Considerações acerca da psicopatia

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Prisão perpetua a brasileira

Como bem sabemos, a constituição federal em seu art. 5º, inciso XLVII, alínea “b, veda a pena de caráter perpétuo, por afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana. Porém, existem determinados indivíduos, que representam verdadeiro perigo a sociedade, devido à falta de tratamento eficaz para os seus transtornos, ao ponto de se tornar unanimidade na comunidade médica e jurídica que após cumprido a prazo máximo de internação ou prisão, voltaram a praticar os mesmos atos selvagens que os levaram ao sistema prisional.

Em razão da vedação tratada no parágrafo anterior, atualmente os operadores do direito, tem enfrentado verdadeiro desafio positivo, no que se refere ao que fazer com os indivíduos com transtornos como a psicopatia, por representarem eterna ameaça à sociedade civil organizada.

Tratamento dado aos psicopatas pelo Estado

O estado brasileiro, através dos seus operadores do direito, tem se mostrado verdadeiro mágico, ante a falta de previsão legal especifica de parte das medidas que vem tomando. O que se tem visto é a verdadeira aplicação do chamado “jeitinho brasileiro”, na aplicação da lei, ante a ausência de previsão legal especifica, e a necessidade de proteger a sociedade de determinados indivíduos que não possuem reabilitação.

Pena Privativa de Liberdade.

Sendo este o tratamento penal, dado a grande maioria dos criminosos, se mostra a medida menos eficaz quando se refere aos psicopatas, uma vez que o psicopata não assimila a punição, não poderá ser ressocializado, uma vez que entende não precisar ser ressocializado. Sendo o contato entre este tipo de indivíduo e os demais presos altamente perigoso, em razão do fato dos psicopatas terem perfil dominador, podendo se tornar verdadeiros chefões dentro do ambiente carcerário, transformando os demais detentos, em cumpridores de ordens emanadas de um ser desprovido de características que definem o homem, enquanto ser humano. Assim leciona Morana sobre o tema:

“Eles têm o perfil adequado para se tornar os chefões da cadeia e os líderes de rebeliões. Podem transformar os outros 80% dos presos em massa de manobra. ‘Além de recriarem o inferno na cadeia, atrapalham a ressocialização dos detentos que podem ser recuperáveis’”

Caso a estes indivíduos seja aplicada a pena privativa de liberdade, o STF por entender, que os mesmos representam verdadeiro perigo a sociedade, entende não ser recomendado a liberação deste apenado antes do cumprimento integral da pena.

Medida de Segurança

Esta tem sido o primeiro tratamento dado pelo Estado aos indivíduos com psicopatia, esta medida leva em consideração o grau de periculosidade do indivíduo, devendo a medida perdurar enquanto não cessar a periculosidade, que será auferida por regulares testes médicos. O código penal brasileiro não estipula prazo máximo para a medida de segurança, apenas o prazo mínimo que será de 1 a 3 anos.

Os indivíduos que são agraciados com aplicação desta medida, vivem em um verdadeiro limbo jurídico, ante a ausência de previsão legal da pena máxima. Porém em razão da lacuna legal, o judiciário brasileiro, ante a omissão do legislativo, exercendo o fenômeno do ativismo judicial, por intermédio do STJ, no ano de 2015, editou a súmula 527 do STJ, que impõe como limite máximo da referida medida, o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado.

Porém tal medida também se monstra ineficaz quando se trata dos psicopatas, em razão de sua duração depender do grau de periculosidade, caso o mesmo cesse, o indivíduo poderá ser posto em liberdade, e como sabemos os psicopatas possuem o poder de ludibriar e manipular as pessoas, podendo enganar os profissionais de saúde.

Ante a ausência de previsão legal da pena máxima, esta medida assim como a internação civil, que será abordada no momento oportuno, são consideradas como verdadeiras penas perpétuas.

Interdição Civil

Após o cumprimento da medida de segurança, em razão da limitação dada pela súmula 527 do STJ, o estado deveria liberar o indivíduo, porém a psicopatia por se tratar de transtorno incurável, e sendo incontroverso que em liberdade, este sujeito irá repetir as práticas delituosas que o levarão ao sistema prisional. O Ministério Público de São Paulo, em face da ausência de previsão legal, teve de recorrer a outra esfera do direito, se utilizando do instituto da interdição civil compulsória, previsto no art. 1767 do código Civil e Lei 10.216/01. Entre os casos de maior comoção social, temos o caso Chico do Picadinho, e o caso Champinha.

Com relação ao caso Champinha, em breve síntese, relembramos o caso. Em 2003, Roberto Aparecido Alves Cardoso, o Champinha, com 27 anos atualmente, chocou o Brasil, ao ter participado da tortura e homicídio de Felipe Caffé e pela tortura e estupro de Liana Friedebach, no ano de 2003, quando tinha apenas 16 anos. Na época, foi diagnosticado com psicopatia, após cumprir os três anos máximos de internação previstos no ECA, deveria ter sido liberado. Porém, diante da constatação do seu transtorno, optou por interdita-lo civilmente, uma vez que não poderia continuar preso e nem cumprir medida de segurança, posto que era menor de idade. Em recente HC negado pelo STJ, o ministro Luis Felipe Salomão, da 4ª Turma do STJ, em seu voto, assim fundamentou seu voto, a favor da manutenção da interdição, “- não há constrangimento ilegal na internação do jovem e que o Estado não pode ser ‘mero espectador’ diante de quem coloque em risco a si e a outros”.

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Porém, não se poderia colocar Champinha, em uma unidade hospitalar comum, assim como não poderia ir para as unidades hospitalares destinadas aqueles que cumprem medidas de segurança. Diante desta questão, foi criada a primeira Unidade Experimental de Saúde (UES), situada na capital de São Paulo, no baixo de Pari, destinada ao tratamento psiquiátrico. Por não se tratar de medida de segurança, não existem parâmetros legais rotineiros, que aufiram o grau de periculosidade, e tão pouco previsão de saída, ante a ausência de previsão legal, a verdade é que estes interditados, vivem num limbo jurídico, onde não existe legalidade, onde o improviso e o achismo prevalecem.


Conclusões

Pode-se concluir que o poder legislativo optou por se omitir, obrigando o judiciário a assumir o papel de legislador às avessas, usurpando função que não lhe foi incubida, o que resultou em uma política criminal totalmente despreparada voltada para o indivíduo psicopata, optando-se pela segregação, atendendo assim o clamor social.

Entende-se ser medida acertada a segregação, porém se faz necessário o fortalecimento da psiquiatria forense, com o emprego de profissionais qualificados, que acompanhem todas as etapas da segregação. Conclui-se também que o criminoso psicopata deverá ser acompanhado até o final de sua vida, pois é fato notório que é impossível ressocializa-lo, indicasse o uso de tornozeleras eletrônicas, para auxiliar nesta tarefa. Por fim, ressalta-se que a garantia constitucional de liberdade do psicopata não deve ser superior a garantia constitucional do direito a segurança da coletividade, por esta razão entendemos que quando confrontados, deverá se optar pelo interesse da segurança da coletividade.


Referências

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BANHA, Nathalia Cristina Soto. A resposta do Estado aos crimes cometidos por psicopatas. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XI, n. 59, nov 2008. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5321>. Acesso em jan 2016.

Especial Psicopatas, na Mente e Cérebro n. 254, O mito da autoestima

HARE, Robert. Nem todo psicopata é criminoso. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/nem-todo-psicopata-e-criminoso-1bmo1ch228at17e9feuo9suoe>. Acesso em: 19 jan. 2016.

KAPLAN, H. B.; SADOCK, B. J.; GREBB, J. A. Compêndio de psiquiatria: Ciências do comportamento e psiquiatria clínica. Porto Alegre: Artes Médicas, 2003.

MORANA, H. C.; STONE, M. H.; FILHO, E. A. Transtornos de personalidade, psicopatia e serial killers. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 28, p. 74-79. 2006.

SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes Perigosas - O Psicopata Mora ao Lado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008. 218 p.

ZYLBERKAN, Mariana. Dez ano depois, o que fazer com Champinha?. Revista Veja. Dez. 2013. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/dez-anos-depois-o-que-fazer-com-champinha/.> Acesso em jan 2016.

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Sobre a autora
Vivianne Aguiar Machado C. Nogueira

Estudante de Direito da Universidade Federal do Maranhão e, em breve, futura profissional da área.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

O presente estudo se perfaz sobre questões atinentes a psicopatia, enaltecendo o comportamento e questionando conceitos sobre as mais diversas queatões, buscando esclarecer de forma simples e coesa o que se passa nas mentes sombrias destes indivíduos

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