A (in)constitucionalidade da ampliação do rol dos crimes de competência do Tribunal do Júri

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Este trabalho procura deslindar a questão relacionada a (In)Constitucionalidade numa possível ampliação do rol de competência do Tribunal do Júri, utilizando para isso da doutrina, da norma jurídica e de trabalhos científicos.

INTRODUÇÃO

Neste trabalho procura-se estudar e compreender a (In)Constitucionalidade da ampliação do rol de competência do Tribunal do Júri e para alcançar tal percepção, necessário faz-se um breve estudo a respeito da história do Tribunal do Júri no Brasil. Através deste, a elucidação e abstração do conteúdo tornar-se-á mais fácil e agradável.

Surgimento do Tribunal do Júri no Brasil

            O tribunal do Júri, no Brasil, foi instituído em 18 de junho de 1822 pela iniciativa do Senado do Rio de Janeiro com atribuição de julgar, apenas, os crimes de imprensa. Era composto por 24 membros, os quais eram denominados como “juízes de fato”. Seus integrantes eram considerados homens bons, honrados, inteligentes e patriotas sendo que, sua nomeação era atribuição a cargo do Corregedor, em atendimento a requerimento feito pelo Procurador da Coroa e Fazenda.

Neste contexto inicial, o réu tinha o direito de recusar 16 dos 24 indicados podendo ainda apelar da decisão para a clemência real, cuja apreciação do recurso cabia ao Príncipe, única pessoa capaz de alterar a sentença.

Advento da Constituição de 1824

Com a promulgação da Constituição de 1824, o Tribunal do Júri, passou a integrar o Capitulo Único, do título 6º (que trata do Poder Judiciário, dos juízes e dos Tribunais de justiça)dos juízes e dos Tribunais de justiça), em seu art. 152, logo transcrito: "Os Jurados pronunciam sobre o facto, e os Juizes applicam a Lei". Ou seja, ele passou a atuar tanto em ações cíveis como criminais, art. 151 "O Poder Judicial independente, e será composto de Juizes, e Jurados, os quaes terão logar assim no Civel, como no Crime nos casos, e pelo modo, que os Codigos determinarem".

Lei de 20 de Setembro de 1830

Em seus: título III, "Da Eleição dos Jurados, e Promotores do Jury"; título IV, Do Jury de Acusação"; título V DO Jury de Julgamento" e, título VI que dispõe sobre Disposições Gerais" regulamentou o exercício do Tribunal do Júri, sua maneira de formação, suas atribuições, dentre outras.

É notório o poder que tal órgão possuía ao se observar os títulos IV e V dessa lei. Vez que, não era apenas um tribunal e sim dois. Os arts. 23 e 24, respectivamente, dizem que formar-se-á um novo júri para a apreciação da lide. Podendo estar acompanhado ou não de advogado.

Art. 23. Se a decisão fôr affirmativa, a sentença declarará que ha lugar a formar-se accusação, e ordenará nos casos do art. 2º §§ 1º 2º, que o responsavel seja posto em custodia, e que se sequestrem (qualquer que seja o objecto da denuncia) os impressos, escriptos, ou gravuras denunciadas.

 Art. 24. Apresentado o processo accusatorio ao Juiz de Direito, este mandará notificar o accusado, para que, por si ou por seu procurador, ou conjunctamente, compareça no lugar determinado para o segundo Jury.
 

O CPC de 1832

Este código trouxe a inovação do recurso, nele descreve-se para quem se poderia recorrer; sobre o que poderia recorrer e, também qual o prazo para recorrer. Ele manteve a prática de dois tribunais de júri sendo um de acusação e o outro de sentença/julgamento.

Lei 261/41

Essa lei foi promulgada em 03 de dezembro de 1941 e aboliu o tribunal do júri, conforme as palavras de Franklyn Roger Alves Silva em sua Monografia, ela acabou

fortalecendo a figura do juiz sumariante e da autoridade policial, ... Foi além, alterando o quorum necessário, que no caso de pena de morte, até então era unanimidade, passando a ser de dois terços, enquanto que as demais decisões poderiam ser tomadas por maioria absoluta. No caso de empate, adotava-se a decisão mais benéfica ao réu.

Podiam compor o júri todos aqueles que fossem eleitores, aos quais deveriam possuir bom senso, pautar-se pela probidade. Entretanto, ficavam excluídos de tal função àqueles que ocupassem cargo de Senador, conselheiro e ministro de Estado, autoridades militares, administrativas e judiciais.

Constituição Republicana

Promulgada em 24 de fevereiro de 1891, foi a 1ª Constituição promulgada. Sendo que, no art. 72, §31 manteve a instituição do júri.

Art.72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes:

...

§ 31. É mandida a instituição do jury.

De acordo com as palavras do ilustre Roberto Bartolomei Parentoni, o tribunal do júri é constitucional pois,

A Constituição Cidadã, quando faz referência à plenitude de defesa, está incluindo nesse princípio o direito à composição heterogênea do Conselho de Sentença. A necessidade de se ter um corpo de jurados que seja representativo dos diversos segmentos da sociedade brasileira justifica a inserção na legislação infraconstitucional de normas autorizando às partes a recusa de jurados sem motivar (art. 459 §2º CPP).

Através dessa Constituição Federal, o Tribunal do Júri, foi alçado ao status de Garantia Individual.

Constituição Federal de 1946

Publicada em 18 de setembro de 1946. Foi através dessa Constituição Federal que a soberania dos vereditos foi implantanda. Isso consta do do art. 141,§28 da referida CF.

  Art 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

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 § 28 - É mantida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, contanto que seja sempre ímpar o número dos seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude da defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatoriamente da sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Constituição Federal de1988

Na Constituição de 1988, o Legislador, expressamente colocou o Tribunal do Júri, em certa posição de superioridade ao dispô-la no art. 5º, XXXVIII, deixando-a como cláusula pétrea. Senão, vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

Com isso, claro está que foi intencional sua inserção no núcleo intangível e, de acordo com o art. 60, § 4º da CF, não se pode dispor , ou seja, suprimir aquilo que ali está posto.

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

...

§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

...

IV - os direitos e garantias individuais.

Todavia, o legislador nada dispôs sobre o acréscimo de competência ao Tribunal do Júri.

Nas palavras de Demercian e Maluly(2014, p.506), "a única regra ampliativa está no art. 78, I, do CPP, que estabelece a vis attractiva do júri nas hipóteses de conexão ou continência com outras infrações penais comuns.

Corroborando ao todo exposto, Roberto Bartolomeu Paretoni diz:

"A atual Carta Magna não só o manteve no rol das garantias fundamentais, mas também cuidou de torná-lo intangível ao elevá-lo à condição de cláusula pétrea. .... A Constituição expressamente limita o poder derivado de reformar esse que é um instituto pertencente aos direitos e garantias individuais. O legislador constituinte originário entendeu que ao Tribunal do Júri deveria ser dado um status tal que lhe seja limitada a possibilidade de sua extinção ao arbítrio do poder de reforma derivado. Qualquer discussão a respeito da exclusão do Tribunal do Júri só poderá se dar numa nova constituinte que promulgue originariamente nova constituição. Além da limitação expressa contida no artigo 60, existe ainda uma limitação implícita ao poder reformador. Portanto, o detentor do poder constituinte derivado não poderá lançar mão do artifício da supressão do citado artigo para depois abrir caminho para propostas de emenda à cláusula pétrea.

            Constitucionalmente, temos apenas uma proibição à redução, seja de que forma for, de Cláusula Pétrea. Entretanto, não há nada que imponha obstáculos à ampliação do rol dos crimes de competência do tribunal do júri.
CONCLUSÃO

O Júri é a expressão da cultura de um povo e uma fonte inesgotável de novas teses e discussões jurídicas, seja no campo do Direito Material, seja no aspecto processual. No direito brasileiro, por exemplo, o Tribunal Popular é uma realidade, ele foi mantido na Carta Magna de 1988, e se acha enumerado entre os direitos e garantias individuais.

A supressão é notadamente inconstitucional porém, a extensão, de suas competências, em nada agride a Constituição. Pode ocorrer. Desde que, nos parâmetros estabelecidos pelo CPP.

REFERÊNCIAS

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei_sn/1824-1899/lei-37987-20-setembro-1830-565654-publicacaooriginal-89402-pl.html.

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www.idecrim.com.br/index.php/artigos/57-tribunal-do-juri.

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-29-11-1832.htm

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM261.htm.

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao46.htm.

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao91.htm

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm.

BRASIL, 2016. Disponível em: http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/103317/lei-263-48.

BRASIL, 2016. Disponível em: http://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=6373b58b-39ec-4648-8fed-837e155b76ff&groupId=10136.

DEMERCIAN, Pedro Henrique e MALULY, Jorge Assaf. CURSO DE PROCESSO PENAL. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

ISHIDA, Válter Kenji. PRÁTICA JURÍDICA PENAL. 8. ed. Sâo Paulo: Atlas, 2015.

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Sobre as autoras
Marli Lima

Graduanda do Curso de Direito na Faculdade de Ilhéus -Cesupi.

Taiana Levinne Carneiro Cordeiro

Advogada criminalista, professora de penal e processo penal da faculdade de Ilhéus/BA, professora de cursinho preparatório para concurso, especialista em processo penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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