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Depósito de expurgos inflacionários do FGTS.

Contas já encerradas. Entendimento do STJ

26/12/2003 às 00:00
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Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do RESP 479956, interposto pela Caixa Econômica Federal, reiterou, mais uma vez, seu entendimento quanto a forma de pagamento dos expurgos inflacionários do saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS para as contas encerradas. A jurisprudência do citado Tribunal acerca da matéria já é vasta, cite-se como exemplos os RESP´s 452745, 408423, 424423, 421424, dentre outros. Em todos eles, tem-se entendido que, dada a omissão do artigo 29-A da Lei n.º 8.036/90, os depósitos dos valores devidos, a título de correção inflacionária, nos casos de contas encerradas, devem ser feitos em contas à disposição do juízo da execução e não na conta vinculada do trabalhador, como defende a Instituição Bancária gestora do Fundo.

Antes de adentrar o mérito do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, faz-se necessário um breve lançar de olhos sobre a origem do FGTS.

O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, trazido pela Lei n.º 5.107, de 13 de setembro 1966, foi instituído, de início, como uma alternativa ao sistema de estabilidade decenal contido no artigo 462 [1] da Consolidação das Leis do Trabalho. Assim, era facultado aos trabalhadores optar pelo, então novo, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço ou pela estabilidade decenal. O FGTS é uma "poupança" do empregado, uma reserva feita por depósitos do empregador, que só pode ser sacada em situações especificadas em lei, como nos casos de demissão sem justa causa. Sua criação objetivou proteger o empregado de demissões injustificadas, na medida em que sua dispensa desmotivada autoriza a liberação da quantia existente em sua conta de FGTS.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, a estabilidade decenal foi extinta, de modo que todos os trabalhadores, a partir de então admitidos, estão sujeitos ao sistema do Fundo de Garantia.

O saldo da conta vinculada, enquanto vigente a Lei n.º 5.107/66, era corrigido de acordo com parâmetros fixados pelo Sistema Financeiro da Habitação. Todavia, com a promulgação da Lei n.º 7.839, de 12 de outubro de 1989, que revogou sua antecessora, preservando o direito à incidência de juros e correção monetária sobre as contas vinculadas, atrelou-se a correção monetária aos índices de correção das cadernetas de poupança. Esse critério foi mantido pela Lei n.º 8.036, de 11 de maio de 1990, atualmente vigente.

A novela dos expurgos inflacionários da conta vinculada de FGTS teve início, em junho de 1987, com o advento do Plano Bresser, o primeiro de uma lista de malfadados Planos Econômicos: Verão (janeiro/1989), Collor I (abril e maio de 1990) e Collor II (janeiro de 1991).

Não compete fazer aqui, nesse trabalho, uma narrativa minuciosa ou mesmo uma explicação da detalhada argumentação acerca de cada plano econômico e seus efeitos (ou ausência deles) sobre a correção da conta vinculada. Fato é, que, não obstante tenha sido pleiteada, desde o início, a concessão dos expurgos inflacionários referentes aos 4 (quatro) planos citados, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento, em 31.8.00, do RE n.º 226855-7 [2], interposto pela Caixa Econômica Federal, entendeu pelo cabimento, tão somente, das correções referentes aos Planos Verão (janeiro/1989) e Collor I, somente quanto ao mês de abril de 1990.

Desde então, cada vez mais trabalhadores tem buscado, junto ao Poder Judiciário, o pagamento das diferenças oriundas dos expurgos inflacionários incidentes na conta vinculada do FGTS, não obstante o Governo Federal tenha editado, em 26.9.01, a Lei Complementar n.º 110 que possibilitou, ao titular da conta vinculada ou seus dependentes, firmar acordo com a Caixa Econômica Federal, de modo a possibilitar o pagamento administrativo dos valores devidos.

Com as reiteradas decisões do Superior Tribunal de Justiça, o pagamento dos expurgos tem-se dado de duas maneiras: mediante depósito na conta vinculada, quando essa estiver ativa, ou em conta à disposição do juízo de execução, quando se tratar de conta encerrada. O inconformismo da Caixa Econômica diante dessas vertentes não se sustenta.

De leitura da Lei n.º 8.037/90 verifica-se que seu texto é omisso quanto à regulamentação dos depósitos para contas já encerradas. Todavia, o fato do legislador não tratar do assunto não leva à lógica conclusão de que as contas ativas, movimentadas ou encerradas devam ser tratadas da mesma maneira.

O pivô da recente batalha é o artigo 29-A - introduzido pela Medida Provisória n.º 2.197-43/01 – cujo conteúdo dispõe que "quaisquer créditos relativos à correção dos saldos das contas vinculadas do FGTS serão liquidados mediante lançamento pelo agente operador na respectiva conta do trabalhador".

O indigitado dispositivo não faz menção a contas já encerradas, ao contrário, de acordo com entendimento do Ministro José Delgado, Relator do RESP n.º 421424/PR [3], ao utilizar-se da expressão "na respectiva conta do trabalhador", o legislador tratou, tão somente, das contas ativas, visto que o encerramento dessa pressupõe sua inexistência, restando impossível depositar quaisquer valores em contas inexistentes.

Resta, então, a dúvida: se a lei é omissa quanto às contas já encerradas, qual o fundamento do Superior Tribunal de Justiça para o entendimento de que o depósito há que ser feito em conta à disposição do juízo?

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A resposta está no artigo 126 do Código de Processo Civil: "O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais, não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito".

Ao deparar-se com a omissão do legislador, no tocante ao procedimento de pagamento de créditos do saldo de FGTS para contas já encerradas, os Ministros do Superior Tribunal de Justiça, procedendo de acordo com o dispositivo do Codex processual, supriram a lacuna legislativa existente, estabelecendo que o depósito há que ser feito em contas à disposição do juízo, fundamentando seu posicionamento, também, no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei n.º 4.657/42), cujo conteúdo determina que, "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum".

A abertura de uma nova conta vinculada ou a reutilização de uma já extinta não é uma solução que vise o bem comum. Ao sujeitar o trabalhador a uma nova conta vinculada, estar-se-ia sujeitando-o, novamente, aos ditames da Lei n.º 8.036/90, impondo-lhe restrições que não devem mais ser aplicáveis ao seu caso.

A solução que vem sendo aplicada, pelo Superior Tribunal de Justiça, nesses casos, possibilita, ao trabalhador já afastado do regime do FGTS, escapar da burocracia imposta pela Lei n.º 8.036/90 e receber, mais rapidamente, um crédito que já lhe é devido há mais de 13 anos. Não obstante a CAIXA tenha lutado em sentido contrário, o Poder Judiciário tem buscado, na medida possível, minimizar os efeitos dessa espera, possibilitando, com decisões como essa, a célere efetivação de um direito já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal.


Notas

01. "Art. 462. O empregado que contar mais de 10 (dez) anos de serviço na mesma empresa não poderá ser despedido senao por motivo de falta grave ou circunstância de força maior, devidamente comprovada."

02. " EMENTA: Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. Natureza jurídica e direito adquirido. Correções monetárias decorrentes dos planos econômicos conhecidos pela denominação Bresser, Verão, Collor I (no concernente aos meses de abril e de maio de 1990) e Collor II. - O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), ao contrário do que sucede com as cadernetas de poupança, não tem natureza contratual, mas, sim, estatutária, por decorrer da Lei e por ela ser disciplinado. - Assim, é de aplicar-se a ele a firme jurisprudência desta Corte no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico. - Quanto à atualização dos saldos do FGTS relativos aos Planos Verão e Collor I (este no que diz respeito ao mês de abril de 1990), não há questão de direito adquirido a ser examinada, situando-se a matéria exclusivamente no terreno legal infraconstitucional. - No tocante, porém, aos Planos Bresser, Collor I (quanto ao mês de maio de 1990) e Collor II, em que a decisão recorrida se fundou na existência de direito adquirido aos índices de correção que mandou observar, é de aplicar-se o princípio de que não há direito adquirido a regime jurídico. Recurso extraordinário conhecido em parte, e nela provido, para afastar da condenação as atualizações dos saldos do FGTS no tocante aos Planos Bresser, Collor I (apenas quanto à atualização no mês de maio de 1990) e Collor II."

03. "ADMINISTRATIVO. FGTS. CORREÇÃO MONETÁRIA. PERCENTUAIS DOS EXPURGOS INFLACIONÁRIOS DOS PLANOS GOVERNAMENTAIS. LEI 8.036/90, ART. 29-A. MEDIDA PROVISÓRIA 2.197-43/2001. CONTAS ENCERRADAS. LACUNA LEGAL. ART. 126, DO CPC. APLICAÇÃO. PAGAMENTO MEDIANTE DEPÓSITO EM CONTA À DISPOSIÇÃO DO JUÍZO.

1. A Lei 8.036/90, em seu artigo 29-A, e em qualquer de seus dispositivos, não se refere e nem regula, de qualquer modo, o procedimento a ser adotado na realização de depósito de diferenças de atualização monetária de FGTS quando a conta do trabalhador já estiver encerrada.

2. Sendo a lei absolutamente omissa sobre a matéria litigiosa, caracteriza-se lacuna legal, que desafia a solução inscrita no art. 126, do Código de Processo Civil.

3. O pagamento relativo às diferenças de correção do FGTS, na hipótese de contas já encerradas, ou de ter havido o seu levantamento, deverá ser realizado mediante depósito à disposição do juízo, descabendo, portanto, a abertura de novas contas vinculadas com este propósito.

4. Recurso especial conhecido, mas desprovido." (Data do Julgamento: 27.8.02 – 2º Turma – Publicado no DJ de 23.9.02)

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Sobre a autora
Andréa Bueno Magnani

advogada em Brasília (DF), pós-graduanda em Direito Processual Civil pela UniDF

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAGNANI, Andréa Bueno. Depósito de expurgos inflacionários do FGTS.: Contas já encerradas. Entendimento do STJ. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 173, 26 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4679. Acesso em: 2 nov. 2024.

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