Os novos contornos da coisa julgada no CPC/2015

27/03/2016 às 15:34
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Neste artigo será tratado a forma pela qual o Novel Diploma trata esta garantia processual constitucional.

1.Aspectos Gerais

A Coisa Julgada pode ser entendida como uma garantia constitucional, contida no artigo 5º, XXXVI da Constituição Federal, que ao revestir uma decisão de mérito, esta torna-se imutável, não podendo mais ser discutida seja por meio de um recurso ordinário tal como a Apelação ou por um recurso extremo tais como os Recursos Especial e Extraordinário.

Assim, pode-se afirmar que  a coisa julgada atua como expressão do princípio da segurança jurídica, um dos pilares do Estado de Direito, eis que proporciona a efetivação da imutabilidade e indiscutibilidade do conteúdo contido em decisão de mérito.

No CPC/2015 houve o aprimoramento de tal garantia, a partir do momento em que seu Artigo 502 fala define a coisa julgada material como a autoridade que torna indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso, abandonando a expressão utilizada pelo CPC/1973, que fazia menção à coisa julgada como eficácia da sentença.

Assim, infere-se que, ao desvincular a ideia de coisa julga de eficácia de sentença, há a possibilidade de que decisões interlocutórias possam adquirir a autoridade de coisa julgada, como é verificado na decisão parcial de mérito, prevista no artigo 356 do NCPC, onde Transitando em julgado essa decisão interlocutória, ela terá eficácia definitiva nos termos do parágrafo 3º do artigo 356 do NCPC. Logo, Em coerência com tais regras, atribui-se à interlocutória de mérito transitada em julgado a autoridade de coisa julgada: o artigo 502 alude genericamente a “decisão de mérito”, em vez de “sentença”.

Pontua-se, ainda que enquanto pender ou ainda couber qualquer recurso ou reexame necessário contra a decisão, não há seu trânsito em julgado nem, consequentemente, coisa julgada.

A coisa julgada não se confunde com os efeitos sentenciais. Ela confere imutabilidade ao comando do qual se extraem os efeitos da sentença. Portanto, é um plus em relação aos efeitos, conferindo-lhes estabilidade. Além disso, A coisa julgada não imutabiliza os efeitos da sentença, mas apenas o comando sentencial de que eles provêm, pois se a relação jurídico-material for disponível, as partes, mesmo depois do trânsito em julgado, podem desconsiderar, modificar ou extinguir os efeitos da sentença, não se permitindo, entretanto, é que o Poder Judiciário emita nova sentença entre as mesmas partes e sobre o mesmo objeto.

2.Espécies de Coisa Julgada

São duas as espécies de Coisa Julgada: Formal e Material.

Contudo, vale lembrar que a coisa julgada consiste sempre na imutabilidade e indiscutibilidade do comando da decisão sobre o qual ela recai. O atributo de formal ou material é do comando, e não da coisa julgada.

Por comando formal, entende-se como aquele que se limita a encerrar o processo (ou sua fase cognitiva), ao passo que comando material é o que repercute sobre a esfera jurídico-substancial dos jurisdicionados (condenando, declarando, constituindo, mandando...).

Deste modo, por Coisa Julgada Formal consiste na proibição de reabertura e redecisão de um processo já encerrado (ou da fase cognitiva processual já encerrada), de forma que, toda sentença, seja de mérito ou não, faz coisa julgada formal, pois sempre veicula comando que encerra o processo como um todo ou sua fase cognitiva, nos termos do parágrafo 2º do artigo 203 do NCPC.

Por sua vez, a coisa julgada que recai sobre o comando material, ou simplesmente Coisa Julgada Material, proíbe que, mesmo em outro processo entre as mesmas partes, ele seja revisto. Por isso, é comum dizer-se que apenas as sentenças de mérito fazem coisa julgada material.

Ainda, destaca-se que a Coisa Julgada Material é incompatível com a cognição superficial de mérito. A decisão proferida nessas condições não se perpetua, sendo tão apenas provisória. Como exemplo de decisões que não fazem Coisa Julgada Material estão a tutela antecipada concedida em caráter antecedente, mesmo quando estabilizada por falta de impugnação recursal do réu e a decisão concessiva de mandado monitório não embargada. Tal incompatibilidade também é expressa pelo parágrafo 2º do artigo 503 do NCPC.

  1. Limites da Coisa Julgada

Os limites da Coisa Julgada podem ser analisados levando em conta 3 aspectos: os limites territoriais, objetivos e subjetivos.

  1. Limite Territorial

O limite territorial da coisa julgada está contido no artigo 16 do NCPC ao definir que a jurisdição civil é exercida pelos juízes e pelos tribunais em todo o território Nacional.

Logo, a coisa julgada decorrente do julgamento de determinado caso concreto existe, é válida e eficaz em todo o território brasileiro.

Por sua vez, a coisa julgada estrangeira somente terá implicações sobre o sistema jurídico nacional após a homologação da sentença produzida em outro país pelo STJ.

Já a coisa julgada internacional relaciona-se a decisões oriundas de cortes internacionais, e a sua eficácia no Brasil dependerá tão somente da adesão de nosso país a tratados ou convenções internacionais, sendo que diferentemente da sentença estrangeira, não precisará passar pelo procedimento de homologação.

  1. Limite Objetivo

Os limites objetivos da coisa julgada são definidos, de regra, pelo dispositivo da sentença, não se estendendo aos motivos (ainda que importantes determinar o alcance da parte dispositiva da sentença) e a verdade dos fatos estabelecida como fundamento da decisão, ou seja, a coisa julgada atinge apenas as questões decididas em caráter principal, como dispositivo da sentença, e não a motivação sentencial, ainda que importante para determinar o alcance de sua parte dispositiva, por força do que dispõe o artigo 504 do NCPC. Além disso, a coisa julgada não atingirá também verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença.

O artigo 503, caput, traz que a decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida, ou seja, nos termos do artigo 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, uma vez constituída a Coisa Julgada, nem mesmo uma lei poderá desconstituí-la.

            3.2.2. Questão Prejudicial e Limite Objetivo da Coisa Julgada

O artigo 503, em seu parágrafo 1º, traz que a Coisa Julgada poderá atingir às questões prejudiciais incidentes no processo, ou seja, as questões atinentes à existência, inexistência ou modo de ser de uma relação ou situação jurídica que, embora sem constituir propriamente o objeto da pretensão formulada (mérito da causa), são relevantes para a solução desse mérito.

A Coisa Julgada incidirá sobre tais questões já decididas expressa e incidentemente no processo, contanto que:

  • Dessa resolução depender o julgamento do mérito;
  • A seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;
  • O juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.

Assim, em contraste com o CPC/1973, ao prever tais hipóteses, o CPC/2015 não prevê mais, como figura geral, a ação declaratória incidental para a solução de questões prejudiciais, havendo hipótese dessa ação prevista especificamente para a declaração de falsidade de documento.

Deste modo conclui-se que a grande novidade do CPC/2015 nesta seara não está em estender-se a coisa julgada à fundamentação, mas sim em dispensar-se a ação declaratória incidental para que o juiz possa proferir comando sobre a questão prejudicial.

Todavia, ainda no que diz respeito à questão prejudicial, o parágrafo 2º do artigo 503 do NCPC, traz que tais hipóteses somente poderão ocorrer caso no processo não haja restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial.

  1. Limite Subjetivo

Por limite subjetivo entende-se por quais pessoas estarão vinculadas à coisa julgada formada, não podendo mais discuti-la.

Pela regra contida no artigo 506 do NCPC, a coisa julgada só opera perante as partes do processo em que ela se estabeleceu, sendo assim uma imposição das garantias do acesso à justiça, devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

Porém tal limitação não impede que os efeitos da decisão de mérito atinjam Terceiros, que poderão atingidos pelos efeitos sentenciais na proporção em que se relacionem com o objeto do litígio, podendo ter benefícios ou desvantagens, mas não ficarão impedidos de discutir em demanda própria aquele mesmo objeto processual, na medida em que detenham legitimidade e interesse para tanto, tais como os terceiros intervenientes, terceiros titulares de direitos comuns ou de direitos ou ações concorrentes e do substituto processual.

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  1. Eficácia Preclusiva da Coisa Julgada

Por preclusão entende-se pela perda de uma faculdade ou poder processual no curso do processo, que pode ser ocasionada:

  • pelo decurso do prazo, ou pela passagem da fase processual, para exercício do poder ou faculdade (preclusão temporal);
  • pelo anterior exercício do poder ou faculdade (preclusão consumativa);
  • pela prática de ato logicamente incompatível com o exercício do poder ou faculdade (preclusão lógica).

Assim, o artigo 507 do NCPC disciplina que é vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão.

Além disso, o NCPC traz em seu artigo 505 que os poderes do juiz também estão sujeitos à preclusão, onde o magistrado mão poderá decidir novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo se tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença ou nos demais casos previstos em lei como o juízo de retratação em apelação em agravo de instrumento em agravo interno e em julgamentos dos tribunais, a possibilidade de correção de erros materiais, a possibilidade de eliminação de omissões, contradições e obscuridades mediante embargos declaratórios, dentre outros exemplos.

Vale pontuar que as faculdades das partes podem submeter-se às três modalidades de preclusão anteriormente referidas. Os poderes do juiz, em regra, submetem-se apenas à preclusão consumativa.

Assim, em todos os casos em que é dado ao juiz redecidir a questão no curso do processo, não incide a regra do artigo. 507 hipóteses em que se permite às partes pleitear ao juiz tal redecisão.

Por fim, o artigo 508 do NCPC traz que transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido. Ou seja, tal regra proíbe que a parte invoque alegações que poderia oportunamente ter feito e não fez como uma saída para desconsiderar a coisa julgada, já que esta traz consigo o veto à apresentação tardia de argumentos que teriam sido relevantes se oportunamente apresentados.

5.Coisa Julgada e Negócio Jurídico Processual

A coisa julgada está fora do âmbito de disponibilidade das partes. Mesmo que o réu não argua sua existência, cumpre ao juiz conhecê-la de ofício. Por isso, não é possível um negócio jurídico processual que elimine a coisa julgada ou lhe diminua o alcance. Mas, observados os requisitos do art. 190 do CPC, as partes podem convencionar a obrigação de não rediscutir pronunciamentos e questões que não estão abrangidos pela coisa julgada.

Referências Bibliográficas:

OAB/PR, AASP – Código de Processo Civil Anotado. 2015

OAB/RS, ESA – Novo Código de Processo Civil Anotado. Porto Alegre. Rio Grande do Sul, 2015

ROQUE, Nathaly Campitelly – in Vade Mecum Jurídico. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

TARTUCE, Fernanda – Resumão Jurídico – Novo CPC. 1 ed. 4ª Tiragem. São Paulo: Barros Fischer e Associados, Novembro de 2015.

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Sobre o autor
Renan Buhnemann Martins

Advogado (OAB/SP 376.997). Bacharel em Direito pela Universidade São Judas Tadeu. Diretor do Departamento Jurídico da ACAAPESP - Associação dos Consultores, Assessores e Articuladores Políticos do Estado de São Paulo

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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