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Principais problemas dentro do sistema prisional brasileiro

30/04/2016 às 15:50
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Com o presente artigo procurou-se discutir a realidade do sistema prisional brasileiro, demonstrando sua ineficácia na busca de sua função ressocializadora. Foram abordados alguns dos principais problemas encontrados dentro do sistema prisional.

1. Introdução

Com o presente artigo procurou-se discutir a realidade do sistema prisional brasileiro, demonstrando sua ineficácia na busca de sua função ressocializadora.

A administração pública, utilizando-se do argumento de não existir verba pública ou interesse político está levando a completa falência e sucateamento do sistema penitenciário brasileiro.

Deixar o detento em condições desumanas e não investir em seu aprimoramento torna impossível que após o cumprimento de sua pena ele consiga um serviço digno e não volte mais a delinquir.

Para demonstrar como o sistema corrompe seus integrantes, será exposto neste artigo alguns dos principais problemas que têm sido encontrados na atualidade, como a superlotação, ociosidade, prisionalização, facções criminosas e tortura.


2. Prisionalização

A primeira consequência para o detento dentro das cadeias, é a ocorrência da prisionalização. Esta, pode ser explicada como a subcultura carcerária que é aprendida, absorvida pelo preso por um processo de “dessocialização”

No mesmo entender, segundo Manuel Pedro Pimentel (1997, p.58) apud Lorival Almeida Trindade (2002, p.44), esclarece que:

Assim como a direção de cadeia tem suas regras de funcionamento e as impõe com rigor aos presos, estes também dispõem de um conjunto próprio de regras que tem vigência entre eles e são aplicáveis por uns presos sobre os outros, somente. As regras da cadeia, assim como as leis de justiça de país, têm autoridades reconhecidas como tais às quais é atribuído o poder de aplicá-las, poder que paira acima das partes envolvidas. Na massa cada um é „juiz de sua própria causa‟,e a ninguém é atribuído o poder de arbitrar as questões de outros. Os presos referem-se a tais regras como as leis de massa. São elas que regulam a ordem na vida do crime.

Marina Fernanda Valejo (2013,p.28) explica que, uma vez dentro deste ambiente, o detento é submetido a diversas regras de disciplina, com o objetivo de impor um determinado comportamento considerado adequado, tanto das autoridades quanto dos já encarcerados. Como o meio é de submissão, o indivíduo através do processo de prisionalização passa a abrir mão de suas características culturais e pessoais, moldando-se a cultura prisional. Há portanto uma massificação do comportamento daqueles ali inseridos, perdendo de forma gradual, suas características individuais definidas. Ainda, segundo a mesma autora:

Devido à modificação e massificação da personalidade daquele submetido ao Cárcere, esse indivíduo carregará essa herança, ou marca do cumprimento de sua pena por muito tempo, mesmo após seu retorno ao convívio social extramuros. Isso porque, acostumado e adaptado a falar, agir, praticar e sobretudo pensar como preso, após o processo de prisionalização se solidificar, muito raro os que conseguem retornar sem grandes prejuízos a sua personalidade anterior.

Por todo o exposto, fica claro que este detento quando posto em liberdade, após tantos anos submetido ao ambiente carcerário irá voltar a se delinquir.


3. Superlotação

A superlotação é, talvez, o mais básico e crônico problema que atinge o sistema penal brasileiro.

Segundo o Departamento Penitenciário Nacional, em seu último levantamento nacional de informações penitenciários, que ocorreu em junho de 2014, a população prisional brasileira chegou a 607.731 mil pessoas.

Pela primeira vez, o número de presos no país ultrapassou a marca de 600 mil. O número de pessoas privadas de liberdade em 2014 é 6,7 vezes maior do que em 1990. Desde 2000, a população prisional cresceu, em média, 7% ao ano, totalizando um crescimento de 161%, valor dez vezes maior que o crescimento do total da população brasileira que apresentou aumento de apenas 16% no período, em uma média de 1,1% ao ano. Observe o gráfico abaixo:

O número de pessoas presas nas Unidades da Federação é bastante distinto. São Paulo, estado com o maior número de presos, tem 219.053 pessoas privadas de liberdade, montante que corresponde a cerca de 36% da população prisional do país. Minas Gerais, com 61.286 presos, e Rio de Janeiro, com 39.321, ocupam, respectivamente, o segundo e terceiro lugares no ranking. Roraima, que tem 1.610 pessoas presas, é o estado com a menor população carcerária em números absolutos:

Ainda, segundo os mesmos dados trazidos pelo Departamento Penitenciário Nacional, existe um déficit de 231.062 vagas no sistema penitenciário.

Roberto Porto (2007,p.21) relata que a Fundação Internacional e Penitenciária coloca o Brasil como o país da América Latina com a maior população carcerária, bem como com o maior déficit de vagas vinculadas ao sistema penitenciário, sendo apenas seguido pelo México.

Em termos mundiais, o Brasil encontra-se em quarto lugar, apenas sendo superado pelos Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,6 milhão) e Rússia (673,800 milhões)

Em alguns Estados, devido à superlotação das Delegacias de Polícia ou pequenas cadeias públicas, muitas mulheres são colocadas em celas masculinas que acabam sendo estupradas, como ocorreu no Estado do Pará, onde uma menina de 15 anos foi colocada uma cela na cadeia de Abaetetuba, juntamente com 20 homens, durante o período de um mês. Segundo o Conselho Tutelar do município e membros da comissão de direitos humanos da OAB do Pará, a menor, detida por furto, foi estuprada durante o tempo em que permaneceu na cadeia

Vale ainda mencionar, apesar de ser um dado antigo, que no livro II Caravana de Direitos Humanos (2000,p.33) há diversos relatos sobre a situação dos presídios Brasileiros, observando-se a superlotação praticamente em todos, entre eles podem ser destacados os presídios do Estado de Pernambuco Aníbal Bruno e Barreto Campelo:

Um dos piores presídios do país, atualmente, o Aníbal Bruno, de Recife, talvez seja um dos recordistas mundiais em superlotação. Para uma capacidade de 524 presos, o estabelecimento contava com 2.988 internos no dia 30 de agosto, quando de nossa visita, ou seja: quase 6 vezes a sua lotação máxima

O presídio encontra-se superlotado. Sua capacidade máxima é de 370 internos. A lotação quando da visita, porém, alcançava 1.032 presos. A média é de 9 presos por cela, o que, além do sofrimento, proporciona um próspero mercado de compra de camas. Por R$ 100,00 um detento pode comprar um lugar mais adequado para dormir

Apesar de mais de 15 anos terem se passado desde este relatório, a situação não melhorou muito, pois o presidio de Aníbal Bruno continua sendo ainda considerado por muitos o pior presídio brasileiro.

A superlotação é, sem dúvida alguma, um outro problema encontrado no sistema prisional que impede ou no mínimo dificulta, em muito, a ressocialização do preso.


4. Ociosidade

A ociosidade, como demonstra Fabiano Mazzoni (2007,p.27), pode causar vários efeitos danosos à saúde física e mental dos condenados, pois, a falta de atividades educativas, de lazer e esportivas, associadas as péssimas condições de higiene e saúde, é capaz de produzir a deterioração físico-psíquica do preso.

A própria Lei de Execuções Penais, em seu artigo 41, incisos V, e VI trazem a garantia do detento ao trabalho e atividades recreativas:

Art. 41. Constituem direitos do preso:

1) proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;

2) exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;

O controle da atividade do detento para evitar a sua ociosidade é de grande importância para sua ressocialização, como mostra Roberto Porto (2007,p.35):

O princípio da não-ociosidade é considerado por Fucault fator essencial no processo de ressocialização do detento. Através da técnica da ocupação máxima do tempo, permite-se exercitar atividades múltiplas, todas ordenadas, de modo a desviar o caráter do criminoso, impondo-lhe sucessivas regras de bom comportamento

Segundo os dados trazidos pelo Departamento Penitenciário Nacional estima-se que existam 106.636 detentos trabalhando. Desta forma, apenas 16% da população prisional do país trabalha. Isto é no mínimo, um total descaso por aquilo que a Lei de Execução Penal determina, pois o trabalho, além de um dever, é um direito do preso.

Conforme explica Elionaldo Fernandes Julião, em sua tese de doutorado, concluiu que trabalhar na prisão diminui as chances de reincidência em 48%, e, quando o preso estuda na cadeia, as chances de voltar ao crime diminuem em até 39%.

O estudo entre os presos do Rio de Janeiro com base na avaliação de 52 mil fichas de prisioneiros realizada nos últimos cinco anos de pesquisa, mostrou que o percentual de reincidência, era de 26% entre presos que não trabalharam, contra somente 11,2% dos que trabalharam.

Infelizmente, segundo Lídia Mendes (2008,p.78), ainda são poucos os estabelecimentos que contam com oficinas de trabalho ou firmam parcerias privadas, sendo que na maioria das atividades, apesar de retirar o preso da ociosidade, não oferecem qualificação técnica, como é o caso das oficinas culturais e de artesanato que podem ser classificadas como atividades recreativa e não trabalho propriamente dito.


5. Assistência Médica

Previsto no artigo 14 da lei de execução penal, a assistência à saúde da pessoa privada de liberdade compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico.

Quando não for possível o estabelecimento penal ser aparelhado para prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.

Apesar do direito a saúde estar prevista de forma impecável dentro do ordenamento legal, na prática, se torna apenas outro trágico problema que atinge o sistema prisional brasileiro

Segundo os dados trazidos pelo Departamento Penitenciário Nacional, apenas 37% dos estabelecimentos prisionais no Brasil possuem um módulo específico de saúde

Como explica Roberto Porto (2007,p.33), um terço da população carcerária nacional é portadora do vírus HIV, não sendo apenas a AIDS o único problema, pois há graves casos na prisão de tuberculose e o uso coletivos de drogas.

No mesmo sentido Soliane Malagueta (2007,p. 77)

O que mais afeta a população carcerária é o vírus HIV, e, de fato, o censo penitenciário constatou que 1/3 da população carcerária é portadora do vírus HVI, o que se vincula às práticas de uso de drogas e relações sexuais sem proteção. O uso de drogas injetáveis caracteriza 1/4 da epidemia da Aids no Brasil, e no sistema prisional esse quadro é ainda maior, sendo 52% dos usuários injetáveis de droga soro-prevalência de HIV, e o uso compartilhado de seringas e agulhas aproxima-se de 60%.

Essas doenças, não afetam apenas os presos e funcionários dentro do sistema penitenciário, pois os presos não estão completamente isolados do mundo externo, podendo causar contaminação através das visitas conjugais, saída em datas especiais, ou mesmo, no seu retorno à sociedade após cumprir sua pena.

Nas palavras de Lídia Mendes (2008,p.78), a falta de serviços médicos ou tratamento deficiente, nos estabelecimentos prisionais, é um dos principais motivos das reclamações dos presos, pois, não é raro, encontrar estabelecimentos prisionais, apenas com fornecimento básico de medicação.

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Ainda conforme a mesma autora, o acompanhamento médico adequado, além de gerar um efeito preventivo e de conscientização sobre os cuidados que os presos devem ter, como uso de preservativos, objetos coletivos e cuidados básicos com higiene, previne diversas doenças, e facilita a constatação de maus tratos, espancamentos e qualquer tipo de sinal de violência entre os presos.

Apesar de inúmeras críticas possíveis ao sistema de saúde penitenciário, talvez pode ser observado como um possível avanço o fato de quem 2014 foi instituída a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional. A partir desta política pública, a população prisional foi inserida formalmente na cobertura do Sistema Único de Saúde. Entre seus objetivos, está assegurar que cada unidade prisional seja um ponto integrante da Rede de Atenção à Saúde do SUS.


6. Tortura

Quando houve a abolição da tortura como forma de pena, existia a crença de que a sua prática no sistema prisional estaria extirpada, porém esta não é a realidade brasileira, sendo os presos submetidos, tanto a tortura física pelos agentes do Estado, que deveriam ser os primeiros a dar o exemplo de integridade moral, como a tortura psicológica, causada pelos diversos problemas encontrados no sistema penitenciário, problemas esses já citados anteriormente.

Conforme o artigo 1° da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes das Organizações das Nações Unidas, realizada em 1991, tem-se que:

1°. Para fins da presente Convenção, o termo “tortura” designa qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido ou suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir essa pessoa ou outras pessoas; ou por motivo baseado em discriminação de qualquer natureza (...)

Já, para o artigo 2° da Convenção Internacional para Prevenir e Punir a Tortura, realizada em 1985:

2°. Para os efeitos desta Convenção, estender-se-á por tortura todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou qualquer outro fim. Entender-se-á também como tortura a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou angústia psíquica. (...)

São Paulo lidera a lista de casos de tortura, com 71 das 211 ocorrências, seguido por Maranhão, com 30, Goiás, com 25, e Rio Grande do Norte, com 12. Segundo os autores do relatório, os números de denúncias por região diferem, porque “em alguns locais a tradição de denunciar casos de tortura está bem sedimentada”.

O artigo Justiça Global (2007,sp) mostra os dados que a Comissão Contra a Tortura da Organização das Nações Unidas divulgou, sobre a prática da tortura no sistema penitenciário brasileiro.

Realizado com base na última visita de uma delegação de peritos ao Brasil, no ano de 2005, que responsabiliza o Estado pelas violações sistemáticas aos direitos humanos dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais.

Este mesmo documento, que foi mantido inicialmente em sigilo a pedido do governo brasileiro, demonstra que os presos estão sendo torturados diariamente nos presídios e delegacias. As péssimas condições de encarceramento no Brasil também causaram uma profunda preocupação aos peritos da delegação mencionada que, em seu relatório, afirma que “há uma impunidade extrema para os autores dos abusos” e as investigações policiais são ineficazes.

Na conclusão, o documento apresentado pela Comissão aponta ainda que os juízes brasileiros contribuem para a manutenção da impunidade pois preferem ignorar a Lei 9.455/1997 que define os crimes de tortura e “qualificam os casos como danos corporais e abuso de autoridade”.

A Comissão apresentou propostas que o Brasil poderia adotar apara solucionar o problema da tortura no Brasil, entre elas:

  • as reclamações de tortura praticada por agentes públicos devem ser imediatamente, plenamente e imparcialmente investigadas e os autores devem ser processados nos termos da lei 1997;

  • os Ministérios Públicos Estaduais devem ter o poder para iniciar e realizar quaisquer investigações de tortura e devem ser oferecidos os recursos financeiros e humanos necessários para que possa cumprir com esta responsabilidade e

  • as violações de direitos humanos cometidos por policiais militares contra civis devem ser investigados por um tribunal criminal em todos os estágios do processo criminal ao invés de tribunais militares.

Também não é raro encontrar no sistema penitenciário brasileiro a chamada tortura psicológica motivada pelas várias unidades onde as penas são cumpridas em celas superlotadas, sem ventilação ou iluminação, com presos extremamente ociosos que são tratados sem o mínimo de dignidade humana tanto pelos agentes do Estado quanto pelos outros presos.


7. Facções Criminosas

Para entender o que são as facções criminosas é necessário primeiramente que se entenda o que é crime organizado, já que a primeira é espécie da segunda.

Não há consenso doutrinário sobre o conceito mais adequado para o crime organizado, pois este possui incrível poder variante em sua estrutura, podendo mudar-se e adaptar-se de acordo com a realidade vigente de um país ou de uma região, sofrendo influências de fatores como condições políticas, econômicas, sociais, atuação da polícia entre outros fatores. O que é possível fazer é uma compilação do que se entende por crime organizado.

Nas palavras de Fernando Capez (2014, p.168) o conceito de crime segundo a Convenção de Palermo:

A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, realizada em Palermo, na Itália, em 15 de dezembro de 2000, definiu, em seu art. 2º, o conceito de organização criminosa como todo “grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o fim de cometer infrações graves, com a intenção de obter benefício econômico ou moral”. Tal convenção foi ratificada pelo Decreto Legislativo n. 231, publicado em 30 de maio de 2003, no Diário Oficial da União, n. 103, p. 6, segunda coluna, passando a integrar nosso ordenamento jurídico.

No Brasil, ainda segundo o mesmo autor, entende-se por organização criminosa:

Considera-se organização criminosa, diz o § 1º do art. 1º da Lei, a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. A lei ainda amplia seu alcance para ser aplicada às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente. É o caso dos chamados crimes a distância. Ainda no tocante à aplicabilidade da lei, pode reger as condutas praticadas por organizações terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam ocorrer em território nacional.

Sobre o crime organizado, Wilson Lavorenti e José Geraldo da Silva (2000, p.11);

A criminalidade organizada é menos visível que a criminalidade comum. Geralmente, possui um programa delinquencial, dentro de uma hierarquia estrutural, além de organizar-se como uma societas sceleris. Possui um campo de atuação disforme e variado e atua de forma a identificar eventuais testemunhas que possam compor um adiminículo probatório, além de praticar infrações cujo bem jurídico tutelado é atingido de forma imediata pelo Estado e imediatamente pelo titular do bem (como nos casos de tráfico de pscicotrópicos, corrupção, crimes contra o sistema financeiro etc...)

O surgimento das facções criminosas no Brasil, segundo Fabiano Mazzoni (2007, p.35) remontam das décadas de 60 e 70 no presídio de Ilha Grande onde os presos comuns eram mantidos junto com os presos políticos, e estes, trouxeram consigo habilidades como eloquência e métodos organizacionais, ou seja, enquanto os presos comuns traficavam drogas, os presos políticos traficavam papéis e informações.

No presídio de Ilha Grande existiam seis grupos ou falanges, como eram conhecidos, vistos como grupos organizados que atuavam apenas dentro do presídio, cada um com suas próprias regras. Para sobreviver às violências, torturas e extorsões de outros presos, surge a falange Lei de Segurança Nacional, idealizada e comandado por presos políticos, que futuramente veio a ser denominado Comando Vermelho.

Com o fortalecimento do Comando Vermelho dentro do presídio de Ilha Grande, as autoridades da época entenderam que a melhor estratégia para acabar com o problema seria a transferência de alguns de seus líderes para outras penitenciárias do estado do Rio de Janeiro. Foi partir deste momento que as facções criminosas começaram a se proliferar por todo sistema prisional carioca, e não muito depois em outros estados brasileiros.

A forma de atuação dessas facções atualmente, em sua grande maioria, age principalmente como substituo do Estado que não consegue operar de forma adequada. A completa ausência ou má prestação de um serviço público dá margem para o surgimento de um Estado Paralelo, que atua executando e controlando os serviços omissos pelo Estado.

Isso exige uma eficiente organização, embora criminosa, que irá atuar com comando próprio, gerência ou administração e execução. A base para a administração pública ou privada, legal ou criminosa. Assim a organização passa a estabelecer uma disputa, como se fosse concorrência em um negócio, mas atuando contra o que determina a Lei.

Já dentro do sistema penitenciário, o preso se vê em uma situação peculiar, onde por sofrer diversas violências, desde sérias lesões corporais a estupros e extorsões, se vê na necessidade de aliciarem-se a umas das diversas facções existentes, muitas vezes não por escolha própria, mas como meio de sobrevivência dentro de um sistema corrupto e falido.

Desse modo é necessário que o Estado ocupe o seu lugar e atenda a sua função social para que aqueles que vivem em situação de cárcere possam, através do Estado, obter o mínimo indispensável para não necessitar recorrer a um “Estado Paralelo” para sobreviverem.

Diante dessas falhas entendidas como cruciais do sistema penitenciário brasileiro, é possível afirmar que o objetivo maior e mais almejado do sistema prisional é ainda, lamentavelmente, um desafio a ser superado


Conclusão

A ressocialização pretendida tem por base a possibilidade de reintegrar o indivíduo que cometeu algum crime, lhe entregando a possibilidade de viver uma vida plena, em consonância com todos os direitos constitucionais que lhe são inerentes, como educação, saúde, informação entre

Porém, a realidade vivida pelo sistema penitenciário brasileiro está longe de ser tão bela, pois pelos motivos citados neste artigo, e entre muitos outros, como por exemplo, a corrupção de funcionários do Estado, o descaso da sociedade, a superlotação, as condições precárias de saúde, vê-se a impossibilidade de qualquer esperança para o detento, que, por diversas vezes, seu crime não é tão grave, porém, por fenômenos como a prisionalização, se veem obrigados a se tornarem verdadeiros criminosos para que sobreviva dentro de um sistema corrupto e falido

No entanto, esperar que o estado, sozinho, encontre uma solução para todos não é a melhor alternativa, importante seria, se houvesse maior cooperação da sociedade, mesmo que fosse apenas não estigmatizando o ex-detento

O preso não deveria ser tratado como um número em meio ás estatísticas pessimistas existentes, mas como um ser humano, que praticou um ilícito penal, mas que de fato passou pelo processo de ressocialização tornando-o apto para novamente viver em sociedade, o que infelizmente, não ocorre na atualidade.


Bibliografia

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Sobre o autor
André Luis Turri

Escrivão de Polícia, graduado em Direito pela Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo, especialista em Direito e Processo Penal, especialista em Direito Público com ênfase em Gestão Pública.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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