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A remessa necessária no novo CPC

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08/03/2016 às 11:23
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5 – A REMESSA NECESSÁRIA – O NOVO DISPOSITIVO 

De acordo com o artigo 496 da Lei 13.105/15, litteris:

Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, os Estados, o distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.

§ 1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.

§ 2º. Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.

§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I – 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – 500 (quinhentos) salários-mínimos para os estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;

III – 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público.

§ 4º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:

I – súmula de tribunal superior;

II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de justiça em julgamento de recursos repetitivos;

III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competências;

IV – entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa. 

5.1 – “Sentença proferida” 

Por “sentença proferida” há de se compreender como toda e qualquer sentença meritória que condene o Poder Público na perda de algo. Nesse sentido, não é necessário que o Poder Público seja réu; ele também pode perder uma ação sendo autor.

Menciono o fato de que a sentença deve ser meritória pela razão de que a remessa necessária visa rever os ônus impostos ao Poder Público. Assim, as hipóteses do artigo 485 (extinção do processo sem resolução do mérito) não impedem que a Fazenda Pública promova nova ação (art. 486); entretanto, se a Fazenda Pública der causa, por três vezes, a sentença fundada em abandono de causa, esta hipótese prevê a impossibilidade de ajuizamento de nova ação (art. 486, § 3º) e, por esta razão, sujeita esta terceira sentença à remessa necessária.

A redação do artigo 496 do CPC não faz nenhuma ressalva quanto às modalidades de sentença que caibam reexame necessário. Portanto, será cabível reexame necessário nas sentenças que possuam carga de eficácia declaratória, constitutiva e condenatória. Igualmente, ocorrerá reexame necessário nas sentenças cuja carga de eficácia preponderante seja mandamental ou executória lato sensu, atentando-se que, face à especialidade da ordem judicial emanada destes provimentos, somente haverá efeito suspensivo quando a lei específica expressamente o indicar.

5.2 – Fazenda Pública stricto sensu ou lato senso? 

De acordo com a regra do CPC, a sentença tem que ser proferida contra a Fazenda Pública, ou seja, contra as pessoas jurídicas de direito público, o que leva a crer que não é cabível a remessa necessária contra empresas públicas e sociedades de economia mista.

Um dos maiores problemas das criações de empresas públicas e sociedades de economia mista, em contraponto à criação de autarquias, é que o legislador nacional, incluindo-se os estaduais e municipais, nunca adoram um rigor científico de distinção. Muitas vezes, empresas estatais foram criadas para o exercício de atribuições de autarquias, apesar de não buscarem lucros.

Para MARINELA, “no que tange à exigência de licitação e às regras aplicáveis aos contratos, deve-se distinguir empresa pública e a sociedade de economia mista, se prestadoras de serviço público ou exploradoras da atividade econômica” (MARINELA : 2013, p. 158).

Neste toar, Alexandre Mazza, em excelente caráter didático, traz importantes distinções:

“As demais características de empresas públicas e sociedades de economia mista variam conforme a atuação preponderante da entidade.

Assim:

1)     Prestadoras de serviço público: são imunes a impostos, os bens são públicos, respondem objetivamente (sem comprovação de culpa) pelos prejuízos causados, o Estado é responsável subsidiário pela quitação da condenação indenizatória; estão sujeitas à impetração de mandado de segurança e sofrem uma influência maior dos princípios e normas do Direito Administrativo. Exemplo: Empresa de Correios e Telégrafos – ECT.

2)     Exploradoras de atividade econômica: não tem imunidade tributária; seus bens são privados; respondem subjetivamente (com comprovação de culpa) pelos prejuízos causados; op Estado não é responsável por garantir o pagamento da indenização, não se sujeitam à impetração de mandado de segurança contra atos relacionados à sua atividade-fim e sofrem menor influência do Direito Administrativo. Exemplos: Banco do Brasil e Petrobrás” (MAZZA : 2013, p. 174).

Essas distinções, atualmente, mudam completamente o entendimento nacional acerca de uma série de consequências jurídicas na vida destas empresas.

De fato, “quando prestadoras de serviços públicos, seguem as normas gerais para licitações, é dizer, submetem-se à Lei 8.666/93 e à Lei n. 10.520/02, em cumprimento ao art. 37, XXI, combinado com o art. 22, XXVII, ambos da CF, como entes da Administração Direta” (MARINELA : 2013, p. 158). Ou seja, as empresas estatais prestadoras de serviços públicos são equiparadas às autarquias.

“Entretanto” – prossegue Marinela – “quando essas empresas exploram a atividade econômica, a situação é diferente, considerando que elas poderão ter regime especial, mediante estatuto jurídico próprio, consoante art. 173, § 1º, III, da CF, para licitações e contratos, obedecendo sempre aos princípios da Administração” (MARINELA : 2013, p. 158).

E aí vem a seguinte indagação: qual seria a natureza dos bens dessas empresas estatais? Para Marinela,

“Acolhe-se neste trabalho a orientação de que os bens pertencentes às pessoas privadas são bens privados, todavia, quando prestadoras de serviços públicos, em razão de diversas regras do ordenamento jurídico, se eles estiverem diretamente ligados à prestação dos serviços públicos, estarão sujeitos ao regime público; para os demais vale o regime privado. Justificam esse tratamento especial: o princípio da continuidade dos serviços públicos; o fato de os bens serem decorrentes da transferência do ente que as criou; a cláusula de reversão ao ente público que lhes deu origem e a possibilidade de a lei instituidora dar essa especialidade para esses bens. Ressalte-se ainda o dever de licitar dessas empresas, o que representa também o rigor do regime público” (MARINELA : 2013, p. 158).

O STF, há cerca de 10 anos, já vinha pontuando a diferenciação entre estas diferentes destinações das empresas estatais. Confira-se, neste sentido, o seguinte acórdão: 

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ECT - EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA: C.F., art. 150, VI, a. EMPRESA PÚBLICA QUE EXERCE ATIVIDADE ECONÔMICA E EMPRESA PÚBLICA PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO: DISTINÇÃO. TAXAS: IMUNIDADE RECÍPROCA: INEXISTÊNCIA. I. - As empresas públicas prestadoras de serviço público distinguem-se das que exercem atividade econômica. A ECT - Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos é prestadora de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado, motivo por que está abrangida pela imunidade tributária recíproca: C.F., art. 22, X; C.F., art. 150, VI, a. Precedentes do STF: RE 424.227/SC, 407.099/RS, 354.897/RS, 356.122/RS e 398.630/SP, Ministro Carlos Velloso, 2ª Turma. II. - A imunidade tributária recíproca -- C.F., art. 150, VI, a -- somente é aplicável a impostos, não alcançando as taxas. III. - R.E. conhecido e improvido. (RE 424227 / SC, Relator Ministro Carlos Veloso, Publicação DJ 10-09-2004 PP-00067)

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No voto, destaca-se o seguinte trecho:

“Srs. Ministros, o meu entendimento, que vem de longe, mencionado, aliás, pelo eminente Ministro Sepúlveda Pertence, é no sentido de distinguir empresa pública que presta serviço público de empresa pública que exerce atividade econômica, atividade empresarial, concorrendo com empresas privadas. A primeira, sempre sustentei, tem natureza jurídica de autarquia

E ainda:

“Distinção entre empresas estatais prestadoras de serviço público e empresas estatais que desenvolvem atividade econômica em sentido estrito. (...). As sociedades de economia mista e as empresas públicas que explorem atividade econômica em sentido estrito estão sujeitas, nos termos do disposto no § 1º do art. 173 da Constituição do Brasil, ao regime jurídico próprio das empresas privadas. (...). O § 1º do art. 173 da Constituição do Brasil não se aplica às empresas públicas, sociedades de economia mista e entidades (estatais) que prestam serviço público.” (ADI 1.642, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 3-4-2008, Plenário, DJE de 19-9-2008.) No mesmo sentido: ARE 689.588-AgR, rel. min. Luiz Fux, julgamento em 27-11-2012, Primeira Turma, DJE de 13-2-2012.

E, neste toar, diversos foram os julgados do STF que concederam às empresas estatais prestadoras de serviços públicos as mesmas garantias da Fazenda Pública, incluindo a impenhorabilidade de seus bens e pagamento de suas dívidas por precatório.

5.3 – Reexame necessário nas sentenças que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal 

Há aqui uma correção na redação originária do CPC/73, posto que não se julga improcedente processo de execução – haja vista que sua destinação é para a satisfação do crédito e não para chegar a uma decisão meritória. O que se julgava procedente eram os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública.

Segundo Flávio Cheim Jorge, “a remessa terá cabimento quando os embargos do executado forem julgados, no todo ou em parte, procedentes. Os embargos podem ser julgados procedentes porque possuem natureza de ação de conhecimento, que comporta julgamento de mérito, e cuja procedência terá o condão de extinguir o processo de execução, decorrendo daí o prejuízo para o erário, a justificar a remessa” (JORGE, DIDIER E RODRIGUES : 2002, p. 60).

Duas outras hipóteses de embargos, não previstas no art. 496, II, podem causar controvérsias, que são:

a)     embargos à execução propostos pela Fazenda Pública, quando estiver sendo executada;

b)    embargos à execução de crédito da Fazenda Pública que não seja dívida ativa.

Na primeira hipótese, de acordo com forte corrente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e que deverá continuar com o CPC/15, não cabe reexame necessário da decisão do juiz de primeiro grau que julgou totalmente improcedente ou parcialmente procedente os embargos à execução opostos pela Fazenda Pública[10].

Segundo sua exegese, o descabimento do duplo grau obrigatório se deve ao fato de que a norma imperativa do então art. 475 do CPC/73 – cuja redação se destina apenas ao processo de conhecimento e não ao processo de execução[11].

De igual forma e pelo mesmo fundamento, não caberá reexame necessário do julgamento de procedência dos embargos à execução de crédito da Fazenda Pública que não seja dívida ativa, por estar fora da previsão legal.

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Sobre o autor
Pedro Dias Araújo Júnior

Mestre em direito processual civil pela UFS.Pós-graduado em direito constitucional e processual civil pela UFS.Extensão em Common Law no Iuslaw/George Washington Law Scholl. Graduado em direito pela UFPE.Professor universitário.Procurador do Estado de Sergipe.Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO JÚNIOR, Pedro Dias. A remessa necessária no novo CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4633, 8 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46222. Acesso em: 21 nov. 2024.

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