Lavagem de capitais (Lei 9.613/98):do crime e das técnicas de investigação

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03/04/2016 às 15:52
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6.       DA COLABORAÇÃO PREMIADA

A lei trouxe a Colaboração Premiada, que é a técnica especial de investigação por meio da qual o acusado, em troca de determinado prêmio legal, não só confessa o delito como também presta informações relevantes sobre o fato delituoso.

Art. 1º (...)

§ 5º A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la (Independentemente da observância do art. 44 CP), a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, OU à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.

Em que pese a lei mencionar a colaboração não precisa ser necessariamente espontânea, bastando que seja voluntária. Não há necessidade de que a colaboração permita a identificação dos autores, conduzam à apuração dos crimes e localização de bens. Basta que ocorra apenas uma dessas possibilidades para que o indivíduo seja beneficiado pela colaboração premiada. 


7.       DA  AÇÃO CONTROLADA

Nos termos do art. 4º-B da Lei 9.613/98, o magistrado poderá suspender ordem de prisão de pessoas ou das medidas assecuratórias quando  das medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores, quando a sua execução imediata puder comprometer as investigações.

Art. 4º-B. A ordem de prisão de pessoas ou as medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores poderão ser suspensas pelo juiz, ouvido o Ministério Público, quando a sua execução imediata puder comprometer as investigações.

A Ação controlada tem por função permitir o magistrado identificar outros criminosos ou outros crimes que dificilmente seriam descobertos caso a ordem de prisão ou de medidas acautelatórias fossem cumpridas de plano.


8. DAS MEDIDAS ACAUTELATÓRIAS 

O Artigo 4º da nova lei trouxe um rol de medidas assecuratórias que possibilitam assegurar futuro confisco do produto ou proveito do crime, reparação ao ofendido (incluindo o próprio Estado), penas pecuniárias, custas e despesas processuais. Podem ser decretadas ex officio, a requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial, durante a investigação ou da Ação Penal. Para tanto, deve haver indícios suficientes da ocorrência de qualquer crime antecedente de lavagem de dinheiro. Vejamos o que diz o texto legal:

Art. 4º O juiz, de ofícioa requerimento do Ministério Público ou mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público em 24 (vinte e quatro) horas, havendo indícios suficientes de infração penal, poderá decretar medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes previstos nesta Lei ou das infrações penais antecedentes. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

§ 1o  Proceder-se-á à ALIENAÇÃO ANTECIPADA para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção.  

§ 2o  O juiz determinará a liberação total ou parcial dos bens, direitos e valores quando comprovada a licitude de sua origem, mantendo-se a constrição dos bens, direitos e valores necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal.  

§ 3o  Nenhum pedido de liberação será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado ou de interposta pessoa a que se refere o caput deste artigo, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores, sem prejuízo do disposto no § 1o.

§ 4o  Poderão ser decretadas medidas assecuratórias sobre bens, direitos ou valores para reparação do dano decorrente da infração penal antecedente ou da prevista nesta Lei ou para pagamento de prestação pecuniária, multa e custas.  

Até mesmo a indisponibilidade de bens poderá ser decretada para viabilizar a reparação dos danos, conforme já decidiu o STF:

 “O Tribunal, resolvendo questão de ordem, indeferiu pedido de substituição de numerário apreendido por garantia real, formulado em inquérito no qual se apura a suposta prática dos crimes de lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98), contra a ordem tributária e econômica (Lei 8.137/90), e contra o sistema financeiro nacional (Lei 7.492/86). Tendo em conta que o dinheiro apreendido constitui, em tese, a própria materialidade do crime de lavagem – visto que dentre as cédulas apreendidas algumas possuem numeração sequencial e outras foram atestadas como falsas – entendeu-se aplicável o art. 4.º da Lei 9.613/98, que admite o bloqueio cautelar de bens, direitos ou valores, na forma dos arts. 125 e 144 do CPP, desde que reputados como o próprio objeto do crime de lavagem. Asseverou-se, também, que a medida acautelatória que se decreta no curso de procedimento penal pelo crime de lavagem de dinheiro não se restringe a assegurar o direito dos lesados, de terceiros ou da própria União (Lei 9.613/98, art. 7.º, I), mas tem por finalidade essencial coibir a própria continuidade delitiva. Ressaltou-se, ademais, que, em se tratando de inquéritos policiais e instruções criminais da espécie, o numerário retido perde sua condição usual de bem fungível, e que a Lei 9.613/98 não prevê a substituição dos bens, direitos ou valores apreendidos. Por fim, considerou-se não vencido o prazo de 120 dias de que trata o § 1.º do art. 4.º da mesma lei, já que, por estarem inconclusas as diligências requeridas pela Procuradoria-Geral da República, não se poderia iniciar a contagem do lapso temporal” (Inq 2248 QO/DF, Pleno, rel. Carlos Britto, 25.05.2006, Informativo 428, grifamos)


9. DA COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO

À luz do artigo 109, IV, da Constituição Federal, compete aos juízes federais processar e julgar os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral.

Já o art. 2º da Lei 9.613/98 diz que:

Art. 2º (...)

III – são da competência da Justiça Federal:

a) Quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;

b) Quando a infração penal antecedente for de competência da Justiça Federal.

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CONCLUSÃO

A evolução das técnicas utilizadas pela criminalidade para esconder a origem ilícita de dinheiro e bens oriundos de crimes reclama resposta à altura por parte do Legislador. A nova lei 12.683/12 facilitou a descoberta e punição destes delitos, notadamente pela obrigação de pessoas físicas e jurídicas colaborarem com a Justiça identificando e denunciando operações suspeitas às autoridades.

Ponto bastante polêmico é a obrigatoriedade de comunicação pelos advogados de operações suspeitas de seus próprios clientes. Em que pese o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil conferir o direito de sigilo ao advogado, se os serviços advocatícios forem prestados pelo advogado no sentido de se indicar a melhor e mais eficaz forma de se ocultar valores obtidos a partir de uma infração penal, é perfeitamente possível que o advogado venha a responder criminalmente pelo delito de lavagem de capitais.   Em nome da “Teoria da Cegueira Deliberada”, ainda, o indivíduo não poderá se furtar à responsabilidade criminal fazendo questão de desconhecer a origem dos valores ou bens por ele mascarados.

Por fim, a nova lei trouxe técnicas de investigação bastante úteis, como a Ação Controlada, que consiste no retardamento deliberado da execução de prisões para identificar o maior número de criminosos bem como outros crimes. Ainda, as medidas acautelatórias visam garantir a responsabilidade patrimonial pelos prejuízos sofridos pelo sujeito passivo do crime.

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Sobre o autor
Heitor Carvalho Silva

Advogado Criminalista em Sumaré/SP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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