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Projeto básico nas licitações públicas.

Lei nº 8.666/93: art. 6º, IX e X

26/01/2004 às 00:00
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PLANEJANDO COMPRAS, SERVIÇOS E OBRAS

Planejar a licitação constitui um dever inafastável de todo agente em qualquer esfera da administração pública devendo tal modo de proceder ser observado por cada órgão ou ente que integre a sua estrutura e que se encontre submetido às normas da Lei 8.666/93. Definir o objeto a ser licitado, indicando as suas características básicas e gerais, bem como os quantitativos a serem fornecidos no certame, torna-se indispensável ao regular processamento da licitação e ao pleno alcance de seus fins.

Quando se trata da compra de bens, a Lei cuida, em seus arts. 14 e 15, das etapas que devem ser observadas. Ao referir-se à contratação de serviços, identificados estes como toda atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a administração (art. 6º, II), torna-se necessário discriminar de forma detalhada o que se pretende, providenciando, para esse efeito, a confecção de projeto básico e/ou executivo quando se trate especificamente de obras e serviços de engenharia.

Disso decorre, todavia, a necessidade de refletir-se sobre o conteúdo do art. 7º da Lei 8.666/93, assim como acerca da definição alusiva a tais instrumentos de planejamento e de definição do objeto da licitação que se consideram necessários. A exigência alusiva à prévia confecção de projeto básico e/ou executivo, aplicam-se a todos os tipos de serviços, ou se adaptam apenas aos serviços de engenharia? Ao se tratar de outros serviços e não havendo como elaborar-se projetos básico e/ou executivo, incumbe à administração adotar outros mecanismos de planejamento? Quais seriam tais instrumentos?

O enfrentamento de tais questões exige necessariamente que se busque identificar os conceitos que em lei se inscrevem a respeito de tais espécies, delimitando o âmbito de sua aplicação e, por meio disso, ofertando respostas às indagações anteriormente formuladas, o que se passa a fazer.


A EXIGÊNCIA ALUSIVA À ELABORAÇÃO DE PROJETOS BÁSICO E EXECUTIVO

Colhe-se, no bojo do art. 6º, inciso IX, que o projeto básico é identificado como "o conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução,... ", devendo, ainda, incorporar elementos que se vêem explicitados de forma detalhada com vista a caracterizar bem o objeto pretendido pela administração.

Dentre tais elementos, impõe-se a necessidade de desenvolver a solução escolhida de forma a fornecer visão global da obra e identificar todos os seus elementos constitutivos com clareza; identificar "os tipos de serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorporar à obra", de ter-se "informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos, instalações provisórias e condições organizacionais para a obra" etc.

Ao definir a lei o que entende como projeto executivo fixa orientação de sentido de corresponder este ao "... conjunto dos elementos necessários e suficientes à execução completa da obra, de acordo com as normas pertinentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT", relacionando-se, como se pode ver, a obra (art. 6º, X).

Conclusão que necessariamente se extrai de tais disposições legais é que tais definições e as exigências a ela relacionadas não se compatibilizam com outros serviços, estando voltadas a regular obras e serviços de engenharia. Isso exige do hermeneuta e do aplicador da lei atenção para evitar que, distorcendo o que se contempla na norma, venha a dificultar o processamento das licitações encarecendo o objetivo almejado, afrontando o princípio de economicidade, ou passe a visualizar irregularidades onde não há, apenas criando embaraços ao administrador que se vê às voltas com questões de respostas óbvias.

Ao examinar, assim, as exigências inscritas no art. 7º da Lei 8.666/93, incluído em seção que se volta a regular a contratação de "obras e serviços" não se pode entender que a sequência ali prevista, onde se estabelece a necessidade de ter-se projeto básico e projeto executivo para só após executar as obras e serviços, esteja voltada a outros serviços que não os de engenharia.

De igual modo e com esse objetivo se deve compreender as obrigações previstas no art. 7º, § 2º, incisos I a IV, onde se renova a orientação alusiva ao projeto básico e se acrescenta exigências relacionadas a orçamento detalhado em planilhas, previsão de recursos orçamentários e produto contemplado nas metas do plano plurianual.

Tais normas – e isto ressumbra induvidoso e indiscutível - não se compatibilizam a todo e qualquer serviço, distanciando-se da boa técnica e da interpretação possível qualquer orientação que, ao se referir a outros serviços, refira-se à necessidade de projeto básico e de orçamento detalhado quando não se esteja cuidando de obras e serviços de engenharia.

O que não se pode olvidar é que a lei exige o planejamento prévio da contratação, devendo a administração ter o cuidado de detalhar aquilo que pretende contratar, descrevendo-o de forma minuciosa no edital, ou detalhando em memorial descritivo, ou simplesmente providenciando a elaboração de um projeto (e apenas isto) voltado e compatibilizado à área de conhecimento de que se cuide. Quem não discrimina o que pretende contratar, termina por contratar o que não desejava!

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Os ensinamentos que a respeito se colhe na doutrina especializada são voltados a afirmar que "Na verdade, a melhor interpretação da Lei 8.666, de 1993, é no sentido de que a exigência de projeto básico refere-se fundamentalmente a obras e serviços de engenharia. O mesmo se pode dizer com referência ao projeto executivo (art. 7º, II). Muitos outros serviços podem ser licitados sem a exigência de projeto básico, desde que seu objeto esteja perfeitamente caracterizado e descrito. Isto vale não só para serviços técnicos especializados (que não sejam de engenharia), como para outros bastante simples, como os de limpeza de edifícios públicos, vigilância etc.". [1]

Idêntica orientação é acolhida por MARÇAL JUSTEN FILHO que, referindo-se ao tema em comento, assevera que "O art. 7º tem de ser interpretado em termos. Sua redação retrata, uma vez mais, as concepções fortemente relacionadas com o campo da engenharia. É claro que "projetos básico e executivo" são figuras relacionadas exclusivamente com obras e serviços de engenharia.... " [2]

Não cabe, como se pode ver, falar em projeto básico e em condições típicas para a contratação de obras e serviços de engenharia, quando se tratar de outros serviços, especializados ou comuns. É sempre necessário ter um adequado planejamento do que se pretende contratar, indicando de forma detalhada o objeto e as diversas etapas, de modo a ter-se como formular proposta compatível com o que é desejado pela administração.


Notas

01. Meirelles, Hely Lopes. "Licitação e Contrato Administrativo". 12ª ed. – São Paulo: Malheiros Editores,1999. p. 42/43.

02. "Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos". 8ª ed. São Paulo: Dialética, 2000. p. 109/110.

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Sobre o autor
Airton Rocha Nobrega

Advogado inscrito na OAB/DF desde 04.1983, Parecerista, Palestrante e sócio sênior da Nóbrega e Reis Advocacia. Exerceu o magistério superior na Universidade Católica de Brasília-UCB, AEUDF e ICAT. Foi Procurador-Geral do CNPq e Consultor Jurídico do MCT. Exerce a advocacia nas esferas empresarial, trabalhista, cível e pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NÓBREGA, Airton Rocha Nobrega. Projeto básico nas licitações públicas.: Lei nº 8.666/93: art. 6º, IX e X. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 204, 26 jan. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4736. Acesso em: 3 mai. 2024.

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