O descrédito das rescisões indiretas dos contratos de trabalho

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21/04/2016 às 18:30
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O presente trabalho aborda uma importante garantia aos empregados, prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a possibilidade de rescindir o seu contrato de trabalho por justa causa do empregador, conhecida como Rescisão Indireta.

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RESUMO

 

O presente trabalho aborda uma importante garantia aos empregados, prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): a possibilidade de rescindir o seu contrato de trabalho por justa causa do empregador. Conhecida como Rescisão Indireta ou Despedida Indireta, tem fundamento no artigo 483 da CLT, que estabelece um rol de possibilidades de o empregado pleitear a rescisão do contrato de trabalho, com o recebimento integral das verbas rescisórias. Embora seja um instituto de grande importância e que objetiva a proteção do empregado contra eventuais abusos do empregador, a rescisão indireta vem caindo em descrédito perante o judiciário, pois muitos empregados, quando se sentem insatisfeitos na empresa apelam para a rescisão indireta ao invés do tradicional pedido de demissão, objetivando o recebimento das verbas rescisórias. Porém, na maioria das vezes, os pedidos são infundados, com o intuito de obter vantagem, ludibriando o Poder Judiciário com provas precárias. Na prática, o que tem acontecido é que quando o empregado quer se desligar da empresa e não consegue fazer um “acordo rescisório”, prática essa considerada ilegal, ele busca o judiciário ajuizando uma reclamação trabalhista, através de um advogado, na tentativa de caracterizar uma falta grave que, de fato, não ocorreu e, assim, obter todas as verbas rescisórias.

 

Palavras chaves: Rescisão Indireta, Consolidação das Leis do Trabalho, Contrato de Trabalho, Abusos do Empregador, Descrédito, Reclamações Trabalhistas, Falta Grave.

Sumário

Pág.

INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 08

1 BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS TERMOS EMPREGADOR E EMPREGADO EXPRESSOS NA CLT ..................................................................... 09

 

2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO QUE MELHOR SE CORRELACIONAM COM A RESCISAO INDIRETA .............................................. 13

2.1 Princípio da Proteção ......................................................................................... 14

2.1.1 Princípio da In Dúbio Pro Operário .................................................................. 14

2.1.2 Princípio da Condição mais Benéfica .............................................................. 15

2.1.3 Princípio da Aplicação da Norma mais Favorável ........................................... 16

2.2 Princípio da Irrenunciabilidade (Indisponibilidade) dos Direitos Trabalhistas .... 17

2.3 Princípio da Primazia da Realidade ................................................................... 18

2.4 Princípio da Proibição da Despedida Arbitrária ou Sem Justa Causa ............... 19

2.5 Princípio da Continuidade da Relação de Emprego .......................................... 19

2.6 Princípio da Intangibilidade Salarial ................................................................... 20

 

3 A RESCISÃO INDIRETA DOS CONTRATOS DE TRABALHO .......................... 22

3.1 Apresentação das alíneas do art. 483 da CLT ............................................... 22

3.1.1 Alínea “a”:forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato”............................................ 22

3.1.2 Alínea “b”:for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo” ................................................................................................. 24

3.1.3 Alínea “c”: “Correr perigo manifesto de mal considerável” ............................ 24

3.1.4 Alínea “d”:Não cumprir o empregador as obrigações do contrato”.............. 24

3.1.5 Alínea “e”: “Praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama” ....................................................... 26

3.1.6 Alínea “f”:O empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem” ................................................. 26

3.1.7 Alínea “g”: “O empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários” ....................... 27

 

4 O DESCRÉDITO DAS RESCISÕES INDIRETAS DOS CONTRATOS DE TRABALHO ............................................................................................................. 29

4.1 Exemplos práticos e jurisprudenciais do descrédito das Rescisões Indiretas..................................................................................................................... 34

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 39

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 40

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo discutir acerca do descrédito encontrado atualmente na rescisão indireta ou despedida indireta do contrato de trabalho, ocorrida quando o empregador pratica falta grave prevista no artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, motivando o empregado a rescindir o contrato de trabalho.

Para tanto, principia-se no capítulo 1, por breves considerações acerca dos termos Empregado e Empregador, conforme expressos pela CLT.

Dando sequencia ao trabalho, explana-se no capítulo 2 sobre os Princípios do Direito do Trabalho que melhor se correlacionam a rescisão indireta dos contratos de trabalho.

O capítulo 3 aborda a rescisão indireta do contrato de trabalho através da apresentação do artigo 483 da CLT e cada uma de suas alíneas e parágrafos

Por fim, o capítulo 4 aborda o tema central deste trabalho, o descrédito das rescisões indiretas dos contratos de trabalho, apontando exemplos práticos e trazendo jurisprudências que evidenciam o problema objeto deste trabalho.

O objetivo deste trabalho foi demonstrar que as ações trabalhistas que pleiteiam o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho têm caído no descrédito, uma vez que na maioria dos casos o empregador não concorreu com culpa alguma para a rescisão indireta, não conseguindo o empregado provar o alegado perante a justiça do trabalho.

 

 

 

 

1 BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS TERMOS EMPREGADOR E EMPREGADO EXPRESSOS NA CLT

 

Para que se possa entender o que é a Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho, cabe primeiramente entender os termos empregador e empregado, apresentados na CLT.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)[1] define em seu artigo 2º o conceito de empregador, in verbis:

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa individual ou coletiva, que assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.

§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para fins exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

O referido artigo apresenta quais são as características próprias e típicas dos empregadores: os riscos econômicos do negócio são exclusivamente do empregador (é quem assume os riscos); critérios pessoais para admissão do empregado (é ele quem admite); o trabalho se realiza mediante pagamento de salário (assalaria); a direção (dirige) do trabalho desenvolvido, que deve ser prestado pessoalmente, ou seja, exclusiva e unicamente pelo contratado, não podendo tal prestação ser delegada ou repassada a terceiros (prestação pessoal de serviços).

Já nas palavras de NASCIMENTO[2]:

Empregador é todo ente para quem uma pessoa física prestar, com pessoalidade, serviços continuados, subordinados e assalariados. É por meio da figura do empregado que se chegará à do empregador, independentemente da estrutura jurídica que tiver.

 

 

No que diz respeito aos riscos da atividade econômica, este também é conhecido como alteridade, definido pelo dicionário Aurélio[3] como “qualidade que é do outro”, ou seja, em termos práticos, característica exclusiva do empregador.

Corrobora nesse sentido os ensinamentos da ilustre Vólia Bomfim Cassar[4]:

O contrato de trabalho é dotado de alteridade já que o empregado presta serviços por conta alheia (do empregador). Em outras palavras, quem corre os riscos do negócio, da execução e do próprio contrato de trabalho é o empregador exclusivamente, estando o empregado isento de qualquer responsabilidade sobre os prejuízos da empresa.

O § 1º do art. 2º da CLT traz exceção do particular, equiparando à condição de empregador àqueles que denominam, particularmente, bem como, de maneira genérica, “outras instituições sem fins lucrativos”

O § 2º do art. 2º da CLT, em consonância ao § 1º, amplia o conceito do que seja empregador de maneira a viabilizar a responsabilização plural, em caráter solidário, das empresas que tenham entre si vinculo jurídico, ainda que uma só delas figure como sujeito típico da relação de emprego. 

Destarte, do outro lado da relação de emprego, em contraponto à figura do empregador, temos o empregado, que por sua vez não assume qualquer risco econômico inerente à atividade desenvolvida; geralmente passa por um processo de seleção antes de ser contratado; recebe salário como contraprestação ao labor prestado; é subordinado ao empregador e, por fim, presta o trabalho pessoalmente.

Vejamos o que dispõe o art. 3º e parágrafo único, da CLT:

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Parágrafo único – Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.

Nesse sentido, preleciona DELGADO[5]:

O conceito legal de empregado está lançado no art. 3º, caput, da CLT. O preceito celetista, entretanto, é incompleto, tendo de ser lido em conjunto com o caput do art. 2º da mesma Consolidação, que esclarece que a prestação pelo obreiro há de ser pessoal. Acoplados nos dois preceitos, encontram-se reunidos os cinco elementos componentes da figura sociojurídica de empregado. Empregado é toda pessoa natural que contrate, tácita ou expressamente, a prestação de seus serviços a um tomador, a este efetuados com pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação.

Dessa forma, empregado é a pessoa contratada para prestar serviços para um empregador, numa carga horária definida, mediante salário. O serviço necessariamente tem de ser subordinado, qual seja o empregado não tem autonomia para escolher a maneira como realizará o trabalho, estando sujeito às determinações do empregador.

O disposto no parágrafo único do art. 3º da CLT, assegurando a igualdade de tratamento (isonomia), vem respaldado por norma constitucional, qual seja, o inciso XXXII, art. 7º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88):

Art. 7º - CRFB/88 - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos.

 

Destarte, cabe salientar ainda que há restrição de aplicação dos preceitos da CLT, ressalvadas disposições expressas em contrário, conforme aduz o art. 7º, in verbis:

 

Art. 7º - CLT - Os preceitos constantes da presente Consolidação, salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam:

a. aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que prestam serviços de natureza não-econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas;

b. aos trabalhadores rurais, assim considerados aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas à agricultura e à pecuária, não sejam empregados em atividade que, pelos métodos de execução dos respectivos trabalhos ou pela finalidade de suas operações, se classifiquem como industriais ou comerciais;

c. aos funcionários públicos da União, dos Estados e dos Municípios e aos respectivos extranumerários em serviço nas próprias repartições;

d. aos servidores de autarquias paraestatais, desde que sujeitos a regime próprio de proteção ao trabalho que lhes assegure situação análoga à dos funcionários públicos.

 

Assim, dispõe a alínea “a” que ao empregado doméstico não são aplicáveis os preceitos da CLT, cuja relação é regida por legislação específica própria e pelo parágrafo único, art. 7º, da Constituição Federal.

A alínea “b” do art. 7º da CLT foi tacitamente revogada pelo art. 7º, “caput”, da Constituição Federal, que estabeleceu condição de igualdade entre o trabalhador urbano e o trabalhador rural.

As alíneas “c” e “d” tratam de funcionários públicos (servidores públicos) que estejam subordinados a regime jurídico próprio, ou seja, cuja relação jurídica não seja regida pela CLT. Observe que aos empregados públicos (espécie do gênero servidor público), cujas relações contratuais têm natureza jurídica eminentemente trabalhista, encontram-se subordinados aos preceitos da CLT, observando-se algumas restrições e peculiaridades, haja vista que são aplicáveis a estas relações as normas de direito administrativo que, pelo imperativo da prevalência do interesse público, não raro, exorbitam e derrogam as normas do direito comum.

2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO QUE MELHOR SE CORRELACIONAM COM A RESCISAO INDIRETA

O Direito do Trabalho é um ramo do direito composto por um conjunto de regras e princípios que regulam as relações de trabalho.

Conforme os ensinamentos de MARTINS[6]:

Os princípios são proposições básicas que fundamentam as ciências. Para o Direito, o princípio é seu fundamento, a base que irá informar e inspirar normas jurídicas. Em outras palavras, são um conjunto de padrões de conduta presentes de forma explícita ou implícita no ordenamento jurídico.

Os princípios são aplicados na falta de uma disposição legal, onde serão aplicados conforme o caso.

O saudoso doutrinador Amauri Mascaro Nascimento[7] leciona em sua obra:

Os Princípios serão aplicados à falta de disposições legais ou contratuais. Vale dizer que aos Princípios cabe o papel de orientar a exata compreensão das normas cujo sentido é obscuro. Porém, havendo norma jurídica para solucionar o caso concreto, esta é que deve ser aplicada. Os Princípios atuariam, como a equidade e a analogia, para que se complete o ordenamento jurídico em face das lacunas da lei. Os Princípios têm várias funções: informadora, normativa e interpretativa, sendo que a função informadora serve de inspiração ao legislador e de fundamento para as normas jurídicas. A função normativa atua como uma fonte supletiva, nas lacunas ou omissões da lei. A função interpretativa serve de critério orientador para os intérpretes e aplicadores da lei.

 

 

Portanto, os princípios desempenham uma importante função no Direito do Trabalho e nos demais ramos do Direito, quais sejam de orientar o legislador na fundamentação das normas jurídicas e, consequentemente, suprir as lacunas omissas na lei.

Quanto aos princípios específicos do Direito do Trabalho que se correlacionam com a Rescisão Indireta, estes serão tratados a seguir.

2.1 Princípio da Proteção

 

 É o princípio do  direito do trabalho que visa a proteção da parte considerada hipossuficiente, ou seja, o trabalhador.

A doutrinadora Alice Monteiro de Barros[8] aponta que:

O principio da proteção é consubstanciado na norma e na condição mais favorável, cujo fundamento se subsume a essência do Direito do Trabalho. Seu propósito consiste em tentar corrigir desigualdades, criando uma superioridade jurídica em favor do empregado, diante da sua condição de hipossuficiente.

Já para Amauri Mascaro Nascimento[9] apud (PLÁ RODRIGUES, 2000, p. 83):

No direito do trabalho há um princípio maior, o protetor, diante da sua finalidade de origem, que é a proteção jurídica do trabalhador, compensadora da inferioridade em que se encontra no contrato de trabalho, pela sua posição econômica de dependência ao empregador e de subordinação às suas ordens de serviço. O direito do trabalho, sob essa perspectiva, é um conjunto de direitos conferidos ao trabalhador como meio de dar equilíbrio entre os sujeitos do contrato de trabalho, diante da natural desigualdade que os separa, e favorece uma das partes do vínculo jurídico, a patronal.

O princípio da proteção se subdivide em três outros princípios, quais sejam:

2.1.1 Princípio do In Dúbio Pro Operário

De acordo com o referido princípio, na dúvida, ao se interpretar uma lei, deve-se fazer da forma que seja mais favorável ao empregado.

Dessa maneira, GARCIA[10] preleciona que:

De acordo com o in dúbio pro operário, na interpretação de uma disposição jurídica que pode ser entendida de diversos modos, ou seja, havendo dúvida sobre o seu efetivo alcance, deve-se interpretá-la em favor do empregado. Não se trata, no entanto, de alterar o significado claro da norma, nem se permite atribuir sentido que, de modo nenhum, possa ser deduzido da disposição.

Corrobora nesse sentido os ensinamentos do doutrinador CARVALHO[11]:

                                      Sobre a regra in dúbio pro operário, devemos frisar que se trata de técnica de interpretação: quando a norma permite interpretação dúbia ou mais de uma interpretação, deve prevalecer aquela que aproveita ao trabalhador. É importante relembrar que o direito do trabalho surgiu como uma técnica de proteção ao obreiro que, por ser economicamente hipossuficiente, estava por ajustar condições indignas de trabalho, aviltantes para o ser humano. Em princípio, toda norma trabalhista parte desse mesmo pressuposto e, se mais de um sentido lhe couber, é de preferir-se aquele que justifica a sua existência, ou seja, privilegia-se a exegese que se mostra apta a oferecer uma condição mais justa de trabalho.

Assim, tal princípio dá ao aplicador da Lei, na dúvida quanto à interpretação da norma, a escolha entre as interpretações legais viáveis, sendo que a norma a ser aplicada deverá ser a mais benéfica ao trabalhador.

2.1.2 Princípio da Condição Mais Benéfica

O Princípio da Condição Mais Benéfica, objetiva proteger situações pessoais mais vantajosas que se incorporam ao patrimônio do empregado por força do próprio contrato, de forma expressa ou tácita. É a garantia de preservação, ao longo do contrato, da cláusula contratual mais vantajosa ao trabalhador.

São exemplos deste princípio o art. 468 da CLT:

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

Assim como as Súmulas 51, I e 288 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), conforme veremos a seguir:

Súmula nº 51 do TST: NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 163 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. (ex-Súmula nº 51 - RA 41/1973, DJ 14.06.1973)

Súmula nº 288 do TST: COMPLEMENTAÇÃO DOS PROVENTOS DA APOSENTADORIA (inserção do item II à redação) - Res. 193/2013, DEJT divulgado em 13, 16 e 17.12.2013

I - A complementação dos proventos da aposentadoria é regida pelas normas em vigor na data da admissão do empregado, observando-se as alterações posteriores desde que mais favoráveis ao beneficiário do direito.

II - Na hipótese de coexistência de dois regulamentos de planos de previdência complementar, instituídos pelo empregador ou por entidade de previdência privada, a opção do beneficiário por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do outro.

No mesmo sentido, DELGADO (2015, p.205) leciona que:

Este princípio importa na garantia de preservação, ao longo do contrato, da cláusula contratual mais vantajosa ao trabalhador, que se reveste do caráter de direito adquirido (art. 5º, XXXVI, CF/1988). Ademais, para o princípio, no contraponto entre dispositivos contratuais concorrentes, há de prevalecer aquele mais favorável ao empregado.

Ademais, conforme os ensinamentos de BARROS (2010, p. 182):

A condição mais benéfica se direciona a proteger situações pessoais mais vantajosas que se incorporaram ao patrimônio do empregado, por força do próprio contrato, de forma expressa ou tacita consistente esta ultima em fornecimentos habituais de vantagens que não poderão ser retiradas, sob pena de violação ao art. 468 da CLT.

2.1.3 Princípio da Aplicação da Norma Mais Favorável:

 

Por sua vez, o Princípio da Aplicação da Norma Mais Benéfica aponta que, na hipótese de existência de duas ou mais normas, deve-se aplicar a que for mais favorável ao trabalhador e sua aplicação permite até mesmo afastar a aplicação hierárquica das normas.

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Vejamos o que aponta os ensinamentos de Vólia Bomfim Cassar[12]:

O princípio da norma mais favorável deriva também do princípio da proteção ao trabalhador e pressupõe a existência de conflito de normas aplicáveis a um mesmo trabalhador. Neste caso, deve-se optar pela norma que for mais favorável ao obreiro, pouco importando sua hierarquia formal. Em outras palavras: o princípio determina que, caso haja mais de uma norma aplicável a um mesmo trabalhador, deva-se optar por aquela que lhe seja mais favorável, sem se levar em consideração a hierarquia das normas.

Destarte, GARCIA[13] em sua obra conceitua e mostra a forma de atuação deste princípio:

O princípio da aplicação da norma mais favorável é no sentido de que, havendo diversas normas válidas incidentes sobre a relação de emprego, deve-se aplicar aquela mais benéfica ao trabalhador. Isso significa que, existindo mais de uma norma jurídica válida e vigente, aplicável a determinada situação, prevalece aquela mais favorável ao empregado, ainda que esta norma esteja em posição hierárquica formalmente inferior no sistema jurídico.

Como visto, o referido princípio exprime a ideia diversa daquela da hierarquia das normas com a Constituição Federal em primeiro lugar. No direito do trabalho, a norma a ser aplicada por primeiro é a mais favorável ao trabalhador.

2.2 Princípio da Irrenunciabilidade (Indisponibilidade) dos Direitos Trabalhistas

 

Aduz que ao empregado não é permitido, por simples manifestação de vontade, dispor das vantagens e da proteção que lhe são asseguradas a ordem jurídica e o contrato de trabalho.

Aborda GARCIA (2015, p. 55):

O princípio da irrenunciabilidade significa não se admitir, em tese, que o empregado renuncie, ou seja, abra mão dos direitos assegurados pelo sistema jurídico trabalhista. Sendo assim, as normas que regulam as relações de trabalho não podem ser modificadas livremente pelo empregador, ou seja, não são dispositivas.

 

 

Uma exceção a este princípio está no art. 7º, VI da CRFB/88, que trata da garantia de irredutibilidade do salário, situação excepcionada em caso de convenção ou acordo coletivo de trabalho. Ou seja, tal direito/garantia poderá ser disposta mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho.

Quanto ao assunto, MARTINS[14] aponta:

O art. 9º da CLT é claro no sentido de que “serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos trabalhista”. Poderá, entretanto, o trabalhador renunciar a seus direitos se estiver em juízo, diante do juiz do trabalho, pois nesse caso não se pode dizer que o empregado esteja sendo forçado a fazê-lo. Estando o trabalhador ainda na empresa é que não se poderá falar em renúncia a direitos trabalhistas, pois poderia dar ensejo a fraudes. É possível, também, ao trabalhador transigir, fazendo concessões recíprocas, o que importa um ato bilateral.

Portanto, esse princípio visa impedir que o empregado renuncie a seus próprios direitos trabalhistas.

2.3 Princípio da Primazia da Realidade

 

No direito do trabalho é imprescindível que se investigue a prática, ou seja, o fato concreto ocorrido ao longo da prestação do serviço, independente da vontade eventualmente manifestada pelas partes na respectiva relação jurídica de trabalho.

Neste sentido, o doutrinador Henrique Correia[15] preleciona

De acordo com o princípio da primazia da realidade, a realidade se sobrepõe às disposições contratuais escritas. Deve-se, portanto, verificar se o conteúdo do documento coincide com os fatos. Exemplo: recibo assinado em branco no ato da contratação, posteriormente apresentado em juízo como prova de pagamento das verbas trabalhistas. É óbvio que esse documento não corresponde à verdade dos fatos.

Em síntese, os fatos são mais importantes do que os documentos formais.

2.4 Princípio da Proibição da Despedida Arbitrária ou Sem Justa Causa

 

Esse princípio pode ser encontrado no art. 7º, I da CRFB/88:

 

Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

 O próprio nome já diz muito sobre o princípio. Importante destacar que no dispositivo mencionado há uma exceção, qual seja, a possibilidade de tal dispensa mediante indenização.

Como se observa, o presente artigo prevê que uma norma complementar regulamente a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, a qual ainda não foi promulgada disciplinando a matéria em seu todo, sendo aplicável, até que isso ocorra o art. 10 do ADCT, a seguir anotado:

 

Art. 10 – Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:

[...]

II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:

a) do empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato;

b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

Além de fundamentar o princípio da proteção da despedida arbitrária ou sem justa causa, o inciso I do art. 7.º, da Constituição, fundamenta também o princípio da continuidade da relação de emprego, que será demonstrado a seguir.

2.5 Princípio da Continuidade da Relação de Emprego

 

Como regra geral, presume-se que o contrato de trabalho terá validade por tempo indeterminado.

De tal modo, os contratos a termo, ou seja, por prazo determinado e temporários, somente poderão ser pactuados nas hipóteses previstas em lei.

Há amparo na súmula 212 do TST, que aduz:

Súmula nº 212 do TST: DESPEDIMENTO. ÔNUS DA PROVA (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.

O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado.

Na doutrina, o presente princípio encontra amparo nas palavras da ilustre jurista Vólia Bomfim Cassar (2014, p. 232):

A relação de emprego, como regra geral, tende a ser duradoura, em face da própria natureza humana que impulsiona o homem na busca do equilíbrio e da estabilidade de suas relações em sociedade. Imagina-se que o empregado, quando aceita um emprego, pretenda neste permanecer por tempo indefinido. Esta é a noção de engajamento do empregado na empresa. Em virtude disto, a regra geral quanto ao prazo do contrato de emprego é que este é indeterminado e a exceção é o contrato a termo. Não havendo prova do ajuste de vigência do pacto, a presunção é de que o contrato de trabalho é indeterminado. Deste princípio também decorre a ilação de que o ônus de provar a data e motivo da extinção do pacto trabalhista é do empregador, na forma da Súmula n° 212 do TST.

Assim, o Princípio da Continuidade da Relação de Emprego visa à preservação do emprego, com o objetivo de dar segurança econômica ao trabalhador e incorporá-lo ao organismo empresarial.

2.6 Princípio da Intangibilidade Salarial

 

O salário do trabalhador tem natureza alimentar e, dessa maneira, garantir os recursos necessários ao sustento do trabalhador e de sua família.

A CRFB/88, em seu art. 7º, inciso VI, flexibilizou esse princípio, ou seja, através de convenção coletiva do trabalho e/ou acordo coletivo do trabalho, há a possibilidade de redução salarial, com o intuito de preservar o contrato de trabalho do trabalhador. É importante ressaltar que essa flexibilização trata-se de um procedimento de exceção, senão vejamos:

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo.”

Salienta-se ainda que o presente princípio da intangibilidade salarial proíbe que ocorram descontos ilegais e abusivos no salário do empregado.

Henrique Correia (2015, p. 42) afirma que:

O princípio da continuidade da relação de empregado determina que o contrato de trabalho deva ser firmado por tempo indeterminado, ou seja, não há prazo previamente fixado para seu fim. Aliás, é de interesse público que esses contratos sejam firmados para prazos de longa duração, pois, enquanto o empregado estiver trabalhando, haverá fonte de sustento, garantindo sua dignidade.

 

Assim, o objetivo da proteção oferecida por tal princípio é garantir ao trabalhador perceber a contraprestação a que faz jus por seu trabalho.

 

 

 

 

 

 

3 A RESCISÃO INDIRETA DOS CONTRATOS DE TRABALHO

 

3.1 Apresentação das alíneas do art. 483 da CLT

 

O artigo 483 da CLT prevê a rescisão do contrato de trabalho por iniciativa do empregado, fundamentada na justa causa por infração cometida pelo empregador, conhecida como rescisão indireta ou despedida indireta.

Nesse sentido, nas palavras de GARCIA[16]:

A dispensa indireta se configura por deliberação do empregado, mas ela ocorre em razão de justa causa praticada pelo empregador, tornando inviável ou indesejada a continuidade do vínculo de emprego. Assim, trata-se da hipótese inversa à dispensa com justa causa: enquanto nesta modalidade de terminação do contrato de trabalho a falta grave é praticada pelo empregado, na dispensa indireta a falta grave é praticada pelo empregador. Enquanto na dispensa com justa causa quem decide pôr fim ao contrato de trabalho é o empregador, na rescisão indireta tal deliberação é tomada pelo empregado.

 

Vejamos a seguir as alíneas do art. 483 da CLT.

3.1.1 Alínea “a”:forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato”.

Nesse sentido, no que tange aos serviços superiores às suas forças, a doutrina tem entendido que por força deve-se entender não somente a força física, mas a intelectual, portanto deve ser interceptado em sentido mais amplo.

O renomado doutrinador GARCIA (2014, p. 677) preleciona que:

A exigência de serviços alheios ao contrato, trata-se do caso em que o empregado recebe ordens de desempenhar atividades para as quais não foi contratado, ou seja, divorciadas das funções a serem desempenhadas.

Por Defesos por lei, significa dizer que o empregador não pode exigir que o empregado execute serviços proibidos por lei, tais como por exemplo: o empregador obrigar o empregado menor a executar serviço em local comprovadamente caracterizado como insalubre ou perigoso. (art. 7º, inciso XXXIII, da Constituição Federal).

E é nesse mesmo sentido que preleciona GARCIA (2015, p. 380):

 

Essa hipótese refere-se ao empregador que impõe ao empregado que execute serviços vedados, ou seja, proibidos por lei. Pode-se entender que constitui falta grave a exigência de serviços que a lei proíbe, com o intuito de tutelar o empregado, como as hipóteses de trabalho insalubre, perigoso ou noturno do menor, o qual é proibido pelo art. 7.º, inciso XXXIII, da CF/1988.

Por Contrários aos Bons Costumes, compreende aqueles contrários à moralidade média da Sociedade de acordo com a doutrina trabalhista. Como exemplo: O empregador exige que seu empregado mantenha conjunção carnal com o diretor de uma empresa com a finalidade de fechar um contrato.

Ainda de acordo com Garcia (2015, p. 380):

A referida falta patronal refere-se a exigir que o empregado desempenhe serviços que contrariam as regras morais que norteiam a sociedade, levando em conta o momento e a localidade. Pode existir certa dificuldade em se precisar, exatamente, quais são todos os limites e as regras de bons costumes. Mesmo assim, deve-se adotar o padrão médio de comportamento, respeitado pela sociedade e visto como aceito pela comunidade, ainda que em sua maioria.

Por fim, entende-se que Alheios ao contrato, seria exigir que o empregado execute tarefas para as quais não foi contratado, como por exemplo determinar que o empregado eletricista execute serviço de motorista, ou vice-versa.

Neste caso, GARCIA (2015, p. 380) se posiciona da seguinte maneira:

Refere-se à conduta do empregador que exige do empregado serviços alheios ao contrato de trabalho que foi firmado. Trata-se do caso em que o empregado recebe ordens de desempenhar atividades para as quais não foi contratado, ou seja, divorciadas das funções a serem desempenhadas (o que deve ser interpretado com razoabilidade), como exigir-se da secretária que realize serviço de limpeza, ou ordenar ao professor que exerça função de porteiro.

3.1.2 Alínea “b”:for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo”.

Quando o empregador persegue seu empregado, quando é intolerante ou tem uma implicância, sem justo motivo, para a sua caracterização, o rigor excessivo. A exemplo disso pode-se citar o caso quando o empregador pune com rigor excessivo um empregado em determinada situação e a punição a outro empregado na mesma situação é mais branda.

Vólia Bomfim Cassar (2014, p. 1144), assim preceitua:

Rigor excessivo significa intransigência exagerada, má-educação, maus-tratos, tortura ou falta de cortesia, desproporcionalidade na punição. Muitas podem ser as formas de rigor excessivo dispensadas pelo empregador aos seus empregados, tais como repreensões verbais grosseiras, com requinte de desmerecimento; exagero minudente de ordens e de perfeição na realização das tarefas; punições desnecessárias sucessivas e violentas; maus-tratos; fiscalização afrontosa; impedimento de ausências durante o expediente para ir ao banheiro ou para se sentar.

 

3.1.3 Alínea “c”: “Correr perigo manifesto de mal considerável”

 

Aqui, caracteriza-se quando o empregador exigir trabalho do empregado onde ele possa contrair doença ou em local onde possa colocar em risco, além de sua saúde, a sua integridade física e mental, quando não for inerente à sua função/profissão.

Garcia (2014, p. 678), cita que:

A hipótese em questão indica o empregado que é exposto a situações de perigo e manifesto (ou seja, evidente) de sofrer um mal considerável (quer dizer, relevante), quando não inerentes à atividade contratada.

3.1.4 Alínea “d”:Não cumprir o empregador as obrigações do contrato”

 

Essa alínea merece uma atenção especial em detrimento das demais alíneas, haja vista que é a hipótese mais corriqueira deste artigo, por não cumprir o empregador com suas obrigações, como não efetuar o pagamento de salários, não efetuar o depósito do FGTS, não observar os intervalos de descanso, etc.

Vólia Bomfim Cassar (2014, p. 1146), assim aponta:

A força obrigatória dos contratos decorre do ajuste entre as partes. Entretanto, em termos de Direito do Trabalho a lei e as normas coletivas impõem as cláusulas mínimas do contrato. Portanto, ao admitir o empregado o patrão assume o compromisso de cumprir as obrigações decorrentes de lei, do contrato, de norma coletiva, regulamento interno, ou qualquer outra norma. A falta deve ser grave a ponto de tornar insuportável a continuidade da relação de emprego. Quando a falta for leve, necessita ser reiterada para que se torne mais grave, quando for grave a repetição é desnecessária.

Caracteriza-se quando o empregador não cumpre com as obrigações pactuadas com o empregado ou a que estão obrigados em virtude de lei ou documento coletivo da categoria profissional respectiva, ou ainda, quando o empregador que altera unilateralmente o que foi acordado quanto à função, horário, salário ou local de trabalho em prejuízo ao empregado. Como exemplo, os casos em que o empregador não paga o salário do empregado por mais de três meses (mora contumaz), sem motivo grave e relevante que o justifique.

É nesse sentido que dispõe a jurisprudência do TST:

RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS POR DOIS MESES. CARACTERIZAÇÃO. ART. 483, D, DA CLT. O atraso no pagamento de salários por dois meses autoriza a rescisão indireta do contrato de trabalho, em face não apenas da natureza alimentar da contraprestação do trabalho, mas também e, principalmente, do princípio da proporcionalidade, tendo em vista que, conforme o art. 482, i, da CLT e a jurisprudência pacífica da Justiça do Trabalho, o descumprimento da obrigação contratual elementar do empregado de comparecer ao serviço por período de apenas 30 dias, metade daquele em que a Reclamada, no presente feito, descumpriu seu dever elementar de pagar os salários do Reclamante já é suficiente para caracterização da justa causa por abandono de emprego. Recurso de revista provido.

TST, 6ª T., RR-6/2000-067-02-00.2, Rel. Horácio Senna Pires, DJ 20/10/2006.

É oportuno salientar que o empregado não pode praticar outra falta para reagir à falta do empregador, sob pena de estar caracterizada a culpa recíproca ou poder ser punido (suspensão ou advertência) por esta.

3.1.5 Alínea “e”: “Praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama”

Os atos lesivos da honra e boa-fama que se refere esta alínea são caluniar, difamar ou injuriar o empregado ou alguém de sua família dentro ou fora da empresa.

Nas palavras de Garcia (2015, p. 373):

 

A lesão à honra ou da boa fama refere-se à conduta que afronta direitos de personalidade, no caso, relacionados à imagem e à moral. A honra engloba a modalidade objetiva (reputação) e subjetiva (dignidade, decoro). A boa fama refere-se ao conceito da pessoa diante da sociedade e da comunidade em que vive. Cabe destacar que o ato lesivo (da honra e boa fama) pode ser não só contra o empregado, mas também contra pessoas de sua família. Esta última expressão possui amplitude um pouco indeterminada. De todo modo, certamente que fazem parte da família do empregado o cônjuge, os pais, os filhos e eventuais irmãos; outros familiares, mais distantes, podem ser objeto de incidência da disposição legal, conforme o caso e as suas circunstâncias, demonstrando-se que a lesão é apta a atingir, de modo reflexo, o próprio empregado, tendo em vista a proximidade e intimidade com o referido familiar.

Por exemplo, o empregador deixa o empregado sem qualquer tarefa ou atribuição a executar, permanecendo ocioso, como forma de castigá-lo ou ofender-lhe a honra. Outro exemplo se dá quando o empregador ou seu preposto agride verbalmente o empregado.

3.1.6 Alínea “f”:O empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem”

Aqui, o abuso por parte do empregador ocorre quando há agressão física do empregador ou de seu preposto contra o empregado, salvo no caso de legitima defesa, podendo esta ocorrer dentro da empresa ou fora dela.

Nesse sentido, Garcia (2015, p. 382) assim leciona:

O caso, portanto, é de lesão à integridade física do empregado, por violência cometida pelo empregador ou seus prepostos. Observa-se que na hipótese específica em questão, pertinente à ofensa física, apenas ao empregado em si é que se faz menção; diferentemente, somente na alínea anterior (e) do art. 483 da CLT é que os familiares são incluídos.Se a referida lesão ocorre em legítima defesa, o ato deixa de ser ilícito, afastando, com isso, a rescisão indireta. No entanto, cabe observar que a legítima defesa deve ser exercida sem abuso, ou seja, sem que sejam excedidos os seus limites.

Por exemplo, o empregador que ameaça o empregado de morte, ou ainda, o preposto do empregador – superior hierárquico – que agride fisicamente o empregado e o empregador nada faz contra o agressor.

3.1.7 Alínea “g”: “O empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários”

Por fim, na alínea “g”, o abuso ocorre quando o empregador fornece quantidade menor de serviço ao empregado cuja remuneração é por produção, reduzindo de forma considerável a sua remuneração.

Assim preceitua Garcia (2015, p. 383):

O trabalho por peça é aquele em que o salário é pago por unidade de obra, recebendo o empregado de acordo com a quantidade produzida. O trabalho por tarefa refere-se àquele em que o salário é estabelecido de forma mista, ou seja, o empregado recebe conforme o serviço estipulado, a ser realizado em certo período de tempo. De todo modo, são situações em que, havendo a redução do trabalho oferecido, proposto ou determinado ao empregado, pelo empregador, o salário pode sofrer sensível redução, pois nos referidos casos o valor recebido varia conforme o que é produzido.

O art. 483 da CLT apresenta ainda três parágrafos.

O parágrafo primeiro do referido art. 483, afirma que o empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.

O parágrafo segundo do mesmo artigo afirma que no caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho e, consequentemente, receber todas as verbas rescisórias que lhe são asseguradas nos termos da lei.

Por fim, o parágrafo terceiro prevê que nas hipóteses das letras “d” e “g” do referido artigo, poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo.

Aqui, o hiato de tempo para consideração de rescisão indireta do contrato de trabalho por parte do empregado deve observar a imediatidade, pois se houver continuidade da relação laboral por algum tempo sem alterações, presume-se que ocorreu perdão tácito, com consequente renúncia à faculdade de resilição contratual.

Nas palavras de Vólia Bomfim[17]:

 

A punição tem que ser atual, pois o transcurso do longo tempo entre a falta e a penalidade acarreta a presunção de perdão ou de renúncia do direito de punir. É um requisito recíproco, isto é, é aplicado tanto para as faltas cometidas pelo empregado,quanto para as cometidas pelo empregador

Mesmo nas hipóteses do parágrafo terceiro do art. 483 da CLT de rescisão indireta em que é possível ao empregado permanecer no serviço, a pleiteação da rescisão deve ser imediata. A inércia e ou a omissão do trabalhador descaracterizam a imediatidade.

É importante lembrar que o empregador, na maioria das vezes, é representado por seus prepostos e que o ato praticado por estes frente aos empregados uma vez enquadrado em um dos motivos (alíneas) acima apontados, poderá acarretar a despedida indireta do contrato de trabalho.

4 O DESCRÉDITO DAS RESCISÕES INDIRETAS DOS CONTRATOS DE TRABALHO

O referido tema possui extrema relevância no meio jurídico, pois aborda uma modalidade extintiva do contrato de trabalho, equiparada à figura da justa causa, que, também de maneira abrupta, põe fim ao contrato existente entre empregador e empregado.

A rescisão indireta ou despedida indireta do contrato de trabalho é fundamentada no art. 483, da CLT, criado pelo legislador para proteger o empregado de eventuais abusos de seu empregador. Tal artigo é taxativo, pois conforme apontado no capítulo anterior, suas alíneas de "a" a "g" descreve as situações em que o empregado pode considerar rescindido o contrato de trabalho, por culpa exclusiva da empresa.

Vejamos a jurisprudência nesse sentido:

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. A falta grave praticada pelo empregador deve ser de tal monta que torne insustentável a continuidade do contrato de trabalho. Violações contratuais praticadas pelo empregador, mas passíveis de reparação judicial, não são suficientes à caracterização da justa causa empresarial nos moldes do art. 483, da CLT. Na presente demanda, tal como explicitado pela r. decisão combatida, não se constata a existência de infração contratual a ensejar o reconhecimento da rescisão indireta, mas sim a ocorrência de rescisão contratual a pedido do empregado, sendo devido o pagamento das parcelas rescisórias inerentes a essa modalidade de rescisão contratual. Recurso ordinário a que se dá provimento parcial.

(TRT/SP - 00017439420115020061 - RO - Ac. 3ªT 20120513450 - Rel. MARIA DORALICE NOVAES - DOE 15/05/2012)

Ocorre que tal instituto previsto em nosso ordenamento jurídico tem caído em descrédito nas demandas trabalhistas, inibindo, a simples rescisão do contrato de trabalho por pedido de demissão, pois esta última se trata de modalidade de rescisão que acarreta considerável redução ao empregado quando do recebimento das verbas rescisórias, diferentemente da rescisão indireta.

Assim, muitos empregados, ao se verem insatisfeitos com a empresa para qual prestam seu labor, e evitando a redução das verbas rescisórias pelo pedido de demissão, tem se valido de pedidos infundados de rescisão indireta para obterem vantagem, ludibriando o Poder Judiciário com provas precárias.

Entretanto, se faz necessário estabelecer parâmetros para o acolhimento desse tipo de pedido, exigindo-se o preenchimento de todos os requisitos legais, posto que esse modelo de rescisão contratual equipara-se à aplicação da justa causa por ato infracional do empregado.

Da mesma forma com que se exige da empresa prova efetiva das infrações causadas pelo empregado quando da aplicação de uma justa causa, a premissa estabelecida deve ser a mesma quando da necessidade de provar os abusos cometidos pela empresa.

Não à toa, o legislador utilizou-se de artigos legais subsequentes e do mesmo capítulo na CLT ao tratar de tais abusos. Se pelo empregado, os abusos acarretam sua demissão por justa causa (art. 482, da CLT); se pelo empregador, tais abusos acarretam na rescisão indireta do contrato de trabalho (art. 483, da CLT).

Destarte, partindo-se da premissa de que a prova deve ser robusta e irrefutável para a manutenção da justa causa em juízo, também assim deverá ser considerada para a comprovação da rescisão indireta do contrato de trabalho, ou estar-se-ão prevalecendo à insegurança jurídica e o desvirtuamento de preceito legal.

Saliente-se, por oportuno, que a jurisprudência é farta no sentido de ser necessária prova robusta para o reconhecimento da rescisão indireta, in verbis:

"RESCISÃO INDIRETA. Falta grave cometida pelo empregador. Prova. A alegação de falta grave cometida pelo empregador, de forma a ensejar despedida indireta, configura fato constitutivo do direito, por força dos artigos 818 da CLT c/c 333, inc. I, do CPC, carreando à reclamante o ônus probatório. A ausência de provas robustas acerca da conduta lesiva afasta a rescisão indireta de que trata o art. 483 da CLT.".

Acórdão 200700777015, PROCESSO TRT/SP Nº: 02279-2004-032-02-00-1, RECURSO ORDINÁRIO – RELATOR(A): PAULO AUGUSTO CAMARA, publicação 02/03/2007.

"RESCISÃO INDIRETA. A culpa da reclamada autorizadora da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do artigo 483 da CLT, deve ser cabalmente comprovada, ônus do qual não se desincumbiu a reclamante. Aplicação do disposto nos artigos 818 da CLT e 333, I, do CPC. Recurso improvido ESTABILIDADE GESTANTE. A reintegração no emprego é incompatível com o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho. Recurso improvido. HORAS EXTRAS. Não demonstradas diferenças a favor da recorrente. Recurso improvido.".

(Acórdão 20071076748, PROCESSO TRT/SP Nº: 00893200530302009, RECURSO ORDINÁRIO – 03ª VT de Guarujá – publicação 18/01/2008).

Nem a hipossuficiência do empregado, por si só, possui o condão, nesses casos, de inverter o ônus da prova ao empregador, pois, devem preservar a relação de emprego, bem como a necessidade da prova ser produzida por quem alega o fato constitutivo de seu direito, de acordo com o art. 818, da CLT, c/c art. 333, inciso I, do CPC, aplicável de maneira subsidiária ao processo do trabalho.

Ainda, equiparando-se tal modalidade de rescisão do contrato de trabalho à justa causa, é importante que se levem em consideração a figura da punição imediata, sob o risco de considerar-se o perdão tácito também nos casos de rescisão indireta, como comumente se exige para aplicação da justa causa ao empregado.

Vejamos o que aponta a jurisprudência nesse sentido:

RECURSO DE REVISTA - RESCISÃO INDIRETA 1. O Tribunal de origem consignou que não ficou demonstrada hipótese de rescisão indireta, razão pela qual são indevidas as parcelas rescisórias pretendidas. Óbice da Súmula nº 126 do TST. 2. Ademais, o Recorrente não impugna o fundamento do acórdão regional, atinente à necessidade de imediata reação da parte lesada para a configuração da justa causa no rompimento do contrato de trabalho, não atendendo ao artigo 514, inciso II, do CPC. Aplica-se a Súmula nº 422 do TST. Recurso de Revista não conhecido.

(TST - RR: 5916720135150032  , Data de Julgamento: 04/03/2015, Data de Publicação: DEJT 06/03/2015)

Conhecida juridicamente pela doutrina e jurisprudência como imediatidade – que consiste numa punição rápida após o conhecimento dos fatos graves que ensejam a demissão por justa causa – tal exigência também deve ser levada em consideração quando da aplicação da rescisão indireta, sob o risco de configurar-se o perdão tácito. Sempre, claro, utilizando-se da mesma premissa tanto para a rescisão contratual por culpa do empregador, como na rescisão por culpa do empregado.

Vejamos o que aponta a jurisprudência nesse sentido:

EMENTA: RESCISÃO INDIRETA - PERDÃO TÁCITO - A doutrina entende como perdão tácito a renúncia do empregador em punir imediatamente a falta do empregado. Tal se configura quando decorre tempo entre o conhecimento do fato e a punição, que fica postergada, como que em compasso de espera, à procura do melhor momento que venha a interessar ao empregador. Ora, o mesmo raciocínio se aplica à alegação de falta grave do empregador. Se o empregado aceita a violação do contrato de trabalho perpetrada ao longo do pacto, sua omissão voluntária equivale ao perdão tácito, afastando a possibilidade de reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho. Processo 00124-2007-007- 03-00-8 RO. Relator Antônio Fernando Guimarães. Data de Publicação 31/05/2007.

ACÓRDÃO - RESCISÃO INDIRETA. INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA IMEDIATIDADE. PERDÃO TÁCITO. Presume-se o perdão quando o empregado, diante de ato faltoso da empresa ensejador da rescisão indireta do seu contrato de trabalho (art. 483 da CLT), demora além do tempo razoável para considerar rescindido o pacto laboral ou pleitear a declaração judicial de rescisão. O princípio da imediatidade vale para ambas as partes. Recurso do reclamante ao qual se nega provimento. PROCESSO TRT-15ª REGIÃO Nº 0071820

Tal entendimento, inclusive, é corroborado pela nossa melhor doutrina, que acerca do tema em questão, conforme MARTINS[18], menciona:

A irregularidade cometida pelo empregador deve ser de tal monta que abale ou torne impossível a continuidade do contrato. Se o empregado tolera repetidamente pequenas infrações cometidas pelo empregador, não se poderá falar em rescisão indireta, devendo o juiz preservar a relação de emprego, pois, principalmente em épocas de crise, é difícil conseguir nova colocação no mercado de trabalho.

Destarte, como demonstrado neste capítulo até então, é claro o desvirtuamento do preceito legal, insculpido no art. 483, da CLT, que prevê a rescisão indireta do contrato de trabalho, de maneira taxativa, em casos de infração grave cometida pelo empregador.

Isso porque, tal situação jurídica, ainda que prevista em lei, tem sido utilizada como forma corriqueira de extinção contratual, ou como substituta do pedido de demissão, pois prescinde de imediatidade, bem como de prova robusta e irrefutável de quem a alega em juízo.

Cabe aqui destacar ainda que, no caso de a rescisão indireta não ser comprovada e tendo o autor se afastado do emprego com o objetivo de não mais retomar, a situação se equipara ao abandono de emprego, sendo devido ao empregado o saldo de salário compreendido até a data do afastamento.

Nesse sentido o brilhante doutrinador Amauri Mascaro Nascimento[19] leciona que:


Se a sentença, a ser proferida na ação de dispensa indireta julgar a pretensão do empregado improcedente porque não reconhece a justa causa do empregador, não haverá direitos rescisórios para o trabalhador, nem os da ação indireta, que perdeu, nem os da dispensa direta, porque incorreu em justa causa.

Corrobora no mesmo sentido a jurisprudência trabalhista, conforme se verifica:


RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO. Empregado que opta por não mais prestar serviços de imediato. O empregado que opta por não mais continuar a prestação de serviços a partir do ajuizamento da ação assume o risco de, julgado improcedente o pedido, ter o contrato rescindido por sua iniciativa e culpa”. Ac. (unânime) do TRT Ia Reg. — 8a T.— RO-16.185/97. Rel: Juiz Marcelo Augusto Souto de Oliveira. Julg. 22.06.99

Dessa forma, verifica-se que já não é de hoje que a rescisão indireta está sendo utilizada simplesmente para garantir ao funcionário que deseja sair da empresa, o pagamento das verbas rescisórias típicas de uma rescisão contratual sem justa causa, quais sejam, seguro-desemprego" data-type="category">seguro desemprego, saque do FGTS, multa de 40% do FGTS e aviso prévio.

Na prática, o que tem acontecido é que quando o empregado quer se desligar da empresa e não consegue fazer um “acordo rescisório”, prática essa considerada ilegal, ele busca o judiciário ajuizando uma reclamação trabalhista, através de um advogado, na tentativa de caracterizar uma falta grave que, de fato, não ocorreu e, assim, obter todas as verbas rescisórias.

Atualmente, em consequência ao excesso de pedidos de rescisão indireta, a maioria dos juízes do trabalho já enxerga com maus olhos as reclamações trabalhistas que contam com esse pleito. Essa “banalização” prejudica o próprio trabalhador de boa-fé que precisa acionar o judiciário para ver rescindido o seu contrato de trabalho. Ele corre o sério risco de não convencer o magistrado, hoje receoso em prejudicar qualquer das partes, dispensando muito mais criterioso e atenção às provas e aos elementos processuais que formarão a sua convicção.

Além disso, nas palavras de Alice Monteiro de Barros[20]:

Quando demonstrada a inexistência de provas no pedido, é facultado aos juízes aplicarem multa por litigância de má-fé ao Reclamante, no intuito de desestimular a propagação da prática.

 

Por fim, é importante frisar que o mero descumprimento de qualquer cláusula contratual, tanto pelo empregado quanto pelo empregador, não pode gerar justa causa para rescisão do contrato de trabalho. E deve ser assim na rescisão indireta prevista na CLT: a falta do empregador, para gerar a ruptura do contrato, deve estar revestida de gravidade acentuada, causando empecilhos para a continuidade da relação laboral. Tal modalidade de rescisão é uma importante garantia ao trabalhador, mas se não utilizada com boa-fé acabará por cercear direitos de quem realmente faz jus a utilizá-la.

4.1. Exemplos práticos e jurisprudenciais do desvirtuamento das Rescisões Indiretas

 

Na página do Tribunal Superior do Trabalho (TST) na internet, verifica-se inúmeras situações que enfatizam que nem todas as situações desagradáveis ao empregado podem ser motivo de rescisão indireta. É o caso, por exemplo, de um empregado transferido de São Paulo para Campinas após 12 anos de trabalho na capital paulista. Para o Tribunal Superior do Trabalho (TST), não houve rescisão indireta, pois o contrato de emprego previa a transferência de local de prestação de serviços.

Outra situação frustrada trazida pelo TST foi a tentativa de duas empregadas demitidas por justa causa por abandono de emprego porque deixaram de comparecer ao serviço após terem descoberto que, no banheiro que utilizavam, havia um buraco pelo qual os colegas homens as espionavam. Segundo contaram em juízo, depois de reclamarem a seus superiores e nada ter sido feito, elas registraram boletim de ocorrência e não mais retornaram ao trabalho.

Após a demissão, elas ajuizaram a reclamação para converter a demissão pelo abandono de emprego em rescisão indireta, mas perderam a causa. Pelas provas produzidas nos autos, suas alegações não convenceram, pois o buraco era tão pequeno que apenas vultos podiam ser vistos através dele. Na sentença, o juiz reconheceu a rescisão por justa causa. A decisão foi mantida em todas as instâncias da Justiça do Trabalho.

O TST apresenta ainda, o caso do empregado demitido por abandono de emprego e que não conseguiu reverter a justa causa em rescisão indireta foi um anestesista, que alegou assédio moral do hospital que trabalhava. Ele foi transferido do setor de cirurgias cardíacas para o de cirurgias geral e plástica, o que lhe causou redução salarial. Segundo o médico, a mudança ocorreu por perseguição por parte da chefia, que teria passado a tratá-lo com extremo rigor após a publicação de uma entrevista na qual criticou o mercado de trabalho para os anestesistas.

Ele emitiu um comunicado à empresa e parou de trabalhar, ajuizando ação com o pedido de reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho e indenização por danos morais. O juízo de primeira instância indeferiu as duas pretensões e entendeu que o comunicado do médico tinha valor de pedido de demissão. A decisão foi mantida até a Oitava Turma do TST.

O site aponta ainda certas situações que lembram investigações de detetives. Numa delas, a Justiça do Trabalho desvendou conluios entre as partes, cujo pedido ou falta de pedido de rescisão indireta foi o que desencadeou a descoberta da fraude. Em uma delas houve fraude de fazendeiro com uma trabalhadora rural que lhe prestava serviços gerais e ajuizou ação pedindo a rescisão indireta. O empregador, sem advogado na audiência, nem sequer questionou o valor de R$ 154 mil pretendido pela empregada, o que motivou a desconfiança do juiz. O pedido foi negado.

Mais um caso de fraude que chegou até à Seção de Dissídios Individuais I do Tribunal Superior do Trabalho (SDI-1 – TST) foi de um chefe da Associação Hospitalar e Maternidade de São Paulo. Ele ajuizou várias reclamações e disse fazer parte da diretoria, recebendo mais de R$ 7 mil de salário. Quem comparecia às audiências eram outros diretores da associação, que não questionavam os valores e faziam acordos fraudulentos, se revezando com ele em outras ações. Como ele alegava que estava há anos sem receber salários, chamou a atenção a ausência do pedido de rescisão indireta. Com os acordos fraudulentos ele receberia mais de 1,2 milhão.

Não bastasse os exemplos práticos acima, a jurisprudência apontada abaixo demonstra a banalização das rescisões indiretas. Vejamos:

PEDIDO DE RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. A jurisprudência dominante trabalhista posiciona-se no sentido de que o reconhecimento da despedida indireta, com amparo na alínea d do art. 483 da CLT, deve ser verificado, apenas, quando residem, nos autos, elementos que, verdadeiramente, ensejem a sua caracterização, não configurando a justa causa o simples descumprimento de obrigações contratuais.

(TRT-5 – RecOrd: 00002684720145050342 BA 0000268-47.2014.5.05.0342, Relator: DALILA ANDRADE, 2ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 30/01/2015.)

PEDIDO DE RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO - INDEFERIMENTO DA PRETENSÃO PELO JUÍZO - CONSEQUÊNCIA - RECONHECIMENTO DO PEDIDO DE DEMISSÃO. Nas reclamações trabalhistas em que há pedido de rescisão indireta, exceto na hipótese de trabalhador protegido por estabilidade, o desfecho da demanda através da prolação da sentença deve resolver o contrato de trabalho, ante a quebra de confiança entre as partes envolvidas. E o indeferimento do pedido de rescisão indireta, em razão dos contornos que envolvem a lide, inexoravelmente induz a declaração do pedido de demissão, forma de dissolução contratual compatível com a situação.

(TRT-2 - RO: 16582920115020 SP 00016582920115020443 A28, Relator: ROVIRSO BOLDO, Data de Julgamento: 19/06/2013, 8ª TURMA, Data de Publicação: 25/06/2013)

PEDIDO DE RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. Deve ser indeferido quando as faltas contratuais cometidas pela reclamada, embora reiteradas ao longo da relação de emprego, não foram, em qualquer momento, repudiadas pelo reclamante que, somente mais de nove anos após a data de sua admissão, pleiteou, com base nelas, a rescisão indireta do seu contrato de trabalho.

(TRT-5 - RO: 1894000420045050010 BA 0189400-04.2004.5.05.0010, Relator: DALILA ANDRADE, 2ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 28/11/2006)

Não obstante ao acima exposto, conforme veiculado pelo Tribunal Superior do Trabalho em seu site, um empregado que dizia estar sendo perseguido por seus superiores, mas não conseguiu fazer prova do que alegava, teve seu pedido de rescisão indireta indeferido pela Justiça do Trabalho. A decisão foi mantida depois de que a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a agravo interposto por um operador de loja do Carrefour Comércio e Indústria Ltda.

Recentemente, conforme veiculado no site do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região, um empregado depois de ter trabalhado por quase três anos como repositor numa empresa atacadista, propôs ação pedindo rescisão indireta, pleiteando horas extras e indenização por danos morais e materiais. Acabou condenado como litigante de má-fé e teve de pagar multa, gastos com a perícia e custas processuais, totalizando pouco mais de dois mil reais. 

A decisão é do juiz Edilson Ribeiro da Silva, em atuação na 5ª Vara do Trabalho de Cuiabá, para quem o fato da empresa não ter comparecido à audiência, nem apresentado defesa, não acarretou confissão ficta (subentendida). Em seu entendimento, por ser relativa, ela pode ficar sem efeito, se nos autos houver provas contrárias às alegações do reclamante.

O magistrado concluiu que o empregado não conseguiu comprovar com seu depoimento, e nem com o resultado da perícia, as alegações trazidas na petição inicial. Além de que ficou configurado que ele postulou direitos que sabia não fazer jus, extrapolando os limites da ética e da normalidade processual. Por isso, além não ter reconhecido nenhum direito pleiteado, foi condenado a pagar multa por litigância de má-fé.

Assim, conforme apontado ao longo deste capítulo, verifica-se que a rescisão indireta do contrato de trabalho vem sendo acionada de forma equivocada e muitas das vezes sem provas robustas, tornando-a banalizada perante o judiciário.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Como fora demonstrado ao longo este trabalho, a rescisão indireta do contrato de trabalho é um mecanismo manifestamente importante em nosso ordenamento jurídico, pois é considerado um trunfo dos trabalhadores contra empregadores que cometem ilegalidades.

A rescisão indireta não deve ser utilizada para gerar situações de conflitos na relação de emprego, e também não deve ser utilizada como forma de pressionar empresas a romper contratos de trabalho apenas por mera vontade do empregado.

Embora o instituto seja um mecanismo contra eventuais abusos do poder do empregador, a rescisão indireta vem caindo em descrédito perante o judiciário.

A lógica da rescisão indireta é criar uma igualdade entre as partes constantes do contrato de trabalho, atribuindo a justa causa como possibilidade punitiva contra empregados e a rescisão indireta contra empregadores.

Entretanto, como apontado, o instituto está se tornando cada vez mais enfraquecido e banalizado, seja por falta de justa causa ou pela ausência de provas.

Nesse sentido, a rescisão indireta já está começando a ser mal vista pelos juízes. Como demonstrado nas citações jurisprudenciais presentes neste trabalho, os magistrados têm censurando advogados e reclamantes em virtude de pedidos indevidos de rescisão indireta, bem como têm aumentado substancialmente os indeferimentos de pedidos envolvendo este instituto.

Portanto, é preciso ter cuidado e analisar friamente se realmente existe justa causa para a caracterização da rescisão indireta, tanto por parte dos empregados e, principalmente, por parte dos advogados.

 

 

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PEREIRA, Leone; SCALERCIO, Marcos; ORSI, Renata. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). 1ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

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Sobre o autor
André Luiz Passos Nascimento

Advogado atuante nas áreas de Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito de Família e Direito do Trabalho.<br> <br>Atualmente, divide seu tempo entre o escritório de advocacia, o exercício do cargo público na Prefeitura Municipal de Caraguatatuba/SP e duas pós-graduações em Direito e Processo do Trabalho e Direito Municipal, ambas pela EPD - Escola Paulista de Direito.<br> <br>É ainda, membro da Comissão Especial do Jovem Advogado para o triênio 2016/2018, tendo sido nomeado pela Portaria nº257/16/PR da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo. <br> <br>Além disso, possui formação interdisciplinar, pois, além de Advogado é também formado em Administração de empresas, com pós-graduação e diversos cursos de extensão na área, possuindo uma visão de negócios e pensamento empreendedor que o permite advogar como um verdadeiro gestor de assuntos jurídicos. Características estas que estão ligadas à advocacia moderna.<br> <br>Tem como objetivo e missão satisfazer plenamente seus clientes com eficiência, segurança, responsabilidade, ética e sigilo na atividade profissional, destacando-se por ser comprometido com a transparência e confiabilidade nos relacionamentos profissionais e por manter seus clientes atualizados sobre os andamentos dos processos judiciais e administrativos e demais trabalhos confiados aos seus cuidados profissionais.

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Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Centro Universitário Módulo, como requisito parcial, para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Professor Ms. Laercio L. Magnoli.

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