilitar aos alunos que cumprem as disciplinas de Estágio Supervisionado na Instituição um contato amplo com as normas de proteção ao Consumidor.

Em decorrência da especificidade das causas discutidas e abarcadas pelo COAC, este foi implementadojunto ao prédio do 1º Juizado Especial Cível de Caruaru, que, de acordo com a Lei nº 9.099/95 tem competência para o julgamento de causas com menor complexidade.

Art. 3º O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade.

É imperioso ressaltar que a criação do Juizado Especial Cível (antes conhecido como Juizado de Pequenas Causas) teve por principal objetivo conceder à sociedade uma resposta satisfatória e em tempo hábil para problemas de pequena complexidade. Outrossim, é necessário destacar que é objetivo da criação dos Juizados Especiais propiciar o acesso à justiça à grande massa popular, principalmente visando assegurar uma prestação jurisdicional digna àquelas pessoas que não possuem condições de pagar custas processuais e honorários advocatícios.

Por tais razões expostas alhures é que foi pensada uma extensão do estágio realizado no Escritório de Práticas da ASCES, onde o publico alvo atendido é aquele formado por pessoas beneficiárias da Gratuidade da Justiça prevista na Lei nº 1060/1950.

Nesse interim, é forçoso analisar que os Juizados Especiais foram criados com a máxima de proporcionar à população de forma bastante peculiar o acesso à justiça. Esse sim, é sem dúvida, o tema mais em voga nos dias atuais e que serviu de base no momento em que a ASCES pensou na instalação do COAC no mesmo prédio do 1º Juizado Especial Cível de Caruaru.

Ora, o acesso à justiça, não apenas por sua estreita relação com a viabilidade política de um Estado Democrático de Direito, mas principalmente porque a jurisdição é, então, de uma parte, direito fundamental do cidadão, e, de outra, dever do Estado[12]. Nelson Néry Junior ressalta nesse sentido que a demora da prestação jurisdicional acaba indo de encontro à perspectiva de uma resposta “justa” idealizada pelo cidadão.

É fato certo e incontroverso que a (natural) demora na entrega da prestação jurisdicional – muitas vezes fruto do necessário respeito ao due processo oflow, garantido constitucionalmente – atenta contra a efetividade do processo, conferindo-lhe feição instrumental e distante de seus objetivos de pacificação social[13].

Pensando em ser o acesso à justiça um direito fundamental do cidadão, o Centro de Orientação e Atendimento ao Consumidor mantém a preocupação de oferecer às pessoas que o procuram, um acompanhamento digno da situação, desde a elaboração da peça inaugural, passando por toda instrução processual e findando com a fase recursal, com extensão desse apoio inclusive no processo de execução.

É certo ainda observar que o acesso à justiça muitas vezes sofre com obstáculos como o da desigualdade das partes. Nesse sentido não é incomum se observar na instrução processual partes que acabam perdendo a prestação jurisdicional por não estarem bem informadas sobre sua capacidade de postulação, por não possuírem experiência litigiosa, por não terem conhecimento técnico ou, por muitas vezes, se encontrarem em condições econômicas bastante desproporcionais à outra parte.

Em apertada síntese, tem-se, de um lado organizações de um grande poder econômico, político e organizacional e, de outro, no mais das vezes, pessoas físicas de escassos recursos e informações[14].

Não se deve olvidar que a proposta da Lei nº 9.099/95 foi bastante interessante quando tentou proporcionar esse acesso à justiça para as causas de menor complexidade e também para as pessoas que não possuíam condições de arcar com as custas e demais despesas processuais, além de honorários advocatícios, como já mencionado alhures.

Todavia, apesar de ter como princípios a celeridade processual, a simplicidade, a oralidade e o acesso à justiça, tendo em vista a possibilidade da capacidade postulatória do autor ser perfeitamente possível nas causas de até 20 (vinte) salários mínimos, a estrutura dos Juizados Especiais Cíveis acaba não atingindo seus objetivos, pois que como dito acima, alguns obstáculos encontrados pelas partes acabam dificultando esse acesso.

Muitas vezes em um termo de queixa reduzido por um servidor do Juizado Especial não consegue escrever o real problema da parte e a falta de fundamentação jurídica acaba colocando em risco a resposta satisfatória de um direito “bom” que aquele cidadão possuía.

Foi através desse pensamento que o COAC foi implementado. Atualmente o Centro de orientação conta com 12 (doze) alunos e duas profissionais orientadoras, além de uma coordenação específica de modo que a estrutura possa viabilizar a celeridade processual e o acompanhamento desse trâmite com maestria por parte dos alunos.

Os discentes que lá realizam o estágio atendem os consumidores que sofreram algum tipo de dano e, após o atendimento, tem a oportunidade de ingressar com a medida judicial cabível no próprio Juizado Especial Cível.

Dessa forma, a iniciativa tem a responsabilidade de oferecer aos consumidores que procuram o Centro uma qualidade no atendimento, na confecção das peças, expondo as razões fáticas e fundamentações jurídicas do pedido, de forma que o direito do cidadão seja resguardado e o Magistrado saiba, ao certo, o que realmente está sendo requerido no caso concreto.

Essa responsabilidade faz com que seja propiciado às pessoas que não tem condições de arcar com honorários advocatícios uma igualdade quando procuram o Judiciário buscando uma solução para seus conflitos, gerando, dessa forma, o esperado amplo acesso à justiça.

Trata-se, pois, de um mecanismo jurisdicional importante na busca de uma tutela jurisdicional mais funcional e, por via de conseqüência, adequada, célere, e eficaz. Provavelmente o último baluarte para a salvaguarda dos interessas da grande massa populacional (...). Enfim, tendem a garantir o amplo acesso à justiça, ensejando igualdade a igualdade ao permitir que todos possam levar seus anseios ao Judiciário, especialmente os mais carentes[15].

A Declaração Universal dos Direitos Humanos consagrou, em 1948, o direito à justiça. No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, inciso LXXIV, assegura a todos a "assistência jurídica", devendo o Estado ser responsável pela garantia deste direito. Entretanto, como nos casos dos Juizados Especiais Cíveis o jus postulandido Autor prevalece nas causas de até 20 salários mínimos, este muitas vezes acaba sendo prejudicado em situações em que sua condição de leigo não o permite uma reivindicação adequada de seus direitos.

Dessa feita, os docentes ainda tem a oportunidade no COAC de acompanhar as audiência de conciliação e instrução, bem como confeccionar recursos e acompanhar a fase de execução auxiliando às partes, juntamente com os profissionais orientadores, à persecução dos direitos ali pleiteados.

Com esse acompanhamento através dos acadêmicos, é perceptível a resposta satisfatória das ações em que o COAC interviu, possibilitando, um maior acesso à Justiça, já que este é tido como um direito social fundamental[16], muitas vezes tolhido dos cidadãos que buscam o Judiciário.

Por fim, mister salientar que o Centro de Orientação ao Direito do Consumidor atua ainda com parceria com o PROCON de Caruaru e conta atualmente com cerca de 200 (duzentas) ações ajuizadas, conseguindo respostas bastante satisfatórias para os consumidores que possuem algum direito lesado.

Como nos ensina Mauro Capelletti, os Juizados devem ser pensados de forma a atrair as pessoas, para que estas se sintam confiantes de que sua pretensão será julgada de forma eficaz. A intenção do Centro de Orientação é justamente proporcionar essa segurança aos consumidores que o procurarem, de forma que não se busque o auxílio somente pelo interesse econômico, mas sim que se sintam à vontade e confiantes para ingressarem no Judiciários, pois terão o acompanhamento desde a confecção das peças até o final da instrução.

Mediação de conflitos no Projeto Escola Legal

O projeto Escola Legal é fruto de mais um convênio da Faculdade ASCES com o Tribunal de Justiça do Estado e surgiu diante da necessidade de solução de conflitos dentro das escolas públicas que atingem gestores, professores, alunos pais de alunos. Os conflitos são de qualquer natureza e afetam as relações no ambiente escolar dificultando relacionamentos, aprendizagem e a convivência em um espaço de paz que por vezes tem se tornado campo de batalha. Ante a constatação desta realidade nas escolas públicas, um Juiz de Direito de Pernambuco, com grande experiência nas Varas de Infância e Juventude, elaborou um projeto que foi discutido e apoiado pelo Tribunal de Justiça, o Governo do Estado e a Secretaria de Educação do Estado[17].

Para que o projeto fosse colocado em pratica se fazia necessário a participação das Instituições de Ensino Superior e a Faculdade ASCES já tinha um convênio com Tribunal de Justiça para homologar as mediações realizadas na Câmara de Mediação. Como o Projeto Escola Legal tem por finalidade a solução pacífica de conflitos ocorridos no ambiente escolar, a utilização da mediação foi o meio escolhido para reestabelecer a ordem e a paz dentro das escolas. Atuar nos conflitos na escola é reconhecer que as crianças e os adolescentes devem estar em espaços seguros que garantam seu desenvolvimento, como nos orienta o ECA. Chamaria a atenção para os artigos do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), Lei Nº 8.069 de 13 de julho de 1990.

Art. 3.º

A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes a pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.

E ainda,

Art. 4.º

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes a vida, a saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, a liberdade, a vida familiar e comunitária.

Completando ainda,

Art. 5.º

Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei, qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.  

Em data de 16 de agosto de 2012, foi assinado o convênio entre a Faculdade ASCES, com o curso de Direito e o Tribunal de Justiça sendo o projeto na cidade de Caruaru coordenado pela Juíza da Vara da Infância e Juventude contando com as seguintes instituições:  Gerente Regional de Educação Agreste Norte Centro/GRE; Secretaria de Esporte, Juventude, Ciência e Tecnologia; Vara Regional da Infância e Juventude da 7ª Circunscrição; Gerencia Regional de Educação Agreste Norte Centro; Conselho Tutelar; 4º BPM; Delegacia Regional de Caruaru; Gerencia de Policia do Agreste; 3ª Delegacia; 2ª Delegacia; Delegacia de Homicídios; Ministério Público, estamos recebendo ainda, os cursos de Serviço Social e Educação Física, que contribuem para o bom andamento do projeto, razão pela qual partimos do contexto em que estamos escola e sociedade inseridos.

No Brasil, a relação entre a violência e a escola se resumia aos comportamentos de ameaça e medo presentes em escolas localizadas em periferias e favelas sob o domínio do tráfico, expressado em atos de vandalismo praticados por jovens delinquentes envolvidos em situações de conflitos na sua própria comunidade, ou alunos em conflito com professores e gestores das unidades escolares afetadas. A partir da década de 90 do século XX começaram a se configurar em crimes mais ofensivos. Passamos a tomar conhecimento de espancamentos de alunos e professores, o aumento das situações de Bullyng no ambiente escolar, e mais recentemente em casos que envolvem crimes sexuais, homofóbicos e homicídios. Em áreas dominadas pelo tráfico de drogas, criminosos interferem no calendário escolar, crianças e professores são alvos fáceis de balas perdidas: no confronto entre traficantes rivais ou no confronto de traficantes com a polícia. Mais recentemente através de um fato ocorrido no Rio de Janeiro no Bairro do Realengo o mundo acompanhou a notícia de uma Chacina que vitimizou estudantes de uma escola pública Carioca, a gravidade do evento na escola no bairro do Realengo trouxe de volta o debate sobre a escola como seara da violência[18].

Assim, a mediação nas escolas é um instrumento de valorização dos direitos humanos e de cultura de paz, estimula as pessoas em conflitos a encontrarem novas formas de reacionamento, vendo o outro, não como inimigo, como igual, semelhante, numa prática fraterna.

Cada aluno é único, portanto diferente (...) naquele espaço há pessoas com traumas, medos, com inseguranças; Há aquelas tomadas por um vulcão de emoções e problemas cujas larvas enfeiam em vez de enfeitar a vida, queimam quando deveriam aquecer. Essas diferenças não significam que o professor não seja bom. O auditório é que é complexo[19].

O projeto está organizado da seguinte forma: Foram escolhido pela Secretaria da Educação 08(oito) escolas da rede estadual: Colégio Estadual de Caruaru; Escola José Carlos Florêncio; Escola Elizete Lopes de Lima Pires; Escola Professora Jesuína Rego; Escola Duque de Caxias; Escola Pe. Zacarias Tavares; Escola Vicente Monteiro; Escola Professor Mário Sette. Nestas escolas, o projeto está sob a coordenação do Escritório de Práticas Jurídicas da Faculdade ASCES através de profissionais orientadores de estágio responsáveis pela Mediação de conflitos e conta com a colaboração de estudantes da graduação em Direito, Serviço Social e Educação Física, que são inscritos como voluntários pelo Tribunal de Justiça e recebem capacitação para atuar nas escolas.

Em cada escola foi criado um comitê de mediação de conflitos que funciona uma vez por semana, estas comitês são formados pelo gestor, representantes dos professores, representantes dos pais, professores do projeto, alunos da Faculdade ASCES, lideres comunitários, representantes do conselho tutelar. As reuniões semanais são realizadas para identificar os tipos de violências ocorridos nas escolas, durante a semana e destinar para as pessoas competentes solucionarem do conflito, que são as infrações consideradas leves, como indisciplinas dos alunos são encaminhadas para a gestora, as infrações consideradas graves são encaminhadas para a Câmara de Mediação da ASCES nas quintas feiras para que o conflito seja solucionado através da mediação, as infrações consideradas gravíssimas são encaminhadas para a Juíza da Vara da Infância e Juventude cujo atendimento dos envolvidos no projeto se dará quinzenalmente na Câmara de Mediação da ASCES nas sextas férias, todos os acordos alcançados são encaminhados para a Juíza da Vara da Infância e juventude para serem homologados;

O Projeto Escola Legal tem como apêndice o projeto dos Fiscais da Infância e Juventude, que são coordenados pela Juíza da Vara da Infância e Juventude e a promotora da cidadania, que fazem visitas as casas de shows, bares, lan house, para evitar a frequência e permanência de crianças e adolescentes nesses ambientes, cujas visitas são acompanhadas pelos Conselheiros Tutelares. No projeto da Escola Legal há cerca de 90 alunos e nos fiscais da infância e juventude cerca de 40 alunos. Assim anualmente, a ASCES, capacita e instrui cerca de 360 alunos nas formas extrajudiciais de conflitos que vão para o mercado de trabalho com uma formação humanística de como solucionar os conflitos de forma harmônica e pacífica para construção da paz social. A relação de reconhecimento de que não estamos sozinhos no mundo é essencial, o outro é parte, devemos reconhecê-lo, perceber nossas diferenças e nos respeitarmos mutuamente.

A inclusão do outro, respeitando-o em sua diversidade, em sua condição de parte da comunidade de seres humanos é o ponto de partida de uma educação em direitos humanos, que tem como premissa a inclusão e a quebra de quaisquer preconceitos, fundados em quaisquer visões de mundo, sejam elas: religiosas, científicas, culturais ou sociais, proposta que passa pela negação de comportamentos fundamentalistas que promovam a intolerância ou a indiferença. A educação em direitos humanos é um ato de coragem dos governos e dos seres que a adotam, é uma declaração de amor ao mundo[20].       

A prática da Mediação no Projeto Escola Legal

A violência assustadora que vivenciamos nas escolas de nosso país, fez com que a sociedade passasse a procurar formas de minimizar essa realidade e para isso existe a necessidade de desenvolver uma educação para que as pessoas possam conviver e solucionarem de forma pacifica seus conflitos, para que seja construída uma cultura de Paz, de convivência harmoniosa entre as pessoas. É no ambiente escolar que deve-se iniciar essa cultura, os alunos precisam receber as técnicas de mediação de conflitos para saber lidar com as diversas formas de litígios para ajudar inclusive a administrar e prevenir de forma construtiva e pacifica  os conflitos individuais, interpessoais e institucionais.

Não podemos assistir aos conflitos inertes, congelados. Comprovamos com nosso trabalho que se o conflito for bem administrado, conduzido de forma responsável os resultados são positivos, para as partes, docentes e discentes. O conflito tem que ser reconhecido como natural na sociedade, ele está presente em todas as formas de relações e que nunca irá deixar de existir. No entanto, tem que ser conduzido naturalmente e de forma eficaz para que seja extraído uma importante experiência de desenvolvimento pessoal, humano e fraterno, na construção da autonomia de pessoas livres e responsáveis.

Os conflitos que são solucionados pelas técnicas da mediação escolar, ocorrem entre estudantes; estudantes e professores; professores; pais e professores; pais e alunos; professores e direção, enfim, envolvendo toda comunidade escolar, uma vez que, podem intervir de modo a serem ouvidos, abrangendo o maior numero possível de pessoas envolvidas no surgimento de uma nova cultura de paz social. Assim, são utilizadas as técnicas da mediação nas escolas, caracterizadas por um processo flexível de caráter voluntário, sigiloso, conduzido por uma terceira pessoa imparcial que chamamos de mediador que irá utilizar os mecanismos da mediação para por fim ao litígio e alcançar um acordo favorável aos envolvidos, tendo como objetivo manter a aproximação e o dialogo entre os conflitantes.

Segundo Abromovay[21] a mediação não é um método moderno de solução de conflitos, visto que historicamente falando existe à 3.000 anos antes de Cristo. Porém, na década de 70, nos Estados Unidos da America, passou-se a estudar e fazer uso das técnicas de resolução de conflitos chamadas de ADR (Alternative Dispute Resolution), sendo esses meios alternativo a Negociação; Conciliação; Mediação e Arbitragem, em seguida com os meios tecnológicos de informações foi se espalhando para os outros continentes e países.

O projeto Escola legal que tem a mediação de conflito como ferramenta para solução dos litígios apresentados ao comitê tem o objetivo de:

  • Conscientizar a comunidade escolar que existe outras formas de solucionar os conflitos fora do judiciário e sem o uso da violência;
  • A respeitar as diferenças que são encontradas na comunidade escolar, respeitando sua cultura e a do outro;
  • Fazer compreender que devemos assumir as responsabilidades por nossos atos e que dessa forma fica mais fácil de ser compreendido em um conflito.    
  • Formar uma cultura de paz e que essas técnicas sejam levadas para as localidades onde vivem esses alunos, constituindo uma oportunidade de aprendizagem e de crescimento pessoal para os participantes da comunidade escolar;

O projeto Escola Legal, tem ainda a função de demonstrar a toda comunidade escolar que através da educação aprende-se a conviver de forma harmoniosa e em paz, no entanto sabemos que mesmo com essa convivência surgirão conflitos, pois este é inevitável a condição humana;  

Com a implantação do Projeto Escola Legal nas Escolas Estaduais, podemos observar de forma ainda lenta, porém crescente as seguintes mudanças[22]:

  1. Diminuição da violência, uma vez que nas reuniões dos comitês, no inicio do projeto os números de conflitos eram bem maiores do que os atuais, principalmente os inter-grupais que envolviam as diferenças étnicas e raciais, também ouve uma diminuição nas suspensões, reduziu-se o numero de abandono escolar;

  1. A mediação tem proporcionado a comunidade escolar um ambiente positivo na sala de aula, visto que as palestras ministradas para os alunos e professores, passou a fazer parte, da vida de todos e eles estão mais sociáveis e comunicativos, explicitando de forma positiva suas carências, passando a demonstrar bom comportamento, respeito e afeto, com isso, a comunidade escolar partilha de idéias e sentimentos que não eram de costume;

  1. Outro aprendizado que é observado através da pratica da mediação, são as formas de resolução de conflitos, como a comunidade escolar passou a treinar as aptidões, reconhecer e lidar com as emoções,  identificar o núcleo do conflito e suas várias formas de expressão que são violentas, hostis e daí passar a utilizar as técnicas da mediação de forma construtiva face aos conflitos escolares, no contexto familiar e comunitário;

  1. Assim, com as pequenas mudanças já encontradas na comunidade escolar onde estão instalados os comitês do Projeto Escola Legal, procura-se desenvolver uma perspectiva construtiva do conflito ensinando-se a estimular a justiça social na comunidade, fazendo compreender que a responsabilidades dos problemas apresentados são dos elementos daquela comunidade, bem como o sucesso das respostas sociais por eles geradas.

Dessa forma, solucionar conflitos entre crianças e adolescentes, professores, alunos e comunidade, fortalece os laços democráticos, estimulando relações sociais saudáveis, onde o espaço da escola é também de construção de relações de educação em direitos humanos e favorece a experiência de uma prática pedagógica baseada em valores que ressignifiquem os valores fraternos entre as pessoas.

Entendo que a Educação em direitos humanos e a fraternidade política necessitam estar ligados numa perspectiva laica e inclusiva para a realização da democracia, passando por políticas públicas de Estado e não apenas de governo que promovam igualdade e inclusão social. Os direitos humanos funcionam como normas de orientação, marco de referência na constituição de um modelo civilizatório, e a fraternidade política como difusor de valores essenciais a um modelo civilizatório da educação que promove “o direito a ter direitos” e o “direito de ser mais”. São conceitos que não podem ser entendidos como categorias privadas, necessitam no processo educativo estarem ligados as lutas contra as opressões e discriminações, na exigência da extensão de direitos e acesso as políticas públicas indistintamente, na ampliação das tomadas de decisões em espaços políticos mais participativos para os grupos excluídos em escala mundial. Pensar um mundo unido é pensar os valores e os modelos que precisamos eleger para educar as pessoas para uma cultura de paz numa perspectiva local e global[23].

Dessa forma para obtermos sucesso nas mediações escolares, sabemos que se faz necessário a participação de profissionais comprometido, com a função social, para a implementação da mediação nas escolas, sendo uma equipe de profissionais multidisciplinar, devidamente capacitados em mediação de conflitos com formação nas áreas de psicologia, sociologia, serviço social, pedagogia, educação física direito e outras, para que desenvolvam um conjunto de ações que possam diagnosticar as reais causas dos conflitos e que sejam tratados de formas adequadas com resultados positivos que resultem da satisfação do projeto.

Assim, tem-se que a mediação escolar está em fase de experiência é um trabalho novo e muito envolvente que põe em debate o desafio de como agir no contexto escolar quando se sabe que os problemas passam por formas diferentes, que se expressam em condutas autoritárias, violentas e intolerantes, pela falta de comunicação, ou mesmo pela comunicação negativa, que estimula os preconceitos, o desrespeito nos espaços escolares.

Portanto tratar os conflitos escolares com as técnicas da mediação é está garantindo a comunidade escolar à formação para a democracia, é, desenvolver uma cultura de paz, garantir os direitos humanos, prevenir a violência, tratar os conflitos com responsabilidade identificando seus núcleos e solucionando-os, assim, estamos criando um ambiente pacífico e prazeroso, favorecendo a convivência da comunidade escolar.

Assim, as negociações não podem ser esporádicas, mas devem se construir numa experiência dialógica o que é um avanço numa democracia frágil, no caminho de uma atuação republicana e cívica que pode começar com a experiência da Educação em direitos humanos e da fraternidade política no interior das nossas escolas. Experiência revelada na solução dos conflitos cotidianos dos mais simples aos mais complexos, fazendo da discussão teórica uma experiência prática e emancipatória de todos os sujeitos envolvidos[24].   

A escola é o lugar primeiro para ensinar aos alunos a resolverem seus conflitos através da mediação, é através da mediação que aprendemos métodos que desenvolvem a capacidade de tomar decisões, estimula os envolvidos a gerar empatia, uma vez que estabelece e mantém as relações interpessoais, ensinamos a usar as emoções adequadamente e que os envolvidos tomem decisões criativas, respeitosas, fraternas para solução dos conflitos.  

Considerações Finais

            O estágio curricular no curso de direito oportuniza ao estudante uma aproximação com a realidade social, na medida em que a vivência em sala de aula, no campo dos estudos teóricos sem esta relação direta com a prática pode fazer o discente desenvolver uma visão descontextualizada da relação que se dá entre a sociedade e o papel do direito como caminho para o exercício da cidadania das pessoas, especialmente as mais excluídas e submetidas a uma grande desigualdade social.

            Neste artigo apresentamos a prática curricular e o atendimento a comunidade como espaços do exercício da fraternidade política na ação institucional, de educadores e estudantes no Escritório de Práticas Jurídicas da ASCES, na garantia do acesso a justiça, na solução pacífica de conflitos, contribuindo na formação de profissionais e pessoas que ao atuar na garantia do direito do outro, se percebem, numa relação de amor ao mundo, de amor as pessoas, e de amor a justiça social, o que nos filia a uma prática pedagógica fraterna.

A fraternidade é considerada um princípio que está na origem do comportamento, de uma relação que deve ser instaurada com outros seres humanos, agindo uns em relação aos outros, o que implica também a dimensão da reciprocidade. Nesse sentido, a fraternidade, mais do que um princípio, ao lado da liberdade e da igualdade, aparece como aquele que é capaz de tornar esses princípios efetivos[25].      

Nessa relação de reciprocidade, compreendemos que aprendemos a nos relacionar com os outros, que não fazemos caridade ao atender com qualidade pessoas pobres e oprimidas. Nessa troca: prestamos uma ação que restabelece a dignidade humana de quem procura o Escritório de Prática Jurídica e conquista através do nosso trabalho o seu direito. Nessa relação de cidadania, é necessário que reconheçamos que aprendemos e ensinamos aos nossos alunos e professores mais que conteúdos técnicos: estabelecemos uma  relação que se preocupa com a formação técnica e humana dos sujeitos envolvidos na relação de ensino e aprendizagem. “Em cambio, la fraternidad “responsabiliza” a cada uno com el outro, y por conseguiente, com El bien de la comunidad y favorecela búsqueda de soluciones para realización de lós derechos humanos”[26].

Nesse sentido, o Escritório de prática Jurídica vem contribuindo através da formação humanizada de professores, alunos e funcionários, estimulando uma prática solidária e democrática de estágio curricular que ao nosso juízo é caminho institucional para a construção e manutenção de relações de fraternidade política, Direitos humanos e cultura de paz.

Referências Bibliográficas

ABRAMOVAY, M (coord.). Escolas inovadoras: experiências bem-sucedidas em escolas públicas. Brasília: UNESCO, Ministério da Educação, 2004.

____________. Violências nas escolas. 3ª edição. Brasília, 2010.

AMARO, Z S. Razoável Duração do Processo - Demora na Prestação Jurisdicional – Implicações à Violação aos Princípios Constitucionais. Acessado dia 28/08/2012. Disponível: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/zoraide_sabaini_dos_santos_amaro.pdf.

ALZATE, R.  Enfoque global de la escuela como marco de aplicación de

 los programas de resolución de conflictos. In F. Brandoni (Ed), Mediación

 escolar: propuestas, reflexiones y experiencias.  Buenos  Aires: Paidós,

1999.

AQUINI, M. Fraternidad y Derechos Humanos. In. (org) BAGGIO, AM. La Fraternidad. El Princípio Olvidado. En La Política y el Derecho. Buenos Aires: Ciudad Nueva, 2009.

AZEVEDO. AG (org). Manual de Mediação Judicial. 2ª Edição, Ministério da Justiça, 2010.

BARROS, AM. Educação em Direitos Humanos e Fraternidade Política: Caminhos para uma cultura de paz. Editora Universitária – UFPE, Recife, 2012 (PRELO). In, (org). BARROS, A M. DUARTE, A M T. Educação, Gênero e Direitos Humanos.  Editora Universitária – UFPE, Recife, 2012 (PRELO).

BARROS, AM, MACIEL, AMS, JORDÃO, MPS. Estudos Sobre Violência Doméstica e Tensão Familiar: Uma Análise a partir do Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Direito de Caruaru. Revista da Faculdade de Direito de Caruaru, Ideia: João Pessoa, 2008. 

BOYADIJIAN, G. H. V. Núcleos de Prática Jurídica nas Instituições Privadas de Ensino Superior. Curitiba: Juruá, 2004.

CAPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Ellen Gracie (Tradução). Sérgio Antonio Fabris: Porto Alegre, 1988. Reimpresso 2002. p.15.

CHALITA, G. Pedagogia da Amizade. Bullyng: O Sofrimento das Vítimas e dos Agressores. SP: Editora Gente, 2008, p. 76.

LIMA, AJC. O Princípio da Fraternidade na Constituição. In. RIVAS, PR (Org). Fraternidad y Conflicto. Buenos Aires: Ciudad Nueva, 2011.

_________ A Dialética da Fraternidade, da Dignidade e do Pluralismo. Vol.39, N. 2. João Pessoa: Ideia,2008.

MARQUES, AC. Perspectivas do Processo Coletivo no Movimento de Universalização do Acesso à Justiça. Ed. Juruá: Curitiba, 2007. p.35.

MONTEIRO FILHO, L. ECA – 10 anos. O desafio do Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.abrapia.org.br. Acesso em: 01/08/2005.

NERY JUNIOR, N. Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis de Acordo com a Lei 10352/01. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2002.

Assuntos relacionados
Sobre as autoras
Maria Perpétua Socorro Dantas Jordão

Mestre e Ciência Política, Profª. Da Faculdade ASCES, Advogada, Coordenadora do Escritório de Práticas Jurídicas da ASCES e do Projeto de Adoção Jurídica de Cidadãos Presos da ASCES, pesquisadora do Grupo de Pesquisa – UFPE/CNPq:Educação, Inclusão Social e Direitos Humanos. Professor.

Elizabeth Bezerra de Moura

Profissional Orientadora do Escritório de Práticas Jurídicas da Faculdade ASCES. Coordenadora da Câmara de Mediação e Arbitragem do Escritório de Práticas Jurídicas da Faculdade ASCES. Participante do Projeto Escola Legal do Escritório de Práticas jurídicas da Faculdade ASCES.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos