Introdução
O processo cautelar tem como finalidade resguardar e assegurar o bem jurídico em disputa. Como é cediço, o processo poderá ser dividido em duas fases: conhecimento e execução.
Na fase de conhecimento, requer-se o reconhecimento do direito por parte do autor. Nela, a cognição deverá ser exauriente, de forma que todos os meios de prova possíveis deverão ser utilizados para formar o convencimento do magistrado, que declarará em uma sentença o detentor do direito, da razão naquilo que está sendo pleiteado.
Declarado o direito e, caso este não seja cumprido espontaneamente, a obrigação deverá ser satisfeita por meio do processo de execução. Em princípio, a execução consiste na expropriação de bens do devedor para a satisfação do direito pleiteado.
Assim, por vezes, diante da demora das duas fases, há o risco do perecimento do bem jurídico tutelado, tonando-se inútil por deteriorização para a parte interessada depois de tanto tempo.
É neste ínterim que temos o processo cautelar, como forma de proteção do bem envolvido no processo. O processo cautelar, portanto, trata de medidas assecuratórias que afastam ou mesmo minimizam os perigos decorrentes da demora com o andamento do processo, para que a satisfação do direito do autor seja concedida.
Destarte, o processo cautelar, visa assegurar a utilidade do processo de conhecimento e do processo de execução, razão pela qual a doutrina entende tratar-se de um “tertium genus”, ou seja, o terceiro gênero.
Deste modo, uma vez que tende a assegurar o resultado útil do processo, o processo cautelar tem caráter instrumental, guardando imprescindível relação com o outro processo principal (conhecimento ou execução). Por isto também importante ressaltar a acessoriedade, ou seja, existência previa de um processo principal de conhecimento, execução ou, ainda, monitório para sua existência. É, por isso, subordinado ao processo principal.
Outra característica do processo cautelar é a preventividade e urgência da medida. Isto porque os efeitos devem ser imediatos.
Demais disso, o processo cautelar é autônomo. Segundo Theodoro Júnior (2004a, p. 84) “A autonomia do processo mais se destaca quando se verifica que o resultado de um não reflete sobre a substancia do outro, podendo, muito bem, a parte que logrou êxito na ação cautelar sair vencida na ação principal ou vice-versa.”
A concessão da cautelar, frisa-se, deve basear-se em prova na exauriente, assim, necessário se faz apenas a aparência do direito, pois a investigação exauriente provocaria irremediável destruição de sua utilidade prática.
Medidas Cautelares
São chamadas de medidas cautelares aquelas providencias jurisdicionais que visam a proteção do bem jurídico tutelado. Assim como as medidas urgentes, as medidas cautelares destinam-se à não ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação.
A medida cautelar pode, ainda, ser revogada ou modificada a qualquer tempo, segundo consta do artigo 807 do Código de Processo Civil. Tal revogabilidade decorre da provisoriedade do processo cautelar. Assim, em desaparecendo a situação fática que levou a concessão da cautela, não há mais que se falar em precaução assegurada por meio de uma medida cautelar.
O poder de cautela do juiz está previsto nos artigos 798 e 799 do CPC, contudo, além das medidas cautelares previstas na lei, o juiz poderá conceder outras que julgar necessárias.
Características gerias do processo cautelar:
{C}1) {C}Urgência;
{C}2) {C}Preventividade da tutela;
{C}3) {C}Sumariedade formal e material;
{C}4) {C}Provisoriedade;
{C}5) {C}Temporariedade;
{C}6) {C}Inexistência de coisa julgada material.
Pressupostos do processo cautelar
Considerando a urgência da concessão da tutela, necessário que se verifique a presença do fumus boni juris e do periculum in mora. Segundo preceitua Humberto Theodoro Junior (2004a, p. 87) é “um dano potencial, um risco que corre o processo de não ser útil ao interesse demonstrado pela parte, em razão do periculum in mora, risco esse que deve ser objetivamente apurável; e a plausibilidade do direito substancial invocado por quem pretenda segurança, ou seja, o fumus boni juris.”
Trata o primeiro da “aparência do bom direito” ou seja, provável existência do direito tutelado no processo principal. É, por conseguinte, uma probabilidade ou uma possibilidade. Já o segundo pressuposto trata do “perigo da demora”. É o risco que o direito corre caso não haja proteção naquele momento.
Classificação das medidas cautelares
Segundo Galeno Lacerda, (1998, p. 11) as medidas cautelares podem ser jurisdicionais ou administrativas. Nas primeiras, decorrem de uma ação e uma sentença. Nas segundas, pode ser dividias em voluntarias, quando um pedido e posteriormente a homologação, ou decretadas de oficio pelo juiz.
Contudo, o atual Código de Processo Civil menciona três espécies de medidas cautelares:
{C}a) {C}Inominadas ou atípicas: aquelas que decorrem do poder geral de tutela do juiz (Artigo 798 do CPC).
{C}b) {C}Nominadas ou típicas: previstas nos artigos 813 a 887 do CPC.
{C}c) {C}Outras medidas provisórias: previstas no artigo 888.
O artigo 797 do Código de Processo Civil ainda define as medidas cautelares ex officio, ou seja, aquelas que podem ser concedidas de oficio pelo juiz nas hipóteses taxativas do diploma legal.
As medidas cautelares podem incidir sobre bens ou coisa, provas ou mesmo sobre pessoas. Incidirá sobre bens ou coisas quando visar assegurar a execução e conservar sua existência. Sobre provas quando visar garantir os meios de convencimento. E incidira sobre pessoas quando se fizer necessária para a manutenção da segurança e tranquilidade da pessoa, bem como para a satisfação de suas necessidades.
Insta salientar que as medidas cautelares, via de regra, não geram efeitos satisfativos, sob pena de ferir o princípio do contraditório e a apreciação do mérito do processo.
Assim, apenas é possível afirmar que a tutela cautelar tem caráter conservativo, ao passo que tutelas antecipatórias possuem caráter satisfativo, em que pese ambas tratarem de medidas de urgência.
Diferenças essenciais entre tutela cautelar e tutela antecipada
A tutela cautelar não representa a antecipação da providencia de mérito da ação principal, apenas, como já visto anteriormente, visa assegurar o direito. Por outro lado, a tutela antecipada, por suposto, antecipa o próprio direito.
Ademais, o único objetivo da cautelar é impedir a inutilidade do processo ao seu fim, ao passo que a tutela antecipada, objetiva adiantar o direito.
Para a concessão de medidas cautelar necessário se faz o fumus boni juris, enquanto na tutela antecipada necessário o juízo de probabilidade mais expressivo.
Ainda como visto, a cautelar trata-se de um instrumento que visa assegurar a obrigação, tendo como característica a autonomia com relação ao processo principal. Contudo, a tutela satisfativa é requerida no próprio processo principal.
Por fim, a duração da cautelar é ilimitada e perdura enquanto houver a situação fática que ensejou a sua criação. Já a tutela de urgência, pode perdurar ao longo do tempo, caso a demanda seja acolhida.
Características em comum entre tutela cautelar e tutela antecipada
Ambas são providencias embasadas em provisoriedade e revogabilidade, podendo ser revogadas ou modificadas a qualquer tempo em havendo alteração dos fatos.
Também possuem medidas reversíveis, ao passo que os efeitos concretos gerados podem ser alterados, fazendo as partes retornarem ao estado anterior.
Ressalta-se, ainda, que o pedido de antecipação dos efeitos da tutela pode ser cumulado com a ação cautelar.
Por vezes torna-se muito difícil a distinção entre ambas tutelas, motivo pelo qual o artigo 273, §7º do Código de Processo Civil estipulou a possibilidade da aplicação do princípio da fungibilidade para matéria. Desta forma, é possível o deferimento de medida cautelar em processo em que o autor formulou pedido de antecipação de tutela.
Em que pese a possibilidade da fungibilidade, verifica-se que a doutrina não é unânime quando se trata de reconhecimento de tutela antecipada quando formulado pedido de medida cautelar. Sustentam alguns doutrinadores que não seria possível a concessão do mais, quando pedido o menos, tendo em vista a maior exigência conferida pela medida antecipatória.
Ação cautelar
As mesmas condições da ação e os pressupostos processuais de desenvolvimento valido e regular do processo são exigidos para ação cautelar. Assim temos: a legitimidade de partes, interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido.
Não se pode confundir as condições especificas caracterizadoras da medida cautelar (fumus boni juris e periculum in mora) com condições da ação. As condições especificadas da medida cautelar não constituem condições da ação cautelar.
Para propositura da ação cautelar, todos os requisitos previstos no artigo 801 do CPC são obrigatórios na petição inicial. Ademais, os requisitos comuns a toda petição inicial, constituídos nos artigos 282 e 283 do mesmo diploma legal serão aplicados de forma subsidiaria quando não incompatíveis com os requisitos específicos da ação cautelar.
Na petição inicial o direito ameaçado deverá ser exposto sumariamente pelo requerente, demonstrando situação de interesse tutelável pela ação principal e que corre o risco de lesão em razão de possível demora do desenvolvimento do processo.
Todas as provas a serem produzidas também devem ser indicadas na petição inicial, conforme consta do artigo 801, V do CPC.
O valor da causa no processo cautelar não corresponde ao dado à causa principal, mas sim ao benefício patrimonial visado pelo requerente da medida.
É possível, ainda a concessão de liminar, em casos excepcionais e urgentes, em havendo possibilidade de o dano se consumar antes da citação do requerido. Tal liminar é viável tanto em caso de procedimento preparatório, quanto em caso de procedimento incidental, de forma que a decisão que examina o pedido liminar é interlocutória, cabendo, assim, Agravo de Instrumento da decisão.
Procedimento cautelar
Segundo o Código de Processo Civil, em seu artigo 796, o procedimento cautelar poderá ser preparatório ou incidental. O primeiro caso ocorrera quando for instaurado antes do processo principal e o segundo quando já houver um processo principal.
A escolha do procedimento dependerá da natureza da medida cautelar pretendida.
Competência
Conforme dispõe o artigo 108 do Código de Processo Civil “a ação acessória será proposta perante o juiz competente para ação principal”. Assim, em se tratando de ação cautelar preparatória o juiz competente será aquele também competente para conhecer da ação principal.
No caso do procedimento incidental, a ação cautelar será distribuída por dependência.
Intervenção de terceiros
De todas as formas de intervenção de terceiros admitidas pelo código, apenas a nomeação à autoria é admitida ao processo cautelar para regularizar a legitimidade para a causa.
Art. 62. Aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor.
Não é admitido no processo cautelar a denunciação à lide ou mesmo o chamamento ao processo, tendo em vista que não há julgamento de mérito. Da mesma forma, inadmissível a aposição.
Espécies de defesa
Após feita a citação do requerido (Artigo 802 do CPC) este terá prazo de 05 dias para se defender, contestando o pedido e indicado as provas que pretende produzir, qualquer que seja o procedimento cautelar em questão. Referido prazo é contado a partir da juntada do mandado de citação devidamente cumprido ou, ainda, da execução da medida cautelar.
As espécies de defesa são: contestação e exceção de incompetência. Não se admite no processo cautelar a reconvenção, justamente porque não há discussão de mérito na cautelar. Entretanto, é possível a formulação de pedido na contestação por parte do requerido para assegurar o direito de ressarcimento dos eventuais danos decorrentes da medida.
Em não havendo oferecimento de defesa por parte do requerido, o juiz poderá, de acordo com o artigo 803 do CPC, em cinco dias decidir a causa. Contudo, em entendendo que não incide os efeitos da revelia ao caso, cuja presunção é relativa, poderá optar por não fazê-lo, determinando audiência para produção de provas. A audiência também poderá ser designada em casos onde houver apresentação de contestação e seja necessária a produção de provas.
Sentença do processo cautelar
Após a instrução, caberá ao juiz proferir sentença, com resultado definitivo, que deverá obedecer, necessariamente, os requisitos essenciais previstos no artigo 458 do Código de Processo Civil.
Saliente-se que o resultado da cautelar poderá ser diverso daquele proferido com relação a ação principal, de forma que, por exemplo, o pedido cautelar poderá ser julgado procedente e o pedido principal improcedente.
Ambos os pedidos ainda podem ser julgados em uma única sentença.
Recursos
Conforme já citado, das decisões interlocutórias proferidas no processo cautelar, será cabível Agravo de Instrumento (Artigo 522 do CPC) que, via de regra, tem apenas efeito devolutivo. Não obstante em alguns casos poderá ser concedido efeito suspensivo ao Agravo apenas nas hipóteses do artigo 558 do Código de Processo Civil.
No caso de sentença, decisão que põe fim ao processo cautelar, caberá recurso de Apelação nos termos do artigo 513 do CPC.
Em casos em que o juiz decide em uma única sentença o processo cautelar e o principal, a apelação será recebida em duplo efeito para a ação principal e somente com efeito devolutivo para a parte da sentença cautelar.
Ainda é cabível Embargos de Declaração contra a sentença proferida no processo cautelar, conforme disposto no artigo 535 e 538 do CPC. Da mesma forma, desde que presentes os requisitos legais, também são admitidos os recursos extraordinário e especial.
Cumprimento de sentença
Apenas as medidas cautelares dão ensejo às sentenças condenatórias passiveis de cumprimento, de forma que as demais exaurem-se em si mesmas.